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A Educação Doméstica no século XIX


A educação doméstica no Brasil de oitocentos

Maria Celi Chaves Vasconcelos
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Universidade Católica de Petrópolis

Resumo

O presente artigo é uma reflexão a partir do livro A Casa e os seus Mestres: a educação no Brasil de Oitocentos (VASCONCELOS, 2005), no qual é apresentada a trajetória da educação doméstica, sistema utilizado pelas elites para a educação de seus filhos no século XIX. Este artigo pretende demonstrar como a educação realizada em casa foi uma modalidade reconhecida de educação durante o Oitocentos e, de que forma, nesse mesmo período a escola estatal vai adquirindo sua oficialidade e se tornando obrigatória, destituindo a educação doméstica do seu lugar reconhecido de formação e instrução. São abordados ainda, aspectos da prática da educação nas casas, como as características de seus agentes, a configuração dos espaços utilizados e os métodos de ensino adotados.

Palavras-chave: Educação doméstica. Escola estatal. Mestres. Professores particulares. Preceptores. Elites. Brasil oitocentista.

The home education at home in Brazil of the 19th century

Abstract

This article is a reflection about the book The House and its Masters: the education in Brazil of the Eighteen (VASCONCELOS, 2005), in which is presented the trajectory of the education at home, system used by the elites to educate their children in the 19th century. The text intends to demonstrate how the education held at home was a recognized meaning of education during the 18th century and, in which way, in this same period the state school goes acquiring its official task and become obligatory, dismissing the education at home of its recognized place of children’s formation and instruction. The article also addresses to aspects of the educational practice in the houses, as the characteristics of its agents, the configuration of the used spaces and the adopted methods of education are still approached.

Keywords: Education at home. State school. Masters. Teachers and tutors private. Elites. Brazil of the 18th century.


Introdução

A partir do século XVIII, na Europa Ocidental, a educação doméstica realizada nas camadas abastadas da população vai deixando de ser privilégio apenas das crianças nobres para se tornar uma prática recorrente entre ricos comerciantes, altos funcionários e famílias de elite que se espelhavam nos hábitos da aristocracia. Esse movimento pela educação das crianças — a fim de que se preparassem melhor para a vida adulta ou, no caso dos meninos, para a ocupação das funções prioritárias na sociedade — converte-se em estatuto de progresso e ascensão social, ultrapassando os desígnios apenas das elites e surgindo como aspiração de outros extratos da população.

No Brasil, tais práticas vão se afirmar durante o Oitocentos, fazendo com que as classes mais favorecidas, que podiam prover a educação de seus filhos, utilizassem a educação doméstica não só para a educação elementar, ou seja, para o ensino da leitura, escrita e contas mas também para a continuidade da formação dos jovens, com conhecimentos específicos. Dessa forma, a educação era dirigida pelo poder privado e estava sob sua estrita responsabilidade.

Tendo em vista a importância que a educação assume no Brasil, especialmente a partir da segunda metade do século XIX, o Estado Imperial, diante das perspectivas de ampliação da educação formal advindas da influência dos modelos europeus, inicia a sistematização da escolarização, há muito praticada pelas ordens religiosas que, porém, atuavam num universo reduzido, direcionando seus colégios para um público definido.

Sob a tutela do Estado Imperial, a educação escolar se dá na esfera pública em contraponto à educação doméstica que, aplicada à esfera privada, permanece nas elites como forma de resistência à inferência do Estado na educação e como diferencial ao projeto de escolarização das classes populares, evidenciando a divergência entre as expectativas de educação desses segmentos. Se a educação popular estava sob a tutela estatal, a das elites iria se diferenciar na medida em que se conserva distante desta intervenção.

No entanto, essa forma pacífica e generalista, organizada por classes, que o texto parece sugerir, estava marcada pelas especificidades de cada lugar, e na realidade, no Brasil, encontrava-se como um movimento efervescente que suscitava inúmeras discussões.

Os rígidos padrões morais da população, as dificuldades de acesso às poucas escolas existentes — por vezes, colocadas pelo próprio Estado — aliadas às limitadas expectativas da população e às necessidades de sobrevivência no Brasil Oitocentista, essencialmente rural, cujas terras eram divididas entre grandes proprietários, faziam com que grande parte da população desconhecesse a escola, não alimentando qualquer perspectiva quanto a ela ou qualquer interesse pelo seu “saber”. A realidade vivida pelas classes menos favorecidas era extremamente rude e precária, constituindo-se em uma luta diária pela sobrevivência, impedindo que se empreendessem meios de freqüência à escola.

