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Este é um blog sobre Matemática em geral, com ênfase no período clássico-medieval, também sobre as Artes liberais (Trivium e Quadrivium), so...

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Sobre S. Isidoro de Sevilha

Santo Isidoro de Sevilha
por Miguel Zitow
PAPA BENTO XVI
AUDIÊNCIA GERAL
Quarta-feira, 18 de Junho de 2008


Santo Isidoro de Sevilha

Amados irmãos e irmãs

Hoje gostaria de falar de Santo Isidoro de Sevilha: era o irmão mais jovem de Leandro, Bispo de Sevilha, e grande amigo do Papa Gregório Magno. O relevo é importante, porque permite ter presente uma aproximação cultural e espiritual indispensável para a compreensão da personalidade de Isidoro. Com efeito, ele deve muito a Leandro, pessoa muito exigente, estudiosa e austera, que tinha criado à volta do irmão mais jovem um contexto familiar caracterizado pelas exigências ascéticas próprias de um monge e pelos ritmos de trabalho exigidos por uma séria dedicação ao estudo. Além disso, Leandro preocupou-se em predispor o necessário para fazer face à situação político-social do momento: de facto, nestas décadas os Visigodos, bárbaros e arianos, tinham invadido a península ibérica e dominado os territórios que pertenciam ao império romano. Era necessário conquistá-los para a romanidade e para o catolicismo. A casa de Leandro e de Isidoro dispunha de uma biblioteca muito rica de obras clássicas, pagãs e cristãs. Isidoro, que se sentia atraído simultaneamente por umas e outras, foi por isso educado a desenvolver, sob a responsabilidade do irmão maior, uma disciplina mais forte dedicando-se ao seu estudo com discrição e discernimento.

Por isso, no paço episcopal de Sevilha vivia-se num clima sereno e aberto. Podemos deduzi-lo dos interesses culturais e espirituais de Isidoro, assim como sobressaem das suas próprias obras, que incluem um conhecimento enciclopédico da cultura clássica pagã e um aprofundado conhecimento da cultura cristã. Explica-se assim o eclectismo que caracteriza a produção literária de Isidoro, que passa com extrema facilidade de Marcial a Agostinho, de Cícero a Gregório Magno. A luta interior que teve de empreender o jovem Isidoro, tornando-se sucessor do irmão Leandro na cátedra episcopal de Sevilha em 599, não foi de modo algum ligeira. Talvez se deva precisamente a esta luta constante consigo mesmo a impressão de um excesso de voluntarismo que se sente ao ler as obras deste grande autor, considerado o último dos Padres cristãos da antiguidade. Poucos anos depois da sua morte, em 636, o Concílio de Toledo de 653 definiu-o: "Ilustre mestre da nossa época e glória da Igreja católica".

Sem dúvida, Isidoro foi um homem de acentuadas oposições dialéticas. E, mesmo na sua vida pessoal, experimentou um conflito interior permanente, muito semelhante ao que já São Gregório Magno e Santo Agostinho tinham sentido, entre desejo de solidão, para se dedicar unicamente à meditação da Palavra de Deus, e exigências da caridade para com os irmãos de cuja salvação, como Bispo, se sentia responsável. Por exemplo, a propósito dos responsáveis das Igrejas ele escreve: "O responsável de uma Igreja (vir ecclesiasticus) deve por um lado deixar-se crucificar no mundo com a mortificação da carne e, por outro, aceitar a decisão da ordem eclesiástica, quando ela provém da vontade de Deus, de se dedicar ao governo com humildade, mesmo que não o queira fazer" (Sententiarum liber III, 33, 1: PL 83, col. 705 B). Então, somente um parágrafo depois, ele acrescenta: "Os homens de Deus (sancti viri) não desejam de modo algum dedicar-se às realidades seculares e gemem quando, por um misterioso desígnio de Deus, são carregados com certas responsabilidades... Eles fazem de tudo para as evitar, mas aceitam aquilo que gostariam de eludir e levam a cabo o que quereriam evitar. Com efeito, entram no segredo do coração e, ali dentro, procuram compreender o que exige a misteriosa vontade de Deus. E quando se dão conta que se devem submeter aos desígnios de Deus, humilham o pescoço do coração sob o jugo da decisão divina" (Sententiarum liber III, 33, 3: PL 83, coll. 705-706).

Para entender melhor Isidoro é necessário recordar, em primeiro lugar, a complexidade das situações políticas do seu tempo, à qual já me referi: durante os anos da infância, experimentou a amargura do exílio. Não obstante, vivia imbuído de entusiasmo apostólico: experimentava o entusiasmo de contribuir para a formação de um povo que finalmente encontrava a sua unidade nos planos político e religioso, com a providencial conversão do herdeiro ao trono visigodo Hermenegildo, do arianismo à fé católica. Todavia, não se deve subestimar a enorme dificuldade de enfrentar de modo adequado problemas muito graves, como aqueles com os hereges e com os judeus. Toda uma série de problemas que parecem muito concretos hoje, sobretudo se se considera o que acontece em certas regiões onde parece que assistimos ao repropor-se de situações muito semelhantes, presentes na península ibérica naquele século VI. A riqueza dos conhecimentos culturais de que Isidoro dispunha permitia confrontar continuamente a novidade cristã com a herança clássica greco-romana, embora mais que o dom precioso da síntese, parece que ele tivesse o da collatio, ou seja, do recolhimento, que se manifestava numa extraordinária erudição pessoal, nem sempre ordenada como se poderia desejar.

De qualquer maneira, é motivo de admiração a sua preocupação de nada descuidar daquilo que a experiência humana tinha produzido na história da sua pátria e do mundo inteiro. Isidoro nada queria perder daquilo que fora adquirido pelo homem nas épocas antigas, quer fossem pagãs, judaicas ou cristãs. Portanto, não nos devemos admirar se, em vista desta finalidade, acontecia que às vezes ele não conseguia transmitir adequadamente, como desejaria, os conhecimentos que possuía através das águas purificadoras da fé cristã. De fato, todavia, nas intenções de Isidoro, as propostas que ele apresenta permanecem sempre em sintonia com a fé católica, por ele sustentada com determinação. No debate dos vários problemas teológicos, ele demonstra que compreende a sua complexidade e propõe muitas vezes com perspicácia soluções que resumem e exprimem a verdade cristã completa. Isto permitiu que os fiéis, ao longo dos séculos, fruíssem com gratidão das suas definições até aos nossos tempos. Um exemplo significativo, a este respeito, é-nos oferecido pelo ensinamento de Isidoro sobre as relações entre vida ativa e vida contemplativa. Ele escreve: "Aqueles que procuram alcançar o descanso da contemplação devem preparar-se primeiro no estádio da vida ativa; e assim, livres dos resíduos do pecado, serão capazes de exibir aquele coração puro, o único que permite ver Deus" (Differentiarum Lib II, 34, 133: PL 83, col. 91 A). Porém, o realismo de um verdadeiro pastor convence-o do risco que os fiéis correm de reduzir-se a ser homens unidimensionais. Por isso, acrescenta: "O caminho do meio, composto por uma e outra forma de vida, é normalmente mais útil para resolver aquelas tensões que muitas vezes são aumentadas pela escolha de um só gênero de vida e por vezes são melhor temperadas por uma alternância das duas formas" (o.c., 134: ibid., col. 91 B).

Isidoro procura a confirmação definitiva de uma justa orientação de vida no exemplo de Cristo, e diz: "O Salvador Jesus ofereceu-nos o exemplo da vida ativa quando, durante o dia, se dedicava a oferecer sinais e milagres na cidade, mas mostrou a vida contemplativa quando se retirava no monte e ali pernoitava dedicando-se à oração" (o.c., 134: ibid.). À luz deste exemplo do Mestre divino, Isidoro pode concluir com este ensinamento moral específico: "Por isso o servo de Deus, imitando Cristo, dedique-se à contemplação sem se negar à vida ativa. Não seria justo comportar-se de outra forma. Com efeito, assim como se deve amar a Deus com a contemplação, também se deve amar o próximo com a ação. Por conseguinte, é impossível viver sem a presença simultânea de uma e de outra forma de vida, nem é possível amar, se não se vive a experiência de uma e de outra" (o.c., 135: ibid., col. 91 C). Na minha opinião, esta é a síntese de uma vida que busca a contemplação de Deus, o diálogo com Deus na oração e na leitura da Sagrada Escritura, assim como a ação ao serviço da comunidade humana e do próximo. Este resumo é a lição que o grande Bispo de Sevilha deixa a nós, cristãos de hoje, chamados a dar testemunho de Cristo no início de um novo milênio.


Texto disponível no link

Leia mais sobre S. Isidoro aqui.

Leia A Matemática de Isidoro de Sevilha e a Educação Medieval.



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Hugo e Ricardo de São Vítor

Nesta iluminura de Giovanni di Paolo (séc. XV), Dante
e sua amada Beatriz (no alto, à esquerda) encontram-se
no Paraíso com alguns dos mais importantes religiosos
da história. Ricardo de São Vítor é o penúltimo direita
para a esquerda no arco de baixo. No alto, com Dante
e Beatriz, estão Tomás de Aquino e Alberto Magno. No
arco, da esquerda para a direita, Graciano de Chiusi,
Pedro Lombardo, Dionísio Areopagita, Salomão, Boécio,
Paulo Orósio, Isidoro de Sevilha (fitando o serafim),
Beda, Ricardo e Siger de Brabante.

Abaixo transcrevemos uma homilia do Papa Bento XVI sobre Hugo e Ricardo de São Vítor.

