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Breve Introdução às Disciplinas Matemáticas

Capa do Livro Compedio Mathematico
de Tomás Vicente Tosca

Trecho retirado do livro Compendio Mathematico, en Que Se Contienen Todas las Materias Mas Principales de las Ciencias, Que Tratan de la Cantidad, Vol. 1, Tomás Vicente Tosca, tradução feita pelo Instituto Hugo de São Vitor na Coleção de Artes Liberais Vol. 9: Aritmética.

O desejo e o apetite pelo conhecimento são naturais nos homens, disse Aristóteles no livro I, capítulo I, da Metafísica, e entre todas as outras ciências naturais a que mais o satisfaz é a matemática: pois as excede sem comparação na pureza de suas verdades, na energia de suas provas, na clareza de suas demonstrações e no contínuo fio de suas consequências. Com isso, recebeu o nome de Matemática, que segundo sua derivação do grego, é o mesmo que doutrina, e disciplina, tornando-se seu este nobre título, que todos poderiam reivindicar como comum, pois carece de dúvidas e opiniões, tão frequente e comuns nas outras ciências, Essas névoas que tendem a obscurecer o esplendor de outras faculdades não atingem a região exaltada da Matemática; ao contrário, tais luzes descem de sua esfera elevada, descobrindo os caminhos para as outras artes naturais, para encontrar a verdade justamente desejada.

Com ela são descobertos os segredos mais escondidos da natureza. É ela quem descobre as forças do ímpeto, as condições do movimento, as causas, efeitos e diferenças dos sons: a admirável natureza da luz, as leis de sua propagação: ela ergue edifícios com beleza, torna quase inexpugnáveis as cidades, ordena admiravelmente os exércitos; e entre as ondas confusas e inconstantes do mar, abre estradas e caminhos a quem navega. Ultimamente a matemática se volta ao Céu, para descobrir a grandeza das estrelas, e o conceito e a harmonia de seus movimentos; e com várias invenções de telescópios, tornou comum o comércio da terra com o céu, tão desejado pelos séculos antigos. O tempo não será mal usado, então, se ele se consumir em seu estudo; nem será em vão o suor, se for usado em solo tão fértil, que retorna em frutos tão multiplicados.

I. Objetos, natureza e divisão da matemática

O objeto da matemática é a quantidade, não tomada como enquanto impenetrabilidade de um corpo com outro, que é a consideração própria da Física; mas apenas na medida em que é extensão ou número: e geralmente é objeto da matemática aquilo pelo qual uma coisa se diz maior, menor ou igual a outra; e a razão é porque todo o seu emprego consiste em descobrir e demonstrar as propriedade e atributos da referida quantidade. Com isso, a matemática nada mais é do que a ciência que lida com a quantidade enquanto mensurável ou contável.

Quase todos o matemáticos antigos, seguindo os pitagóricos, dividiram a matemática em quatro partes principais: aritmética, geometria, música e astronomia. Mas procedendo com melhor ordem, eu a divido em matemática pura e não pura. A primeira lida com a quantidade de tal maneira que não considera nela nenhum acidente ou afecção sensível: tais são a geometria e a aritmética; porque aquela fala do triângulo, independentemente de ser branco ou preto; de madeira, ou de ferro, etc. E a outra fala dos números, sem se envolver em descobrir se o que numera são homens, ou pedras, etc. As matemáticas não puras são aquelas que consideram a quantidade vestida e acompanhada de algum acidente ou condição sensível; e porque os afetos sensíveis são próprios da filosofia natural, ou física, elas são chamadas de físico-matemáticas: tais são a música, que trata da quantidade sonora; a óptica, da quantidade visível, etc. Estes subdividem-se em muitos outros, aos quais quero referir-me brevemente aqui, antes de entrar nesta obra; para que, vendo o estudioso reduzida a um breve mapa a agradável província que ele tem de caminhar, obterá um novo encorajamento a sua disposição.

II. As partes nas quais a matemática é dividida são declaradas

A primeiras delas é a geometria, que, tratando da extensão, mede linhas, ângulos, superfícies e sólidos: descobre suas proporções e abre as base sobre as quais se ergue a construção de toda a matemática. Segue-se a aritmética, que se vale dos números, especula sobre suas propriedades e realiza operações infalíveis com eles. Em terceiro lugar entra a Álgebra, que com incrível sagacidade, segue por vários e ocultos caminhos a verdade até encontrá-la; dissolve as equações mais difíceis e abre caminho nos labirintos mais intricados. Acompanha-lhe a trigonometria, cujo negócio é resolver triângulos: todo o sucesso da astronomia se deve a ela. A logarítmica aumenta a facilidade das operações, trata da nobre invenção dos logaritmos, números artificiais, que não pouco enriqueceram o muno literário. Todas as mencionadas são ciências puramente matemáticas.

Na ordem da físico-matemática, ocupa o primeiro lugar a música, que trata da quantidade sonora: descobre a razão das consonâncias e dissonâncias; expõe o sistema musical em diferentes gêneros: arranja os órgãos, fístulas, cravos etc., compõe diversas melodias, ajustando nelas o que está de acordo com o que está em desacordo, para o tranquilo entretenimento do ouvido. Segue a mecânica, que com máquinas artificiais aumenta muito as forças de qualquer potência: é incrível o quanto ela auxilia para se filosofar com sucesso sobre as coisas da natureza.

A estática, mesmo com o peso de seu objeto, eleva seu voo às regiões mais remotas da física, descobre as proporções e as causas da gravidade dos corpos, examina seus movimentos, esquadrinha a proporção deles ao longo de qualquer linha: seu aumento e diminuição: a balística e arte da artilharia dependem desta faculdade, de modo que sem ela nada se pode determinar corretamente. A hidrostática segue a estática, que trata das correntes das águas; descobre seus movimentos, compõe fontes artificiais deles, determina a origem e a causa dos seus movimentos naturais: examina os pesos dos metais e outros corpos no líquido e abre uma grande porte para o conhecimento das coisas naturais.

