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A Educação e a Verdade

 

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Tempo de leitura: 7 minutos.

Texto retirado do livro A ideia de verdade e a educação de Ruy Afonso da Costa Nunes, publicada pela editora Kírion, em 2019.

O conceito de verdade através do tempo

João Pedro da Fonseca
O Estado de São Paulo, 28 de janeiro de 1979.

Quando lemos jornais ou revistas e conhecemos várias versões de um mesmo fato, quando confrontamos opiniões divergentes a respeito de um mesmo assunto, quando lemos a exposição de motivos de uma lei e o editorial de um jornal a respeito do mesmo documento, quando tomamos conhecimento de dados estatísticos, contestados por especialistas, quando estudamos doutrinas divergentes a respeito dos mais diferentes problemas, quando comparamos as "verdades” da situação e da oposição, enfim, quantas vezes não teremos perguntado a nós mesmos: onde está a verdade? O que é a verdade? 

Que relação existe entre a verdade e a educação? Em que consiste o papel da escola e do professor diante da verdade?

Ruy Afonso da Costa Nunes nos apresenta neste livro um denso estudo a respeito das concepções de verdade de vários autores da Antigüidade, da Idade Moderna e Contemporânea. O autor declara que "não tivemos a intenção de elaborar uma exposição exaustiva a respeito das concepções de verdade através dos tempos. Dada a dimensão do tema e a extensão deste trabalho, procuramos cingir-nos ao essencial".

O livro é dividido em três partes, em que são tratados sucessivamente os seguintes temas: a concepção clássica da verdade, as concepções modernas da verdade e as concepções contemporâneas da verdade. Na conclusão, o autor correlaciona a verdade e a educação, sobre verdade e educação e magistério e verdade, sendo que este último merece destaque especial.

Os principais autores estudados são: na concepção clássica da verdade, Platão, Aristóteles e Santo Tomás de Aquino; na concepção moderna: Bacon, Descartes, Hegel, Marx, William James, John Dewey e Kierkegaard; na concepção contemporânea, Husserl, Karl Jaspers, Heidegger, Sartre, Gabriel Marcel, os do Círculo de Viena, Ayer, Bertrand Russell e Tarski.

Pela relação de nomes, é fácil perceber a impossibilidade de se aprofundar estudo de cada filósofo, mas, com as limitações reconhecidas do autor, temos uma visão geral muito boa das concepções de verdade ao longo dos tempos. Isso é conseguido, principalmente, graças à clareza de pensamento, ao caráter didático da obra, à quantidade de pesquisas efetuadas, à riqueza de informações e ainda à veia crítica presente nos comentários, não faltando, às vezes, boa dose de ironia.

O autor não poupa severas críticas a alguns filósofos, por exemplo, aos do Círculo de Viena: "augustos cientistas que resolveram fazer filosofia das ciências sem a filosofia", a Ayer:

Nessa obra de juventude [Linguagem, verdade e lógica], escrita com o fervor adquirido no Círculo de Viena, Ayer pontifica que nada existe na natureza da filosofia que justifique a existência de 'escolas' filosóficas rivais, e assegura, do alto de sua insuficiência juvenil, que ele, Alfred Jules Ayer, vai apresentar a solução definitiva dos problemas que no passado causaram controvérsias entre os filósofos. Durmam tranquilos Platão e Aristóteles, Duns Scotus, Descartes, Hume, Kant, e tantos outros, pois Alfred Jules Ayer chegou para acabar com as dúvidas e resolver para sempre a questão da filosofia.

Ao discorrer sobre Heidegger, além de criticar sua linguagem arrevesada, não poupa seus endeusadores:

Fala-se muito do grande momento representado pelo opúsculo Sobre a essência da verdade, como se Heidegger tivesse feito uma descoberta do outro mundo, e como se a concepção clássica da verdade tivesse sido exorcizada para sempre como puro avantesma. Além disso, há quem chegue ao delírio, ao tecer ditirambos à incalculável profundeza desse opúsculo heideggeriano. De fato, parece-me que a coisa é mais simples do que freqüentemente se quer fazer acreditar.

Esses exemplos dão uma idéia do estilo franco e aberto do professor Ruy Afonso que pode agradar ou não agradar aos leitores. Louve-se, porém, o fato é um autor que interpreta e que assume posições elogiando, criticando, de que às vezes, ironizando, como faz ainda ao comentar Ayer:

É pena que o filósofo não tenha percebido, e nenhum dos seus consultores o tenha advertido antes da publicação do livro, o engano filosófico de sua concepção de verdade [...]. Até mesmo um filósofo inglês não consegue, às vezes, ter senso de humor para rir dos próprios enganos.

Quanto à correlação entre verdade e educação, o autor trata do tema em dois capítulos, tendo apresentado algumas idéias gerais que precisam ser mais aprofundadas e merecem momentos de reflexão, principalmente o segundo. Neste capítulo, o problema do magistério é tratado de forma quase dramática, com muita felicidade, equilíbrio e lucidez. Às vezes, o capítulo tem o caráter de denúncia:

Os governos, pelo menos em nossa pátria, preocupados com o desenvolvimento econômico, e apesar das numerosas advertências feitas pelos educadores, continuam de ouvidos moucos aos apelos do professorado, de tal modo que os mestres não dispõem de recursos que lhes permitam uma vida tranquila e consagrada ao estudo e ao ensino.

Não são apenas os direitos do professorado que o autor defende, mas chama a atenção também para os seus deveres. Se afirma que o professor "precisa ganhar um salário que lhe permita trabalhar tranqüilo", adverte que ninguém "pode almejar tornar-se um argentário através do magistério".

Apresentando a fragilidade humana, a má vontade e a má fé como as principais responsáveis pela derrota da verdade, diz que precisamos de mestres de "mente límpida e de personalidade retilínea". Condena a hipocrisia, a duplicidade, a dissimulação, as criaturas de natureza viscosa e conclui:

O erro e o dolo provêm principalmente das nossas paixões, do amor-próprio, do espírito de campanário, da inveja, da preguiça, da sensualidade e do ódio, muito mais que dos desvios lógicos, do pensamento, da falta de atenção ou da acuidade intelectual.

*

Sobre o Autor: Ruy Afonso da Costa Nunes nasceu em Sorocaba no dia 13 de maio de 1928, filho de Heitor José da Costa Nunes e Cassilda Lobo da Costa Nunes. Realizou os primeiros estudos no Colégio Santa Escolástica — onde, muitos anos mais tarde, viria a lecionar —, e fez ali sua primeira comunhão. Com a morte do pai, em 1934, a família transferiu-se para Belém do Pará, onde residiam os familiares da mãe. Aos 12 anos, ingressou no Seminário Metropolitano Nossa Senhora da Conceição, dirigido pelos salesianos, e concluiu, em 1947, o estudo de humanidades e filosofia. Aos 19 anos decidiu regressar para a terra natal: mudou-se para São Paulo — onde vivia o tio Carlos Alberto da Costa Nunes — e iniciou o curso de filosofia na Universidade de São Paulo, no Centro Universitário Maria Antônia. Bacharel e licenciado em filosofia, Doutor em educação e Livre-docente de filosofia e ciências da educação da Faculdade de Educação da USP, foi também catedrático de filosofia do Instituto de Educação Dr. Júlio Prestes de Albuquerque, professor fundador da antiga Faculdade de Ciências e Letras de Sorocaba, hoje UNISO, e membro da Academia Sorocabana de Letras; proferiu as aulas inaugurais da Faculdade de Filosofia de Brusque e da Universidade São Judas Tadeu. Além dos quatro volumes de sua História da Educaçãona Antigüidade Cristã (1978), na Idade Média (1979), no Renascimento (1980), e no Século XVII (1981) — publicou A formação intelectual segundo Gilberto de Tournai (1970), Gênese, significado e ensino da filosofia no século XII (1974), A idéia de verdade e a educação (1978), além de inúmeros ensaios e artigos para os principais jornais do país e para as revistas culturais mais relevantes de sua época. Em fevereiro de 2006 celebrou as bodas de ouro com sua esposa Leonor Bruneli da Costa Nunes e suas filhas Maria Cecília, Maria Eleonor e Maria Heloísa, e faleceu no mesmo ano aos 11 de setembro, com 78 anos de idade. Ruy Nunes deixou uma imensa e rara biblioteca, de aproximadamente 30.000 volumes.

***

Leia mais em Definição de educação

Leia mais em A verdadeira filosofia da educação



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Livro A Vida Intelectual

Capa do livro A Vida Intelectual

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Tempo de leitura: 30 min.

Trecho retirado do Prefácio e Introdução do livro A Vida Intelectual de A.-D. Sertillanges publicado pela editora É Realizações, em 2010.

Sinopse: A Vida Intelectual, do padre A.-D. Sertillanges, redigida originalmente em 1920, ainda se mantém atual para os leitores do novo milênio. Para aqueles que desejam não apenas um manual prático que permita esboçar orientações de como entrar na vida dos estudos, o livro vai além e também oferece um exemplo de vida bem-sucedida no mundo intelectual – a do próprio padre Sertillanges, que por meio de dicas preciosas permite e disponibiliza, para qualquer pessoa que tenha abertura e coragem necessárias, uma nova forma de viver que abrange gradualmente a dimensão intelectual e todos os percalços que essa vida traz consigo. A vida intelectual não é uma dimensão separada da vida prática, e sim abarca e transcende esta, trazendo novas possibilidades e responsabilidades diante de si, dos outros e do mundo. Assim, o espírito de uma vida intelectual está no fato de que se ela transcende a vida prática, deve ser no sentido de propiciar um maior entendimento dela. Suas condições são os valores éticos, como a honestidade intelectual e a sinceridade. Seu método consiste nos exemplos que percorrem toda a escrita do padre Sertillanges. Este livro é dedicado a todos aqueles que desejam uma vida plena – em todas as suas potencialidades, e não há nada mais atual que esse desejo.