PAPA BENTO XVI
AUDIÊNCIA GERAL
Quarta-feira, 25 de Novembro de 2009

Hugo e Ricardo de São Vítor

Queridos irmãos e irmãs!
Nestas Audiências de quarta-feira estou a apresentar algumas figuras exemplares de crentes, que se comprometeram a mostrar a concórdia entre a razão e a fé e a testemunhar com a sua vida o anúncio do Evangelho. Hoje, pretendo falar-vos de Hugo e Ricardo de São Vítor. Ambos se situam entre aqueles filósofos e teólogos conhecidos com o nome de Vitorianos, porque viveram e ensinaram na abadia de São Vítor, em Paris, fundada no início do século XII por Guilherme de Chapeaux. O próprio Guilherme foi mestre renomado, que conseguiu dar à sua abadia uma sólida identidade cultural. Em São Vítor, de facto, foi inaugurada uma escola para a formação dos monges, aberta também a estudantes externos, na qual se realizou uma síntese feliz entre os dois modos de fazer teologia, da qual já falei em catequeses precedentes:  isto é, a teologia monástica, orientada sobretudo para a contemplação dos mistérios da fé na Escritura, e a teologia escolástica, que utilizava a razão para procurar perscrutar estes mistérios com métodos inovadores, e criar um sistema teológico.

Temos poucas notícias da vida de Hugo de São Vítor. São incertos a data e o lugar do nascimento:  talvez na Saxónia ou na Flandres. Sabe-se que, tendo chegado a Paris – a capital europeia da cultura desse tempo – transcorreu o resto dos seus anos na abadia de São Vítor, onde foi primeiro discípulo e depois professor. Já antes da morte, no ano de 1141, alcançou uma grande fama e estima, a ponto de ser chamado um "segundo Santo Agostinho":  de facto, como Agostinho ele meditou muito sobre a relação entre fé e razão, entre ciências profanas e teologia. Segundo Hugo de São Vítor, todas as ciências, além de serem úteis para a compreensão das Escrituras, têm um valor em si mesmas e devem ser cultivadas para ampliar o saber do homem, assim como para corresponder ao seu anseio por conhecer a verdade. Esta sadia curiosidade intelectual levou-o a recomendar aos estudantes que jamais limitassem o desejo de aprender e no seu tratado de metodologia do saber e de pedagogia, intitulado significativamente Didascalicon (sobre o ensino), recomendava:  "Aprende de bom grado de todos o que não sabes. Será mais sábio do que todos aquele que terá querido aprender algo de todos. Quem recebe algo de todos, acaba por se tornar mais rico do que todos" (Eruditiones Didascalicae, 3, 14:  PL 176, 774).

A ciência da qual se ocupam os filósofos e os teólogos chamados Vitorianos é de modo particular a teologia, que exige antes de tudo o estudo amoroso da Sagrada Escritura. Com efeito, para conhecer Deus não se pode deixar de começar a partir do que o próprio Deus quis revelar de si mesmo através das Escrituras. Neste sentido, Hugo de São Vítor é um típico representante da teologia monástica, totalmente fundada na exegese bíblica. Para interpretar a Escritura, ele propõe a tradicional articulação patrístico-medieval, ou seja, em primeiro lugar o sentido histórico-literal, depois o alegórico e anagógico, e por fim o moral. Trata-se de quatro dimensões do sentido da Escritura, que também hoje se redescobrem, pelo qual se vê que no texto e na narração oferecida se esconde uma indicação mais profunda:  o fio da fé, que nos conduz para o alto e nos guia nesta terra, ensinando-nos a viver. Contudo, mesmo respeitando estas quatro dimensões do sentido da Escritura, de modo original em relação aos seus contemporâneos, ele insiste – e este é um aspecto novo – sobre a importância do sentido histórico-literal. Por outras palavras, antes de descobrir o valor simbólico, as dimensões mais profundas do texto bíblico, é preciso conhecer e aprofundar o significado da história narrada na Escritura:  caso contrário – adverte com uma comparação eficaz – corre-se o risco de ser como que um estudioso de gramática que ignora o alfabeto. Para quem conhece o sentido da história descrita na Bíblia, as vicissitudes humanas parecem marcadas pela Providência Divina, segundo um seu desígnio bem ordenado. Assim, para Hugo de São Vítor, a história não é o êxito de um destino cego ou de um caso absurdo, como poderia parecer. Ao contrário, na história humana age o Espírito Santo, que suscita um diálogo maravilhoso dos homens com Deus, seu amigo. Esta visão teológica da história põe em evidência a intervenção surpreendente e salvífica de Deus, que realmente entra e age na história, quase se faz parte da nossa história, mas salvaguardando e respeitando sempre a liberdade e a responsabilidade do homem.

Para o nosso autor, o estudo da Sagrada Escritura e do seu significado histórico-literal torna possível a teologia verdadeira, isto é, a ilustração sistemática das verdades, conhecer a sua estrutura, a explicação dos dogmas da fé, que ele apresenta numa síntese sólida no tratado De Sacramentis christianae fidei (Os sacramentos da fé cristã), onde se encontra, entre outras, uma definição de "sacramento" que, aperfeiçoada ulteriormente por outros teólogos, contém aspectos ainda hoje muito interessantes. "O sacramento", escreve ele, "é um elemento corpóreo ou material proposto de modo externo e sensível, que representa com a sua semelhança uma graça invisível e espiritual, a significa, porque para esta finalidade foi instituído, e a contém, porque é capaz de santificar" (9, 2; PL 176, 317). Por um lado a visibilidade no símbolo, a "corporeidade" do dom de Deus, no qual contudo, por outro lado, se esconde a graça divina que provém de uma história:  o próprio Jesus Cristo criou símbolos fundamentais. São portanto três os elementos que concorrem para definir um sacramento, segundo Hugo de São Vítor:  a instituição por parte de Cristo, a comunicação da graça e a analogia entre o elemento visível, o material e o elemento invisível, que são os dons divinos. Trata-se de uma visão muito próxima da sensibilidade contemporânea, porque os sacramentos são apresentados com uma linguagem rica de símbolos e imagens capazes de falar imediatamente ao coração dos homens. É importante também hoje que os animadores litúrgicos, e em particular os sacerdotes, valorizem com sabedoria pastoral os sinais próprios dos ritos sacramentais – esta visibilidade e tangibilidade da Graça – cuidando atentamente da sua catequese, para que cada celebração dos sacramentos seja vivida por todos os fiéis com devoção, intensidade e júbilo espiritual.

Um discípulo digno de Hugo de São Vítor é Ricardo, proveniente da Escócia. Ele foi prior da abadia de São Vítor de 1162 a 1173, ano da sua morte. Também Ricardo, naturalmente, atribui um papel fundamental ao estudo da Bíblia, mas, ao contrário do seu mestre, privilegia o sentido alegórico, o significado simbólico da Escritura com o qual, por exemplo, interpreta a figura veterotestamentária de Benjamim, filho de Jacob, como símbolo da contemplação e vértice da vida espiritual. Ricardo trata este tema em dois textos, Benjamim Menor e Benjamim Maior, nos quais propõe aos fiéis um caminho espiritual que convida antes de tudo a exercer as várias virtudes, aprendendo a disciplinar e a ordenar com a razão os sentimentos e os impulsos interiores afectivos e emotivos. Só quando o homem alcança equilíbrio e maturação humana neste campo, está pronto para aceder à contemplação, que Ricardo define como "um olhar profundo e puro da alma sobre as maravilhas da sabedoria, associado a um sentido estático de estupefacção e admiração" (Benjamim Maior, 1, 4; PL 196, 67).

Por conseguinte, a contemplação é o ponto de chegada, o resultado de um caminho difícil, que exige o diálogo entre a fé e a razão, ou seja – mais uma vez – um discurso teológico. A teologia começa a partir das verdades que são objecto da fé, mas procura aprofundar o conhecimento com o uso da razão, apropriando-se do dom da fé. Esta aplicação do raciocínio à compreensão da fé é praticada de modo convincente na obra-prima de Ricardo, um dos grandes livros da história, o De Trinitate (A Trindade). Nos seis livros que a compõem ele reflecte com perspicácia sobre o Mistério de Deus uno e trino. Segundo o nosso autor, dado que Deus é amor, a única substância divina exige comunicação, oblação e dilecção entre duas Pessoas, o Pai e o Filho, que se encontram entre si num intercâmbio eterno de amor. Mas a perfeição da felicidade e da bondade não admite exclusivismos nem fechamentos:  exige antes a presença eterna de uma terceira Pessoa, o Espírito Santo. O amor trinitário é participativo, concorde e requer superabundância de dilecção, gozo de alegria incessante. Isto é, Ricardo supõe que Deus é amor, analisa a essência do amor, o que está implicado na realidade do amor, chegando assim à Trindade das Pessoas, que é realmente a expressão lógica do facto de que Deus é amor.

Contudo Ricardo está consciente de que o amor, mesmo se nos revela a essência de Deus, nos faz "compreender" o Mistério da Trindade, contudo é uma analogia para falar de um Mistério que supera a mente humana, e – sendo poeta e místico – serve-se também de outras imagens. Por exemplo, compara a divindade com um rio, com uma onda amorosa que brota do Pai, flui e reflui no Filho, para ser depois felizmente difundida no Espírito Santo.

Queridos amigos, autores como Hugo e Ricardo de São Vítor elevam o nosso ânimo à contemplação das realidades divinas. Ao mesmo tempo, a imensa alegria que nos suscitam o pensamento, a admiração e o louvor da Santíssima Trindade, funda e apoia o compromisso concreto de nos inspirarmos neste modelo perfeito de comunhão no amor para construir as nossas relações humanas de todos os dias. A Trindade é deveras comunhão perfeita! Como mudaria o mundo se nas famílias, nas paróquias e em qualquer outra comunidade as relações fossem vividas seguindo sempre o exemplo das três Pessoas divinas, em que cada um vive não só com o outro, mas para o outro e no outro! Recordei isto há alguns meses no Angelus:  "Só o amor nos torna felizes, porque vivemos em relação, e vivemos para amar e para ser amados" (L'Oss. Rom., ed. port. de 13 de Junho de 2009). É o amor que realiza este milagre incessante:  como na vida da Santíssima Trindade, a pluralidade recompõe-se em unidade, onde tudo é complacência e júbilo. Com Santo Agostinho, tido em grande honra pelos Vitorianos, também nós podemos exclamar:  Vides Trinitatem, si caritatem vides – contemplas a Trindade, se vês a caridade" (De Trinitate VIII, 8, 12).

