Postagem em destaque

COMECE POR AQUI: Conheça o Blog Summa Mathematicae

Primeiramente quero agradecer bastante todo o apoio e todos que acessaram ao Summa Mathematicae . Já são mais de 100 textos divulgados por a...

Mais vistadas

Como analisar um livro de Matemática do Ensino Médio


RECEBA NOSSAS ATUALIZAÇÕES

DIGITE SEU EMAIL:

Verifique sua inscrição no email recebido.


Tempo de leitura: 16 minutos. 

Apresentamos o texto da Apresentação e da Introdução do livro Exame de Textos: Análise de Livros Didáticos de Matemática Para o Ensino Médio, dos seguintes autores:

Elon Lages Lima (editor)

Analistas:

Augusto César Morgado 
Edson Durão Júdice
Eduardo Wagner
Elon Lages Lima
João Bosco Pitombeira de Carvalho 
José Paulo Quinhões Carneiro 
Maria Laura Magalhães Gomes 
Paulo Cezar Pinto Carvalho

e publicado em 2001 por

VITAE - Apoio à Cultura, Educação e Promoção Social 
IMPA Instituto de Matemática Pura e Aplicada 
SBM Sociedade Brasileira de Matemática.


Apresentação

Este trabalho contém análises de 36 volumes, que compõem 12 coleções de livros didáticos de Matemática, utilizados nos três anos do Ensino Médio das escolas brasileiras.

Ao publicá-lo, moveu-nos o propósito de contribuir para a melhoria da qualidade dos nossos livros-texto, complementando a ação do MEC, que tem avaliado os livros da primeira à oitava série. Devemos esclarecer, entretanto, que há pelo menos duas diferenças fundamentais entre nossa iniciativa e a do MEC. A primeira é que não nos propomos a fazer avaliações; nem sequer temos mandato para isso. A segunda é que nossas análises têm um cunho de orientação, oferecendo (junto com a crítica) sugestões e propostas, numa linha de pensamento objetivo, com base nos princípios estabelecidos na Introdução que dá início a este livro. Depois de apresentadas as 36 análises, o Posfácio resume ao final a impressão que nos deixou essa longa leitura de mais de 15 mil páginas.

Para cumprir esta tarefa, contei com a competente e dedicada colaboração de um seleto grupo de colegas aos quais tive o privilégio de me associar e tenho agora a satisfação de agradecer publicamente. Muito obrigado, pois, a Augusto César Morgado, Edson Durão Júdice, Eduardo Wagner, João Bosco Pitombeira de Carvalho, José Paulo Quinhões Carneiro, Maria Laura Magalhães Gomes e Paulo Cezar Pinto Carvalho.

Cada coleção foi analisada por dois de nós. No índice, após a referência a cada obra escrutinizada, seguem-se os nomes dos respectivos analistas.

A execução deste projeto só foi possível graças ao honroso patrocínio de VITAE, uma organização privada à qual a Educação em nosso país muito deve. Como sempre, contamos com o apoio do IMPA, que vê corretamente o ensino básico como uma etapa indispensável para a pesquisa, e da SBM, cujo suporte nosso trabalho tem sido constante todos esses anos.

Rio de Janeiro, fevereiro de 2001
Elon Lages Lima


Introdução

Fundamentos para a análise dos livros-texto de Matemática para o Ensino Médio

Análise dos livros-texto para o ensino da Matemática na Escola Média deve levar em conta, acima de tudo, sua adequação às três componentes básicas desse ensino, a saber: Conceituação, Manipulação e Aplicação. Em seguida, deve-se indagar se o livro examinado é organizado de modo a permitir ao seu leitor (professor ou aluno) o acesso aos, a familiarização com, e — posteriormente — a utilização efetiva dos conhecimentos adquiridos.

A Conceituação compreende a formulação de definições, o enunciado de proposições, o estabelecimento de conexões entre os diversos conceitos, bem como a interpretação e a reformulação dos mesmos sob diferentes aspectos. É importante destacar que a conceituação precisa é indispensável para o êxito das aplicações.