A arquitetura civil eleva os edifícios com firmeza, bela proporção e simetria, segundo as cinco ordens comuns. Isso foi conseguido pela arte chamada montea, que, usando regras geométricas, corta e ajusta as pedras, levantando com elas vários tipos de arcos e abóbodas nas fábricas. Segue-se a arquitetura militar, que ensina a fortalecer as praças, com tal arranjo de muralhas, baluartes, fossos e outras defesas, que podem poucos lutar e se defender de muitos. A artilharia trata das máquinas de fogo, arranja e examina os canhões; regula a forma de lançar as balas e outras invenções do fogo para um determinado local, por diversas linhas.

A óptica considera a quantidade enquanto é visível, e assim alarga sua consideração para os campos mais agradáveis da natureza, usando-se na especulação do movimento da luz e dos raios visuais: ela ensina a formação e a deformação das imagens, em tão diversas projeção e reduções que se formam a partir de um único ponto, que com desordem ordenada vai deformando muitos. Perspectiva, catóptrica e dióptrica nascem dela. Aquela com diferentes trajetórias, projeções e decussação dos raios, finge longe o que está perto, e avoluma o que não tem corpo. A dióptrica, ou arte anaclástica, trata dos raios de luz refratados, seus ângulos, competições e desvios: é usada na fabricação de todos os tipos de telescópios e microscópios, com os quais faz o que está longe, parecer próximo e perto; grande o que é pequeno e pequeno o que é grande: com isso ela deu a esses séculos novas notícias dos céus: novo conhecimento do artifício que a natureza escondeu por tanto tempo. A arte catóptrica, ou anacamptica, trata dos raios refletidos e, de acordo com suas leis, fabrica uma grande variedade de espelhos planos, côncavos e convexos, que, reunindo ou espalhando os raios, causam efeitos admiráveis.

A geografia considera o globo terrestre, e nos oferece, nos mapas que faz, uma ideia perfeita de seu traçado, apresentado a nossa vista em um curto espaço suas extensas regiões e províncias. A astronomia vai mais alto, sobe às regiões celestes, descobre as distâncias, grandezas e disposições dos astros, e num sistema nos esclarece a grande máquina de seus movimentos. A astronomia é seguida pela gnomômica, que com a sombra de um estilo nos mostra os movimentos dos céus; e com a variedade de relógios que fabrica, determina em diferentes planos os passos que o sol dá no curso luminoso de sua eclíptica. E ultimamente a cronografia usa na ordenação dos tempos, ajustando seus períodos aos movimentos do céu. Estas são as principais disciplinas da matemática.

III. Origem, progresso e utilidade da matemática

Não há dúvida de que com as outras ciências Deus incutiu em nosso primeiro pai Adão a notícia da matemática, que foi continuada por seus descendentes até Abraão, que a comunicou aos caldeus e aos egípcios: e destes passou sem dúvida para os gregos, porque Tales Milésio no ano 584 antes do Nascimento de Nosso Salvador passou da Grécia para o Egito, para aprender geometria, e depois comunicá-la aos seus: ele foi seguido por homens ilustres em matemática, como Pitágoras Sâmio, Anaxágoras Clazomênio, Enópides Quio, Anaximandro Milésio, Hipócrates Quio, Demócrito, Teodoro e seu discípulo Platão, Arquitas Tarentino, Teoteto, Euclides, Erastóstenes, Arquimedes, Gemino, Menelau, de cujos escritos Teodósio compôs os elementos esféricos na época de Pompeu, o Grande; estes foram seguidos por Ptolomeu Alexandrino, Proclo, Teão, Campano, João de Regiomonte, e muitos outros até nosso século, em que a matemática foi muito avançada por muitos e ilustres, especialmente São Basílio, que é elogiado por seu discípulo São Gregório Nazareno, por ter avançado muito em astronomia, geometria, aritmética e outras matemáticas; aos quais se acrescentam Santo Agostinho e Beda, o venerável, como se vê no que deixaram escrito sobre estes assuntos.

E não espanta se apreciaram tanto seu estudo, porque além de sua nobreza, ele é de imponderável proveito. Eles, disse Platão, animam o engenho e, usando a fala, a tornam apta para aprender melhor as outras ciências: por isso ele excluiu de sua Academia aqueles que eram ignorantes em geometria. Sem a matemática não é possível abrir caminho na filosofia natural com sucesso. Porque sem a estática, como explicar os movimentos dos corpos pesados, sua aceleração e suas proporções? Como a restituição do comprimido e tenso, no qual está indubitavelmente a maior parte dos efeitos da natureza? Sem a óptica, dióptrica, o que acontecerá em matéria de cores e luz, senão a escuridão? Que conceito pode ser feito da formação da íris, coroas e outros meteoros? Quanto aproveitam também para Teologia, Santo Agostinho o declara muito bem no livro 2 do Sobre a Doutrina Cristã, nos capítulo 16, 19 e 37; e São Jerônimo, no volume I, epístola I. E especialmente são necessários para o perfeito entendimento da Sagrada Escrituram, geometria, aritmética e geografia, pois são quase inumeráveis os texto que requerem estas notícias para sua inteligência.

IV. Explicação de alguns termos que são frequentes na Matemática

Autores, antigos e modernos, tendem a usar os seguintes termos em seus tratados de matemática: definições, axiomas, postulados, proposições, teoremas, problemas e lemas; que será bem explicado no início deste trabalho.

Definições são explicações de nomes e termos. E assim dizemos que por este nome Triângulo não entenderemos nada além de uma figura, que consiste em três ângulos. Estas explicações dos termos devem estar no início de qualquer Tratado, porque grande para das questões e também dos Paralogismos que se cometem, decorrem da ambiguidade e das diferentes inteligências dos nomes.

Os postulados são princípios tão claros e evidentes que não precisam de prova ou demonstração; e por serem frequentes no curso da ciência, podem que sejam concedidas no início, para que depois não haja tropeço nas demonstrações: como de um ponto a outro, pode-se traçar uma linha reta.

Axiomas, ou noções comuns, são os princípios gerais comuns a todas as ciências: tão evidentes e claros que, por si mesmo, apenas com a declaração dos termos, eles manifestam, como é "O todo é maior que sua parte"; porque sabendo que a coisa é todo e parte, a dita verdade é evidente.