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Boécio e Cassiodoro

Cassiodoro, em um manuscrito
do século XII
PAPA BENTO XVI
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 12 de Março de 2008

Boécio e Cassiodoro

Amados irmãos e irmãs

Hoje, gostaria de falar de dois escritores eclesiásticos, Boécio e Cassiodoro, que viveram nos anos mais atormentados do Ocidente cristão e, em particular, da península itálica. Odoacre, rei dos Erulos, uma etnia germânica, revoltou-se, pondo fim ao império romano do Ocidente (a. 476), mas depressa teve que sucumbir aos Ostrogodos de Teodorico, que por algumas décadas mantiveram o controle da península itálica. Boécio nasceu em Roma por volta do ano 480, da nobre linhagem dos Anísios, e entrou ainda jovem na vida pública, alcançando já com vinte e cinco anos de idade o cargo de senador. Fiel à tradição da sua família, comprometeu-se na política, convencido de que se podiam conciliar as linhas fundamentais da sociedade romana com os valores dos novos povos. E neste novo tempo do encontro das culturas, considerou como sua missão reconciliar e unir estas duas culturas, a clássica romana com a cultura nascente do povo ostrogodo. Foi igualmente activo na política, mesmo sob Teodorico, que nos primeiros tempos o estimava muito. Apesar desta actividade pública, Boécio não descuidou os estudos, dedicando-se em particular ao aprofundamento de temas de ordem filosófico-religiosa. Mas escreveu também manuais de aritmética, de geometria, de música e de astronomia: tudo com a intenção de transmitir às novas gerações, aos novos tempos, a grande cultura greco-romana. Neste âmbito, ou seja, no empenho de promoção do encontro das culturas, utilizou as categorias da filosofia grega para propor a fé cristã, também aqui em busca de uma síntese entre o património greco-romano e a mensagem evangélica. Precisamente por isto, Boécio foi qualificado como o último representante da cultura romana antiga e um dos primeiros intelectuais medievais.

Sem dúvida, a sua obra mais conhecida é o De consolatione philosophiae, que ele compôs no cárcere para dar um sentido ao seu aprisionamento injusto. Com efeito, fora acusado de conspiração contra o rei Teodorico, por ter assumido a defesa em juízo de um amigo, o senador Albino. Mas este era um pretexto: na realidade Teodorico, ariano e bárbaro, suspeitava que Boécio tivesse simpatias pelo imperador bizantino Justiniano. De facto, processado e condenado à morte, foi justiçado no dia 23 de Outubro de 524, com apenas 44 anos. Precisamente por este seu fim dramático, ele pode falar do interior da sua experiência também ao homem contemporâneo e sobretudo às numerosas pessoas que padecem a sua mesma sorte por causa da injustiça presente em muitas partes da "justiça humana". Neste obra, no cárcere busca a consolação, a luz, a sabedoria. E diz que soube distinguir, precisamente em tal situação, entre os bens aparentes na prisão eles desaparecem e os bens verdadeiros, como a amizade autêntica que mesmo na prisão não desaparecem. O bem mais excelso é Deus: Boécio aprendeu e ensina-nos a não cair no fatalismo, que apaga a esperança. Ele ensina-nos que não é o caso que governa, mas sim a Providência, e que ela tem um rosto. Pode-se falar com a Providência, porque Ela é Deus. Assim, também no cárcere lhe permanece a possibilidade da oração, do diálogo com Aquele que nos salva. Ao mesmo tempo, também nesta situação, ele conserva o sentido da beleza da cultura e evoca o ensinamento dos grandes filósofos antigos gregos e romanos, como Platão, Aristóteles, começara a traduzir estes gregos em latim Cícero, Sêneca e inclusive poetas como Tibulo e Virgílio.

A filosofia, no sentido da busca da verdadeira sabedoria, é segundo Boécio o autêntica remédio da alma (cf. lib. I). Por outro lado, o homem pode experimentar a verdadeira felicidade unicamente na sua interioridade (cf. lib II). Por isso, Boécio consegue encontrar um sentido, pensando na sua tragédia pessoal à luz de um texto sapiencial do Antigo Testamento (cf. Sb 7, 30-8, 1), que ele cita: "Contra a sabedoria, a maldade não pode prevalecer. Ela estende-se de um confim ao outro com força e governa com bondade excelente todas as coisas" (lib III, 12: PL 63, col. 780). A chamada prosperidade dos malvados, portanto, revela-se falsa (cf. lib. IV) e evidencia-se a natureza providencial da adversa fortuna. As dificuldades da vida não somente revelam como ela é efémera e de breve duração, mas chegam a demonstrar-se úteis para reconhecer e manter os relacionamentos genuínos entre os homens. A adversa fortuna permite, efectivamente, discernir os amigos falsos dos verdadeiros e faz compreender que nada é mais precioso para o homem que uma amizade autêntica. Aceitar de modo fatalista uma condição de sofrimento é absolutamente perigoso, acrescenta o crente Boécio, porque "elimina pela raiz a própria possibilidade da oração e da esperança teologal, que se encontram na base da relação do homem com Deus" (lib. V, 3: PL 63, col. 842).

A peroração final do De consolatione philosophiae pode ser considerada uma síntese de todo o ensinamento que Boécio dirige a si mesmo e a todos aqueles que viessem a encontrar-se nas suas mesmas condições. Assim escreve na prisão: "Combatei portanto os vícios, dedicai-vos a uma vida virtuosa, orientada pela esperança que eleva o coração a ponto de alcançar o céu com as orações alimentadas de humildade. A imposição que padecestes pode transformar-se, se rejeitardes a mentira, na enorme vantagem de ter sempre diante dos olhos o juiz supremo que vê e sabe como as coisas verdadeiramente são" (lib. V, 6: PL 63, col. 862). Cada prisioneiro, independentemente do motivo pelo qual terminou no cárcere, intui como é pesada esta particular condição humana, sobretudo quando é embrutecida, como acontece com Boécio, pelo recurso à tortura. Particularmente absurda é, além disso, a condição de quem, ainda como Boécio que a cidade de Pavia reconhece e celebra na liturgia como mártir da fé, é torturado mortalmente, sem qualquer motivo que não seja o das suas próprias convicções ideais, políticas e religiosas. Boécio, símbolo de um número imenso de aprisionados injustamente de todos os tempos e de todas as latitudes, é com efeito a objectiva porta de entrada para a contemplação do misterioso Crucificado no Gólgota.

Contemporâneo de Boécio foi Marcos Aurélio Cassiodoro, um calabrês nascido em Squillace por volta do ano 485, que faleceu em idade avançada em Vivarium, por volta de 580. Também ele, homem de alto nível social, se dedicou à vida política e ao compromisso cultural como poucos outros no ocidente romano do seu tempo. Talvez os únicos que podiam comparar-se com ele neste seu dúplice interesse foram o já recordado Boécio e o futuro Papa de Roma, Gregório Magno (590-604). Consciente da necessidade de não deixar esquecer todo o património humano e humanístico, acumulado nos séculos de ouro do império romano, Cassiodoro colaborou generosamente, e nos níveis mais elevados da responsabilidade política, com os novos povos que tinham atravessado os confins do império, estabelecendo-se na Itália. Também ele foi modelo de encontro cultural, de diálogo de reconciliação. As vicissitudes históricas não lhe permitiram realizar os seus sonhos políticos e culturais, que visavam criar uma síntese entre a tradição romano-cristã da Itália e a nova cultura gótica. Porém, aquelas mesmas vicissitudes convenceram-no da providencialidade do movimento monástico, que se ia confirmando nas terras cristãs. Decidiu apoiá-lo, dedicando-lhe todas as suas riquezas materiais e forças espirituais.

Concebeu a ideia de confiar precisamente aos monges a tarefa de recuperar, conservar e transmitir à posteridade o imenso património cultural dos antigos, para que não se perdesse. Por isso, fundou o Vivarium, um cenóbio no qual tudo era organizado de tal maneira que o trabalho intelectual dos monges fosse considerado extremamente precioso e irrenunciável. Ele dispôs que também os monges que tinham uma formação intelectual não deviam ocupar-se somente do trabalho material, da agricultura, mas também transcrever manuscritos e assim contribuir para transmitir a grande cultura às gerações vindouras. E isto sem qualquer desvantagem para o compromisso espiritual, monástico e cristão, nem para a actividade caritativa aos pobres. No seu ensinamento, distribuído em várias obras, mas sobretudo no tratado De anima e nas Institutiones divinarum litterarum, a oração (cf. PL 69, col. 1108), nutrida pela Sagrada Escritura e particularmente pela leitura assídua dos Salmos (cf. PL 69, col. 1149), tem sempre uma posição central como alimento necessário para todos. Eis, por exemplo, como este doutíssimo calabrês introduz a sua Expositio in Psalterium: "Rejeitando e abandonando em Ravena as solicitações da carreira política assinalada pelo sabor amargo das preocupações mundanas, e tendo experimentado o Saltério, livro descido do céu como autêntico mel da alma, mergulhei ávido como um sedento para o perscrutar sem cessar e para me deixar permear inteiramente por esta docilidade salutar, depois de me ter saturado das numerosas amarguras da vida activa" (PL 70, col. 10).