A Manipulação, de caráter essencialmente (mas não exclusivamente) algébrico, está para o ensino e o aprendizado da Matemática assim como a prática dos exercícios e escalas musicais está para a Música. A habilidade no manuseio de equações, fórmulas, operações e construções geométricas elementares, o desenvolvimento de atitudes mentais automáticas, verdadeiros reflexos condicionados, permitem ao usuário da Matemática concentrar sua atenção consciente nos pontos realmente cruciais, sem perder tempo e energia com detalhes.

A Aplicação é o emprego de noções e teorias da Matemática em situações que vão de problemas triviais do dia-a-dia a questões mais sutis provenientes de outras áreas, quer científicas quer tecnológicas. Ela é a principal razão pela qual o ensino da Matemática é tão difundido e tão necessário.

Ainda no  âmbito dessas considerações gerais, o crítico deve ter em mente que o livro didático é, na maioria dos casos, a única fonte de referência com que conta o professor para organizar suas aulas, e até mesmo para firmar seus conhecimentos e dosar a apresentação que fará em classe. Assim, é necessário que esse livro seja não apenas acessível e atraente para o aluno, como também que ele constitua uma base amiga e confiável para o professor, induzindo-o a praticar os bons hábitos de clareza, objetividade e precisão, além de ilustrar, sempre que possível, as relações entre a Matemática e a sociedade atual.

Conceituação

No exame do livro didático sob o aspecto da Conceituação, os seguintes itens devem ser apreciados:

1. Erros. Este é um quesito de natureza ampla, que abrange, entre outros, os tipos abaixo.

(a) Erros provenientes de desatenção, como erros de cálculo e de impressão. Estes são corrigíveis pelo professor cuidadoso mas são muito desagradáveis para o aluno, que fica perplexo, principalmente quando os encontra nas respostas dos exercícios.

(b) Erros de raciocínio, como confundir uma proposição com sua recíproca, tirar conclusões forçadas (exemplo: afirmar que um fato geral é conseqüência de um caso particular), dividir por algo que pode ser zero, etc.

(c) Erros de definição. Uma definição pode ser incorreta por vários motivos. Ela pode estar em flagrante desacordo com a prática universal (exemplo: “chama-se intervalo a todo conjunto de números reais”), pode conduzir a contradições (exemplo: admitir uma reta como paralela a si própria e, noutro local, dizer que um sistema linear com duas incógnitas é impossível quando as retas que representam as equações são paralelas), pode ser incompleta, deixando de lado casos importantes que deveriam ser incluídos nela, pode ser excessivamente abrangente, etc.

(d) Erros resultantes de conceitos mal formulados e vagos, que dão lugar a ambigüidades, das quais resultam conclusões absurdas, como “no sistema $S$, de $3$ equações com $3$ incógnitas, $x$ e $y$ são indeterminados mas $z$ é impossível”.

2. Excesso de formalismo. Isto ocorre, por exemplo, na definição de função como conjunto de pares ordenados, na desnecessária definição de equação e, de um modo geral, nos capítulos que se referem a conjuntos.

3. Linguagem inadequada. Erros gramaticais, como “o objeto $A$ satisfaz a propriedade $P$”, “grau de uma função”, “raiz de uma função”, “variável” em vez de “incógnita”, “interceptar” em vez de “intersectar”, etc.

4. Imprecisão. Principalmente nas definições. O radiano, por exemplo, raramente é definido corretamente. O comprimento de um arco também. Até mesmo seno e cosseno têm definições vagas. O importante conceito de número real, que deve ser apresentado como o resultado de uma medida, é sempre deixado indefinido.

5. Obscuridade. Aqui a Conceituação e a Didática devem juntar-se para que se dê atenção a trechos ambíguos, ininteligíveis ou contraditórios.

6. Confusão de conceitos. Principalmente nos argumentos demonstrativos.

7. Ainda se pode incluir no item “Conceituação” o importante aspecto do livro didático que diz respeito à sua objetividade, que consiste em não dar relevância a pontos triviais e, ao mesmo tempo, destacar os tópicos, os conceitos e as proposições de importância crucial. Exemplos de desatenção a este princípio são abundantes e refletem uma deficiência realmente danosa, a saber, a ignorância do autor sobre as utilizações posteriores do que está apresentando. Esta deficiência é claramente notada no longo e dispersivo tratamento dado à Trigonometria, com exagero de fórmulas sem importância, impedindo o aluno, e o próprio professor, de distinguir o essencial do supérfluo. Esta grave falta ocorre ainda em vários outros tópicos, como PA, PG, Geometria Analítica, etc.