Além disso, havia muitas restrições às idéias de democratização do ensino e elas confrontavam os limites políticos e culturais típicos de uma sociedade escravista, autoritária e baseada nas desigualdades sociais. O Estado Imperial tinha presença muito pequena no que tange à instrução, até porque a própria escola não havia se firmado detentora de um lugar social legítimo. Eram contestáveis a sua existência e necessidade.

Algumas províncias, já na primeira metade do século XIX, estabeleceram leis que tornavam obrigatória a freqüência da população livre à escola. Porém, eram muitos os limites enfrentados para a concretização de tais ordenamentos legais. Aos obstáculos culturais, políticos e sociais relacionados à sociedade escravista e desigual se somavam a falta de orçamento nas províncias para um investimento que demandava amplos recursos para a concretização da universalização da instrução e que, ainda, teria de acarretar profundas mudanças nos hábitos na população.

Nesse contexto, favoreceu-se a educação doméstica, para a qual se voltaram os pais desejosos de garantir a instrução de seus filhos. Tratavam de aplicá-la eles mesmos, ou se socorriam dos préstimos de algum parente ou do capelão da paróquia local. As famílias mais abastadas podiam contratar mestres para lhes ensinar, especialmente as primeiras letras. Villalta sinaliza que:

A instrução na Colônia processava-se, assim, em grande parte, no âmbito do privado, preenchendo o vazio da escola pública e semipública inexistente ou escassa; quando se ultrapassavam os domínios da informalidade, estabelecendo-se vínculos formais entre professor e aprendizes, criava-se um ambiente se não tipicamente escolar, ao menos muito próximo de sê-lo. (VILLALTA, 1997, p. 357).

Para Faria Filho (2000, p. 138), há indícios de que a rede de escolarização doméstica atendia a um número de pessoas bem superior ao da rede pública: “Essas escolas, às vezes chamadas de particulares, outras vezes de domésticas, ao que tudo indica, superavam em número, até bem avançado o século XIX, aquelas cujos professores mantinham um vínculo direto com o Estado.”

Apesar da fragilidade e precariedade dos dados estatísticos, que, de forma muito precária, quase sempre se referem à instrução primária mantida pelo Estado, deixando de lado um significativo número de escolas sem nenhuma ligação com o mesmo, tais dados, bem como a crescente instituição de estruturas administrativas, dão-nos mostras de que em várias províncias do Império existiam significativas redes de escolas públicas, privadas ou domésticas. (FARIA FILHO, 2000, p. 138).

O autor acrescenta que “[...] a instituição escolar não surge no vazio deixado por outras instituições [...]” mas enfrentando outras formas tradicionais de educação que eram praticadas. (FARIA FILHO, 2000, p. 136).

Nesse sentido, constata-se — desde a Colônia, avançando por todo o século XIX — a importância da educação doméstica, pela quais crianças e jovens, filhos, parentes e agregados de famílias abastadas, como os cafeicultores do Vale do Paraíba fluminense recebiam educação nas suas próprias casas, com a contratação de mestres, professores particulares, preceptores ou até mesmo por parentes que habitavam na mesma casa.

Tais práticas podem-se afirmar com base em inúmeras fontes relativas ao período indicado, foram majoritárias na educação de crianças e jovens das elites durante a primeira metade do século XIX e permaneceram como uma forma reconhecida de educação até o limiar da República. Mesmo à medida que a escola se instituía e se afirmava em sua legitimidade, a educação doméstica continuava como um diferencial das classes mais favorecidas.

Os agentes da educação doméstica

Segundo Vasconcelos (2005), não havendo um estatuto formal e não podendo ser tratada como uma prática uniforme, a educação doméstica, como modalidade de educação, pode ser caracterizada conforme a atuação de seus agentes, levando em conta que suas práticas ora se mesclavam, ora se encontravam casos isolados que não se situam em nenhuma das formas descritas, ou até aproximam-se de todas.

Os professores particulares, também chamados de mestres particulares ou mestres que davam lições “por casas”, eram mestres específicos de primeiras letras, gramática, línguas, música, piano, artes e outros conhecimentos, que visitavam as casas ou fazendas sistematicamente, ministrando aulas a alunos membros da família, ou agregados, individualmente. Não habitavam nas casas, mas compareciam, para ministrar as aulas, em dias e horários pré-estabelecidos. Eram pagos pela família pelos cursos que ministravam.

Os preceptores eram mestres ou mestras que moravam na residência da família, às vezes, estrangeiros, contratados para a educação das crianças e jovens da casa (filhos, sobrinhos, irmãos menores). Os mestres preceptores caracterizavam-se pelo fato de viverem na mesma casa de seus alunos, constituindo-se, assim, dentro da realidade da educação doméstica, naqueles que parecem ter tido o maior custo para as famílias, sendo encontrados nas classes mais abastadas.