Prefácio à terceira edição

Será este o momento certo para reeditar um escrito assim? Quando o universo está em chamas, será oportuno jogar sobre as brasas umas folhas de papel para serem queimadas em vez de formar uma fila e bombear água do poço?

O que se há de fazer? De qualquer forma a sensação que se tem é de esmagadora impotência. Mas se o presente só traz tormento e desconcerto, não se deveria passar através de tudo e preocupar-se com o porvir?

O porvir cabe a Deus e a nós, mas numa dada ordem. Ele não cabe antes de tudo à força, e sim ao pensamento. Após uma medonha devastação, será preciso reconstruir. Todos os elementos da civilização devem ser retomados na base. Arquitetos aventurosos virão com projetos. Já alguns se alardeiam. Poderão nossos mestres de obra chegar a um acordo condizente com a amplidão, a harmonia e a solidez que seria de se esperar? Queira Deus! Em todo caso, haverá muito trabalho para a reflexão. Há futuro para o conhecimento sob todos os aspectos que ele pode assumir em nossas complexas civilizações, quer passadas, quer em vias de renascer. O pensamento católico não terá o direito de cruzar os braços, tampouco o terão outros. Para todos os homens de boa vontade a lide vai ser imensa. Convicto de ser detentor da verdade essencial a ele confiada pelo Cristo, o católico tem mais responsabilidade que qualquer um e, para estar à altura de assumi-la, ele tem de estar de posse de todos os seus meios, conferir seus métodos e preparar seu coração pela meditação sobre suas possibilidades bem como sobre suas obrigações.

Este livro não tem outro objetivo senão o de ajudá-lo nessa tarefa. Como em épocas mais calmas e entretanto necessitadas, o leitor saberá avivá-lo com uma chama nova que jorrará de sua própria consciência. Por si só, um texto não é nada, tal como uma viagem por si só tampouco é nada. Uma alma se faz necessária para concatenar entre si os méritos desta e as frases daquele, fazendo jorrar do contato essa luz misteriosa que se chama verdade ou que tem por nome beleza.

O efeito de um livro depende de cada um de nós. A última etapa definitivamente não é a do impresso que sai do editor, mas a do verbo mental que o próprio leitor elabora. Ante o chamado dos acontecimentos e em meio à aflição atual, mais do que nunca no dia seguinte a uma paz adquirida a tão alto preço e que recobrirá tantos destroços, confiamos que as considerações aqui expostas no tocante à vida intelectual encontrarão em nossos moços uma compreensão renovada e uma eficácia superior.

Eis porque reeditamos este trabalho. Sabemos que ele tem de se difundir em outros lugares, bem longe daquele onde veio ao mundo, e é-nos uma alegria pensar que amanhã, a necessidade devendo tornar-se universal, como hoje o caos, nosso humilde esforço poderá se unir ao dos melhores numa atmosfera comum renovada e nos dois mundos.


A.-D. SERTILLANGES, O.P.
Membro do Instituto
1944


Prefácio à segunda edição

A pequena obra hoje reeditada foi reimpressa já muitas vezes. Ela data de 1920. Eu não a havia relido. Eu me perguntava, ao abordá-la com um novo olhar e uma experiência quinze anos mais velha, se nela reconheceria meu pensamento. Encontro-o integralmente, salvo certos matizes que eu não deixarei de levar em consideração na revisão que ora assumo. A razão disso é que estas páginas, na verdade, não têm data. Elas saíram de meu âmago. Já as trazia em mim havia um quarto de século quando eclodiram. Escrevi-as como alguém que expressa suas convicções essenciais e abre seu coração.

O que me dá a confiança de que elas tiveram alcance é, com toda a certeza, sua repercussão de amplas proporções; mas é sobretudo o testemunho de cartas inumeráveis, umas me agradecendo pela ajuda técnica que eu levava até os obreiros do espírito, outras pelo calor que me diziam ter sido transmitido a ânimos jovens ou viris, a maioria por aquilo que parecia ao leitor a revelação dentre todas a mais preciosa: a do clima espiritual próprio à eclosão do pensador, a sua elevação, a seu progresso, a sua inspiração, a sua obra.

Eis aí efetivamente o principal. O espírito tudo rege. É ele que inicia, executa, persevera e conclui. Como ele preside a cada aquisição, a cada criação, ele dirige o trabalho mais secreto e mais exigente que opera sobre si o trabalhador por toda a sua carreira.

Não cansarei, assim espero, o leitor ao insistir uma vez mais nesse todo da vocação de pensador ou de orador, de escritor e de apóstolo. É verdadeiramente a questão prévia; é depois a questão de fundo, e é consequentemente o segredo do sucesso.

Querem os senhores compor uma obra intelectual? Comecem por criar em seu interior uma zona de silêncio, um hábito de recolhimento, uma vontade de despojamento, de desapego, que os deixem inteiramente disponíveis para a obra; adquiram esta disposição das faculdades mentais isenta do peso de desejos e de vontade própria, que é o estado de graça do intelectual. Sem isso, não farão nada, em todo caso, nada que valha.

O intelectual não é filho de si mesmo; ele é filho da Ideia, da Verdade eterna, do Verbo criador e animador imanente a sua criação. Quando pensa corretamente, o pensador segue Deus à risca; ele não segue sua própria quimera. Quando tateia e se debate no esforço da busca, ele é Jacó lutando com o anjo e “forte contra Deus”.

Não é natural, nessas condições, que o homem que recebeu o chamado repudie e esqueça deliberadamente o homem profano? Que deste ele rejeite tudo: sua leviandade, sua inconsciência, seu desleixo no trabalho, suas ambições terrenas, seus desejos orgulhosos ou sensuais, a inconsistência de seu querer ou a impaciência desordenada de seus desejos, suas complacências e suas antipatias, seus humores acrimoniosos ou seu conformismo, toda a inumerável rede de impedimenta [1] que obstruem o caminho do vero e impossibilitam sua conquista?

O temor a Deus é o começo da sabedoria, diz a Escritura. Esse temor filial não é no fundo senão o medo de si. No campo intelectual pode-se chamá-lo de atenção liberada de todas as preocupações inferiores e de fidelidade perpetuamente apreensiva ante a possibilidade de decair. Um intelectual deve estar sempre de prontidão para o pensar, isto é, para receber uma parte da verdade que o mundo carreia em seu curso e que lhe foi preparada, para tal ou qual curva desse curso, pela Providência. O Espírito passa e não volta. Feliz de quem está pronto para não perder, para de preferência até provocar e aproveitar o milagroso encontro!

Toda obra intelectual começa pelo êxtase; só depois se exerce o talento do arranjador, a técnica dos encadeamentos, das relações e da construção. Ora, o que é o êxtase senão um elevar-se para longe de si mesmo, um esquecimento de se viver, de si próprio, para que viva no pensamento e no coração o objeto de nossa embriaguez?

A memória mesma participa desse dom. Existe uma memória baixa, uma memória de papagaio e não de inventor: esta aí causa obstrução, tapando as vias por onde flui o pensamento em proveito de palavras e fórmulas fechadas. Mas há uma memória engatilhada em todas as direções e à espera de uma eterna descoberta. Em seu conteúdo, nada há que venha “já pronto”; suas aquisições são sementes de futuro; seus oráculos são promessas. Ora, tal memória é também extática; ela funciona pelo contato com as fontes de inspiração; de modo algum se compraz de si mesma; o que encerra é novamente intuição, sob o nome de lembrança, e o eu de quem é hóspede se entrega por seu intermédio à exaltante Verdade tanto quanto à busca.

O que é verdadeiro para as aquisições e as consecuções era já verdadeiro para o chamado no início do percurso. Depois das hesitações da adolescência, quase sempre angustiada e perplexa, foi inevitável chegar à descoberta de si, à percepção desse impulso secreto que persegue em nós não sei qual resultado longínquo que a consciência ignora. Supõem que isso seja simples? ”À escuta de si mesmo” é uma outra formulação para esta expressão: À escuta de Deus. É no pensamento criador que jaz nosso ser verdadeiro e nosso eu na forma autêntica. Ora, essa verdade de nossa eternidade, que domina nosso presente e prevê nosso porvir, é-nos revelada tão somente no silêncio da alma, silêncio dos vãos pensamentos que levam ao “divertimento” pueril e dissipador; silêncio dos barulhos de chamada que as paixões desordenadas não se cansam de fazer-nos escutar.

A vocação pede o atendimento, que, num esforço único para sair de si, escuta e atende. 

O mesmo se dará por ocasião da escolha dos meios para ser bem-sucedido, da estruturação de seu modo de vida, de seus relacionamentos, da organização de seu tempo, da partilha entre a contemplação e a ação, entre a cultura geral e a especialização, entre o trabalho e os descansos, entre as concessões necessárias e as intransigências ferozes, entre a concentração que fortalece e as expansões que enriquecem, entre o retrair-se e o relacionar-se com gênios, pessoas com quem se tem afinidade de ideias, com a natureza ou a vida social etc. etc. Tudo isso só é avaliado com sabedoria quando em êxtase também, perto do eternamente verdadeiro, longe do eu que cobiça e é tomado de paixão.

E ao final a dádiva dos resultados e sua extensão estipulada lá no alto exigirão a mesma virtude de acolhida, a mesma postura desinteressada, a mesma paz em uma Vontade que não seja a nossa. Chega-se ao que se pode, e nosso poder precisa avaliar-se, para não se subestimar, de um lado, ou, inversamente, transbordar de presunção e jactância vazia. De onde vem esse julgamento senão de um olhar fiel à verdade impessoal e da submissão a seu veredicto, mesmo que isso nos custe um esforço ou um desapontamento secreto?