8. Conexões. Os vários assuntos expostos no livro (ou na coleção) devem ser relacionados uns com os outros, sempre que possível. Exemplos: PA com função afim, PG com função exponencial, função linear e função quadrática com áreas e volumes. A maioria dos livros fala em função inversa no vol. 1 e não menciona que exp e log são inversas; muito menos explora este fato. Sistemas lineares não são vistos sob o ponto de vista geométrico, etc. A conexão entre Trigonometria e Números Complexos tem sido pouco explorada. O mesmo ocorre entre Números Complexos e Geometria Plana.

Manipulação

Este aspecto é tão predominante nos livros didáticos brasileiros que praticamente o público em geral (mesmo os professores e alunos também) considera a Matemática como se resumindo a ele.

A manipulação deve estar presente, principalmente, nos exercícios mas precisa também ocorrer no texto, neste caso (sempre que possível) acompanhada de observações visando ajudar o leitor a ganhar eficiência, evitar erros, refletindo a experiência do autor que oferecerá sugestões para que a prática seja proveitosa.

É bem conhecido o abuso de manipulações desnecessariamente complicadas e inúteis, como por exemplo, os famosos “carroções” e mesmo as expressões (e equações) trigonométricas.

Exercícios de manipulação devem ser comedidos, simples, elegantes e, sempre que possível, úteis para emprego posterior.

Aplicações

Aqui reside a principal deficiência dos livros didáticos brasileiros de Matemática. Um teste revelador sobre a qualidade do livro a este respeito é o seguinte: quais são os exercícios e exemplos nele contidos, onde o objeto principal não é o assunto que acaba de ser estudado? Exemplos: exercícios sobre logaritmos onde a palavra “logaritmo” não ocorra no enunciado; problemas que se resolvam com trigonometria mas que não falem em seno, cosseno, etc.

Qualidades didáticas

As qualidades didáticas de um livro são as características nele contidas que ajudam o leitor a entender mais facilmente as noções ali apresentadas, aprendendo como utilizá-las e, principalmente, motivando-o a prosseguir na leitura, atraído pelo estilo do autor, pela elegância e simplicidade dos seus argumentos e pelos desafios que propõe.

A este respeito, uma importante qualidade que o livro deve possuir é que cada novo conceito apresentado seja precedido de situações-problema que justifiquem sua introdução e acompanhado de vários exemplos que visem não somente exibir suas aplicações como também esclarecer o significado desse conceito e familiarizar o leitor com seu uso. As aplicações podem variar do emprego na vida real até as conexões com outros tópicos matemáticos. Por exemplo, o estudo da função quadrática pode ser ilustrado com aplicações físicas ou por meio de problemas geométricos.

Deve ainda ser incluída entre as boas qualidades didáticas do livro a transmissão que seu(s) autor(es) faça(m) de sua experiência para o leitor, ajudando-o a não cometer erros e a corrigi-los caso os cometa. Por exemplo, sempre que cabível, nos exemplos e exercícios resolvidos no texto, deve ser feita uma estimativa preliminar da ordem de grandeza do resultado. O livro deve ainda incentivar o uso do bom-senso, para que erros sejam detectados por conduzirem a resultados absurdos. Isto, naturalmente, levará os autores a fazerem com que os dados e respostas dos problemas sejam realísticos.

Adequação do livro à realidade atual

O livro deve ajudar a preparação do aluno para tarefas relevantes na sociedade de hoje. Para isso, ele deve libertar-se de tópicos e métodos ultrapassados, substituindo-os por outros que correspondam aos dias de hoje.