Havia, ainda, encarregados da educação doméstica, membros da própria família, mãe, pai, tios, tias, avós, ou até mesmo o padre capelão, que ministravam aulas no espaço da própria casa, não tendo custo algum e atendendo apenas às crianças daquela família ou parentela.

Apesar da nomenclatura e das circunstâncias diferenciadas de educação, todos eram tratados por “mestres”.

Homens e mulheres podem ser encontrados tanto como professores particulares como preceptores, entretanto, a preceptoria, por sua característica de moradia na casa dos alunos, era comumente exercida por mulheres, especialmente estrangeiras, que, por vezes, já vinham para o Brasil com a finalidade de exercer tais funções.

Nas Casas da aristocracia brasileira, a posição de mestres de meninos e meninas, durante a primeira metade do século XIX, gozava de uma relativa importância social, que se referia, na maioria das vezes, à condição da família em que atuavam e as habilidades que podiam ensinar.

Essa importância atribuída ao lugar de professores particulares ou de preceptores pode ser demonstrada, entre outros, pelo hábito observado em muitos anúncios dos jornais da época, especialmente até o final da década de 1860, nos quais os indivíduos que ofereciam seus préstimos, tanto homens como mulheres, indicavam o seu nome e a sua morada, tornando pública a sua ocupação.

A posição vantajosa ocupada pelos mestres das Casas, aumentava, assim como o seu reconhecimento e privilégios eram maiores, conforme a posição social e a fortuna que seus patrões possuíssem. Portanto, era contada como uma excelente referência do professor particular ou preceptor, a posição dos patrões para os quais já haviam trabalhado. Dessa forma, era um diferencial dentro das funções de mestres das Casas, trabalhar como professor particular ou preceptor em uma família nobre ou ainda ter educado filhos de personalidades destacadas no cenário político e econômico do Império.

As funções de professores particulares e preceptores também estavam submetidas a determinados critérios, sendo que nem todos os candidatos que se ofereciam, poderiam ser considerados aptos a educar os filhos das famílias abastadas. Nesse sentido, muitas vezes, eram solicitadas aos candidatos inúmeras referências pessoais, que iam desde a aparência física até a condição social em que se encontravam.

Empregando-se para “educar” meninas e meninos, dominando os diversificados conhecimentos exigidos para tal e ocupando um cargo ambicionado por estrangeiros que vinham para o Brasil, os professores particulares e os preceptores não poderiam ser desprovidos de um lugar representado como privilegiado nas estruturas sociais existentes. Entretanto, havia um limiar muito tênue entre o respeito e reconhecimento a sua posição social e à condição de empregados das elites, tratados como tal.

Nesse sentido, podem ser observadas preocupações por parte dos agentes da educação doméstica, principalmente as preceptoras, pois eram aquelas que mais ficavam submetidas à casa e aos patrões, levando-as a certificar-se do lugar que ocupariam e do tratamento que receberiam dos seus senhores.

À elite, a educação doméstica parece ter sido uma prática imprescindível, considerando-se, nesse período, um diferencial social, a educação passar pela casa. Dessa forma, mesmo aqueles cujos filhos freqüentavam algum colégio, ou aqueles que educavam, eles próprios, os filhos, em determinado momento, necessitavam dos serviços de professores particulares ou preceptores, seja para completar a educação recebida ou para a aprendizagem de alguma atividade específica.

Os agentes da educação doméstica também funcionavam como solução para aqueles que, por escolha ou por custos, tendo optado pelo colégio, não haviam conseguido dele os resultados esperados, vendo-se obrigados a recorrer aos serviços dos mestres das casas.

Tornando-se populares na Corte, ao longo do século XIX, os professores particulares, por vezes, eram bastante conhecidos, principalmente considerando-se que mesmo a cidade do Rio de Janeiro, durante o Oitocentos, tinha ares provinciais e conservava traços característicos dos vilarejos e aldeias do interior, com tipos caricatos, bem ilustrados na literatura, entre os quais, provavelmente, figurava o mestre ou professor.

O tempo na função de mestre das Casas parece ter sido, ainda, um atrativo que se constituía como uma distinção entre os sujeitos que atuavam na educação doméstica. Desse modo, a idade era um diferencial para a escolha dos pretendentes ao cargo de professores particulares ou preceptores das famílias, pois considerava-se que, quanto mais idosos, mais adequados os sujeitos a essa função. Cabe observar que a faixa etária a partir dos 30 anos, já era vista como de “meia-idade.” (ANÚNCIOS, 1869).

A partir do final da década de 1870, observa-se um princípio de concorrência explícita entre os anúncios de professores particulares e preceptores, provavelmente, causada pelo grande número existente de pessoas dedicadas à educação doméstica. Assim o preço dos serviços prestados de educação nas casas, passam a ser informados, como também os aspectos valorizados anteriormente.