Proposição é um nome geral e significa aqui qualquer conclusão da ciência que propomos provar por seus princípios. Das proposições, algumas são teoremas e outros problemas.

Teoremas, é uma proposição especulativa, que diz alguma propriedade ou paixão do sujeito, como é "Os três ângulos de qualquer triângulo junto são iguais a dois ângulos retos".

Problema é um Proposição prática, que propõe a maneira de fazer algo; como aquela que ensina a dividir uma linha em duas partes iguais.

Há também frequentemente uma proposição, que eles chamam de lema. Este é aquele que apenas é colocado, e é assumido para provar a proposição, ou as proposições seguintes, de modo que, se não fosse para este fim, nenhum menção seria feita.

Além do acima mencionado, o seguinte será encontrado neste tratado.

Corolário, ou consectário, é uma proposição, que por consequência legítima se infere do que já foi demonstrado.

Escólio é uma anotação, que às vezes é adicionada ao final de uma proposição, para sua explicação posterior, ou para uma maior extensão do que é ensinado nela.

***

Os 9 tomos originais do Padre Tomás Vicente Tosca em espanhol se encontram aqui: drive.


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INTRODUÇÃO À ASTRONOMIA CLÁSSICA

Astrônomo Copérnico, ou conversa com Deus -
 Jan Alojzy Matejko - 1872

Texto retirado da Introdução do livro Os Lusíadas - vol. I Comentários de Francisco de Sales Lencastre, edição de Renan Santos. Editora Concreta, 2018.

IV. COSMOGRAFIA

Para complemento da interpretação dos Lusíadas, é indispensável proporcionar aos indoutos algumas breves noções do sistema cosmográfico exposto pelo poeta, as quais não poderiam caber em notas de cada estância. Às vezes exprime-se Camões na linguagem mitológica e até na linguagem da humanidade primitiva, cujas idéias sobre a forma do universo eram as duma criança ignorante. [8]

“O céu parece uma abóbada azul posta em cima da Terra chata e circular. Vemo-nos no meio deste disco da Terra. Assim supõem os povos antes de terem viajado. Cada um deles se julga no centro do mundo. A que distância chega o céu ao horizonte? A resposta é vaga, porque, para qualquer lado que se caminhe, não se chega a esse limite aparente. E a própria Terra onde pousa? É o que não se sabe, e ninguém ousa perguntá-lo; supõe-se primeiramente que ela é infinita em profundidade.

“Depois, vendo-se que o Sol, a Lua e as estrelas se levantam no horizonte, passam por cima das nossas cabeças, vão mergulhar no lado oposto e tornam a aparecer no dia seguinte outra vez no Oriente, sente-se que esses astros têm necessariamente uma passagem por baixo da Terra. Supõe-se então que esta não tem raízes infinitas, mas que é sustentada sobre montanhas ou colunas, entre as quais passam os astros.” [9]

Homero (séc. IX a.C.) afirmava que a Terra era um disco rodeado pelo Oceano e coberto por uma abóbada, debaixo da qual os astros do dia e da noite giravam sobre carros. A escola de Pitágoras, na antiga Grécia (séc. VI a.C.), foi a primeira que professou a idéia da esfericidade do globo terrestre.

No Canto X finge o poeta que a deusa Tétis, na Ilha dos Amores, está mostrando a Vasco da Gama um globo translúcido, que se sustenta no ar e que representa a estrutura do universo conforme a astronomia do tempo de Ptolomeu (séc. II d.C.).

Vinte nove anos antes da publicação dos Lusíadas, já fora impressa (1543) a obra de Copérnico – astrônomo polaco, fundador da astronomia moderna; mas adiante se dirá o motivo provável do ter adotado o poeta, na sua descrição cosmográfica, as antigas teorias.

Agora expliquemos, para inteligência do texto, qual era o sistema chamado de ptolomaico, e como se fundou.

Formada a idéia de que a abóbada celeste girava em volta de nós em 24 horas e de que as estrelas estavam aderentes a essa abóbada – que se supunha sólida –, admitia-se que a Terra era um globo – o qual, sem apoio algum, pairava no meio do universo – e que a esfera celeste o envolvia completamente.

Este sistema de aparências era consolidado pelas observações dos navios no mar, as quais confirmam ser esférica a Terra, visto que as montanhas vão desaparecendo pela parte inferior à proporção do afastamento.

“A observação das estrelas que descem para baixo do horizonte ao norte, aparecendo outras diferentes ao sul à proporção que o viajante vai caminhando das nossas latitudes para o equador; e a observação da sombra da Terra – que se desenha em círculo negro sobre a Lua eclipsada – acrescentam novas confirmações à idéia de que habitamos um globo colocado no meio da esfera estrelada.

“Nota-se mais tarde que alguns astros se deslocam entre as estrelas. O primeiro em que se notou o deslocamento foi Vênus – a radiante estrela da tarde e da manhã –, cuja mudança de sítio é sensível de dia para dia, pois umas vezes aparece depois do Sol posto, outras vezes precede o nascer do Sol.

“O segundo astro errante que se notou foi o brilhante Júpiter, que faz lentamente a volta do céu em doze anos.

“Observou-se depois um terceiro astro errante, com menos brilho do que os dois precedentes, mas às vezes muito rutilante: Marte, de irradiação avermelhada, que faz o giro do céu em dois anos.

“Depois um quarto: Saturno, que se move através da esfera celeste com tal lentidão, que emprega não menos de 30 anos em percorrer a sua órbita.

“Mais tarde notou-se ainda um quinto astro móvel: Mercúrio, que ora aparece de tarde a Oeste, ora de manhã a Leste, da mesma maneira que Vênus – mas menos brilhante –, e que se afasta menos do Sol; por isso mais difícil de se distinguir e reconhecer.

“Estes astros foram denominados planetas, vocábulo que significa ‘errantes’ – por oposição às outras estrelas (denominadas fixas, por se conservarem sempre no mesmo lugar respectivo da abóbada celeste).

“Em conseqüência de aparecer o Sol todas as manhãs mais tardiamente do que as estrelas e de não voltar ao mesmo ponto do céu senão depois de 365 dias e 6 horas, supunha-se que ele estava adstrito a um círculo distinto da esfera estrelada, e dentro desta se movia de leste para oeste em um ano.

