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Paulo Freire, patrono ou ídolo de barro?

O impacto negativo de uma “pedagogia” construída sobre princípios errôneos.

Embora possa parecer o contrário, dada a forma prolixa e uma série de neologismos e a apropriação de termos do contexto católico [1], Paulo Freire, o atual patrono da educação brasileira [2], destoa e contradiz a concepção católica da educação. E como a concepção católica da educação fundamenta-se na filosofia perene, o dito patrono distancia-se e nega a própria tradição pedagógica e as verdades acerca da educação.

E, como a árvore se conhece pelos frutos que dá, é no ambiente escolar que se perceberá todo impacto negativo de uma “pedagogia” construída sobre princípios errôneos e por vezes contraditórios entre si [3]. O presente artigo visa, portanto, expor alguns dos principais erros em matéria pedagógica por negar os princípios perenes da educação, depois de que, algumas amargas consequências práticas da assunção destes erros na prática escolar sem uma maior reflexão, mas influenciado pelo misticismo que se construiu em torno ao seu inventor.

Para a educação católica, o fim último da educação é levar o homem a Deus e enobrecer este mesmo ser humano pelo que lhe é próprio: a alma racional e imortal [4]; Paulo Freire rebaixa o fim da educação à formação política do homem [5] – acepção essa bem diversa do zoon politikon de Aristóteles – de modo que a pedagogia freiriana visa a militância mais que o intelecto, tratando-se portanto de uma pedagogia materialista.

Para a educação católica, a busca da sabedoria é o mais alto ideal e para alcançá-la são necessários fundamentos vigorosos como o trabalho intelectual e a vida virtuosa [6]; para Paulo Freire a crítica vem antes do fundamento e a politização do educando antes da sabedoria [7].

Para a educação católica, a Religião ocupa lugar de destaque como possibilidade de síntese e sentido para o conhecimento e a elevação do mesmo; Paulo Freire, apesar de fazer uso de termos tirados do contexto católico, todavia, por apoiar-se em princípios materialistas, ignora ou mesmo nega o ensino religioso defendido e praticado pela educação católica – na esteira de seus inspiradores que dizem que a religião é alienante [8]. Paulo Freire inclusive mostra afinidades com regimes políticos condenados pela Igreja por tratar-se de regimes ateístas e que grande mal fizeram à humanidade [9].

Para a educação católica, o professor é a causa auxiliar da educação e o aluno a causa principal, de modo que o aluno é o principal responsável pelo próprio aprendizado, sem todavia negar ou diminuir o papel do professor e o seu saber maior que o do aluno a fim de auxiliá-lo com conteúdos e no próprio processo de aprendizagem [10]; a pedagogia freiriana reduz, quando não, nega o papel indispensável do professor e com isso dos conteúdos, da escola e da autoridade [11], visão oriunda da ideologia revolucionária e igualitarista a que conduz os sistemas nos quais se fundamenta.

Para a educação católica, conforme a ordem natural, a família tem a primazia inviolável, mas não despótica, na educação da prole e seu papel é indispensável, sendo ajudada pela Igreja e subsidiada pelo Estado [12]; Paulo Freire suprime a primazia da família em relação a educação da prole e a transfere para a ideologia do partido que assume as faces do Estado [13].

Algumas consequências práticas:

Analfabetismo funcional agravado

Alfabetização é o primeiro passo e o mais fundamental para o domínio da linguagem, portanto deve ser muito bem realizada a fim de deixar calçados os outros estágios. Paulo Freire nega o conceito tradicional de alfabetização, o qual afirma não passar de “ato mecânico de ‘depositar’ palavras, sílabas e letras nos alfabetizandos” ou ainda de “mera transfusão alienante” que em nada contribui para a “transformação revolucionária da sociedade de classes, em que a humanização é inviável” [14]. “A alfabetização, que era feita em poucos meses no primeiro ano do ensino fundamental, hoje não se completa em três anos. E 63% da população é analfabeta funcional” [15].