A busca de Deus, orientada para a sua contemplação anota Cassiodoro permanece a finalidade permanente da vida monástica (cf. PL 69, col. 1107). Porém, ele acrescenta que, com a ajuda da graça divina (cf. PL 69, col. 1131-1142), uma melhor fruição da Palavra revelada pode ser alcançada através da utilização das conquistas científicas e dos instrumentos culturais "profanos" já possuídos pelos Gregos e pelos Romanos (cf. PL 69, col. 1140). Pessoalmente, Cassiodoro dedicou-se a estudos filosóficos, teológicos e exegéticos sem uma particular criatividade, mas atento às intuições que reconhecia válidas nos outros. Lia com respeito e devoção, sobretudo Jerónimo e Agostinho. Deste último, dizia: "Em Agostinho, há tanta riqueza que me parece impossível encontrar algo que não tenha já sido tratado abundantemente por ele" (cf. PL 70, col. 10). Citando Jerónimo, ao contrário, exortava os monges de Vivarium: "Alcançam a palma da vitória não somente aqueles que lutam até à efusão do sangue ou que vivem na virgindade, mas também todos aqueles que, com a ajuda de Deus, vencem os vícios do corpo e conservam a recta fé. Mas para que possais, sempre com a ajuda de Deus, vencer mais facilmente as solicitações do mundo e as suas seduções, permanecendo nele como peregrinos continuamente a caminho, procurai acima de tudo garantir para vós a ajuda salutar sugerida pelo primeiro Salmo, que recomenda meditar a lei do Senhor noite e dia. Com efeito, o inimigo não encontrará qualquer passagem para vos assaltar, se toda a vossa atenção for ocupada por Cristo" (De Institutiones Divinarum Scripturarum, 32: PL 70, col. 1147). É uma admoestação que podemos acolher como válida também para nós. De facto, agora vivemos num tempo de encontro de culturas, de perigo da violência que destrói as culturas e do necessário compromisso de transmitir grandes valores e de ensinar às novas gerações o caminho da reconciliação e da paz. Encontramos este caminho, orientando-nos para Deus com o rosto humano, o Deus que se nos revelou em Cristo.


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O que é o Quadrivium? - por Roberto Helguera

Um jovem sendo apresentado às sete
artes liberais, 1484-1486. Sandro Botticelli

Transcrevemos abaixo um vídeo sobre Quadrivium traduzido pela própria Sacros*. Vídeo original está neste link.

 ...são artes que nos explicam a harmonia
que existe nas coisas
e essa harmonia é contemplável em si mesma,
porque diretamente
nos aponta para aquele Deus que nos fez
imagem e semelhança...

...são coisas que nos surpreendem
e nos fazem rir
porque, assim como O Pequeno Príncipe, 
elas nos fazem cantar,
eles nos fazem rir
porque são lindas...

...para entender que eu
também sou chamado para ser um ser divino,
para ser um Filho de Deus...

Olá. Como vai? Mais uma vez, estamos juntos. Estamos aprendendo a educar. Estamos aprendendo sobre homeschooling e estamos aprendendo sobre um monte de coisas. Quero falar com você hoje. Já falei com você sobre o que fazer se no meio de sua vida você descobrir que não foi educado.

Depois, falei com você sobre em que consiste uma boa educação. Mencionei a você que uma boa educação requer as artes do trivium e do quadrivium: as artes liberais ou aquelas artes que tornam o homem livre. Era o que os antigos, até não muito tempo atrás consideravam que tinha que saber qualquer pessoa capaz de participar politicamente ou governar a polis. Por quê? Porque essas artes liberais da gramática, lógica, retórica, aritmética, geometria, música e astronomia foram aquelas que moldam a alma e inteligência de tal forma que você pudesse se tornar um homem sábio, porque elas lhe permitiram não apenas nomear o que existe, mas ver bem o que existe nessas coisas. Prudência, como adaptar seu intelecto a uma realidade que está fora de você.

Hoje quero falar com você sobre o quadrivium, as quatro artes liberais, cujo objeto é, se você preferir, a matéria, mas me referir a elas como artes cujo objeto é a matéria, pode lhe dar uma ideia errada de que o quadrivium é mais do que qualquer outra coisa artes servis e não liberais, ou seja, artes que são usadas para fazer coisas.

Por exemplo, a física é usada para construir pontes ou resolver problemas de construção de edifícios, ou balística, ou guerra, ou qualquer outra coisa. Esses são usos legítimos da física, usos legítimos de uma ciência, mas não é a forma como os antigos pensavam nisso.

A razão pela qual temos quatro artes liberais que é a aritmética, geometria, música e astronomia,  principalmente, é porque são artes que nos explicam a harmonia que existe nas coisas, e essa harmonia é contemplável em si mesma, porque diretamente nos aponta para aquele Deus que nos fez imagem e semelhança... Portanto, a maneira liberal de pensar nas artes, tanto na gramática quanto na lógica, retórica, bem como as artes do quadrivium, é pensar no que elas nos dão de harmonia.

Como posso alcançar a harmonia? Pois a harmonia é o repouso, o repouso de minha alma e esse repouso que é obtido pela contemplação e compreensão, aquele momento em que você diz: "ah, entendi" ou se não, pelo menos acho que isso deve ser ótimo. "Senhor - como o Pedro disse - estamos muito bem aqui, vamos fazer três tendas". Por que Pedro quis ficar com Cristo transfigurado? Porque ele estava vendo a harmonia daquele Deus criador.

As artes liberais nos permitem ver a harmonia e considerar a harmonia das coisas. E isso, essa permanência constante na beleza é uma questão que nos da esse repouso. Repousa a mente, repousa a alma e é muito sensato, é muito saudável para minha mente, é muito saudável para essa modernidade.

Vamos pensar: o que a modernidade nos oferece hoje?

A modernidade hoje nos oferece uma "desarmonia", música que não é harmônica, pura gritaria, pura percussão, puro pulo, um escapismo. Desconstrói, o ser humano e a alma em mil matérias e em mil aspectos, como se fôssemos uma coleção acidental de átomos. Não acredita em leis permanentes. Tudo está sujeito a mudanças. Sempre há gritos. Existe um desespero, uma falta de esperança. Por quê? Porque não há beleza. Porque não há beleza. Podemos ver isso de forma muito prática.

Na cidade de Buenos Aires, onde eu moro, por exemplo, é possível ver perfeitamente bem imagens da rua onde temos muito bonita arquitetura de uma época anterior, onde o homem que via harmonia e também tem arquitetura mais bem "original" e muitas vezes brutalista e feia, de uma mentalidade moderna que não acredita mais em harmonia, mas acredita no efêmero do ser humano. Acredita que estamos aqui por acidente e, na pior das hipóteses, também temos todas as calçadas e todas as paredes pichadas por pessoas que não acreditam mais em nada. Portanto, é muito importante trazer harmonia para sua vida. 

Assim como a palavra do trivium nos deu harmonia nos nomes, em nomear, em dizer: "sim, de fato, esse som, essa palavra, ela significa justamente essa realidade" e isso nos dá repouso. A lógica junta essas palavras em uma sintaxe harmônica: sujeito, verbo, predicado, etc., que nos dá satisfação em completar uma ideia, em dar uma ideia completa e expressá-la. A retórica nos dá... diz o grande Andrew Kern do Instituto CIRCE, que é um grande pensador, nos diz: o propósito da retórica é trazer harmonia para a comunidade. Por quê? Porque com a palavra da gramática e da lógica argumentamos para convencer o outro do que é bom, belo e verdadeiro, e para manter a paz, para obter paz para a comunidade.

Dessa forma podemos considerar a Ilíada, aqueles que a leram, a Ilíada, onde tudo é guerra  como uma falha de harmonia como uma falha na retórica. Por outro lado, na Odisseia, onde se trata de uma jornada de um personagem, Ulisses ou Odisseu, desde o naufrágio e a pobreza, de ter perdido todos os seus tesouros de guerra e seus homens para recuperar sua pátria, botim e riquezas e tudo graças à sua boa retórica.

Bem, hoje Quero falar com você sobre harmonia em números, em quantidade ou magnitude, no tempo e no espaço. Vamos falar sobre aritmética. A aritmética é harmônica, por quê? Porque os números, (a quantidade é natural para o homem e os números). Brincando com os números, aqueles que são bons em matemática sabem que há muitas regras.

Por exemplo. Como posso saber qual número é divisível por determinados números? Eu sei que todo número par é divisível por dois. Por que isso acontece? Porque eu tenho uma ideia do que significa a unidade e do que o dois significa. Dois não é somente um mais um, dois tem suas próprias características, é por isso que o chamamos de número par, entre outras coisas.

Quais números são divisíveis por três ou por seis ou por nove? Muitas vezes sabemos que se for divisível por três e por dois é divisível por seis, ou que, se a soma de seus dígitos dá nove, é divisível por nove. Isso é muito interessante porque nos diz que que há uma harmonia desde o início.

Tendo mencionado o "(princípio)", você quer ir embora. O que lemos em São João?

"No princípio era o Verbo, e a Palavra era Deus - ou é Deus - e a Palavra era Deus e a Palavra está com Deus, e sem a Palavra nada foi criado".

A Palavra é uma só, mas Deus é uno e trino. Como sabemos disso? Porque Deus cria o homem à sua própria imagem e semelhança e fala no plural. E nós sabemos que Deus é três e criou o homem, macho e fêmea: dois. E criou o homem com quatro, digamos, elementos da natureza: o úmido, o seco, o quente e o frio, como diriam os antigos. E assim por diante temos números em toda a natureza.

De fato, aqueles que estão familiarizados com o número áureo ou a proporção áurea sabem que a sequência de Fibonacci. Pesquise: "Sequência de Fibonacci". É uma sequência que indica uma ordem absolutamente permeável por toda a criação. Essa sequência é como um logaritmo que indica que cada número é o resultado da soma dos dois anteriores.

Então é $1$; 
$2=1+1$;
$3=2+1$; 
$5=3+2$; 
$8=5+3$, e assim por diante...

E se fizermos isso logaritmicamente, geometricamente, isso nos dará uma curva específica que você vê na forma como as sementes crescem, os galhos das árvores, a forma do nautilus, esse caracol, tão bonito das profundezas do mar e tantas outras figuras da natureza. Isso nos mostra que Deus utiliza a quantidade de forma harmoniosa, mas também a magnitude, porque a matéria tem, além de quantidade, além de ser quantificável. Por quê? Porque ela tem partes. A matéria tem magnitude, tem comprimento, tem largura, profundidade, volume e tudo isso está dentro dos limites. Isso significa que a matéria tem formas.