“A Lua – executando uma revolução análoga em 27 dias e quase 8 horas – supuseram-na adstrita a um círculo colocado mais próximo da Terra e girando nesse círculo.

“A combinação deste movimento com o do Sol dava conta da série de fases lunares, que se realizam em 29 dias e meio. A mais destes dois círculos (do Sol e Lua) acrescentavam-se cinco para os cinco planetas que ficam nomeados, o que perfazia ao todo sete círculos (sete céus) sucessivos a partir da Terra para o céu, por esta ordem:

1º, da Lua (com um movimento de 27 dias);
2º, de Mercúrio;
3º, de Vênus, que tem freqüentemente mudado de posição;
4º, do Sol (365 dias);
5º, de Marte (2 anos);
6º, de Júpiter (12 anos);
7º, de Saturno (30 anos).

Superior a estes sete céus estava o 8º – o das estrelas fixas.

“Esta representação do universo, esta constituição do mundo físico (a etimologia grega da palavra sistema quer dizer “constituição”) representava a natureza terrestre e celeste, tal como parece à vista, e correspondia completamente ao testemunho dos olhos. Facilmente se concebe que diferentes povos – em separado – tivessem chegado a formar do mundo a mesma imagem geral e que a ciência astronômica – baseada sobre o estudo de observação de muitos séculos – tivesse erigido este conjunto em sistema absoluto, transmitindo-se, de geração para geração, duns povos para outros povos. Deste modo foi comunicado da Ásia oriental – berço da história humana – à China para leste; e da Caldéia ao Egito para sudoeste. Na seqüência dos séculos, a Grécia inteligente e artística, tendo chegado a elevado grau de esplendor, adotou do Egito os mesmos princípios, desenvolvendo-os e completando-os com as próprias observações. Dessa nação – ilustrada pelos monumentos gigantescos e pelas altas pirâmides – recebeu a Judéia também o mesmo sistema astronômico, do qual Moisés e Jó nos guardaram fragmentos – do mesmo modo que Hesíodo e Homero entre os gregos.

“O astrônomo cujos estudos mais contribuíram para estabelecer em sólida base o sistema das aparências foi Hiparco (séc. I a.C.). As suas observações ainda hoje prestam grande auxílio, o que não é para se admirar, quando se reflete que uma observação bem feita serve à astronomia moderna fundada na realidade, da mesma sorte que à astronomia antiga fundada sobre as aparências. A esse astrônomo se deve o ter verificado que o Sol não está, em cada ano, sobre o mesmo ponto do céu no momento do equinócio da primavera, mas que recua sucessivamente sob as estrelas: as que se vêem ao Sul, por exemplo, em determinado instante, não se vêem exatamente sobre o mesmo lugar no ano seguinte em igual instante; do mesmo modo vemos também as do Norte deslocarem-se, de sorte que o céu estrelado executa uma revolução completa calculada em 25.870 anos.

“Ao movimento da Terra é hoje atribuída esta grande revolução do céu – chamada ‘precessão dos equinócios’ –, que se supunha ser efetuada pela própria abóbada estrelada; e esse movimento secular é devido à atração do mar e do Sol sobre a protuberância equatorial do nosso globo. Deste modo as observações, sobre as quais se tinha estabelecido o sistema da imobilidade da Terra e do movimento dos céus, servem hoje para a teoria do movimento da Terra.

“Aristóteles (séc. IV a.C.) expusera e tentara demonstrar solidamente o sistema das aparências. O ilustre preceptor de Alexandre consagrou a vida a escrever uma enciclopédia dos conhecimentos humanos, na qual a astronomia ocupava o primeiro lugar.

“Até o século XVI, a Europa – ou para melhor dizer, as corporações de ensino –, reconhecendo em Aristóteles [10] o grande mestre, não quiseram admitir senão o que estava escrito nas suas obras; e ele tinha sustentado:

1º Que a Terra se conservava imóvel no centro do Universo;

2º Que o movimento de todas as esferas celestes procedia de origem inesgotável, inerente à própria essência do céu mais alto, designado pelo nome de Primeiro móbil;

3º Que, para além das estrelas fixas e do Primeiro móbil, estava a última e mais vasta esfera, que encerrava todas as outras, chamada Empíreo;

4º Que o Universo tinha portanto um limite: era verdadeiramente fechado pela última esfera imensa, além da qual não existia mais nada.

“Esta representação do Universo fez objeto de livro especial – o mais venerado dos tratados de astronomia –, intitulado Almagesto (vocábulo que quer dizer “o grande”) devido a Cláudio Ptolomeu. Este geógrafo-astrônomo coligiu toda a astronomia antiga (completada pelos trabalhos de Hiparco) e depois da sua obra – escrita no século II da nossa era – designou-se sob o seu próprio nome o antigo sistema do mundo, sob a denominação de Sistema de Ptolomeu.

“Os sucessores de Ptolomeu tiveram, como artigo de fé, a crença – aliás tão natural, aparentemente – da imobilidade da Terra no meio do universo. Tudo estava classificado no seu lugar e regrado para toda a duração do mundo. Dois elementos, a terra e a água, eram distinguidos cá em baixo: a terra, mais pesada, formava a base; a água do oceano e dos rios flutuava à superfície. Um terceiro elemento, mais leve do que os dois primeiros, envolvia o globo: era o ar ou a atmosfera. Por cima do ar, um quarto elemento, o fogo ou éter, mais leve do que os quatro, formava uma zona superior à atmosfera, e nele se acendiam os meteoros. Por cima vinham ainda os círculos ou orbes celestes, as órbitas dos planetas – na ordem já indicada. Para além desses sete círculos, estava colocada a esfera das estrelas fixas, que formava o oitavo céu. O décimo era o Empíreo, habitação da Divindade. Todo este edifício se supunha ser construído duma substância transparente, comparável a gelo ou cristal de rocha. Alguns espíritos superiores (Platão [11], por exemplo) não admitiam a solidez dos céus; mas a maior parte dos astrônomos declarava que era impossível conceber o maquinismo e o movimento dos astros, se os céus não fossem formados duma substância dura, sólida e eterna. Segundo conta Plutarco [12], pensavam os físicos antigos que os aerólitos eram pedaços destacados da abóbada celeste e que, subtraídos à força centrífuga, caíam sobre a Terra em conseqüência do próprio peso.”