Os grandes homens nos parecem ter uma grande ousadia; no fundo, eles são mais obedientes que os outros. A voz soberana os alerta. É porque um instinto provindo dela os aciona que eles tomam, com coragem sempre e às vezes com grande humildade, o lugar que a posteridade lhes conferirá mais tarde, ousando atitudes e arriscando inovações com muita frequência contrárias a seu meio, sendo até mesmo alvo de sarcasmos. Eles não têm medo porque, por mais isolados que pareçam, não se sentem sozinhos. A seu favor está o que tudo decide no final. Eles pressentem seu futuro poder.

Nós temos sem dúvida de lidar com uma humildade de natureza totalmente diversa, nós devemos entretanto ir colher nossa inspiração nas mesmas alturas. É a altitude que mede a pequenez. Quem não possui o sentido das grandezas se deixa exaltar ou abater facilmente, quando não as duas coisas ao mesmo tempo. É para não pensar no escaravelho gigante que a formiga acha o ácaro demasiadamente pequeno, e é para não sentir o vento dos cumes que o caminhante se demora languidamente nas encostas. Sempre conscientes da imensidão da verdade e da exiguidade de nossos recursos, jamais empreenderemos o que está além de nosso alcance, e iremos até o fim do nosso poder. Seremos felizes, então, com o que nos terá sido oferecido à nossa altura.

Não se trata aqui de pura mensuração. O motivo da observação é o fato de que o trabalho insuficiente ou pretensioso é sempre um trabalho malfeito. Uma vida empurrada muito para o alto ou largada muito lá embaixo é uma vida que se desorienta. Uma árvore pode ter uma rama e uma floração medíocre ou magnífica: ela não as chama e não as constrange; sua alma vegetal desabrocha pela ação da natureza no geral e das influências do ambiente. Nossa própria natureza geral é o pensamento eterno; recorremos a ele com as forças que dele provêm e com os instrumentos que ele nos fornece: deve haver concordância entre o que recebemos em matéria de dons – incluindo-se a coragem – e o que devemos esperar em matéria de resultados.

O que não haveria para se dizer sobre essa disposição fundamental, ante um destino inteiramente dedicado à vida pensante! Mencionei as resistências e as incompreensões que agem contra os grandes; mas elas atingem também os pequenos: como resistir a elas sem um puro apego ao verdadeiro e sem autoesquecimento? Quando não se procura agradar o mundo, ele se vinga; se por acaso se consegue agradá-lo, ele ainda assim se vinga nos corrompendo. A única saída é trabalharmos longe dele, tão indiferentes a seu julgamento quanto prontificando-nos a ser-lhe úteis. O bom é, talvez, que ele nos repele e nos obriga assim a retirar-nos para nosso próprio interior, a crescermos por dentro, a controlar-nos, a aprofundar-nos. Esses benefícios vêm à proporção que nosso desinteresse se torna superior, isto é, que nosso interesse se centra naquilo que é o unicamente necessário.

Estaríamos nós mesmos sujeitos, para com outrem, às tentações da difamação, da inveja, das críticas sem fundamento, das disputas? Teríamos então de nos lembrar que inclinações como essas, ao perturbar o espírito, são nocivas à verdade eterna e são incompatíveis com seu culto.

É preciso observar nesse particular que a difamação, até um determinado nível, é mais aparente do que real e tem algum valor para a formação da opinião geral. Nós nos enganamos com frequência sobre o modo como os mestres falam uns dos outros. Eles se criticam severamente, mas bem sabem, mutuamente, o que valem, e criticam os outros quando não atribuem importância a isso.

Seja como for, o progresso em comum precisa de paz e de ação conjunta e sofre grande atraso por conta de estreitezas. Diante da superioridade de outrem, só resta uma atitude honrosa: amá-la, e ela se torna assim nossa própria alegria, nossa própria fortuna.

Uma fortuna diferente poderá nos tentar: a que se obtém mediante um êxito exterior, a bem dizer, hoje em dia, bastante raro, quando se trata de um verdadeiro intelectual. O público, de modo geral, é vulgar e só gosta da vulgaridade. Os editores de Edgar Poe diziam ser obrigados a pagar-lhe menos do que a outros, porque ele escrevia melhor que os outros. Conheci um pintor a quem um marchand de arte dizia: “Seria bom tomar umas aulas.” – ?... – “Sim, para aprender a não pintar tão bem”. O homem dedicado à perfeição não entende essa linguagem; ele não aceita por preço algum, sob forma alguma, ser um seguidor do que Baudelaire chamava de zoocracia. Mas e se essa dedicação esmorecesse?...

Mesmo não dando importância aos juízos de terceiros, não estamos nós à mercê, quando a sós, dos tolos julgamentos da vaidade e da puerilidade instintiva? “Nunca cales, nunca escondas de ti o que se pode pensar contra teu próprio pensamento”, escreve Nietzsche. Já não se trata mais aí dos incompetentes e dos curiosos, e sim de nosso próprio testemunho em estado vigilante e íntegro. Quantas vezes não gostaríamos de desconversar, de alcançar a autossatisfação mesmo que enganosa, de dar-nos a preferência conquanto indevidamente! A severidade para consigo, tão propícia à retidão dos pensamentos e à preservação destes contra os mil riscos da busca, é um ato de heroísmo. Como declarar-se culpado e amar sua condenação sem o amor desvairado daquilo que julga?

Isso se corrige, é verdade, por um apego intransigente às nossas persuasões profundas, às intangíveis intuições que se encontram na base de nosso esforço e até de nossa crítica. Não se constrói sobre o nada, e os retoques do artesão não afetam os primeiros alicerces. O que está assimilado e averiguado deve ser resguardado de retratações infundadas e de escrúpulos. É o mesmo amor pela verdade que assim o quer; é o mesmo desinteresse que se interessa, em nós, por aquilo que nos supera e que nem por isso deixou de vir alojar-se em nossa consciência. Apreciações como essas são delicadas; elas são porém necessárias. Sob hipótese alguma as elevadas certezas sobre as quais se assenta todo o trabalho da inteligência devem ser abaladas.

É inclusive o caso de defender-se, em nome desse mesmo apego, contra este melhor que se chamou muito adequadamente de inimigo do bom. Pode ocorrer, ao ampliar-se o campo da pesquisa, que ela se enfraqueça, e pode ocorrer, ao aprofundar-se nela para além de determinados limites, que o espírito fique perturbado e não consiga alcançar nada além de perplexidade. A estrela que se fita de modo por demais ardente e contínuo pode, em razão desse próprio fator, pôr-se a piscar cada vez mais e acabar desaparecendo do céu.

Não decorre daí que se deva evitar aprofundar-se, nem tampouco desprezar essa vasta cultura que é uma condição para o aprofundamento em qualquer setor; mas alerto contra os excessos, e aponto que o puro apego ao que é verdadeiro, sem paixão pessoal, sem frenesi, é o que constitui sua especificidade.

Existe ainda uma outra defesa contra a precipitação nos julgamentos e na elaboração das obras. Ninguém se deixa ofuscar, quando ama a verdade, por uma ideia brilhante à qual se deu por auréola meras banalidades. Não é assim que uma obra adquire seu valor. Pode acontecer que o mais medíocre dos seres encontre uma ideia, como se fosse um diamante bruto ou uma pérola. O difícil é lapidar essa ideia e sobretudo engastá-la na joia da verdade que será a verdadeira criação.

“Na categoria dos leitores precipitados de uma obra”, diz o sr. Ramon Fernandez usando uma formulação divertida, “eu incluiria de bom grado o autor da mencionada obra”. Está muito bem! Mas de onde provém essa pressa negligente, que absolve de antemão um leitor menos interessado e menos responsável? Ela deverá ser evitada, por uma dedicação mais profunda tão somente à verdade.

Será preciso igualmente abster-se de se lançar sobre um tema específico que se gostaria de desenvolver sem ter investigado seus antecedentes gerais e seus vínculos. Ser múltiplo por longo tempo é a condição para ser uno sem perder a riqueza. A unidade do ponto de partida não é senão um vazio. Isso se sente quando a elevada e misteriosa verdade tem nosso culto. Se não utilizarmos então tudo quanto aprendemos, restará no que dissermos uma ressonância secreta, e a confiança recompensa essa plenitude. É um grande segredo o de saber fazer com que uma ideia se irradie graças a seu fundo feito de noite crepuscular. Outro segredo é o de fazer-lhe conservar, apesar desse fulgor, sua força de convergência.

O fracasso nos espreita, ou chega a ser sequer sentido? É hora de se refugiar no culto imutável, incondicionado, que havia inspirado o esforço. “Meu cérebro se transformou num retiro para mim”, escreve Charles Bonnet. Acima do cérebro está aquilo a que ele se consagra, e o retiro, então, é de uma segurança toda especial. Mesmo à custa de muita dor, a criação é uma alegria, e, mais do que a criação, a veneração da ideia de onde ela procede.

De mais a mais, como observava Foch, “é com resíduos que se ganham as batalhas”. Um fracasso em tal coisa é o que prepara para uma vitória em tal outra, para uma vitória, em suma, como fica assegurado a qualquer um que tenha mérito e faça esforço.

*

Quero assinalar um último efeito da submissão absoluta da qual acabo de tecer o elogio. Ela limita nossas pretensões não apenas pessoais, mas também humanas. A razão não pode tudo. Sua última ação, segundo Pascal, consiste em constatar seus limites. Ela o faz tão somente se ela se entregou à sua primeira lei, que não é sua verdade própria, encarada como propriedade ou como conquista, mas a Verdade impessoal e eterna.