Além das vantagens da educação doméstica ser praticada nas casas a um número reduzido de alunos, sem intermediações relativas ao pagamento, os serviços eram melhor remunerados se analisados na proporção das possibilidades de ganho, já que, na educação doméstica, os professores particulares, poderiam, por exemplo, ensinar em várias casas. Quanto aos preceptores, além de receberem um valor maior anual, podiam residir na casa de seus alunos, reduzindo as suas despesas pessoais.

Na educação doméstica, quanto mais diversificadas as matérias ensinadas pelo professor, maiores eram as chances de ser contratado pelas famílias, principalmente aquelas que utilizavam preceptores, bem como mais vantajosa a remuneração pelos serviços.

Em relação aos conhecimentos ensinados na educação doméstica, algumas vezes, eram encarregados diferentes professores particulares, atendendo aos desejos da família que os contratava, pois eram os pais que escolhiam, entre as matérias consideradas importantes, aquelas mais adequadas aos seus interesses, para que fossem ministradas aos seus filhos e, a partir daí, procediam à colocação de anúncios solicitando professores habilitados para tal, ou então, selecionavam, entre os anúncios existentes, aqueles que lhes pareciam mais apropriados a seus filhos, tratando da contratação dos mestres.

Assim, são oferecidos para a educação doméstica, além de “primeiras letras” e “instrução primária” —, caracterizadas como o ensino da escrita, leitura e contas —, ensinamentos de português e francês prioritariamente, seguidos de latim, inglês, alemão, italiano, espanhol, caligrafia, literatura, composição, religião, música, piano, solfejo, canto, rabeca, gramática portuguesa, latina, francesa e inglesa, lógica, matemática, geometria, aritmética, álgebra, contabilidade, escrituração mercantil, física, botânica, história universal, história do Brasil, geografia, desenho, pintura e aquarela.

Para as meninas, havia conhecimentos específicos a serem aprendidos como bordar, coser, marcar, cortar, dançar, trabalhos de agulha, caia a ouro, prata, matiz e escama de peixe, tricot, filot, flores, obras de fantasia, recortar estofos, veludos e outros trabalhos manuais, que eram oferecidos para serem ministrados por professores particulares e preceptores, juntamente com algumas das demais matérias citadas.

Espaços utilizados: a arquitetura da educação doméstica

No modelo de religiosidade que imperava no Brasil, atribuía-se um santo protetor a todos os ofícios, o que sugere que a análise dos padroeiros pode ser indicativa das atividades comumente exercidas nesse período.

Assim, encontramos em Villalta (1997, p. 358) referência a Sant’Ana como “[...] modelo inspirador das mães-mestras, particularmente comuns numa colônia em que escasseavam os professores de primeiras letras.”

Dessa forma, nas salas, onde ocorriam as lições, era comum que houvesse uma imagem de Sant’Ana, que, além do simbolismo da educação virtuosa dada a Maria, ainda demonstrava uma constante vigilância das atitudes de alunos e mestres.

Como a educação se dava na casa, principalmente em se tratando de fazendas distantes, as salas de lições, muitas vezes, possuíam a organização e decoração de um espaço físico doméstico para a leitura, ensinamentos e o armazenamento de livros e manuscritos.

Ao descrever as bibliotecas privadas, seus ambientes específicos e volumes armazenados, Villalta (1997) aponta a existência desses espaços, desde o Período Colonial, nas casas das elites econômicas e intelectuais, cujas salas de leitura e guarda de livros, possivelmente, eram também utilizadas para ensinamentos. Além de espaços de leitura e escrita, que vão tomando forma e mobília, algumas casas contavam com objetos para esse fim, como lupas, cavaletes, estantes, tinteiros, penas, papeleiros, escrivaninhas, com as paredes, por vezes, decoradas com mapas ou outros desenhos para estudos ou ilustração.

As casas possuíam ainda seus próprios instrumentos de castigos, que eram oferecidos ao professor ou preceptor, para quando sua utilização fosse necessária, ficando expostos nas salas onde se davam as lições, para depois serem guardados numa pequena dispensa junto aos aparelhos de tortura dos escravos, formando o arsenal com que a Casa impunha o seu poder aos seus habitantes. Entre esses eram bastante utilizados a “[...] ‘palmatória de pão’, a ‘palmatória de balêa’, o ‘azorrague’, as ‘corrêas’, as ‘cordas’, ‘a vara de marmeleiro’.” (VASCONCELOS, 2005, p. 87).