Pelo sistema exposto – considerando a Terra como centro do universo –, Tétis explica a Vasco da Gama a estrutura do mundo (Canto X), apontando-lhe primeiro o Empíreo (est. 79), o céu imóvel onde residem as almas dos bem-aventurados. E do mesmo modo descreve o zodíaco com as suas doze constelações figuradas por animais – que se imaginou serem as doze estâncias do Sol, cujo caminho aparente sobre o céu estrelado é percorrido durante o chamado “ano sideral” (isto é: 365 dias, 6 horas, 9 minutos e 9 segundos), voltando à posição anterior, com referência às estrelas, no fim desse intervalo.

Deu-se o nome de zodíaco a uma faixa de 9 graus de largura, por cima e por baixo desse caminho aparente, dividida em doze signos de 30 graus cada um. Estes signos têm os mesmos nomes das constelações que ocupam essa faixa do céu, posto que não muito exatamente.

Foi cerca de 14 séculos antes da nossa era que os gregos dividiram o céu em constelações, cujos nomes latinos se contêm nos seguintes versos:

Sunt Aries, Taurus, Gemini, Cancer, Leo, Virgo,
Libraque, Scorpius, Arcitenens, Caper, Amphora, Pisces.

Estes nomes em português são: Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão, Virgem, Libra, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes. O poeta não só menciona as doze constelações do zodíaco, mas ainda outras muitas das mais notáveis, enumerando os planetas pela ordem em que se julgavam dispostos no céu estrelado – segundo o sistema de Ptolomeu, tendo-se referido também aos chamados excêntricos e epiciclos [13] – inventados pelos astrônomos para explicar o movimento das esferas. Estes excêntricos e epiciclos explica-os hoje [início do séc. XX] a ciência deste modo:

“Os movimentos aparentes dos planetas que observamos são resultantes da combinação da translação da Terra em volta do Sol com a translação dos planetas em volta do mesmo astro.

“Tomemos Júpiter para exemplo: este planeta circula em volta do Sol a uma distância cinco vezes maior do que a distância da Terra ao Sol. A sua órbita envolve portanto a nossa com um diâmetro cinco vezes maior, e leva doze anos esse mesmo planeta a efetuar a sua translação.

“Durante os doze anos que Júpiter emprega em fazer a sua revolução em torno do Sol, a Terra faz doze revoluções em torno do grande astro. Por conseqüência o movimento de Júpiter – visto daqui – não é um simples círculo seguido lentamente durante doze anos, mas uma combinação deste movimento com o da Terra. Dê-se o leitor ao incômodo de traçar a seguinte figura: um ponto representando o Sol – um pequeno círculo em volta a dois centímetros de distância representando a órbita da Terra – e um segundo círculo – a dez centímetros – representando a órbita de Júpiter; facilmente reconhecerá que, girando em volta do Sol, produzimos um deslocamento aparente de Júpiter sobre a esfera estrelada em que ele se projeta. Este deslocamento dá-se, à metade do ano, em um sentido, e, à metade do ano, em outro. É como se a órbita de Júpiter fosse composta de doze anéis. Para dar conta do movimento aparente de Júpiter, os astrônomos antigos não tinham podido conservar por muito tempo o simples círculo: viam-se obrigados a fazer rodar sobre ele – no decurso de doze anos – o centro dum outro pequeno círculo, em cuja circunferência supunham o planeta encaixilhado. Deste modo, Júpiter não seguia diretamente o seu grande círculo: percorria o círculo pequeno que fazia doze giros no mesmo plano, rodando ao longo do círculo primitivo em um período de doze anos.

“Saturno em 30 anos faz o seu giro à volta do Sol. Para explicar as marchas e contramarchas aparentes vistas da Terra, tinha-se semelhantemente ajuntado à sua órbita um segundo círculo, cujo centro seguia esta órbita e cuja circunferência, levando encrostado o planeta, girava 30 vezes sobre si própria durante a revolução inteira.

“Estes segundos círculos receberam o nome de epiciclos.

“O de Marte era menor que os precedentes; os de Vênus e Mercúrio eram muito maiores.

“Eis uma primeira complicação do sistema circular primitivo. Mas não era só esta.

“Os planetas, visto que geralmente seguem elipses, estão em uns pontos do seu percurso mais perto do Sol do que em outros pontos. E, visto que todos os planetas – compreendendo a Terra – se movem em períodos diferentes à volta do Sol, o resultado é cada planeta estar ora mais próximo, ora mais afastado da própria Terra. Em certos pontos da sua órbita, Marte, por exemplo, chega a estar afastado de nós mais quatro vezes do que noutros pontos.

“Para dar conta destas variações de distância, os astrônomos modificaram os círculos primitivos. Como se pretendia conservar a figura circular, supôs-se que os círculos percorridos por cada planeta tinham por centro não precisamente o próprio globo terrestre, mas um ponto situado fora da Terra. Por este estratagema, Marte, por exemplo, descrevendo uma circunferência à roda dum centro situado ao lado da Terra, encontrava-se ora mais afastado, ora mais próximo dela. O centro real de cada órbita celeste não coincidia com o centro da Terra, senão por meio do subterfúgio do segundo centro móvel em torno do qual se efetuava essa órbita.

“Esta nova acomodação mecânica foi designada com o nome de ‘sistema dos excêntricos’.

“Estes epiciclos e estes excêntricos foram sucessivamente inventados, modificados e multiplicados conforme as necessidades do caso. À medida que as observações se tornavam mais exatas, era necessário acrescentar novos círculos para representar mais precisamente os movimentos celestes. Cada século acrescentava novo círculo e nova engrenagem ao mecanismo do universo, de modo que, no tempo de Copérnico – isto é, no começo do século XVI –, havia já deles número imenso, inextricáveis, emaranhados uns nos outros.