Aqui, mais nenhuma limitação para a honra, pelo próprio fato de se haver renunciado à fatuidade. O mistério compensa. A fé substituída à busca arrasta o espírito em vastidões que ele jamais teria conhecido por si mesmo, e a luminosidade de seu próprio plano só tem a ganhar com o fato de que astros longínquos o obriguem a voltar o olhar para o céu. A razão tem por ambição apenas um mundo; a fé lhe dá a imensidão.

*

Não quero prolongar mais esse discurso. Tornar-se-á necessariamente a encontrá-lo, visto ser seu objeto o de assinalar onde está o todo.

Este todo, defendi-lhe os direitos com uma incapacidade de que tenho plena consciência e pela qual peço desculpas. Faço votos de que minhas sugestões no que toca a ele, por mais insuficientes que sejam, contribuam para trazer até ele melhores panegiristas e mais ardentes servidores.


A.-D. Sertillanges
Dezembro de 1934


Introdução

Encontra-se entre as obras de Santo Tomás uma carta a um certo frei João, onde são enumerados Dezesseis Preceitos para Adquirir o Tesouro da Ciência. Essa carta, seja ela autêntica ou não, pede para ser examinada em si mesma; ela não tem preço; gostar-se-ia de deixar gravados todos os seus termos no íntimo do pensador cristão. Acabamos de publicá-la mais uma vez na sequência das Orações do mesmo Doutor, nas quais se condensa seu pensamento religioso e transparece sua alma [2].

Tivemos a ideia de comentar os Dezesseis Preceitos a fim de anexar-lhes o que pode vir a ser útil lembrar aos estudiosos modernos. Na prática, esse procedimento nos pareceu um tanto limitado, preferimos agir mais livremente. Mas a substância desse pequeno volume nem por isso deixa de ser totalmente tomista; nele se encontrará o que nos Dezesseis Preceitos, ou em algum outro escrito, o mestre sugere quanto aos caminhos por onde conduzir o espírito.

*

Este livrinho não tem a pretensão de substituir As Fontes; ele em parte faz referência a elas. O autor não esqueceu, não mais que muitos outros sem dúvida, a comoção de seus vinte anos, quando o padre Gratry estimulava nele o ardor pelo saber.

Numa época que tanto necessita de luz, vamos lembrar tão frequentemente quanto possível as condições que permitem obter-se luz e preparar sua difusão por meio de obras.

*

Não se tratará aqui da produção em si mesma: seria o objeto de um outro trabalho. Mas a mente é sempre a mesma, quer ao propiciar o enriquecimento, quer ao proceder a um sábio dispêndio.

Devendo dizer mais para a frente que o dispêndio é nesse caso um dos meios da aquisição, não podemos duvidar da identidade dos princípios que tornam, em ambas as situações, nossa atividade intelectual fecunda.

É uma razão para ter a esperança de ser útil a todos.


CHANDOLIN, 15 de agosto de 1920


Notas:

[1] Em latim no original. (N. E.)

[2] Les Prières de Saint Thomas d’Aquin [As Orações de Santo Tomás de Aquino]. Tradução e apresentação de A.-D. Sertillanges. Paris, Librairie de l’Art Catholique.


Sobre o autor: Antonin-Dalmace Sertillanges, conhecido também como Antonin-Gilbert Sertillanges ou Antonin Sertillanges (Clermont-Ferrand, 16 de novembro de 1863 – Sallanches, 26 de julho de 1948), foi um filósofo e teólogo francês, considerado como um dos maiores expoentes do neotomismo da primeira metade do séc. XX.

Em 1883 ingressa na ordem dos dominicanos, mudando o próprio nome para Antonin-Gilbert. Chefe de redação da Revue Thomiste, em 1900 é nomeado professor de Ética do Institut Catholique de Paris, onde permanecerá até 1922. A publicação do seu monumental Thomas D’Aquin (1910) dá-lhe notoriedade nacional e internacional. Em 1918 é eleito membro da Académie des Sciences Morales et Politiques. Depois de um longo período em Jerusalém (1923), transfere-se para o convento de Le Saulchoir como professor de Ética Social, fazendo-se cada vez mais notar como um dos principais representantes do neotomismo francês, ao lado de Jacques Maritain e Etienne Gilson. De volta a Paris em 1940, falece oito anos depois, aos 85 anos, de parada cardíaca durante uma convenção num convento de Haute Savoie.

Segundo Sertillanges, toda atividade humana e todo saber encontram a própria razão de ser no cristianismo. Em Le Christianisme et les Philosophies, publicado em dois volumes, em 1939 e em 1941, trata os dados do próprio pensamento segundo as relações entre cristianismo e filosofia. Depois da aparição dos Evangelhos não pode haver filosofia alguma que possa prescindir dos seus ensinamentos. Segundo Sertillanges: “Sem o cristianismo não haveria nenhuma filosofia aceitável (...) todas as que apareceram depois do Evangelho, por mais úteis que sejam se fundidas com ele, jamais poderiam sozinhas trazer qualquer benefício à nossa civilização (...)”.

O teólogo francês é também um profundo conhecedor e admirador de Santo Tomás, de quem se aproximou desde que, no final do séc. XIX, foi nomeado chefe de redação da Revue Thomiste. A sua biografia do santo, publicada, como já se disse, em 1910, é uma obra imprescindível a todos que desejam aprofundar-se no estudo da vida e da obra do Aquinate. Voltará a ocupar-se de Santo Tomás em La Philosophie Morale de Saint Thomas D’Aquin (1916) e Les Grandes Thèses de la Philosophie Thomiste (1928). De Santo Tomás, Sertillanges aprecia sobretudo a aguda inteligência amparada em sólida fé e em vigorosa tensão espiritual. Logra, além disso, extrair a radical modernidade da metafísica tomista do ser (em latim, esse) e sua profunda autonomia em relação a Aristóteles, que, não obstante, o santo tinha por modelo. Escreve o filósofo francês: “[Santo Tomás] não hesita em afastar-se da autoridade de Aristóteles sempre que lhe pareça justo (...) ele engrandece a doutrina de Aristóteles e a enriquece infinitamente (...)”.

Sertillanges também é conhecido por seus estudos sobre Pascal (Blaise Pascal, 1941) e sobre Bergson (Henri Bergson et le Catholicisme, 1941), a quem era ligado por uma profunda amizade. Os seus ensaios de divulgação têm tido difusão enorme, como os teológicos Catéchisme des Incroyants (1930) e Dieu ou Rien? (1933), além de La Vie Catholique (1921) e Recueillement (1935), de inspiração moral. O teólogo também tratou de aspectos estéticos do culto cristão, sobretudo em Un Pèlerinage Artistique à Florence (1895) e Art et Apologétique (1909).

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Um tesouro perdido da Educação

Tempo de leitura: 18 min.

O texto abaixo é a Apresentação do livro de Didascalicon - sobre a arte de ler, de Hugo de São Vitor, publicado pelas Edições Kírion, 2018. 

APRESENTAÇÃO

O que aqui se oferece ao leitor é uma obra rica e profunda, que por muito tempo constituiu um dos pilares da educação cristã, mas que depois acabou por ser totalmente esquecida. Por esta razão, não podemos simplesmente jogá-la em seu colo sem fazer-lhe a advertência de que este livreto aparentemente obsoleto é na verdade um grande tesouro. O propósito desta apresentação — e também das notas de rodapé ao longo do livro — é propiciar uma absorção mais consciente de seus ensinamentos tão fundamentais, enquadrando-os num panorama mais abrangente da pedagogia vitorina, de modo que os frutos colhidos desta leitura possam ser mais saborosos e nutritivos.

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A começar pelo autor da obra, podemos afirmar que, se é pouco conhecido o seu nome, menos ainda o são sua vida e sua relevância na história da Igreja e da educação. Já considerado por muitos um dos expoentes da educação, não só cristã, mas ocidental, e um dos maiores teólogos da história, ao lado de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, Hugo de São Vítor reúne em si, harmonicamente, todas as principais potências que um bom cristão pode almejar, como descreve São Boaventura:

“[…] de onde se deduz que todas as Sagradas Escrituras ensinam estas três coisas: a geração eterna e a encarnação temporal de Cristo, a norma do viver e a união da alma com Deus, ou a fé, os costumes e o fim de ambos. Sobre a primeira destas coisas devemos exercitar-nos com afinco no estudo dos Doutores; sobre a segunda, no estudo dos Pregadores; sobre a terceira, no estudo das almas contemplativas. Santo Agostinho ensina de preferência a primeira; São Gregório, a segunda; São Dionísio Areopagita, a terceira. Santo Anselmo segue a Santo Agostinho; São Bernardo segue a São Gregório; Ricardo de São Vítor segue a São Dionísio Areopagita; porque Santo Anselmo se distingue no raciocínio, São Bernardo na pregação e Ricardo de São Vítor na contemplação. Mas Hugo de São Vítor se sobressai nas três” [1].

Qual foi, então, a causa do esquecimento de tão grande doutor? No que concerne à sua obra teológica, o motivo parece claro. Hugo de São Vítor, calcado numa longa tradição de comentadores e estudiosos da Sagrada Escritura, realiza com seu trabalho uma nova façanha: reunir, num único livro, tudo que o cristão deve saber de fundamental sobre os mistérios da fé. Ou seja, tudo aquilo que antes estava disperso nos muitos comentários dos Santos Padres e dos teólogos subseqüentes foi sintetizado numa única obra, com uma unidade perfeita, de tal modo que este tipo de escrito veio a se tornar a nova prática no estudo da teologia: é o que posteriormente se chamará de “suma teológica”. Ele mesmo o descreve:

“Por isto reunimos nesta obra uma suma de todos os mistérios da fé, para que a alma, firmando-se em coisas certas, pudesse conformar-se e unir-se às mesmas em sua intenção, a fim de não ser tragada sem direção e sem ordem pelos vários volumes e lições das Sagradas Escrituras” [2].