Os métodos de ensino

A educação doméstica, bem como a escola estatal emergente, utilizavam o método de ensino individual, que consistia no atendimento específico a cada aluno, mesmo quando o professor tinha vários alunos na classe.

O método individual foi, sem dúvida, o mais usado na educação de Oitocentos, e como não poderia deixar de ser, o mais adequado à educação doméstica. Nele cada aluno era atendido individualmente pelo professor, não só no que tange a conhecimentos ensinados, mas também na observação de seus progressos e recuos, bem como, na aplicação das “sabatinas” e “tomadas de lição ou ponto.” (VASCONCELOS, 2005, p. 91).

Em dezembro de 1855, o jornal A Semana publicava, em sua parte literária, uma exposição dos métodos de ensino mais conhecidos no Brasil para o Ensino Primário, fazendo uma análise da aplicação do método individual:

O método individual tem muitas vantagens preciosas. Por via dele o preceptor, ou professor contrai um íntimo conhecimento das disposições, do gênio, do caráter, das inclinações e da vocação do aluno; e por conseqüência acha-se habilitado para formar-lhe o coração, e dirigir-lhe a inteligência. Mas tem este método dois grandes inconvenientes. Carecia, que houvesse, como no Emilio de Rousseau um professor para cada discípulo; e este discípulo assim isolado, seria de um caráter insociável; e o seu saber seria como o ouro do usurário, que só aproveita à grosseira cobiça de quem o aferrolha. (METHODO MENEMONICO. LER, ESCREVER E CONTAR. EXPOSIÇÃO DE METHODOS, 1855, p. 4).

Faria Filho (2000) também descreve essa prática utilizada durante muito tempo, mesmo depois da instituição da escola formal:

Na verdade, era o método por excelência da instrução doméstica, aquela que ocorria em casa, onde a mãe ensinava aos filhos e às filhas, ou os irmãos que sabiam alguma coisa ensinavam àqueles que nada sabiam. O método individual caracterizava-se, pois, pelo fato de os alunos ficarem muito tempo sem o contato direto com o professor, fazendo com que a perda de tempo fosse grande e a indisciplina um problema sempre presente. Certa ocasião, um professor fez as contas e chegou à conclusão de que com uma jornada de 4 horas diárias de aula, mesmo [...] supondo uma multidão de circunstâncias favoráveis, que nunca jamais se podem encontrar, temos que, no sistema individual, cada aluno tem por dia 4 ½ minutos de lição de leitura, 3 de escrita e ½ de cálculo. (FARIA FILHO, 2000, p. 140).

No entanto, quando se trata de educação doméstica, podemos afirmar que não havia homogeneidade nos métodos de ensino, pois cada professor, cada preceptor tinha a sua escolha particular, o seu próprio método, o qual, por vezes, era criado pelo mesmo e anunciado para ser avaliado pelos pais.

Além da não uniformidade nos métodos utilizados, também, os compêndios e manuais utilizados eram de livre escolha dos mestres e das famílias, especialmente, porque durante muito tempo não havia compêndios brasileiros, pois “[...] são todos os compêndios em língua estrangeira [...]” (INSTRUÇÃO PÚBLICA, 1861, p. 2), o que fazia com que os alunos precisassem inicialmente dominar a língua em que liam, para depois compreender as lições e regras escritas.

Os estrangeiros também traziam de seus países de origem os métodos utilizados. Entretanto, algumas vezes, tais métodos não produziam o efeito desejado, especialmente pelas diferenças culturais existentes entre mestres e discípulos. É o que relata a preceptora Ina Von Binzer (1980), em uma de suas cartas:

Não consigo habituar-me a este ensino superficial; mas, quando começo a profundar-me ainda é pior: fico completamente desanimada. A respeito da disciplina então! Só essa palavra já me faz subir o sangue à cabeça. Imagine isto: outro dia, ao entrar na classe, achei-a muito irrequieta e barulhenta e na minha confusão recorri ao Bormann. Quando obtive silêncio para poder ser ouvida, ordenei: ‘Levantar, sentar’, cinco vezes seguidas, o que no nosso país nunca deixa de ser considerado vergonhoso para uma classe. Mas, aqui — oh! Santa Simplicitas! —, quando cheguei a fazer-lhes compreender o que delas esperava, as crianças estavam tão longe de imaginar que aquilo representasse um castigo, que julgaram tratar-se de uma boa brincadeira e pulavam perpendicularmente como um prumo, para cima e para baixo, feito autômatos, divertindo-se regiamente. Grete, desde então o Borman está definitivamente descartado, para mim, aqui no Brasil. Reconheço ser indispensável adotar-se uma pedagogia aqui, mas ela deve ser brasileira e não alemã, calcada sobre moldes brasileiros e adaptada ao caráter do povo e às condições de sua vida doméstica. As crianças brasileiras, em absoluto, não devem ser educadas por alemães; é trabalho perdido, pois o enxerto de planta estrangeira que se faz à juventude daqui não pegará. (BINZER, 1980, p. 87).