“Os astrônomos e os sábios oficiais da época dificilmente permitiam que se tocasse nesse edifício secular. Segundo Aristóteles e a sua escola, havia uma linha de demarcação natural que da Terra separava o Céu. A Terra, cercada pelos seus quatro elementos, era a sede das mudanças; o Céu, a partir do círculo da Lua, era incorruptível e imutável. Os movimentos celestes, guiados por leis que lhes eram próprias, não tinham relação alguma com as que governam a Terra. Traçada, deste modo, uma linha de demarcação entre a mecânica celeste e a mecânica terrestre, a filosofia colocava uma delas fora do campo das indagações experimentais e punha obstáculos a qualquer progresso da outra, estabelecendo princípios fundados sobre observações incompletas. Continuou por isso a astronomia, durante séculos, a ser uma ciência pura de tradições, em que a teoria não entrava senão no intento de conciliar as desigualdades dos movimentos celestes e uma pretendida lei de revolução circular e uniforme, que se considerava compatível com a perfeição do mecanismo celeste.

“Daí procedia o acervo (informe e contraditório) de movimentos hipotéticos do Sol, da Lua e dos planetas em círculos, que eram sucessivamente centros doutros círculos, até que finalmente – tornando-se mais exata a observação e multiplicando-se constantemente os epiciclos – tornou-se palpável o absurdo de sistema tão confuso.”

Expostas como ficam, sumariamente, as velhas teorias que serviram de base à descrição do universo feita pelo poeta no Canto X, é conveniente que também aqui se dê breve notícia das teorias modernas para as quais concorreu Copérnico [14], transformando o sistema de Ptolomeu, mudando a posição da Terra e demonstrando que o centro do universo é o Sol.

“Copérnico ainda manteve a esfericidade das órbitas celestes, a confusa engrenagem dos epiciclos e excêntricos e outras teorias que os sucessores do grande astrônomo foram modificando – ao ponto de engrandecerem e idealizarem o mundo pela maneira hoje conhecida. Quando se lêem os filósofos gregos – cujos conhecimentos científicos se podem apreciar, ainda que por maneira muito restrita –, causam notável impressão a sutileza que desenvolviam nas discussões, o êxito prodigioso dos raciocínios abstratos, a admirável sagacidade nos assuntos puramente intelectuais – todas estas qualidades formando contraste com a negligência e os poucos cuidados que prestavam ao estudo da natureza externa. Em certos casos, tiravam conclusões ilógicas de princípios de generalização fundados sobre fatos pouco numerosos e mal observados. Alguns desses filósofos prevaleciam-se com inconcebível leveza de princípios abstratos que não se referiam à natureza e dos quais, todavia, deduziam, como supostos axiomas matemáticos, todos os fenômenos e leis que os regem. Estavam, por exemplo, convencidos de que o círculo devia ser a figura mais perfeita, e daí concluíam naturalmente que as revoluções dos corpos celestes deviam fazer-se em círculos exatos e movimentos uniformes; se a observação estabelecia o contrário, não levantavam dúvidas sobre o princípio ou fundamento que haviam estabelecido. Longe disso: não cuidavam senão de salvar a sua perfeição ideal; e, para o conseguir, não havia espécie de combinações de movimentos circulares que eles não imaginassem.

“Nesta guerra de palavras, era desprezado o estudo da natureza, e considerava-se indigna dum sábio a paciente e modesta investigação dos fatos. O radical erro da filosofia grega foi imaginar que era aplicável à física o método que tão bons resultados dera nas matemáticas e que, partindo de noções simples quase evidentes, ou de axiomas, se podia resolver tudo. Por isso todos esses sábios que cultivavam a física andavam sempre ocupados em raciocinar ou desarrazoar sobre pretendidos princípios. Um considera o fogo como sendo a matéria essencial e a origem do Universo; outro adota o ar; um terceiro encontra a solução e a explicação de todos os fenômenos no “infinito”; um quarto vê-os no “ser” e “não ser”. Enfim, um filósofo, que havia de estabelecer opinião durante dois mil anos, decidia que a matéria, a forma e a privação deviam ser consideradas princípios de todas as causas.

“Esta maneira de perder o tempo em argumentos metafísicos, sob o pretexto de fazer ciência, durou nas escolas desde a Antiguidade até Copérnico, e retardou por muito tempo a supremacia das ciências exatas. A astronomia de observação progredia entre os árabes e na escola de Alexandria, mas o seu estudo tornava-se estéril, e sem a teoria era quase impossível atingir o alvo da ciência, o qual consiste em tornar conhecida a natureza. Reconhecemos contudo, para não sermos acusados de ingratidão com a Antiguidade e a Idade Média, que, se não houvesse os trabalhos antigos, não existiria a ciência moderna. Chega-se a grande, depois de se ser pequeno. Graças às observações e explicações antigas é que se pôde verificar a insuficiência das hipóteses e imaginar outras melhores.

“Foi nos séculos XV e XVI que se estabeleceu o método experimental, aparecendo sábios independentes, que se podem chamar precursores de Copérnico: George Peurbach (1423–1461), Jean Muller (1436–1476), Fracastori (1483–1553).

“Enquanto os astrônomos faziam os últimos esforços para explicar do melhor modo possível os movimentos celestes – sem se afastarem da velha hipótese da imobilidade da Terra –, o célebre Colombo descobria o Novo Mundo; e o globo terrestre desvendava-se por todos os lados às vistas da ciência aventurosa; o espírito humano, conhecendo, daí por diante, diretamente e por experiência, a esfericidade do globo e o seu isolamento no espaço, adquiria o elemento mais essencial para conceber o seu movimento.

“No ano imediato à morte do grande navegador, estava Copérnico tratando de destruir as idéias antigas sobre astronomia; e em 1543 publicava em Nuremberg a obra imortal, que mudou a face da astronomia, e cujo título era: Nicolai Copernici Torinensis, de Revolutionibus orbium celestium, libri VI.

“O sistema das aparências, a opinião da imobilidade do globo terrestre e do movimento do Céu, era ainda no século XVI – e ainda hoje é – a idéia simples e vaga que reina no espírito do povo ignorante.