Rebaixamento do nível intelectual, moral e cultural

Ao prescindir da aquisição da humanidade no decorrer da história, desconsiderando conquistas e conteúdos, em favor de uma crítica carente de fundamentos, evidentemente a consequência é a queda do nível intelectual, moral e cultural, pois o que passa a contar é o que cada um traz consigo independentemente se certo ou errado, se tenha ou não princípios ou não que condigam com tal assertiva. Tudo passa a valer. De modo que a herança das gerações passadas não passa de domínio das elites. Uma prova cabal de tal rebaixamento a nível intelectual se nota a posição do Brasil no ranking do PISA: no fundo do poço. Mesmo o investimento em educação, em relação ao PIB, ultrapassando o de nações como os EUA, este 5,4%, o Brasil 7% [16].

Degradação do ambiente escolar

Tirada a finalidade real da educação e a definição correta de autoridade todo edifício tende a ruir-se – e, de fato, este é o objetivo revolucionário “o movimento real que suprime o estado de coisas atual”. Deixo aos interessados, como constatação, uma obra que descobri nos cantos da prateleira de uma livraria e que diz muito da degradação do ambiente escolar: “Indisciplina e impunidade na escola. Porque professores estão adoecendo e alunos não estão aprendendo” [17]. O tema por si só já é bastante sintomático.

Um ligeiro confronto com a concepção da educação conforme a filosofia católica, e por isso, perene, é suficiente para que o ídolo se despedace, tanto mais quando se olha para as consequências de uma tal “idolatria”. O ídolo esculpido não resiste a verdade, se quebra. Tomo por bem, concluir a reflexão com as palavras de Thomas GIULLIANO, organizador da obra Descontruindo Paulo Freire, na qual se baseou a presente reflexão: “Patrono é sinônimo de: padroeiro, protetor, defensor. No nosso caso, não encontramos em nosso modelo escolhido qualquer uma dessas virtudes. Temos o símbolo politicamente esculpido, porém, intimamente oco” (p. 49).


Referências

[1] GIULLIANO, T. Desconstruindo Paulo Freire. Porto Alegre: História Expressa, 2017. p. 181-182.

[2] Lei n. 12.612 de 13 de abril de 2012, sancionada por Dilma Rousseff.

[3] GIULLIANO. op. cit. p. 124ss.

[4] SIQUEIRA, A. A. Filosofia da Educação. Rio de Janeiro: Vozes, 1948. p. 127ss.

[5] “...Paulo Freire não tem apenas preocupações pedagógicas, mas é também movido por intenções políticas. Aliás, um repórter do Jornal da República do Recife, aos 31/08/79, interrogou Paulo Freire, de passagem pelo Brasil, a respeito de eventual filiação a partido político; ao que respondeu o mestre: “Faço política através da pedagogia” (GIULLIANO. p. 163). “A conscientização, associada ou não ao processo de alfabetização, (...) não pode ser blá-blá-blá alienante, mas um esforço crítico de desvelamento da realidade, que envolve necessariamente um engajamento político” (FREIRE, P. Ação cultural: para a liberdade e outros escritos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014. p. 109).

[6] REDDEN, J. D.; RYAN F. A. Filosofia da Educação. Rio de Janeiro: Agir, 1973. p. 15.

[7] “...neste sistema nós não fazemos discurso, não fazemos aula, porque inclusive o que nós estamos conseguindo é uma espécie de subversões legítimas. (...) superamos o programa acadêmico por situações sociológicas desafiadoras que nós pomos diante dos grupos com quem nós provocamos e arrancamos uma sabedoria que existe e que é esta sabedoria opinativa e existencial do povo” (Discurso do professor Paulo Freire, em Angicos, ao encerramento do curso de alfabetização de adultos, p. 5-6. apud. GIULLIANO. op. cit. p. 205).

[8] GIULLIANO. op. cit. p. 196ss.

[9] GIULLIANO. op. cit. p. 184-190.

[10] SIQUEIRA. op. cit. p. 175ss.