Independente do método utilizado, as lições dadas aos alunos seguiam um ritual que pode ser resumido da seguinte forma:

[o professor] indica ao menino as páginas de um livro para objeto da lição quer seja de gramática ou leitura, quer seja de aritmética ou catecismo. Os mais zelosos mestres interrogam os alunos no fim do tempo da aula, e usando da fórmula — adiante! adiante! adiante! nos casos de hesitação nas respostas chegam ao termo da argumentação ou sabatina ou interrogação ou que melhor nome tenha com a consciência tranqüila de haverem cumprido um dever regulamentar. (O ENSINO PRIMÁRIO, 1872, p. 34).

A educação nas casas, quando se tratava do ensino elementar, tinha como objetivos gerais ensinar “de cór” todas as regras de gramática, encaminhar a leitura de textos clássicos, conhecer as quatro espécies de operações de aritmética e ensinar todas as orações do catecismo.

Baseados no ensino pela memória, grande parte dos métodos utilizados no Brasil em Oitocentos tinha como subsídio principal a memorização do que estava sendo ensinado. Assim, durante até 8 horas por dia, as crianças e jovens fixavam os olhos sobre as páginas dos livros, realizavam inúmeros exercícios semelhantes, cópias, declamações, respondiam a sabatinas, argüições e eram corrigidos naqueles que eram considerados os “defeitos principais dos meninos”: “[...] distração, orgulho, sensualidade, preguiça, ambição, perversidade e egoísmo [...]”, assim como eram estimulados naquelas que eram consideradas as “principais qualidades a criar-se”: “[...] franqueza, ordem, pudor, atividade, civilidade, obediência e exatidão.” (PRELECÇÕES PEDAGOGICAS, 1887, p. 422 e 424).

Uma vez que eram os pais que decidiam mandar ensinar a seus filhos certos conhecimentos em detrimento de outros, baseados em preconceitos, em um gosto, ou, simplesmente, tendo como guia a “rotina”, também eles participavam na escolha dos métodos de ensino, considerando, na maioria das vezes, aqueles mais apreciados à época, ou simplesmente entregando ao mestre a decisão do que era melhor para o ensinamento de seus filhos.

Sujeitos a professores particulares e preceptores, essas crianças e jovens encontravam no contexto em que viviam fora das aulas ou lições um dia-a-dia repleto de adultos, de outras crianças, espaços e “muleques” filhos de escravos que não tendo que se submeter à educação, como era entendida e trabalhada, guardadas as devidas proporções, eram mais livres que os próprios pequenos senhores e juntos aprendiam, no cotidiano doméstico, aquilo que os mestres, mesmo das casas, desconsideravam: a infância.

A educação doméstica e a escola estatal

Com o fortalecimento do Estado Imperial e com as discussões cada vez mais acirradas acerca da importância da instrução escolar, uma das preocupações iniciais é a de construção de espaços específicos para a escola estatal, a fim de comprovar sua ação mais eficaz junto às crianças, para êxito daqueles que defendiam sua superioridade frente às demais formas de educação.

O processo de apropriação pelo Estado da instrução pública e a própria concepção dos aspectos que englobariam o projeto centralizador têm como primeira tarefa, então, o distanciamento da educação dos sujeitos das práticas exercidas até esse momento nas casas, sob a exclusiva escolha e vigilância dos familiares e voltadas para aprendizagens e compromissos bem mais restritos do que aqueles aos que o Estado aspirava.

Romper com esse monopólio e isolamento das famílias em relação à formação de seus filhos é uma tarefa que vai exigir do Estado Imperial fundamentação e demonstração de legitimidade na condução de tal pleito.

Inicialmente, é na afirmação da instrução pública como empreendimento hercúleo e unicamente capaz de colocar a nação em condição de igualdade aos países tomados como referência que o projeto do Estado ganha adeptos, por vezes, convictos de que o ideal da instrução pública se destinava, de fato, a uma perspectiva de progresso e de distribuição do conhecimento a toda a população.

Apesar de a idéia de instrução pública parecer carregada de tais pretensões, a realidade de sua implantação caminhava em sentido oposto, pois ao questionar e desestabilizar a educação dada na casa aos seus senhores, expondo suas dificuldades e obstáculos, a instrução pública se propunha, então, apenas a substituí-la.