A geometria é o estudo das formas, por assim dizer. Mas essas formas também são harmônicas porque elas nos trazem repouso na compreensão das propriedades, por exemplo, dos quadriláteros. O que acontece quando eu divido um segmento, por exemplo, em partes iguais e desiguais e construo um quadrado nesse segmento? Percebo que a área desse quadrado, por exemplo, é a soma da área dos dois quadrados menores formados pelos segmentos mais dois quadriláteros, formados por um lado por um segmento longo e o outro lado por um segmento curto. Isso nada mais é do que a equação quadrática, mas expressa geometricamente, ela tem uma beleza enorme.

Portanto, a geometria é importante para a educação porque ela nos traz harmonia, porque é cheia de maravilhas. Temos admiração por esse tipo de regras que acabei de mencionar para você, ou que os ângulos internos de um triângulo somam dois ângulos retos. Sempre. Essas são coisas que nos surpreendem e nos fazem rir porque, assim como O Pequeno Príncipe, elas nos fazem nos fazem cantar, nos dão, nos fazem rir porque são lindas.

A geometria também é bonita. Há pelo menos três fontes de beleza na geometria. Primeiro, as próprias figuras que são perfeitas, dentro de sua espécie, são perfeitas. Cada um dos sólidos, por exemplo, a simetria e a proporção. Isso também é algo que nos dá prazer. E finalmente, há uma beleza nas próprias verdades geométricas,

E já estou falando de forma abstrata, que não estou falando de geometria ou aritmética como algo útil para construir pontes. Ela pode ser usada para isso, e por ter essas propriedades que estão descobrindo e há uma grande alegria, um grande descanso em harmonia quando se vê essas coisas.

Além disso, a geometria está repleta de elementos fundamentais para a filosofia. É por isso que vemos na famosa Academia de Platão uma placa na entrada que dizia que ninguém que seja ignorante de matemática ultrapassa esse limite. Ou seja, que ninguém que seja ignorante de matemática faça filosofia. Isso é importante porque na modernidade o filósofo é visto como alguém que lida com palavras, ciências sociais e não em ciências exatas. As ciências exatas são para engenheiros. Mentira. Não há melhor filósofo do aquele que entende bem de física, que entende bem a beleza e a harmonia da matemática.

Por quê? Bem, porque Platão viu muitos dos princípios universais facilmente descobertos na matemática, e são princípios que são fundamentais para a filosofia, que o todo é maior do que a parte. Você vai me dizer: óbvio. Mas isso é frequentemente negado. Que uma coisa não pode ser tanto par ou ímpar, por exemplo. Isso me mostra o princípio da não-contradição. Os gregos eram muito, muito realistas que não iam além das três dimensões. Para eles, quatro, cinco ou seis dimensões não têm sentido.

A matemática moderna muitas vezes segue uma física moderna que contém muitos dos erros filosóficos, mas isso não impede ninguém, qualquer físico, prefira às equações mais elegantes, mais bonitas, mais sintéticas e que melhor e mais elegantemente expressam uma realidade. É por isso que Einstein, apesar de sua belíssima equação da relatividade, estudou todo o fenômeno da relatividade tentando salvar as equações de Maxwell, as equações da eletricidade, porque ele as viu de forma tão bela que disse que elas não podem deixar de ser verdadeiras, não podem não ser verdadeiras, porque naquela época eles não podiam provar que as equações de Maxwell eram verdadeiras.

Então, isso é interessante. É um aspecto da vida de alguém que realmente considera a geometria ou a matemática, a aritmética como algo belo em si mesmo, como algo que tem um valor em si mesmo. A geometria, além disso, exercita a mente de uma forma elevada. É por isso que os gregos estudavam a geometria como algo fundamental e necessário, algo que mostra, se você preferir, a ordem divina das coisas.

E isso nos leva ao o estudo da música. A música, diriam os antigos, é o conhecimento prático, segundo eles, da modulação, "modulatio" que constitui o som e o canto e a música deriva da palavra musa. As nove musas dos gregos, que inspiravam os poetas para expressar verdades divinas sem compreendê-las. Ou seja, como se os deuses falassem por meio dos poetas, ao homem normal. Mas como eles falavam em um idioma superior, eles falavam de uma forma poética, de uma forma intuitiva, como metafórica ou alegórica, ou, exatamente, dessa forma: analógica. Essa linguagem que é tão importante saber e que eu já falei com você em outros vídeos sobre a importância importância de conhecer esse modo de conhecer, é uma linguagem que, é expressa na música.

A música também é muito matemática. Como assim? Porque as notas são uma questão de relações matemáticas. Se você souber, uma nota, por exemplo, uma oitava, é uma proporção de 1 para 2. Se eu tiver uma corda com comprimento de um metro e eu a cortar pela metade, por 50 centímetros, esses 50 centímetros vai soar uma oitava acima do que a corda, ela vibrará duas vezes mais rápido, do que a corda inteira. E assim sabemos que, por exemplo, uma 5ª é uma proporção de 2 para 3 e uma 4ª é uma razão de 3 para 4, e a segunda é uma proporção de 9 para 11 ou 9 para 12, se não estou enganado.

Quanto mais harmônico o som, mais simples a proporção, quanto mais atonal ou "inarmônico" for o som, mais complexa será a relação para o ouvido, o número é maior. E é dito que, por exemplo, os planetas circulam, há uma sinfonia famosa do som dos planetas por Holst, que me parece ser baseada no Timeu, onde os planetas circulam em órbitas que têm relações matemáticas com respeito ao resto das órbitas, e essas relações formam sons, sons do universo.

O antigo tinha um ouvido capaz de ouvir muitas harmonias e muitas coisas que nós perdemos por causa do barulho de toda a tecnologia da modernidade. Nós perdemos, mas podemos recuperá-lo sempre buscando isso.

Portanto, a terceira arte do quadrivium é a música e ela é tão fundamental e tão embutida na criação que não é à toa que um poeta, por assim dizer, como Tolkien escreve em seu Silmarillion, que no início Ilúvatar, que é um nome para Deus, cantou, fez música e essa música era criativa, criou.

E a Liturgia nós a cantamos ou deveríamos cantá-la. E quando estamos felizes, ou apaixonados ou alegres, o que fazemos? Começamos a assobiar ou cantar. E por que cantar é orar duas vezes? Porque quando alguém canta afirma que o que ele está cantando é bonito, é bom, é bonito e é verdadeiro. Afirma duas coisas: é verdadeiro e é belo portanto, é digno de uma canção. É por isso que a música é uma das artes mais importantes e não deve faltar em sua educação ou na educação de seus filhos.

Se você nunca fez nada sobre música, bem, nunca é tarde demais para começar a estudar um instrumento, um instrumento clássico: violino, violoncelo, algum instrumento agradável se você tiver um bom ouvido. O piano é o mais simples, porque as notas já estão predeterminadas. O violão é um pouco mais difícil, mas é muito satisfatório. E cantar. Cante, cante, coloque música em sua vida, em sua alma. Isso é importante.

Na modernidade, estamos acostumados a não fazer música, mas a ouvir música transmitida eletronicamente. E é muito bom, mas eu te encorajo a tentar fazer música você mesmo, participe de um coral, cantar, fazer aulas de voz, aulas de canto faça alguma coisa.

Finalmente, astronomia. A astronomia, aqui podemos lembrar dessa pequena rima de Estrelinha, com a música de Mozart, que resume todo o espírito da astronomia.

«Twinkle, Twinkle twinkle little star. How I wonder what you are».

Brilha, brilha, estrelinha. Eu me pergunto o que você é.

E isso é como O Pequeno Príncipe. Aqui chega um estudo que nos leva ao espaço. E o espaço nos atrai porque é misterioso e cheio de ordem e previsibilidade. Todo dia o sol nasce, todo dia o sol se põe, todo dia nós vemos a lua de minguante, de meia-lua, de lua cheia, até cheia e assim por diante. Ela cresce e cresce a cada 29 dias, é regular, há uma regularidade nos planetas, nas órbitas que quando as entendemos, nos causa uma enorme harmonia na alma.

Saber que esses seres misteriosos que estão lá, essas criaturas que são esses planetas e sóis gigantescos que estão lá, alguns que nós nunca chegaremos a ver como seres humanos. E Deus os colocou lá pelo prazer, para nos mostrar a beleza e que a beleza como é Deus é harmônica, porque Deus Trino e Uno e Trino faz tudo em harmonia.

Por exemplo, é dito que o universo começou no dia 25 de março. E por quê? Porque a encarnação ocorreu no dia 25 de março e também no dia 25 de dezembro, nove meses depois Cristo nasce e assim tudo tem uma harmonia, certo? E se você me dissesse: «adivinha que dia poderia ser o dia em que tudo acabaria" E eu diria: Não sei quando, não sei em que ano, mas apostaria no dia 25 de março.

Então, no quadrivium temos a aritmética da quantidade, a geometria da magnitude, música, que é quantidade, magnitude e tempo colocados em uma harmonia. E a astronomia que me causa, me mostra essa harmonia de toda a criação que eu contemplo para entender que eu também fui chamado para ser um ser divino, para ser um Filho de Deus... para me alegrar como o Pequeno Príncipe.

E quando eu olhar para as estrelas, rir e ouvir a risada do Pequeno Príncipe, esse é o quadrivium, muito importante faça com que isso faça parte de sua vida, coloque em prática em seu programa, eduque seus filhos com isso ou se eduque também nessas artes. Eu te incentivo.

Nos vemos na próxima vez para continuarmos falando sobre educação.

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A diferença entre a Educação Clássica e a atual

Ilustração de um manuscrito
do século XVI que mostra
uma reunião de médicos na
Universidade de Paris

A diferença da Educação Clássica

A nós, que normalmente tivemos uma educação progressista, pode parecer nebulosa a ideia da educação clássica. Se na ciência e na tecnologia voltar atrás na história uns trezentos anos é impensável, por que seria diferente com a educação? Por que desprezar o modelo de ensino que hoje impera em nossas escolas em busca de um ideal “do passado” que todos já julgavam morto?