“Refletindo nas condições mecânicas do sistema das aparências, Copérnico pensou que esse sistema, tão complicado e tão grosseiro, não podia ser divino nem natural, porque tudo na natureza é extremamente simples; e, depois de 30 anos de estudos, convenceu-se de que, atribuído à Terra duplo movimento – um, de rotação sobre si própria em 24 horas, e outro, de translação à volta do sol em 365 dias e um quarto –, se explicavam todos os movimentos celestes, para os quais se tinham inventado esses numerosos círculos de cristal.

“O sistema existente parecia estar de harmonia com a observação, mas era aparente essa harmonia. Para que o universo fosse constituído de tal maneira, seriam indispensáveis condições mecânicas que não existem: seria preciso, por exemplo, que a Terra fosse mais pesada que o Sol; que ela fosse o astro mais importante do sistema solar; que as estrelas não estivessem separadas de nós por tão prodigiosas distâncias. Reconheceu-se, pois, que os planetas não circulam em volta do globo terrestre, mas sim em companhia da própria Terra em volta do Sol (relativamente imóvel) – seguindo, no seu movimento, elipses e não círculos.”

Eis alguns dos pontos fundamentais do método de Copérnico e das suas demonstrações – em que todavia aparecem restos das antigas teorias:

“A Terra é esférica [15], porque a esfera é de todas as figuras a mais perfeita, e a que sob a mesma superfície circunscreve maior espaço em todos os sentidos.

“O Sol e a Lua são de forma esférica. É a forma que tomam naturalmente os corpos, como se vê nas gotas de água. Todos os corpos celestes têm forma esférica. Demonstra-se a esfericidade da Terra: um objeto visível ao longe na ponta do mastro dum navio que, visto da praia, parece descer à medida que o navio se afasta: prova-se também pelos eclipses da Lua, na qual se vê a sombra redonda da Terra.

“Qual é a posição da Terra no Universo? Quase todos os autores estão de acordo em supor que a Terra é imóvel; parece-lhes até ridícula a opinião contrária. Examine-se atentamente o caso. Qualquer deslocação observada procede, ou do movimento do objeto observado, ou do observador, ou do movimento simultâneo de ambos; porque, se os dois movimentos forem iguais, não haverá meio de os perceber. Ora, é da parte de cima da Terra que observamos o Céu. Se a Terra se move, parecer-nos-á que o Céu se move em sentido contrário, transportado de Oriente para Ocidente em cerca de 24 horas. Deixai o Céu em repouso e dai movimento à Terra, mas do Ocidente para Oriente: tereis as mesmas aparências exatamente.

“Sendo imensa a esfera celeste, como se pode conceber que ela gire em 24 horas? Não é mais natural atribuir este movimento à Terra, e só à Terra? Quando a Terra gira, tudo que está no Céu nos parece girar; mas as nuvens e tudo que está no ar participam do movimento dela.

“Se todos os astros girassem em volta da Terra, o que sucederia?

“O astro mais próximo de nós (a Lua) está a 96.000 léguas da Terra. Ser-lhe-ia, portanto, necessário percorrer em 24 horas uma circunferência de 192.000 léguas de diâmetro, isto é, 603.000 léguas de extensão; teria, por isso, de correr com uma velocidade de 25.125 léguas por hora, ou 400 léguas por minuto, ou 7 léguas por segundo… Mas isto é o de menos.

“O Sol – a 37 milhões de léguas de nós – teria de percorrer no mesmo intervalo de 24 horas uma circunferência de 232 milhões de léguas em volta da Terra; ser-lhe-ia preciso voar com uma velocidade de 9.680.000 léguas por hora e 161.300 léguas por minuto, ou 2.690 léguas por segundo!

“Os planetas Marte, Júpiter e Saturno, mais longe da Terra do que o Sol – que participam igualmente do movimento diurno –, seriam levados no espaço com uma rapidez ainda mais inconcebível. O último planeta conhecido dos antigos – Saturno –, nove vezes e meia mais afastado de nós do que o Sol, seria obrigado, para em 24 horas dar a volta em roda da Terra, a descrever uma circunferência de dois bilhões de léguas de extensão e a queimar o espaço com uma rapidez de mais de 20 mil léguas por segundo.

“E as estrelas? A imaginação assusta-se com a rapidez que seria necessário supor a esse movimento se elas dessem a volta da Terra em 24 horas. Saturno está distante de nós 218.431 semidiâmetros do globo terrestre. Ora, as estrelas estão para lá do orbe de Saturno. Sabe-se que a estrela mais próxima de nós está à distância de 275.000 vezes a distância da Terra ao Sol, isto é, dez trilhões de léguas. Essa estrela – o alfa de Centauro – deveria percorrer, no intervalo de 24 horas, uma circunferência de 63 trilhões de léguas em extensão, e a sua velocidade seria de 2.666 bilhões de léguas por hora, 44.400 milhões por minuto – em suma, 740 milhões de léguas por segundo.

“Havendo vários centros, não é crível que o centro do mundo seja o da Terra e da gravidade terrestre. A gravidade não é mais do que a tendência natural dada pelo Criador a todas as partes do mundo, e que as leva a reunirem-se e a formarem globos. Esta força deu ao Sol, à Lua e aos outros planetas a forma esférica, o que não obsta a que executem revoluções diversas. Se a Terra, portanto, tem movimento em volta dum centro, esse movimento será semelhante àquele que percebemos nos outros corpos – teremos um circuito anual. O movimento do Sol será substituído pelo movimento da Terra. Tornado imóvel o Sol, realizar-se-ão do mesmo modo o nascimento e o ocaso dos astros; as estações e as retrogradações serão resultado do movimento da Terra; o Sol será o centro do mundo. É a ordem natural de tudo que sucede, é o que ensina a harmonia do mundo – e que é forçoso admitir.

“A esfera superior a todas é a das estrelas fixas – esfera imóvel que abraça o conjunto do Universo. Seguem-se entre os planetas errantes primeiramente Saturno, que precisa de 30 anos para fazer a sua revolução; depois Júpiter, que faz o caminho em doze anos; segue-se Marte, que precisa de dois anos. Na quarta linha encontram-se a Terra e a Lua, que – no espaço de um ano – chegam ao seu ponto de partida. O quinto lugar é ocupado por Vênus, que precisa de nove meses para o seu caminho; Mercúrio ocupa o sexto lugar, e precisa apenas de 24 dias para descrever a sua órbita. No meio de todos, reside o Sol. Qual é o homem que, em templo tão majestoso, poderia escolher outro e melhor lugar para o brilhante astro que ilumina todos os planetas e os seus satélites? Não é sem razão que o Sol se chama a luz do mundo, a alma e o pensamento do universo. Colocando-o no centro dos planetas, como sobre um trono real, entregamos-lhe o governo da grande família dos corpos celestes.”