[11] “Assim, em lugar da escola, que nos parece um conceito, entre nós demasiado carregado de passividade, em face de nossa própria formação (mesmo quando se lhe dá o atributo de ativa), contradizendo a dinâmica fase de transição, lançamos o Círculo de Cultura. Em lugar do professor, com tradições fortemente “doadoras”, o Coordenador de debates. Em lugar da aula discursiva, o diálogo. Em lugar de aluno, com tradições passivas, o participante de grupo. Em lugar de “pontos” e de programas alienados, “programação compacta”, “reduzida” e “codificada” em unidades de aprendizado” (FREIRE, P. A Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015. p. 102-103).

[12] PIO XI. Divini Illius Magistri. Roma, 1929.

[13] Diz ele: “As relações pais-filhos, nos lares, refletem, de modo geral, as condições objetivo-culturais da totalidade de que participam. E, se estas são condições autoritárias, rígidas, dominadoras, penetram os lares, que incrementam o clima da opressão” (Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014. p. 208). “Características da consciência ingênua: 2 – Há também uma tendência a considerar que o passado foi melhor. Por exemplo: os pais que se queixam da conduta de seus filhos, comparando-a ao que faziam quando jovens” (FREIRE, P. Educação e mudança. 36ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014. p. 52). “Não podem nem devem omitir-se, mas precisam saber assumir que o futuro é de seus filhos e não seu. É preferível, para mim, reforçar o direito que tem à liberdade de decidir, mesmo correndo o risco de não acertar, a seguir a decisão dos pais. É decidindo que se aprende a decidir... a posição da mãe ou do pai (...) assessor ou assessora do filho ou da filha (...) jamais tenta impor sua vontade ou se abespinha porque seu ponto de vista não foi aceito” (FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015. p. 103).

[14] ARAÚJO, P. H. A. Pedagogia católica e pedagogia da barbárie. Revista Catolicismo, Ano LXIX, nº 823, p. 44-45, julho, 2019. [Disponível no link: https://www.ipco.org.br/pedagogia-catolica-e-pedagogia-da-barbarie]

[15] GIULLIANO. op. cit. p. 192. Disse ele mesmo a respeito do próprio método: “Eu fiz, no Recife, no Movimento de Cultura Popular, que relato no livro ‘Educação como prática da liberdade’, uma experiência que durou de dois a três meses, se não me falha a memória. Eram cinco pessoas, das quais duas desistiram. As três que ficaram, depois de três meses, liam. Aliás, um dia eu levei uma aluna minha da faculdade pra ver isso e ela não acreditou. Pegou, ela mesma, um livro de Machado de Assis, da biblioteca do lugar onde se fazia a experiência. Deu ao homem e ele leu. Se você perguntar se foi possível discutir com ele a página que ele leu de Machado de Assis, eu acho que não discutimos, e se discutíssemos, possivelmente, ele não teria feito uma penetração mais profunda no texto, pois, para uma experiência de dois a três meses, o sujeito fazer isso é extraordinário” (PELANDRÉ, N. Efeitos a longo prazo do método de alfabetização Paulo Freire. UFSC, 1998. p. 304-305. apud. GIULLIANO. op. cit. p. 211).

[16] Há um excelente artigo de BRUGGEMANN Marcelo V. a este respeito na Revista Cidade Educadora, ano II, nº 18, p. 13-15, março, 2019. [Disponível no link: https://cidadeeducadora.net/noticias/capa/na-terra-de-paulo-freire-sobra-dinheiro-para-educacao-e-brasil-permanece-entre-os-ultimos-no-ranking-do-pisa/]

[17] SCHIMIEGUEL, O.; SCHIMIEGUEL, H. Indisciplina e impunidade na escola: por que os professores estão adoecendo e os alunos não estão aprendendo. Blumenau: Nova Letra, 2015.

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Texto de autoria do Padre Alexandre Alessio e retirado do link. Sobre o autor: Pe. Alexandre Alessio, CR - Religioso da Congregação da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo (CR). Concluiu os estudos de Filosofia no Instituto São Basílio Magno, Curitiba - PR, sua formação teológica ocorreu em Roma pela Pontifícia Universidade Gregoriana. Atualmente é pároco da Paróquia Imaculada Conceição em Franco da Rocha, Diocese de Bragança Paulista - SP, local onde iniciou o Projeto de Evangelização Jesus ao Centro, sustentado pela Associação Bento XVI, da qual é o fundador.


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