A provocação pode se agravar ao pensarmos no currículo. Latim, uma língua que ninguém fala fora dos círculos eclesiásticos e jurídicos? Literatura Clássica, livros com centenas ou milhares de anos? Foco nas Humanidades, quando o que mais importa é, geralmente, a técnica? Moral, em tempos de tão intenso relativismo? Parece apego irracional ao passado.

No entanto, ao vemos o absoluto fracasso da educação moderna, em que muitas vezes doutores e graduados são incapazes de construir argumentos inteligíveis ou se articular, professores não sabem nem a própria língua e reina absoluta ignorância, ao ponto de grande parte da população, apesar de saber ler, não se pode dizer propriamente alfabetizada, pode nos vir uma dúvida: — Será que foi sempre assim? E basta abrirmos um desses livros velhos de centenas ou milhares de anos para, respondida esta primeira pergunta com um firme — Não!, vir-nos outra: — O que aconteceu?

Vivemos em uma época tumultuada. As instituições, costumes e padrões estão em constante e rápida mudança. Nossa cultura está cada vez mais instável, insegura de si mesma, buscando novidades. Esta avidez por novidades gera uma sede ainda maior por mudanças. Mudanças radicais. E de mudança em mudança, de revolução em revolução, cada vez com maior inocuidade, a mudança virou rotina, e uma rotina tediosa e previsível. Em meio a esta confusão, perdemos o caminho. E quando se perde o caminho, a maneira mais efetiva de seguir em frente é voltar atrás, até o ponto em que reconhecemos, e dali, buscando as direções deixadas pelos que nos precederam, continuar avançando no caminho certo.

No caso da Educação, talvez não tenha sido apenas o caminho que tenha sido perdido, mas a própria essência. O que chamamos de educação hoje, embora guarde semelhanças fortes, tem pouco a ver com o que era educação no passado. O coração da diferença entre a educação clássica e a atual não está no currículo nem nos métodos de ensino, embora estas diferenças existam. A grande diferença está no objetivo. A educação é a passagem da sabedoria e do conhecimento de uma geração para a outra, é uma transmissão cultural, como uma corrida de revezamento em que o novo corredor recebe o bastão muito à frente do que estava quando o atual corredor o recebeu – mas ainda é o mesmo bastão.

O coração da diferença entre a educação clássica e a convencional, dizíamos, está no objetivo. A maior diferença é filosófica. Ou, antes, teológica. A educação atual é, em última instância, nihilista, acreditando que vivemos em um grande vácuo sem sentido. A educação clássica repousa sobre o Fundamento do Ser. Todo o resto segue isso. Pode parecer difícil colocar o currículo e o método como secundário, mas é esta a grande diferença da Educação Clássica. O objetivo vem em primeiro lugar.

A segunda maior diferença, diríamos, é metafísica. A educação atual é orientada para o poder, para a carreira, para a formação (diplomas, capacitação) enquanto a educação clássica é orientada para a verdade. Para a Educação Clássica, a prática é serva da verdade, e não o contrário.

Uma terceira diferença seria no nível ético. A educação atual parte da premissa de que o propósito da infância é a socialização. Já que não há verdade objetiva, o que importa seria aprender a conviver com a diversidade. A Educação Clássica, porém, rejeitando a ideia de que não há verdade, vê a infância como a época do desenvolvimento moral e intelectual.

Uma quarta diferença seria no nível científico. A educação atual vê a ciência natural, pragmática, como a única verdade universal. A Educação Clássica, porém, não afirma que as ciências naturais são a única forma de adquirir conhecimento nem acredita que a ética, a metafísica e a teologia devam ser submissas ao conhecimento excepcionalmente limitado que pode ser alcançado através dos métodos do natural nem que ele é o único nem possa ser sujeito a revisões dialéticas. Por natureza, as ciências naturais não são definitivas. Elas só surgem em um contexto onde a metafísica e a teologia as apoiam. Culturas que acreditam que o mundo é uma ilusão não desenvolvem as ciências naturais muito longe.

Uma quinta diferença seria a própria cosmovisão. A educação atual prega que nada é verdadeiro, que tudo é permitido: — Você tem a sua verdade, eu tenho a minha. Em poucas palavras, prega que não há verdade ou que ela não é compreensível. A Educação Clássica, porém, percebe que o mundo dá amostras da ordem com que foi criado e que essa ordem é cognoscível, por isso ensina o aluno a obter esse conhecimento e, usando as ferramentas certas, conhecer melhor a perfeição daquele que criou esta ordem.

As sete artes liberais foram desenvolvidas precisamente para esse fim. Acreditando que podemos conhecer a verdade, e acreditando que a verdade liberta, os educadores clássicos gastaram milhares de anos refinando as ferramentas de busca da verdade que foram usadas desde o início dos tempos, mas foram primeiro codificadas por Aristóteles. As sete artes liberais são o refinamento do senso comum. Eles nos permitem usar as faculdades da razão dadas por Deus para descobrir a verdade. Eles podem até mesmo, se os usarmos de maneira santificada, nos ajudar a vencer o pecado, a ignorância e a insensatez. Estar sentado ouvindo a voz de Deus de um modo místico, quando Ele já está falando conosco e expressando Sua vontade através da lei da não-contradição e a ascensão do sol não é espiritualmente saudável.

Em poucas palavras, a Educação Clássica se diferencia da Educação Atual porque seu objetivo, seus meios e seu fim são outros. O objetivo é cultivar a sabedoria e a virtude, fazer o aluno aprender a aprender e a pensar. Os meios são por a verdade acima do poder e dos bens desta terra. A virtude, acima da socialização. A dialética honesta acima do empirismo. As sete artes acima da manipulação e da ideologia. O fim da Educação Clássica, por sua vez, é a felicidade humana, que consiste na contemplação da Verdade, na contemplação de Deus!

Retirado do site: Link

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As Artes Liberais do Trivium e do Quadrivium

Sete virtudes e sete artes liberais, Francesco Pesellino, 1450

Trecho extraído do livro "O Trivium - As artes liberais da lógica, da gramática e da retórica" da Irmã Miriam Joseph. Editora É Realizações, 2008. Pág 27-36.

As artes liberais denotam os sete ramos do conhecimento que iniciam o jovem numa vida de aprendizagem. O conceito é do período clássico, mas a expressão e a divisão das artes em trivium e quadrivium datam da Idade Média.

O trivium e o quadrivium

O trivium [1] inclui aqueles aspectos das artes liberais pertinentes à mente, e o quadrivium, aqueles aspectos das artes liberais pertinentes à matéria. Lógica, gramática e retórica constituem o trivium; aritmética, música, geometria e astronomia constituem o quadrivium. A lógica é a arte de pensar; a gramática, a arte de inventar símbolos e combiná-los para expressar pensamento; e a retórica, a arte de comunicar pensamento de uma mente a outra, ou de adaptar a linguagem à circunstância. A aritmética, ou teoria do número, e a música, uma aplicação da teoria do número (a medição de quantidades discretas em movimento), são as artes da quantidade descontínua ou número. A geometria, ou teoria do espaço, e a astronomia, uma aplicação da teoria do espaço, são as artes da quantidade contínua ou extensão.

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O trivium: As três artes da linguagem pertinentes à mente

Lógica: arte de pensar
Gramática: arte de inventar e combinar símbolos
Retórica: arte de comunicar

O quadrivium: As quatro artes da quantidade pertinentes à matéria

Quantidade descontínua ou número
Aritmética: teoria do número
Música: aplicação da teoria do número

Quantidade contínua ou extensão
Geometria: teoria do espaço

Astronomia: aplicação da teoria do espaço
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1-1. As sete artes liberais

Essas artes da leitura, da escrita e do cálculo formaram a base tradicional da educação liberal, cada uma constituindo tanto um campo do conhecimento quanto a técnica para adquirir esse conhecimento. O grau de bacharel em artes [2] é conferido àqueles que demonstram a proficiência requerida nessas artes; o grau de mestre em artes, àqueles que demonstram uma proficiência maior que a requerida.

Hoje, como em séculos passados, o domínio das artes liberais é amplamente reconhecido como a melhor preparação para o estudo nas escolas de formação profissional, tais como as de medicina, direito, engenharia ou teologia. Aqueles que primeiro aperfeiçoam suas próprias faculdades através da educação liberal estão, deste modo, mais bem preparados para servir aos outros em sua capacidade profissional.

As sete artes liberais diferem essencialmente das muitas artes ou ofícios utilitários (tais como carpintaria, alvenaria, vendas, impressão, edição, serviços bancários, direito, medicina, ou o cuidado das almas) e das sete belas-artes (arquitetura, música instrumental, escultura, pintura, literatura, teatro e dança), pois tanto as artes utilitárias como as belas-artes são atividades transitivas, enquanto a característica essencial das artes liberais é que elas são atividades imanentes ou intransitivas.

O artista utilitário produz utilidades que atendem às necessidades do homem; o artista de uma das belas-artes, se for de superlativa categoria, produz uma obra que é “algo de belo e uma alegria para sempre” [3] e que tem o poder de elevar o espírito humano. No exercício tanto das artes utilitárias quanto das belas-artes, ainda que a ação comece no agente, ela sai do agente e termina no objeto produzido, tendo normalmente um valor comercial; portanto, o artista é pago pelo trabalho ou obra. No exercício das artes liberais, todavia, a ação começa no agente e termina no agente, que é aperfeiçoado pela ação; consequentemente, o artista liberal, longe de ser pago por seu trabalho árduo – do qual, aliás, é o único a receber todo o benefício –, com frequência paga a um professor para que este lhe dê a instrução e o guiamento necessários na prática das artes liberais.
O caráter intransitivo das artes liberais poderá ser entendido melhor a partir da analogia a seguir.

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ANALOGIA: O caráter intransitivo das artes liberais

O carpinteiro aplaina a madeira.

A rosa floresce.