Nesse sentido, era preciso conciliar a instrução pública e as aspirações das elites acerca do Estado como patrocinador do projeto educativo e, nessas pretensões, aspirava-se à manutenção de privilégios e de diferenciações entre aqueles que eram pensados como cidadãos participantes do projeto de nação e aqueles que não sendo pensados como cidadãos, provavelmente, também não eram pensados como usuários da instrução pública.

Para delimitar os espaços de educação doméstica e de instrução pública se fazia necessária, ainda, a diferenciação dos sistemas de ensino, começando pelo local de atuação. Se a educação doméstica realizada na casa acompanhava esse cotidiano, à instrução pública se propunha a construção de espaços específicos que, considerados neutros, estivessem mais adequados às perspectivas do Estado e marcassem, definitivamente, a diferença entre a educação privada realizada na casa e a instrução pública tutelada pelo Estado Imperial.

A ambição da construção de escolas caracterizadas como locais adequados à instrução pública vai, progressivamente, incorporando-se ao próprio conceito de educação e destituindo do lugar de instrução todos os outros espaços, entre eles as casas e os ambientes domésticos utilizados para educação de crianças e jovens que, não assemelhados à escola, confrontavam a sua legitimidade e a sua exclusividade como instituição de educação.

Dessa forma, a instrução pública passa a ser demonstrada como uma dimensão exclusiva das escolas, caracterizadas como instituições educativas do Estado ou subordinadas a ele em suas licenças, autorizações e certificações.

Todavia, a difusão de tais idéias não foi suficiente para a mobilização da população para essa perspectiva de educação e escolarização, principalmente, nas classes que já usufruíam a educação nas casas.

O Estado, diante da resistência à escolarização e, conseqüentemente, ao projeto de instrução pública propagado em suas idéias e em seus projetos, vê-se na impossibilidade de colocar em prática suas disposições e realizar seus intentos. Para reverter tais circunstâncias é encaminhada aquela que parecia ser a possibilidade cabível de convencimento da população, o estabelecimento da obrigatoriedade do ensino por intermédio do instrumento de que o Estado dispunha, a imposição da legislação.

Apesar de contar com o apoio de educadores — que viam em tais medidas legais um estímulo à freqüência dos espaços escolares — e de a conjuntura política ser favorável à implantação de idéias que parecessem progressistas e voltadas para o atendimento das populações até então desassistidas, a obrigatoriedade do ensino, articulada à instrução pública, demonstrava uma interferência sem precedentes do Estado na educação, iniciando aquele que seria, mais tarde, o resultado do processo de estatização dos sistemas educacionais: a escolarização obrigatória.

Contudo, a afirmação da escolarização estatal gratuita e obrigatória se constituiu em um processo lento que suscitou avanços e recuos que perpassaram a própria história das instituições educativas no País.

Nas casas, muitos entendiam estar na sua vontade dar ou não instrução aos filhos, especialmente, quando a idéia de instrução pública estava identificada com a freqüência a uma escola estatal. A escola estatal não era vista como um lugar apropriado, seja por suas instalações deficientes seja pela diversidade de crianças e jovens que a freqüentavam ou, ainda, pelo temor dos efeitos à moralidade que poderia ocasionar tal reunião de meninos e, principalmente, de meninas.

O Estado se posicionava diante das críticas a seus projetos de unificação dos espaços de educação e de propagação de uma concepção de educação acessível a “todos” tutelada por ele, afirmando que a instrução e a educação dos filhos não constituíam um “direito do pátrio poder”, cujo exercício dependeria da vontade do pai, mas se caracterizaria como um ônus e um dever, cujo cumprimento cabia ao Estado exigir, como “[...] a primeira condição de progresso e da ordem social.” (ENSINO OBRIGATÓRIO, 1873, p. 171-172).

Além disso, o Estado, por meio de seus agentes, declarava “repugnante” e contraditório à natureza da família, às leis do progresso e à ordem social, esse pretendido direito de privar os filhos do desenvolvimento intelectual que, posto em prática, tornaria a família uma instituição bárbara e a distinguiria de seu verdadeiro papel de “base das sociedades cristãs” e “princípio de toda a civilização”.

Segundo os articulistas do Estado, a obrigação de instruir e educar os filhos tinha sanção legal nos Códigos Civis de todas as nações civilizadas e somente o Estado, pelo processo de escolarização, o qual se propunha a desenvolver, poderia exigir o cumprimento dessa obrigação, admitindo, porém, a possibilidade da educação privada sob as normas estatais, quando assim fosse o desejo dos pais, mas exigindo a instrução pública para todos os outros que não dispusessem de tais meios.

Na tentativa de seduzir adeptos a suas idéias, o Estado expunha ainda os aspectos econômicos de seu empreendimento educacional, demonstrando como a criação de um sistema público de ensino seria o mais fecundo em proveitosos resultados e o mais econômico, uma vez que reuniria para “dar educação em comum aos meninos e jovens pobres e aos meninos e jovens ricos.”