Um habito arraigado nos textos tradicionais, fortemente impregnado na mente dos professores (e conseqüentemente dos alunos) é o mito das fórmulas e regras: fórmula das raízes de uma equação do segundo grau, regra de Cramer, fórmulas trigonométricas, regra de extração da raiz quadrada, etc. É necessário conscientizar-se da superioridade dos algoritmos sobre as fórmulas e regras, dos métodos iterativos de aproximação sobre as expressões fechadas e pouco utilizáveis.

Outro exemplo de obsolescência são as tabuas de logaritmos, que foram banidas pela calculadora mas ainda sobrevivem em diversos livros didáticos.

De um modo geral, o uso de calculadoras deve ser estimulado, como meio de evitar o desperdício de tempo com cálculos longos, laboriosos e inúteis (mas nunca como substituto para a tabuada).

Ainda dentro deste item se enquadra a escolha dos assuntos tratados pelo livro, que deve conter material que, além de atraente e ilustrativo, seja relevante por seu conteúdo básico e por suas aplicações, tanto a outras áreas da Matemática como a outras Ciências e à vida de hoje. Naturalmente esta seleção, para ser bem feita, requer do autor uma visão ampla, consultas a especialistas diversos e uma pesquisa cuidadosa em fontes variadas.

Papel educativo da avaliação

Cada relatório concernente à análise de uma coleção deverá trazer (além dos destaques dos pontos positivos e das críticas às suas deficiências) sugestões no sentido de corrigir as falhas, dando assim oportunidade a que os autores e editores de boa-vontade possam, em edições posteriores, reformular os textos, adaptando-os aos objetivos do Ensino Médio, conforme definidos na Lei de Diretrizes e Bases.


Livros analisados

Antônio dos Santos Machado - Matemática na Escola do Segundo Grau. Editora Saraiva.

(Analisado por Elon Lages Lima e Eduardo Wagner)


Benigno Barreto Filho e Cláudio Xavier da Silva - Matemática, Aula por Aula. Editora FTD.

(Analisado por Elon Lages Lima e Eduardo Wagner)


Edwaldo Bianchini e Herval Paccola - Matemática. Editora Moderna

(Analisado por Analisado por Paulo Cezar P. Carvalho e João Bosco Pitombeira de Carvalho)


Gelson Iezzi, Osvaldo Dolce, José Carlos Teixeira, Nilson José Machado, Márcio Cintra Goulart, Luiz Roberto da Silveira Castro e Antônio dos Santos Machado - Matemática. Editora Saraiva

(Analisado por Eduardo Wagner e Augusto César Morgado)


Nelson Gentil, Carlos Alberto Marcondes dos Santos, Antonio Carlos Greco, Antônio Bellotto Filho e Sérgio Emílio Greco - Coleção Matemática para o Segundo Grau. Editora Ática

(Analisado por Paulo Cezar P. Carvalho e João Bosco Pitombeira de Carvalho)


José Ruy Giovanni e José Roberto Bonjorno - Coleção Matemática. Editora FTD

(Analisado por José Paulo Q. Carneiro e Augusto César Morgado)


Katia Cristina Stocco Smole e Rokusaburo Kiyukawa - Matemática. Editora Saraiva

(Analisado por Eduardo Wagner e Augusto César Morgado)


Luiz Roberto Dante - Matemática: Contexto e Aplicações. Editora Ática

(Analisado por Elon Lages Lima e Eduardo Wagner)


Manoel Rodrigues Paiva - Coleção Matemática. Editora Moderna

(Analisado por Paulo Cezar P. Carvalho e João Bosco Pitombeira de Carvalho)


Márcio Cintra Goulart - A Matemática no Ensino Médio. Editora Scipione

(Analisado por Elon Lages Lima e Eduardo Wagner)


Maria Helena Soares de Souza e Walter Spinelli - Matemática. Editora Scipione

(Analisado por Paulo Cezar P. Carvalho e João Bosco Pitombeira de Carvalho)


Paulo Bucchi - Curso Prático de Matemática. Editora Moderna

(Analisado por Edson Durão Júdice e Maria Laura Magalhães Gomes)

***

Leia mais em A dura tarefa de escrever livros de Matemática

Leia mais em Os três componentes da Matemática



Curta nossa página no Facebook Summa Mathematicae

Nossa página no Instagram @summamathematicae e YouTube.



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Total de visualizações de página