A ação de um verbo transitivo (como aplaina) começa no agente, mas “cruza” e termina no objeto (a madeira). A ação de um verbo intransitivo (como floresce) começa no agente e termina no agente (a rosa, que se aperfeiçoa por florescer).
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Classes de bens

As três classes de bens – valiosos, úteis e aprazíveis – ilustram o mesmo tipo de distinção que existe entre as artes.

Bens valiosos são aqueles que são desejados não apenas por sua própria causa, mas também porque aumentam o valor intrínseco de quem os possuir. Por exemplo: conhecimento, virtude e saúde são bens valiosos.

Bens úteis são aqueles que são desejados porque permitem que alguém adquira bens valiosos. Por exemplo: alimento, remédio, dinheiro, ferramentas e livros são bens úteis.

Bens aprazíveis são aqueles que são desejados por si mesmos em função da satisfação que dão a quem os possuir. Por exemplo: felicidade, uma reputação honrada, prestígio social, flores e comida saborosa são bens aprazíveis. Eles nada acrescentam ao valor intrínseco do possuidor nem são desejados como meios, ainda que possam estar associados a bens valiosos ou úteis. Por exemplo, o conhecimento, que acrescenta valor, pode ao mesmo tempo ser prazeroso; sorvete, que é um alimento nutritivo e, portanto, promove a saúde, é, ao mesmo tempo, agradável.

As artes utilitárias, ou servis, permitem que alguém seja um servidor – de outra pessoa, do Estado, de uma corporação, de uma profissão – e que ganhe a vida. As artes liberais, em contraste, ensinam a viver; treinam as faculdades e as aperfeiçoam; permitem a uma pessoa elevar-se acima de seu ambiente material para viver uma vida intelectual, uma vida racional e, portanto, uma vida livre para adquirir a verdade. Jesus Cristo disse: “E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João 8,32).

O novo lema do Saint John’s College, em Annapolis, Maryland, expressa o propósito de uma escola de artes liberais através de um interessante jogo com a etimologia da palavra liberal: “Facio liberos ex liberislibris libraque”. “Transformo crianças em homens livres por meio de livros e comparações” [experimentos em laboratório].

Ciência e arte

Cada uma das artes liberais é, a um só tempo, uma ciência e uma arte, no sentido de que em cada campo há algo a conhecer (ciência) e algo a fazer (arte). Uma arte pode ser empregada com sucesso antes que se tenha um conhecimento formal de seus preceitos. Por exemplo: uma criança de três anos pode fazer uso de gramática correta ainda que nada saiba de gramática formal. De maneira análoga, a lógica e a retórica podem ser usadas eficazmente por quem não conheça os preceitos teóricos dessas artes. Todavia, é desejável e satisfatório adquirir um conhecimento claro dos preceitos e saber por que certas formas de expressão ou de pensamento estão certas ou erradas.

O trivium é o órgão, ou instrumento, de toda educação em todos os níveis, porque as artes da lógica, da gramática e da retórica são as artes da comunicação mesma, uma vez que governam os meios de comunicar – a saber: leitura, redação, fala e audição. O pensamento é inerente a essas quatro atividades. A leitura e a audição, por exemplo, apesar de relativamente passivas, envolvem pensamento ativo, pois concordamos ou discordamos daquilo que lemos ou ouvimos.

O trivium é usado essencialmente quando exercitado na leitura e na composição. Foi exercitado sistemática e intensivamente na leitura dos clássicos latinos e na composição de prosa e versos latinos pelos garotos nas grammar schools [4] da Inglaterra e do continente europeu durante o século XVI. Este foi o treinamento que formou os hábitos intelectuais de Shakespeare e de outros autores da Renascença [5]. O resultado de tal treinamento transparece em suas obras [6]. O trivium era básico também no currículo do período clássico, na Idade Média e na pós-Renascença.

Na gramática grega de Dionísio da Trácia (circa 166 a.C.), o mais antigo livro de gramática [7] existente e a base para os textos gramaticais durante pelo menos treze séculos, a gramática é definida de uma maneira tão abrangente que inclui versificação, retórica e crítica literária.

A gramática é um conhecimento experimental dos modos de escrever nas formas geralmente correntes entre poetas e prosadores de uma língua. Está dividida em seis partes: (1) leitura instruída, com a devida atenção à prosódia [versificação]; (2) exposição, de acordo com figuras poéticas [retórica]; (3) apresentação das peculiaridades dialéticas e de alusões; (4) revelação das etimologias; (5) relato cuidadoso das analogias; (6) crítica das obras poéticas, que é a parte mais nobre da arte gramatical.

Uma vez que a comunicação envolve o exercício simultâneo da lógica, da gramática e da retórica, estas artes são as artes fundamentais da educação: ensinar e ser ensinado. Consequentemente, devem ser praticadas simultaneamente pelo professor e pelo aluno. O aluno deve cooperar com o professor; deve ser ativo e não passivo. O professor pode estar presente direta ou indiretamente. Quando alguém estuda através de um livro, o autor é um professor presente indiretamente. A comunicação, de acordo com a etimologia da palavra, resulta em algo que é possuído em comum; é uma unicidade compartilhada. A comunicação tem lugar somente quando duas mentes realmente se encontram. Se o leitor – ou o ouvinte – recebe as mesmas ideias que o escritor – ou o emissor – desejava transmitir, ele as entende (ainda que delas possa discordar); se não recebe ideia alguma, nada entende; se recebe ideias diferentes, entende mal. Os mesmos princípios da lógica, da gramática e da retórica guiam o escritor, o leitor, o emissor e o ouvinte.

A educação liberal

A educação é a mais nobre das artes no sentido de que impõe formas (ideias e ideais) não sobre a matéria, como fazem outras artes (por exemplo, a carpintaria e a escultura), mas sobre a mente. Essas formas não são recebidas passivamente pelo estudante, mas sim através da cooperação ativa. Na verdadeira educação liberal, e segundo Newman [8], a atividade essencial do estudante é relacionar os fatos aprendidos num todo unificado e orgânico, assimilando-os tal como um corpo assimila alimento, ou, ainda, como a rosa assimila nutrientes do solo e daí cresce em tamanho, vitalidade e beleza. Um aprendiz deve usar algo como colchetes mentais, com os quais ligue os fatos entre si de modo a formar um todo significativo. Isso torna o aprendizado mais fácil, mais interessante e muito mais valioso. O acúmulo de fatos é mera informação e não merece ser chamado educação, pois sobrecarrega a mente e a estultifica, em vez de desenvolvê-la, iluminá-la e aperfeiçoá-la. Mesmo quando alguém esquece muitos dos fatos que uma vez aprendeu e relacionou, a sua mente retém o vigor e o aperfeiçoamento que obteve ao neles se exercitar. Porém a mente faz isso somente porque lida com fatos e ideias. Ademais, é muito mais fácil lembrar ideias associadas do que ideias sem conexão.

Cada uma das artes liberais veio a ser entendida não no sentido restrito de uma disciplina em separado, mas mais propriamente no sentido de um grupo de disciplinas relacionadas. O trivium, em si mesmo uma ferramenta ou uma habilidade, ficou associado às suas matérias de estudo mais apropriadas – línguas, oratória, literatura, história e filosofia. O quadrivium compreende não apenas a matemática, mas muitos ramos da ciência. A teoria do número inclui não apenas a aritmética, mas também álgebra, cálculo, teoria das equações e outros ramos da matemática superior. As aplicações da teoria do número incluem não só a música (aqui entendida como princípios musicais, tais como a harmonia, que constituem a arte liberal da música, a qual deve ser distinguida da música instrumental aplicada, que é uma das belas-artes), mas também a física, muito da química e de outras formas de medição científica de quantidades descontínuas. A teoria do espaço inclui geometria analítica e trigonometria. As aplicações da teoria do espaço incluem princípios da arquitetura, da geografia, da agrimensura e da engenharia.

Ler, escrever e contar constituem o cerne não apenas da educação elementar, mas também da educação superior. A competência no uso da linguagem e a competência em lidar com abstrações, particularmente as quantidades matemáticas, são consideradas como os mais confiáveis índices do calibre intelectual de um estudante. Consequentemente, criaram-se testes para medir essas competências, de modo que programas de orientação educacional e vocacional em instituições de ensino superior [9] e nas forças armadas se baseiam nos resultados de tais testes.

As três artes da linguagem proveem disciplina à mente, uma vez que esta encontra expressão na linguagem. As quatro artes da quantidade proveem meios para o estudo da matéria – mais precisamente, extensão –, visto que essa é a característica notável da matéria. (A extensão é uma característica apenas da matéria, enquanto o número é característica tanto da matéria quanto do espírito). A função do trivium é treinar a mente para o estudo da matéria e do espírito, que juntos constituem a substância da realidade. O fruto da educação é a cultura, que Matthew Arnold [10] definiu como “O conhecimento de nós mesmos [mente] e do mundo [matéria]”. Na “doçura e iluminação” da cultura cristã, que acrescenta a inteligência de Deus e a de outros espíritos ao conhecimento do mundo e de nós mesmos, tornamo-nos verdadeiramente aptos a “Ver a vida resolutamente; a vê-la por inteiro” [11].

AS ARTES DA LINGUAGEM

As artes da linguagem e a realidade

As três artes da linguagem podem ser definidas conforme se relacionam com a realidade e entre si. A metafísica ou ontologia [12], a ciência do ser, trata da realidade, da coisa tal como ela existe. A lógica, a gramática e a retórica têm as seguintes relações com a realidade.

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A lógica trata da coisa tal como ela é conhecida.

A gramática trata da coisa tal como ela é simbolizada.

A retórica trata da coisa tal como ela é comunicada.
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1-2. Linguagem e realidade

ILUSTRAÇÃO: Relação entre a metafísica e as artes da linguagem

A descoberta do planeta Plutão, em 1930, ilustra a relação entre a metafísica e as artes da linguagem. O planeta Plutão já era uma entidade real, percorrendo a sua órbita em torno do Sol havia muitos e muitos milênios, por nós desconhecido e, portanto, sem nome. A sua descoberta em 1930 não o criou; porém, ao ser descoberto, tornou-se uma entidade lógica. Quando lhe foi dado o nome Plutão, tornou-se uma entidade gramatical. Quando, por seu nome, o conhecimento dessa entidade foi comunicado a outros através da palavra falada e escrita, o planeta Plutão tornou-se então uma entidade retórica [13].