Portanto, o que Hugo de São Vítor fez foi nada menos que lançar as bases e o modo de fazer daquilo que São Tomás de Aquino levaria à perfeição. E foi justamente isto o que fez com que o seu De Sacramentis Fidei Christianae deixasse de ser copiosamente lido, dando lugar à Suma teológica de São Tomás de Aquino.

Quanto ao âmbito da educação, seu esquecimento não foi algo individual. Na verdade, toda aquela educação que gerara tantos sábios e santos ao longo de séculos foi progressivamente abandonada devido ao novo esquema educacional centrado nas universidades. Fica evidente logo nas primeiras páginas do Didascalicon que Hugo de São Vítor não visava formar pessoas para desempenharem certas funções — garantidas pelo futuro diploma —, mas para alcançarem o último degrau da Sabedoria, a contemplação, com a qual, segundo ele mesmo, “tem-se um antegosto nesta vida do que será a recompensa futura das boas obras”. Ele visava a uma formação integral que proporcionasse uma união cada vez mais profunda com o próprio Deus, ou seja, algo que não teria Ԃm aqui nesta vida e nem mesmo no Céu, o exato oposto de uma formação que visa à conclusão do curso. De um ponto de vista mais geral, Hugo de São Vítor foi esquecido junto com muitos outros ao passo que a tradição cristã foi perdendo vigência na Europa, dando lugar aos modismos cada vez mais passageiros da modernidade.

Afinal, qual é a origem deste homem e o que ele fez?

Hugo de São Vítor nasceu na Saxônia, em 1096, em uma família profundamente religiosa. Influenciado desde cedo pelo seu tio Reinardo, que era bispo e matinha uma relação muito próxima como Mosteiro de São Vítor, localizado nos arredores de Paris, Hugo convenceu um tio-avô seu de mesmo nome, Hugo, a irem até lá e entregarem suas vidas unicamente a Deus, tornando-se religiosos daquele recente mas já famoso mosteiro.

A fundação do Mosteiro de São Vítor está diretamente ligada à fama, primeiro porque seu fundador quis fugir dela, e segundo porque ele não conseguiu. Guilherme de Champeaux fez seus estudos na escola anexa à Catedral de Notre Dame, em Paris, e ali mesmo continuou sua trajetória, tornando-se padre, bispo e o mais célebre professor da mais célebre escola do início do século XII. Ao chegar ao auge da fama, Guilherme percebeu ser outro o caminho que Deus queria para ele, e fez a inesperada escolha de largar sua cátedra e sua fama para se isolar nas proximidades da capelinha de São Vítor, afastada do centro movimentado de Paris, e viver uma vida ascética e de maior comunhão com Deus, optando por vestir o hábito agostiniano. Porém alguns de seus alunos, sedentos pelos ensinamentos de seu antigo mestre, seguiram-no e o encontraram. No começo tomavam aulas semanais, mas a freqüência foi aumentando, e com ela o número de alunos, e Guilherme viu-se obrigado a tomar uma atitude: por volta de 1108, dando-lhe o nome da capela onde se reuniam, ele funda, com uma escola anexa e sob a Regra de Santo Agostinho, o Mosteiro de São Vítor.

Essa mesma fama atraiu o jovem Hugo, que levou consigo seu tio-avô, o qual acabaria por ser o maior financiador das despesas da grande igreja do mosteiro de São Vítor. (Hoje, infelizmente, a igreja e o mosteiro já não existem, destruídos durante a Revolução Francesa). Lá Hugo continuou os estudos que havia começado em sua terra natal e ordenou-se sacerdote. Em 1125 tornou-se professor da escola anexa ao mosteiro; em 1133, diretor; logo depois, tornou-se também o prior do mosteiro, tendo sido consagrado bispo. Faleceu em São Vítor em 11 de fevereiro de 1141.

“Hugo foi certamente um dos homens mais ilustres de seu tempo por suas virtudes e por sua ciência. Jacques de Vitry, em sua História ocidental, depois de um elogio pomposo da comunidade de São Vítor e dos grandes homens que ela produziu, acrescenta: ‘O mais célebre e o mais renomado de todos foi Hugo. Ele foi a harpa do Senhor, e o órgão do Espírito Santo: um símbolo de virtudes e um símbolo de pregação. Levou um grande número de cristãos à prática do bem pelo seu exemplo e pela sua pia conversação, dando-lhes a ciência pela sua doutrina tão doce quanto o mel’” [3]

É realmente incrível tudo que Hugo fez em apenas 45 anos de vida. Além de todas estas funções, dirigindo tantas almas, ele escreveu inúmeros tratados, livros e opúsculos acerca dos mais variados temas, desde teologia, moral e mística até gramática, pedagogia e geograԂa; sua obra ocupa três volumes da Patrologia Latina de Migne. Em 1154, o cronista Robert de Torigny registrou: “O mestre Hugo escreveu tantos livros que não haveria modo de enumerá-los, de tão espalhados que estão”.

Um dos pontos mais interessantes a ser ressaltado na sua produção escrita, em relação à esfera pedagógica, é que Hugo de São Vítor fazia de fato o que hoje os teóricos dizem ser a grande novidade da educação contemporânea: colocar o foco do processo de aprendizado no estudante. O que hoje parece inovação é, na verdade, um simulacro do que se fez durante séculos, desde Platão até Hugo de São Vítor. Hoje podemos encontrar inúmeros livros que dirão aos professores como centrarem-se no aluno, mas Hugo de São Vítor se dirigia aos próprios estudantes: o leitor-estudante é o interlocutor do Didascalicon. Para Hugo, era absolutamente claro ser o aluno a causa eԂciente do processo de aprendizado. Portanto, o Didascalicon não é um livro sobre como ensinar, mas como aprender; não é sobre didática, mas a própria didática aplicada, uma verdadeira aula, por assim dizer, a todo aquele que procura percorrer este caminho que conduz à Sabedoria.

“Os resultados destes modos diversos de encarar a pedagogia são também diversos. O primeiro, centrado no mestre, tende a tornar-se uma transferência mecânica de conhecimento do professor para o aluno; o segundo, centrado no aluno, tende a tornar-se uma aventura do espírito. A escola centrada no mestre só irá produzir um discípulo melhor do que o mestre por acaso, quando o discípulo, apesar do método utilizado, puder fugir espontaneamente às regras desta pedagogia; a escola centrada no aluno tende a produzir por sua natureza um certo número de alunos melhores do que o mestre. Conseqüência destes fatos é que os professores da escola centrada no mestre são, no que depende da escola, a cada geração possuidores de um nível cada vez mais baixo, enquanto que na escola centrada no aluno a tendência é a oposta.

[…]

Obras filosóficas e sínteses deste porte ainda surgem hoje em dia; mas a diferença é que hoje em dia elas aparecem apesar das escolas, enquanto que na época da Escola de São Vítor e na época em que Aristóteles estudou com Platão elas surgiam por causa das escolas. O tipo de gênio que havia em Newton e em Einstein foi desenvolvido por eles próprios sem que, entretanto, o soubessem desenvolver em seus alunos. Na escola de Platão, o gênio do mestre soube reproduzir-se em Aristóteles, e na de São Vítor o gênio de Hugo soube reproduzir-se em Ricardo, e, menos diretamente, em diversos contemporâneos que reproduziram seu sistema de ensino” [4].

Neste caminho que visa à Sabedoria, a última ciência a ser adquirida é a Ciência Sagrada, que tem na Sagrada Escritura o seu alicerce. Hugo pertence a uma tradição, que começou mais explicitamente com Orígenes, na qual o caminho rumo à Sabedoria está no estudo dos conhecimentos mais profundos da Sagrada Escritura. Assim diz Cassiodoro, a quem Hugo de São Vítor tinha por mestre:

“Esta talvez seja a escada de Jacó pela qual os anjos subiam e desciam, e feliz será aquela alma a quem Deus conceder formar-se na intimidade deste caminho; mais feliz ainda será aquele que nele souber indagar pela inteligência da vida, aquele que, sabendo despojar-se dos pensamentos humanos, souber revestir-se do discurso divino” [5].

Para estes sábios, compreender a palavra de Deus é o caminho mais eԂciente para se unir à Palavra Viva de Deus, o Logos Divino. AԂnal, para Hugo, a filosofia — a amizade com a Sabedoria —, é uma participação na própria Sabedoria Divina, e elas não são duas coisas distintas, mas a mesma inteligência que está no ser de todas as coisas, não sendo contida por elas, mas contendo-as todas.

Muitos especialistas em educação podem achar que este ensino, com esta finalidade e este caminho, é na verdade um tipo específico de escola, adequado para determinados fins. Para Hugo de São Vítor, porém, esta é a verdadeira e única escola: tudo o que não se direcionar à Sabedoria é um simulacro de escola, de aprendizado, uma deturpação do uso da nossa inteligência, a qual nos foi dada por Deus para, acima de tudo, contemplarmos a Ele próprio. “Esta é a verdadeira e legítima finalidade da escola. São as outras escolas, e não esta, que representam um desvio do verdadeiro ideal do ensino”[6].

Por fim, a última advertência que faço ao leitor é que não se espante se o texto às vezes lhe parecer demais sintético ou obscuro. É praticamente impossível em uma primeira leitura e sem qualquer mediação compreender com profundidade os escritos filosóficos deste glorioso período, considerado por muitos o apogeu da educação cristã, e que culminou enԂm em São Tomás de Aquino. Nossa ignorância é tão sobrepujante que a princípio nos parece estarmos lendo algo errado, ou incompleto, ou fora de ordem. Hoje em dia estamos todos, de modo geral, acostumados a uma linguagem rasa e unívoca, que pouco expressa além de nossos sentimentos e desejos mais momentâneos. Quando nos deparamos com uma obra de tamanha densidade (sem esquecer de que ela era voltada para os iniciantes nos estudos), não sabemos sequer por qual caminho seguir a fim de apreender esta luz que brilha para nós como se tivéssemos acabado de sair da escuridão. Sentimos falta de explicações detalhadas, de exemplos abundantes e de clareza nos termos. Mas a clareza que buscava Hugo de São Vítor e seus pares não estava focada nas palavras, mas na própria realidade e na sua compreensão. Se não tivermos isso sempre em vista, jamais compreenderemos o que ele está querendo nos mostrar através de suas palavras.