Tais argumentos, entretanto, desconsideravam aquele que se caracterizava como um dos maiores obstáculos ao projeto estatal: uma escola que reuniria classes sociais diferentes, perspectivas de cidadania distintas e formações que se pretendiam diferenciadas.

A escola estatal, porém, em sua constituição definitiva, estabelece-se, inicialmente, com ideais de socialização e difusão da educação pública para, posteriormente, em suas ações efetivas, adaptar-se às intenções e às expectativas das classes que podiam freqüentá-la.

No entanto, à medida que a escola estatal vai afirmando seu papel, as outras formas de educação não tuteladas pelo Estado, como a educação doméstica, vão sendo questionadas em sua legitimidade, limitando-se, no primeiro momento dessa fase de transição, à esfera da educação primária e, posteriormente, rendendo-se à educação estatal. Nesse percurso, bastante conflituoso, a educação doméstica não perece sem oferecer resistência, principalmente, à intervenção do Estado nos espaços de formação, mas, ao contrário, permanece ainda por muito tempo concomitante ao ensino oficial, como diferencial de posição social e expectativas educacionais.

Considerações finais

A educação doméstica foi durante muito tempo considerada pela historiografia da educação como uma prática de menor importância, baseando-se na hipótese de que se restringia a uma camada específica da população e que sua amplitude teria alcançado apenas alguns períodos e locais, onde a escola ainda não havia se afirmado. No entanto, pesquisas acerca do cotidiano sociocultural, principalmente do século XIX, demonstram que as lacunas de ensinamentos deixadas pela falta de escolarização da população, eram preenchidas pela educação doméstica, não só na aristocracia, mas nas camadas sociais emergentes que se inspiravam nos hábitos das classes mais favorecidas e aspiravam a dar a educação considerada apropriada, na época, aos seus filhos.

Nessa perspectiva, muitos foram aqueles que, durante o Oitocentos, tiveram educação nas casas, talvez até em maior número do que os que freqüentaram instituições escolares.

Mesmo quando a escola estatal emergente passa a ser uma demanda reconhecida pela população, pode-se afirmar que ela se destinava a um grupo social diferente daquele que já recebia educação. No entanto, é inegável que, sob a chancela do Estado, ela altera sensivelmente as formas de educação instituídas, como a educação doméstica, que se fragiliza pela impossibilidade de evoluir e por métodos e posturas constantemente criticados tanto por aqueles que dela usufruíam, como por aqueles que viam na intervenção estatal uma forma de integrar a nação e implantar critérios uniformes de se fazer ensino e educação.


Referências

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BINZER, Ina Von. Os meus romanos: alegrias e tristezas de uma educadora no Brasil. Tradução de Alice Rossi e Luisita da Gama Cerqueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.

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FARIA FILHO, Luciano Mendes. Instrução elementar no século XIX. In: LOPES, Eliane Marta Teixeira; FARIA FILHO, Luciano Mendes; VEIGA, Cynthia Greive. (Org.). 500 anos de educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

INSTRUCÇÃO PÚBLICA. Àlbum litterario, periódico instructivo e recreativo, Rio de Janeiro, 15 mar. 1861, v. 2, n. 16, p. 2.

METHODO MENEMONICO. LER, ESCREVER E CONTAR. EXPOSIÇÃO DE METHODOS. A Semana, Jornal Litterario Scientifico e Noticioso, Rio de Janeiro, 08 dez. 1855, v.1, n.1, p. 4.

O ENSINO PRIMÁRIO. Jornal A Instrucção Publica, Rio de Janeiro, 12 maio 1872, v. 1, n. 5, p. 34.

PRELECÇÕES PEDAGOGICAS. Jornal A Instrucção Publica, Rio de Janeiro, v. 5. n. 48, p. 422-424, 1887.

VASCONCELOS, Maria Celi Chaves. A casa e os seus mestres. A educação no Brasil de Oitocentos. Rio de Janeiro: Gryphus, 2005.

VILLALTA. Luiz Carlos. O que se fala e o que se lê: língua, instrução e leitura. In: SOUZA, Laura de Mello e Souza. (Org.) História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.


Profa. Dra. Maria Celi Chaves Vasconcelos
Faculdade de Educação
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Programa de Mestrado da Faculdade de Educação da Universidade
Católica de Petrópolis
Pesquisadora nas áreas de Políticas Públicas e História da Educação

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O presente artigo foi publicado na Revista Educação em Questão, Natal, v. 28, n. 14, p. 24-41, jan./jun. 2007 e se encontra disponível aqui: artigo.

A dissertação citada está disponível nesse LINK.


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