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A retórica é a arte mestra do trivium [14], pois pressupõe e faz uso da gramática e da lógica; é a arte de comunicar através de símbolos as ideias relativas à realidade.

Comparação de materiais, funções e normas das artes da linguagem

As artes da linguagem conduzem o orador, o escritor, o ouvinte e o leitor ao uso correto e eficaz da linguagem. A fonética e a ortografia, que estão associadas à arte da gramática, são aqui incluídas para demonstrar sua relação com as outras artes da linguagem no que concerne a materiais, funções e normas.

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Fonética: prescreve como combinar sons de modo a formar corretamente as palavras faladas.

Ortografia: prescreve como combinar letras de modo a formar corretamente as palavras escritas.

Gramática: prescreve como combinar palavras de modo a formar corretamente as frases.

Retórica: prescreve como combinar frases em parágrafos e estes numa composição completa, que apresente unidade, coerência e a ênfase desejada, bem como clareza, vigor e beleza.

Lógica: prescreve como combinar conceitos em juízos e estes em silogismos e cadeias de raciocínio de
modo a obter a verdade.
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1-3. As artes da linguagem: seus materiais e funções


Uma vez que a retórica almeja mais a eficácia do que a correção, lida não apenas com o parágrafo e com a composição completa, mas também com a palavra e a frase, pois prescreve que a dicção seja clara e apropriada; que as frases sejam variadas na estrutura e no ritmo. A retórica reconhece vários níveis de discurso, tais como o letrado ou literário (donzela, corcel), o comum (moça, cavalo), o iletrado (mulezinha) [15], o da gíria ou o regionalismo (cabrita, pangaré) e o técnico (Homo sapiens, Equus caballus), cada um com o seu uso apropriado. A adaptação da linguagem às circunstâncias, que é a função mesma da retórica, requer a escolha de certo estilo e dicção própria quando alguém fala a adultos, de outro estilo ao apresentar ideias científicas ao público em geral e de outro ainda quando essas ideias são apresentadas a um grupo de cientistas. Visto que a retórica é a arte mestra do trivium, pode até mesmo dar-se ao luxo de usar gramática ou lógica incorretas para efeito de caracterização de um personagem iletrado ou estúpido em uma narrativa qualquer.

Tanto quanto a retórica é a arte mestra do trivium, a lógica é a arte das artes porque dirige o ato mesmo de raciocinar, o qual dirige todos os outros atos humanos ao seu fim apropriado através dos meios que
determina.

No prefácio à sua Art of Logic, o poeta Milton observa:

O assunto geral das artes gerais é tanto a razão quanto a palavra. Elas são empregadas no aperfeiçoamento do raciocínio em benefício do bem pensar – como na lógica –, no aperfeiçoamento do modo de falar, em benefício do uso correto das palavras – como na gramática –, ou no uso eficaz das palavras – como na retórica. De todas as artes, a primeira e mais geral é a lógica, seguida da gramática e, por último, da retórica, uma vez que pode haver muito uso da razão sem o falar, mas nenhum uso da palavra sem a razão. Demos o segundo lugar à gramática porque o uso correto da palavra pode ser feito sem adornos; mas dificilmente será possível adorná-lo antes que esteja correto [16].

Considerando que as artes da linguagem são normativas, elas são estudos práticos quando em contraste com os teóricos. Um estudo teórico é aquele que busca apenas conhecer – a astronomia, por exemplo. Nós podemos apenas saber algo a respeito dos corpos celestes. Não podemos influenciar seus movimentos.

Um estudo prático, normativo, é aquele que busca regular, ajustar segundo uma norma ou padrão – a ética, por exemplo. A norma da ética é o bem, e seu propósito é ajustar a conduta humana em conformidade com a bondade.

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A correção é a norma da fonética, da ortografia e da gramática.

A eficácia é a norma da retórica.

A verdade é a norma (ou meta) da lógica. O pensar corretamente é o meio normal de chegar à verdade, que é a conformidade do pensamento com as coisas tais como são – com a realidade.
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O próprio intelecto, no que tange às suas operações, é aperfeiçoado pelas cinco virtudes intelectuais, três teóricas e duas práticas. A compreensão é o captar intuitivo dos princípios primeiros. (Por exemplo, em declarações contraditórias, uma deve ser verdadeira e a outra falsa.) A ciência é o conhecimento das causas mais prováveis (física, matemática, economia, etc.). A sabedoria é o conhecimento das causas fundamentais – a metafísica na ordem natural, a teologia na ordem supernatural. A prudência é o raciocínio reto concernente às ações [17]. A arte é o raciocínio reto concernente à produção [18].

Notas:

[1] Trivium significa o cruzamento e a articulação de três ramos ou caminhos e tem a conotação de um “cruzamento de estradas” acessível a todos (Catholic Encyclopedia, vol. 1, s.v., “The seven liberal arts”). Quadrivium significa o cruzamento de quatro ramos ou caminhos.

[2] A despeito da semelhança com a terminologia brasileira, os graus Bachelor of Arts e Master of Arts não encontram aqui equivalência direta e perfeita. Um BA é diploma obtido num College, que já é instituição de ensino de nível superior. O MA lhe é superior e confere o direito de lecionar. No passado, foi equivalente ao doutorado nos EUA; em algumas áreas e universidades, assim permanece. Todavia, hoje parece consolidar-se uma tendência para distinguir o mestrado como intermediário, antes do Ph.D., seguindo a tradição alemã em lugar da inglesa. (N. T.)

[3] “A thing of beauty and a joy forever” – Adaptado de “Endymion”, de John Keats (1795-1821): “A thing of beauty is a joy forever: / Its loveliness increases: it will never / Pass into nothingness”.

[4] Atualmente, equivale a uma escola secundária que só admite alunos por suas habilidades. Já nos EUA, a grammar-school equivale à escola primária. (N. T.)

[5] Marshall McLuhan trata do assunto, com ênfase em Thomas Nashe (1567-1601), na obra O Trivium Clássico. Trad. Hugo Langone. São Paulo, É Realizações, 2012. (N. E.)

[6] Ver T. W. Baldwin, William Shakespeare’s Small Latine and Lesse Greek. Urbana, The University of Illinois Press, 1944. A expressão “small Latine and lesse Greek” vem do poema de Ben Jonson “To the Memory of My Beloved, The Author, Mr. William Shakespeare”. Ben Jonson (1572-1637) era colega e amigo de Shakespeare.

[7] Elementos do esboço de gramática de Dionísio da Trácia ainda são componentes básicos num currículo de artes da linguagem: figuras de linguagem, uso da alusão, etimologia, analogias e análise literária.

[8] John Henry Newman (1801-1890), autor de The Idea of a University Defined e Apologia pro Vita Sua.

[9] A autora se refere aos Colleges, que são instituições de ensino superior, mas ainda não vocacional ou profissional. (N. T.)

[10] Matthew Arnold (1822-1888), poeta, ensaísta e crítico inglês. A expressão “sweetness and light” [doçura e iluminação] vem do seu ensaio “Culture and Anarchy”.

[11] Matthew Arnold, “To a Friend”.

[12] A Metafísica de Aristóteles deu sequência à sua obra em física. Em grego clássico, meta significa “depois” ou “além”. Na Metafísica, Aristóteles definiu os princípios primeiros no entendimento da realidade. A ontologia é um ramo da metafísica e trata da natureza do ser.

[13] A realidade do planeta Plutão, soubesse alguém ou não de sua existência, pertence ao reino da metafísica. É a descoberta humana que dele foi feita que o traz para o reino da lógica, da gramática e da retórica.

[14] Chamar a retórica de “a arte mestra do trivium” é um lembrete quanto à ambivalência associada ao termo. Durante as pesquisas para a terceira edição do American Heritage Dictionary, os editores indagaram de especialistas no vernáculo se a sentença retórica vazia era redundante. Um terço dos especialistas disse que sim, enquanto a maioria ainda aceitava o sentido tradicional do termo. Em sua obra sobre a retórica, Aristóteles dá esta definição: “A retórica pode ser definida como a faculdade de, em qualquer situação, perceber os meios de persuasão disponíveis” (1.2). Todavia, mesmo na sua Retórica, Aristóteles é obrigado a justificar o seu uso. Ele argumenta que o uso de algo bom para um fim mau não nega a boa qualidade da coisa mesma. “E, se é possível objetar que alguém que faça mau uso de tal poder da palavra pode causar grande dano, então esta é uma acusação que poderia ser feita também contra todas as coisas excelentes, exceto a virtude, e, acima de tudo, contra as coisas mais úteis, tais como a força de vontade, a saúde, a riqueza e a capacidade de comando” (1.1) (Aristóteles, The Rhetoric and the Poetics of Aristotle. Trad. W. Rhys [Rhetoric] e Ingram Bywater [Poetics]. Nova York, The Modern Library, 1984).

[15] No original, o nível iletrado de cavalo é exemplificado por hoss, intraduzível para a língua portuguesa. (N. T.)

[16] John Milton, Artis Logicae. Trad. Allan H. Gilbert. The Works of John Milton. Nova York, Columbia University Press, 1935, v. 2, p. 17.

[17] Aristóteles diz: “A ação [práxis] é diferente da produção [poíesis]. A arte é uma capacidade de produzir com raciocínio reto. É produção e não ação. A carência de arte é uma disposição acompanhada de falso raciocínio.” In: Ética a Nicômaco, 1140a.

[18] O Trivium oferece uma precisão no modo de pensar que frequentemente se reflete no uso de categorias. Neste aspecto, a irmã Miriam Joseph segue Aristóteles, cujos escritos dão forma a O Trivium. Categorias é uma das obras de Aristóteles que apresentam a sua teoria da lógica.


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