Que este possa ser o objetivo do leitor com este livro: iluminar sua compreensão do mundo e de sua própria vida; que, além de uma fonte de informações, este escrito seja uma porta que se abre para o aperfeiçoamento cujos frutos são de valor inestimável, como nos diz o próprio Hugo:

“Quem quer que se entregue ao estudo da sabedoria ou da ciência divina conhecerá o fruto de seu aprendizado mais pela experiência do que pelo documento ou conhecimento alheio. Nela a alma possuirá o bem da ocupação honesta, o amparo da meditação, o estímulo da oração e a luz da suprema contemplação. Ali será formada no exemplo da santidade, será instruída no exercício da virtude e se fundamentará no exercício da boa obra. Ali, rejeitado o engano da falsidade, expulsa a malícia da iniqüidade, será conduzida ao verdadeiro e ao perfeito conhecimento da verdade e amor da bondade. Nela será fortalecida, para não desanimar diante da adversidade; será conԂrmada, para não desviar-se na prosperidade, aprenderá a recordar-se do passado e a acautelar-se com o futuro”[7].

Roger Campanhari 
Campinas, junho de 2018.


Notas:

[1] São Boaventura, Redução das ciências à teologia.

[2] Hugo de São Vítor, Prólogo ao De Sacramentis Fidei Christianae.

[3] Monsenhor Hugonin, bispo de Bayeux, Ensaio sobre a fundação da Escola de São Vítor de Paris.

[4] Princípios fundamentais de pedagogia, disponível em cristianismo.org.br/pfp-00.htm.

[5] Cassiodoro, De Institutione Divinarum Litterarum.

[6] Princípios fundamentais de pedagogia, idem.

[7] Hugo de São Vítor, Prólogo ao Simbologia de ambos os Testamentos.

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Leia mais em Princípios Fundamentais de Pedagogia - parte 1

Leia mais em Princípios Fundamentais de Pedagogia - parte 2

Leia mais em Opúsculo sobre o modo de aprender e de meditar de Hugo de São Vítor.

Leia mais em Hugo e Ricardo de São Vítor


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Platão Educador

Texto retirado de MARROU, Henri-Irénée. História da Educação na Antigüidade. 4ª Impressão, São Paulo, Editora Pedagógica Universitária Ltda. e Editora da Universidade de São Paulo, 1973. (Esta obra foi reeditada pelas Edições Kírion, em 2017).


A PROCURA DA VERDADE

A obra pedagógica de Platão ultrapassou de muito em importância histórica, o papel propriamente político que ele lhe havia designado. Opondo-se ao pragmatismo dos Sofistas, demasiado apegados à eficácia imediata, Platão edifica todo o seu sistema educacional sobre a noção fundamental da verdade, sobre a conquista da verdade pela ciência racional.

O verdadeiro homem de Estado, este dirigente, este "rei" ideal que urge plasmar, distinguir-se-á de todas as suas contrafações por possuir a ciência [23], a ciência crítica e direta do comando [24], no sentido técnico que, no grego de Platão, reveste a palavra ἐπιστήμη, a saber, o de ciência verdadeira, fundada em razões, por oposição à δόξα, a opinião vulgar.

Mas esta "ciência real" qualificará, também, aquele que, ao invés de uma cidade, tem apenas sua família e sua casa para reger [25]. Mais ainda: é o mesmo critério, ou seja, a posse da verdade, que definirá o verdadeiro orador, por oposição ao sofista [26], como também o verdadeiro médico [27], e, evidentemente, também o verdadeiro filósofo [28]. Por conseguinte, o tipo de educação que Platão concebe com vistas à formação do dirigente político é um tipo de educação dotado de valor e alcance universais: qualquer que seja o campo da atividade humana para o qual alguém se oriente, não há mais que uma alta cultura válida: a que aspira à Verdade, à possessão da verdadeira ciência. Todo o pensamento de Platão é coroado por esta alta exigência; ela se afirma, já, com a máxima nitidez, na famosa réplica do Hipias Maior [29]:

-- Sócrates, será que esta distinção escapará ao nosso adversário?
De qualquer modo, Hípias, juro que ela não escapará àquele homem perante o qual eu me ruborizaria, mais do que perante qualquer outro, se disparatasse e falasse sem dizer nada!
-- Que homem?
-- Eu mesmo, Sócrates, filho de Sofronisco, que não mais me permitirei fazer levianamente uma afirmação não verificada do que me permito crer que sei o que ignoro.
 
A norma não é mais o sucesso, mas a verdade: daí o valor conferido ao saber verdadeiro, fundado em rigor demonstrativo, cujo símbolo é a verdade geométrica que o Ménon oferece como exemplo. Por toda a obra de Platão insinua-se este mesmo tema: o Protágoras, e mesmo os primeiros Diálogos Socráticos, fazem-nos descobrir que a ἀρετή, isto é, a nobreza espiritual, pressupõe, ainda que não se identifique com ele, o conhecimento, a ciência do Bem; no sétimo livro da República [30], o célebre mito da Caverna proclama o poder emancipador do saber, que delivra a alma desta incultura (ἀπαιδευσία), já no Górgias [31] denunciada como o maior dos males. 

Esta educação "científica", Platão não a sonhou apenas: durante cerca de quarenta anos (387-348), subministrou-a aos discípulos reunidos ao seu redor na Academia.

ORGANIZAÇÃO DA ACADEMIA

Os modernos arguem-se no afã de determinar se esta era uma "associação para o progresso da ciência" ou, antes, um estabelecimento de ensino superior (8). Discussão um tanto vã: o entusiástico realismo da Escola e a bonomia desta idade arcaica impedem-nos de transferir para esse ambiente a idéia moderna de ciência em evolução e contínuo desenvolvimento: a ciência existe, constituída fora de nós, ao nível das Idéias, e o problema é adquiri-la, antes que construí-la. Somente com Aristóteles [32] se manifestará, no pensamento grego, a distinção, tão nitidamente realçada entre os modernos por Max Scheler, entre a alta Ciência e sua réplica pedagógica, o Saber configurado nos programas escolares. Não se poderia contar com uma pedagogia autônoma, servindo para transmitir esta pubescente ciência platônica, fremente ainda de sua novel descoberta: o sino aí coincide com o método de investigação.

Tudo o que os Diálogos nos permitem entrever mostra-nos Platão como um partidário dos métodos ativos: seu método dialético é bem o contrário de uma doutrinação passiva. Longe de inculcar a seus discípulos o resultado, já elaborado, de seu próprio esforço, ao Sócrates pintado por Platão apraz, ao contrário, fazê-los trabalhar, fazê-los descobrir por si mesmos, de início, a dificuldade, e depois, à custa de aprofundamento progressivo, o meio de superá-la. A Academia era, pois, ao mesmo tempo, uma Escola de Altos Estudos e um instituto de educação.

Começamos agora a visualizar, de maneira bastante nítida, os quadros de sua organização; a Academia tem uma sólida estrutura institucional: ela não se apresenta como uma empresa comercial, mas na forma de uma confraria, de uma seita, cujos membros se acham estreitamente unidos pela amizade (sempre este vínculo afetivo, senão passional, entre mestre e alunos). Do ponto de vista legal, ela é, como a seita pitagórica, uma associação religiosa (Θίασος), uma confraria votada ao culto das Musas (9) e, após a morte do mestre, ao culto de Platão heroificado: precaução útil para açaimar as suscetibilidades da beatice democrática, sempre disposta a acusar os filósofos de impiedade (10), como o haviam mostrado os processos intentados contra Anaxágoras (432), Diágoras e Protágoras (415), para não falar no

de Sócrates (399), e na expectativa dos de Aristóteles (entre 319 e 315) e Teofrasto (307). Este culto corporificava-se em festas: sacrifícios e banquetes, meticulosamente regulamentados. Tinha por sede um santuário consagrado às Musas, e depois ao próprio Platão, situado à sombra do bosque sagrado dedicado ao herói Acádemos, lugar afastado e solitário da zona norte de Atenas, perto de Colona, e que Platão havia escolhido não por sua comodidade -- pois nos é dito [33] que era, ao contrário, um sítio insalubre -- mas pelo prestígio religioso que o cercava (11), pois era um lugar santo, ilustrado por muitas lendas, pretextos para jogos fúnebres regulares, e onde havia vários outros santuários, consagrados aos deuses infernais -- a Posídon, Adrasto ou Dioniso. A propriedade de Acádemos encontrava-se no termo de um caminho retilíneo saindo de Atenas para o Dípilon, caminho ao qual uma dupla fila de túmulos e monumentos comemorativos conferia um caráter religioso; o bosque sagrado, propriamente dito, devia estar sem dúvida reduzido a um pequeno arvoredo, emoldurado nesse conjunto incôndito, em que as áreas consagradas, circundando templo e altares, repletas de monumentos votivos, se justapunham a campos de esporte cercados de colunatas. Era num desses ginásios [34] que o Mestre ensinava, sentado no centro de uma êxedra [35] (12).

Não imaginemos este ensino sob uma forma demasiado doutoral: paralelamente às lições, concedamos um lugar bastante amplo a entretenimentos familiares durante as "patuscadas em comum" (συμόσια): estas, habilmente conduzidas representavam, para Platão, um dos elementos constitutivos da educação [36]. A vida da Academia implicava, com efeito, certa comunidade de vida entre mestre e discípulos, mas não uma organização propriamente colegial (pois não está seguramente estabelecido que eles tenham habitado, juntos, um edifício vizinho).

Infelizmente, conhecemos melhor, desta escola, o estatuto jurídico, o local e até o mobiliário (havia ali quadros murais, ilustrativos da classificação dicotômica dos seres) (13) do que a vida quotidiana. Alguns raros testemunhos -- como o do cômico Epicrates, mostrando os jovens platônicos em busca da definição da abóbora [37], ou o de Aristóteles sobre a orientação do ensino oral de Platão em sua velhice [38] -- não bastariam para proporcionar-nos uma imagem precisa do conteúdo da educação platônica, se não possuíssemos os programas, tão notavelmente detalhados, contidos nas grandes utopias da República e das Leis.

UTOPIA E ANTECIPAÇÕES

Naturalmente, não se trata de pretender que Platão haja executado, de maneira sistemática, no âmbito restrito de sua Academia, os planos que elaborou nessas duas obras, com plena liberdade teórica: ele próprio salienta bastante, que a realização do seu ideal pedagógico teria exigido uma transmutação completa do Estado. Com efeito, o lugar de primeira plana que reinvindico para Platão, nesta história da educação, não é apenas função de educador por ele desempenhado, concretamente, na Academia: foi todo o seu pensamento, inclusive sob os aspectos paradoxais que ele conscientemente lhe deu, que exerceu profunda influência sobre a educação antiga.

Nem tudo, aliás, era pura utopia, mesmo em tais aspectos: eles encerram muitas antecipações proféticas; digamos, para racionalizar, que esses paradoxos representavam o reconhecimento de aspirações profundas da consciência grega, aspirações às quais as instituições do período seguinte deviam, em ampla medida, satisfazer. Citarei dois exemplos:

Antes de tudo, a exigência fundamental: a educação deve -- diz ele -- tornar-se coisa pública; os mestres serão escolhidos pela cidade, controlados por magistrados especiais... [39]. Em sua época, este anseio não era realizado quase senão nas cidades aristocráticas, como Esparta; por toda parte, alhures, a educação era livre e privada. Ora, veremos que a Grécia helenística adota- ria, muito genericamente, um regime bastante análogo

àqueles que recomendam as Leis. Do mesmo modo, a igualdade rigorosa que ele preceitua, entre a educação dos rapazes e a das moças [40] (educação paralela, mas não co-educação: a partir de seis anos, os dois sexos têm mestres e classes distintos [41]), assume, nas tintas de sua pena, o exagero de um paradoxo: ela reflete apenas um fato real, qual seja a emancipação das mulheres na sociedade do quarto século, e, também nisto, antecipa as realizações da época helenística.

Utopia ou antecipações, a teoria platônica da educação merece, porém, ser estudada, por si mesma, em seu conjunto.

EDUCAÇÃO ELEMENTAR TRADICIONAL

No topo do sistema alcandoram-se os altos estudos filosóficos, reservados a um escol de indivíduos especialmente dotados. Esses estudos supõem a prévia aquisição de uma sólida formação básica: aquela que, na República (livros II-III), Platão dispensa a todos os membros da aristocracia militar dos φύλακες; é a mesma que descrevem as Leis, com mais detalhes, e reduzindo suas exigências àquilo que permitia o estado real da civilização grega. Esta "educação preparatória" (προπαιδεία) [42] não pretende conduzir à verdadeira ciência: contenta-se com tornar o ser humano capaz de ter-lhe acesso um dia, desenvolvendo-lhe harmoniosamente o espírito e o corpo; paralelamente, ela o predestina e o predispõe a tal aquisição, incutindo-lhe hábitos salutares. É notável que Platão não tenha elaborado um programa original para este primeiro ciclo de estudos; no momento de empreender-lhe a análise, faz Sócrates [43] dizer:

Qual será, pois, essa educação? Parece difícil descobrir uma melhor do que a adotada pelos Antigos: ginástica para o corpo, "música" para a alma...

E, de fato, é ao quadro da "antiga educação" ateniense, pintado por Aristófanes [44], que nos remete outra vez a pitoresca evocação das Leis [45], mostrando-nos, ao romper

do dia, as crianças que se dirigem juntas para a escola, sob a guarda dos "pedagogos". Ter Platão assim alojado, na base do seu sistema pedagógico, a educação grega tradicional, eis um fato que se revestiu de considerável importância para o desenvolvimento da tradição clássica, cujas continuidade e homogeneidade ela reforçou: por um lado, a cultura filosófica, longe de romper com a educação anterior, apresentou-se como um prolongamento, um enriquecimento desta; por outro lado, esta educação primeira veio a constituir um denominador comum entre a cultura filosófica e a cultura rival, que Isócrates lhe opunha -- uma e outra apresentando-se como duas variedades de uma mesma espécie, como dois ramos divergentes oriundos de um tronco comum.

Os primeiros anos da criança deveriam, segundo Platão, ser ocupados por jogos educativos [46] praticados em comum, pelos dois sexos, e sob vigilância, em jardins de crianças [47]; mas, para ele, como para todos os gregos, a educação propriamente dita só começa aos sete anos. Ela compreende, pois (as Leis [48] retomam a distinção da República), ginástica para o corpo, e "música" -- ou melhor: cultura espiritual para a alma.

No referente à ginástica, Platão reage, violentamente [49], contra o espírito de competição que, como o lembrei, causava já tantos danos ao esporte do seu tempo. Queria ele reduzi-la à sua finalidade original, a preparação para a guerra: eis por que, no atletismo puro, interessa-se ele sobretudo pela luta [50], que é preparação direta para o combate. Sem dúvida, o programa dos jogos que deverão constituir a sanção da educação física não exclui os outros esportes: compreende a gama normal das corridas a pé: estádio, duplo estádio, etc. [51]; mas Platão aí introduz, também, combates de esgrima, combates de infantaria pesada e de infantaria leve [52] e, de maneira geral, insiste particularmente nos exercícios de caráter militar [53] (que destina tanto às mulheres como aos homens: a cidade platônica inclui mulheres-solda-

dos): o arremesso de flecha com arco, o dardo, a funda, a esgrima, as marchas e manobras táticas, a prática do acampamento. Anexa, enfim, a esta formação-tipo, o aristocrático esporte hípico (que será, igualmente, obrigatório para as moças), com seu acompanhamento normal, a caça [54]: outros tantos traços arcaicos recebidos diretamente da mais velha tradição nobre. Mas eis que, aqui, ao contrário, orienta-nos para o porvir e para as instituições helenísticas: toda esta formação pré-militar será instilada nos ginásios, estádios e picadeiros públicos, sob a direção de monitores profissionais assalariados pelo Estado [55].

Outro traço arcaizante: a preocupação de dar ao esporte seu valor propriamente educativo, seu alcance moral, seu papel, em pé de igualdade a cultura intelectual, e, em estreita colaboração com ela, na formação do caráter e da personalidade [56]. Mas, também aqui, o arcaísmo associa-se intimamente ao "modernismo": em sua concepção da ginástica, Platão inclui todo o domínio da higiene, as prescrições concernentes ao regime de vida e, notadamente, ao regime alimentar, assunto tratado com predileção pela literatura médica de seu tempo. A influência da medicina foi muito profunda sobre o pensamento de Platão, pelo menos igual à da matemática (14). Ora, a medicina grega, por um progresso notável, cujas etapas podemos acompanhar ao longo do quinto e do quarto séculos, havia chegado a considerar que seu objeto fundamental era não o cuidado imediato com a doença, mas, principalmente, a manutenção da saúde, por meio de um regime adequado. Daí uma estreita aproximação entre os domínios do médico e do treinador esportivo, que a dupla carreira de Heródico de Selímbria simboliza a nossos olhos [57].

À ginástica, as Leis acrescentam ainda a dança, que, inseparável do canto coral [58], pertenceria também à música: Platão insiste, longamente, sobre seu ensino e sua prática [59]; reserva-lhe um lugar nos concursos e nas festas, ao lado das procissões solenes para as quais a juventude é convidada [60]. Salienta-lhe, igualmente, as virtudes educativas: a dança é o meio de disciplinar, de submeter à harmonia de uma lei a necessidade, espontânea em todo ser jovem, de exaurir-se, de agitar-se [61]; ela contribui assim, da maneira mais direta e mais eficaz, para a disciplina moral [62]. (...)

Todavia, o lugar que Platão concede, em sua discussão, aos aspectos propriamente espirituais da cultura, mostra claramente ter já o papel da educação física passado para segundo plano: lentamente, a cultura helênica se distancia de suas origens cavalheirescas e evolui na direção de uma cultura de letrados. Sem dúvida, a mutação não está ainda concluída: a música, no sentido preciso em que a entendemos, ocupa, sempre, um lugar na honra educação [65], e, para Platão, um lugar de (κυριωτάτη): a criança aprenderá, pois, do mestre de música (κιθαριστής), o canto e o manejo da lira [67]. Sempre fiel às velhas tradições, ele gostaria, à custa de uma regulamentação severa, de preservar o ensino artístico na via traçada pelos antigos clássicos, ao abrigo das inovações e das tendências dissolventes da música "moderna", suspeita de veicular alguma debilidade, espírito anárquico e relaxamento moral [68]: pois aqui, como em toda parte, a ambição moralizadora domina todo o esforço do educador.

Mas já a música propriamente dita, "o canto e as melodias [69]" , começa a ceder o passo às letras -- λόγοι [70], γράμματα [71]; a criança deverá aprender a ler e a escrever [72], depois passará aos autores clássicos, estudando-os integralmente [73] ou em antologias [74] (é a primeira vez que a história menciona este recurso aos "trechos escolhidos", destinados a tão frutífera carreira); aos poetas, únicos autores estudados outrora, Platão junta autores em prosa [75]; os estudos literários serão, naturalmente, sancionados em concursos ou jogos musicais [76].

Quais serão estes autores? É sabido que Platão critica violentamente os poetas reputados clássicos em seu tempo, começando pelo velho Homero (mas sua crítica atinge também os Trágicos, e, de maneira geral, o papel desempenhado pelos mitos na educação tradicional da criança grega): formulada pela primeira vez nos livros II-III da República [77], essa crítica é retomada, em profundidade, no livro X [78] e será repetida nas Leis [79]. Seu caráter paradoxal não deve escamotear o quanto ela se prende à essência mesma da doutrina platônica.

Ela condena os poetas porque seus mitos são mentiras, apresentando da divindade ou dos heróis uma imagem falaciosa, indigna de sua perfeição. Sua arte, repassada de ilusão, é perniciosa por ser contrária à Verdade -- essa verdade a que toda a pedagogia deve estar subordinada --, por desviar o espírito de seu fim, que é a conquista da ciência racional. Opondo com tal vigor a poesia e filosofia [80], rompendo com a mais constante tradição, que, como vimos, situava Homero na base de toda educação, Platão punha a alma grega diante de uma opção difícil: devia a educação permanecer basicamente artística e poética ou devia tornar-se científica? Este problema não deixou, desde Platão, de apresentar-se à consciência de todo educador, e nunca foi resolvido de maneira definitiva: nosso próprio ensino não se acha sempre dividido entre as reivindicações opostas das "letras" e das "ciências"?

Sabe-se que, de modo geral, a civilização antiga não subscreveu essa condenação de Homero e não aceitou as soluções radicais propostas por Platão [81]: submeter os textos poéticos a uma severa censura, expurgá-los, corrigi-los, ainda que para isto fosse necessário reescrevê-los! A própria obra de Platão depôs contra ele: seus Diálogos não são bem o modelo mesmo duma poesia magnífica,

que não renuncia a nenhum dos procedimentos da arte, que termina por servir-se do próprio mito para instilar a persuasão por um encantamento quase mágico? Disso, sem dúvida, Platão, antes de todos, tinha consciência: "Também nós somos poetas", brada ele, dirigindo aos Trágicos um desafio cheio de ousadia [82]; e, meio sério, meio jocoso, propõe adotar-se o próprio texto de suas Leis, para explicação nas aulas [83].

Mas não somente isto: cada página de seus Diálogos testemunha, de maneira brilhante, quanto a cultura pessoal de Platão se havia nutrido e beneficiado do ensino tradicional dos poetas: a citação de Homero, dos líricos, dos trágicos, brota espontaneamente de sua pena, serve para exprimir seu pensamento profundo, que ela sustenta tanto quanto o ilustra. Pelo uso que dela faz, Platão demonstra, contra si mesmo, não apenas a fecundidade dessa cultura literária, mas também o proveito que o espírito filosófico podia dela tirar.

Entretanto, não se deveria considerar essa crítica como uma facécia vã: ela não foi suficiente para banir Homero da cidade, assim como a crítica do Emilio não expulsou o deleitoso La Fontaine das nossas escolas -- mas não deixou de infiltrar-se, por sua vez, na tradição antiga, como uma interrogação levantada, um repto, um desafio, e cada geração, cada letrado teve, por sua vez, de reconsiderá-la.


Notas:

[23] [PLATÃO] O Político, 259b. 
[24] Idem, 292b. 
[25] Idem, 259bc. 
[26] Fedro, 270a s. 
[27] Idem, 270b.
[28] O Sofista, 267e.
[29] Hipias Maior, 298b. 
[30] A República, VII,
[31] Górgias, 527e. 514a s.
[32] ARISTÓTELES, Partes dos Animais, 639 a 1 s.
[33] ELIANO DE PRÊNESTO, Histórias Variadas, IX, 10; PORFÍRIO, Da Abstinência, 36, 112; SÃO BASÍLIO DE CESARÉIA, Sermões, XXII, 9. 
[34] EPIGRATES ap. ATENEU, Banquete dos Sofistas, II, 59 D, 10. 
[35] DIÓGENES LAÉRCIO, Vidas dos Filósofos, IV, 19. 
[36] PLATÃO, As Leis, I, 41cd; II, 652a.
[37] Ap. ATENEU, Banquete dos Sofistas (ed. Casaubon), II, 59 D. 
[38] ARISTÓTELES, Metafisica, VI-VIII. 
[39] PLATÃO, As Leis, VI, 754cd; 765d; VII, 801d; 804c; 813e; 809a.
[40] A República, V, 451d-457b; As Leis, VII, 804d-805b; 813b. 
[41] Idem, 794c; 802e; 813b.
[42] A República, VII, 536d. 
[43] Idem, II, 376e; cf. VII, 521de. 
[44] ARISTÓFANES, As Nuvens, 961 s. 
[45] PLATÃO, As Leis, VII, 808d.
[46] Idem, I,  643bc.
[47] Idem, VII, 793e-794b. 
[48] Idem, 795d-796d. 
[49] Idem, 796a, d; VIII, 830a. 
[50] Idem, VII, 795d-796a; VIII, 814cd. 
[51] Idem, 832d-833d. 
[52] Idem, 833d-834a. 
[53] Idem, VII, 794c; 804d-806c; 813b; VIII, 829e; 833cd.
[54] Idem, VII, 823c; 824a.
[55] Idem, 804cd; 813e. 
[56] A República, III, 410c-412a.  
[57] Idem, 406ab; Protágoras, 316e; Fedro, 227d. 
[58] As Leis, II,  654b. 
[59] Idem, 653d s.; VII, 795e; 814e-816d.
[60] Idem, 796c. 
[61] Idem, II, 653de. 
[62] Idem, 654a-655b. 
[65] PLATÃO, A República, III, 398c-403c.
[66]. Idem, 401d. 
[67] As Leis, VII, 812be. 
[68] Idem, II, 656ce; III, 700a-701c. 
[69] A República, III, 398 c.  
[70] Idem, II, 376e.
[71] As Leis, VII, 809b. 
[72] Idem, 810b. 
[73] Idem, 810e. 
[74] Idem, 81la.
[75] Idem, 809b.
[76] Idem, VIII, 834e-835b.
[77] A República, 377a-392b.
[78] Idem, 595a-608b. 
[79] As Leis, VII, 810c-811b.
[80] A República, X, 607b. 
[81] Idem, III, 386c; 387b; As Leis, VII, 801d-802b; cf. VIII, 829de.
[82] As Leis, VII, 817b. 
[83] Idem, 811ce. 


Notas Complementares

(8) O que era Academia: P. BOYANCÉ, Le Culte des Muses chez les Philosophes grecs, p. 261, resume o debate: uma associação de sábios (U. VON WILAMOWITZ-MÖLLENDORF, Platon 2, Berlim, 1920, ps. 270 segs; Antigonos von Karystos, Philogische Untersuchungen, IV, Berlim, 1881, ps. 279 segs.; H. USENER, Organisation der Wissenschaftlichen Arbeit, Vorträge und Aufsatze, Leipzig-Berlim, 1907, ps. 67 segs.), ou uma Universidade (E. HOWALD, Die Platonische Akademie und die moderne Universitas litterarum, Berna, 1921)?

(9) A Academia como tíase das musas: P. BOYANCE, ibid., ps. 261-267; sobre a heroificação de Platão, ibid., ps. 259-261, 267-275, e O. REVERDIN, La Religion de la Cité platonicienne, Paris, 1945.

(10) Sobre Les Procès d'impiété intentés aux Philosophes à Athènes aux Ve.-IVe siècles, cf. o trabalho, publicado sob este título, de E. DERENNE, ap. Bibliothèque de la Faculté de Philosophie et Lettres de l'Université de Liège, XLV. Liège, 1930.

(11) Caráter sagrado do sítio da Academia: CH. PICARD, Dans les Jardins du héros Académos, Institut de France, Séance publique annuelle des cinq Académies du jeudi 25 octobre 1934, Discours, Paris, 1934. Por iniciativa, e com o patrocínio de P. ARISTOPHRON (L'Académie de Platon, Paris, 1933), a Academia de Atenas empreendeu, no sítio, escavações que, infelizmente, foram interrompidas no momento em que começavam a tornar-se frutíferas: ver-lhe a crônica ap. Bulletin de Correspondance hellénique, de 1930 (t. LIV, ps. 459-460) a 1937 (t. LXII, ps. 458-459), ou Jahrbuch des Deutschen archäologischen Instituts, Archäologischer Anzeiger, notadamente 1934, c. 137-140 (plano: Abb. 8).

(12) A êxedra de Platão: para ajudar o leitor moderno na "composição de lugar", lembrarei os mosaicos (que embora romanos reproduzem um original helenístico) do museu de Nápoles e da cidade Torlonia-Albani, representando uma assembléia de filósofos (os Sete Sábios?): G. W. ELDERKIN, American Journal of Archaeology, XXXIX (1935), ps. 92-111; O. BRENDEL, Römische Mitteilungen, LI (1936), ps. 1-22 e ainda ELDERKIN ibid., LII (1937), ps. 223-226.

(13) Quadros murais usados na Academia para os exercícios práticos de classificação (cf. ARISTT., P. A., I, 639 a): A. DIES, Notice em sua edição do Politique, coleção "Budé", Paris, 1935, p. XXVII.

(14) Influência da medicina e, notadamente, da ciência higiênica sobre o pensamento de Platão: cf. W. JAEGER, no admirável capítulo que abre o tomo III de sua Paideia, ps. 3-45, "a medicina grega como paideia".


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