Em seguida se encontra a figura deste sistema, copiada de um fac-símile da mão de Copérnico:

Breve notícia dos sábios astrônomos que sucederam a Copérnico, confirmando constantemente o seu sistema e concorrendo para os progressos da astronomia moderna, constitui completa explicação dos motivos que induziram Camões a explicar a contextura do Universo segundo o sistema de Ptolomeu. Se doutro modo procedesse, a censura inquisitorial não permitiria a publicação do poema, e levaria talvez a severidade ao ponto de encarcerar o poeta.

A teoria de Copérnico – a do movimento da Terra em volta do Sol, sendo este astro o centro do Universo – continuou a ser tida por absurda, ridícula e inadmissível. Dois anos depois da morte do venerável renovador do mundo, celebrava-se o Concílio ecumênico de Trento (1545), que estabeleceu como fundamental artigo de fé a imobilidade da Terra no centro do mundo. Tycho Brahe (1546–1601), notável astrônomo, tinha exaltada admiração pelo talento de Copérnico, mas deixou-se arrastar naturalmente por escrúpulos religiosos, não admitindo o novo sistema senão corrigido.

Kepler (alemão) e Galileu (italiano), professor de astronomia em Pisa, dois sábios eminentes da sua época (fins do século XVI e princípios do século XVII), defendendo a doutrina de Copérnico, foram dela os primeiros propagandistas. Galileu, escrevendo a Kepler, dizia-lhe: “Copérnico era digno duma glória imortal, e foi tido por insensato!” Kepler respondia-lhe que lhe comunicasse os seus escritos, pois talvez pudesse publicá-los na Alemanha, visto a Itália pôr obstáculo às suas publicações.

Galileu (1610), dirigindo para a Lua as lunetas astronômicas pouco antes inventadas, descobriu que o vizinho astro era uma terra como a nossa, coberta de montanhas e vales; dirigindo-as para o Sol, verificou a existência de manchas na sua superfície e a rotação dele de Oeste para Leste. Esta rotação do astro do dia apresentava um testemunho de alta presunção em favor de movimento de translação dos planetas e da Terra em volta do Sol no mesmo sentido. Voltando a luneta para Júpiter, o ilustre astrônomo descobriu que esse imenso planeta é acompanhado de quatro luas ou satélites, que o seguem no seu curso do mesmo modo que a Lua acompanha a Terra: este pequeno sistema representava em miniatura o sistema planetário todo inteiro. Assim se acumulavam, como por encanto, os testemunhos favoráveis a Copérnico. O mais palpável e mais significativo de todos foi ver-se que se realizava no campo do óculo a profecia que 60 anos antes tinha feito Copérnico perante os seus detratores. Diziam-lhe estes:

— Se o Sol estivesse realmente no centro do sistema planetário, e se Mercúrio e Vênus girassem em torno dele numa órbita interior à da Terra, esses dois planetas deviam ter fases; Vênus, quando estivesse do lado de cá do Sol, devia estar em crescente como se fosse a Lua; e, quando formasse ângulo reto com o Sol e a Terra, devia apresentar-se com o aspecto de quarto crescente. Ora, isso é que nunca se viu.

— Essa é a realidade, respondeu Copérnico, e é o que os homens hão de ver um dia, se acharem meio de aperfeiçoar a vista.

Por isso Galileu [16] exclamou, entusiasmado, quando com a lente descobriu as fases de Vênus:

— Ó, Nicolau Copérnico! Que felicidade seria a tua, se tivesses podido gozar estas novas observações, que tão plenamente confirmam as tuas idéias.

Até então, a nova doutrina não tinha sido objeto de perseguição direta. Mas quando tomou corpo, e pareceu impor-se para substituir os princípios ensinados desde séculos, ligaram-se os sábios oficiais de comum acordo – alguns de boa-fé, outros por interesse ou ciúme – para impedir que triunfasse a novidade. Os teólogos decidiram unanimemente que era contrária às Escrituras. A Congregação do Index, estabelecida para manter a fé católica, foi incumbida pelo Papa de estudar a questão sob o ponto de vista dogmático. Em 1616, publicou essa Congregação um decreto declarando que a nova teoria do movimento da Terra era contrária às Escrituras, e que seria considerado herege quem a sustentasse, proibindo que ela fosse ensinada em qualquer país cristão, e interditando a obra de Copérnico até ser corrigida.

Quatro anos depois, a mesma Congregação indicou as alterações que se deviam fazer na obra de Copérnico: as mais importantes eram intercalar a palavra hipótese em todos os lugares em que o autor expunha a teoria do movimento da Terra e apagar a palavra astro em todos os lugares onde estivesse aplicada à Terra.

Todos sabem que Galileu foi condenado à prisão perpétua por não ter obedecido às proibições da autoridade eclesiástica e que morreu em 1642, depois de ter confirmado com provas indestrutíveis a teoria de Copérnico.

As sentenças eclesiásticas contra a crença do movimento da Terra, no século XVII, foram revogadas pelo Papa Bento XI [17], e hoje a Igreja Católica admite o verdadeiro sistema do mundo.

Kepler (1571–1630) declarou-se, ao mesmo tempo que Galileu, em favor de Copérnico, e na Alemanha publicou – com mais liberdade do que o seu êmulo em Itália – trabalhos profundos que concorreram para radicar, em bases inabaláveis, a teoria discutida do movimento da Terra e imobilidade relativa do Sol no centro das órbitas planetárias. Dos trabalhos de Kepler, resultou saber-se que os astros, no seu curso, não descrevem círculos mas elipses; e foi ele que estabeleceu, além de outras, duas leis imortais, que completaram a obra de Copérnico: 1) que os planetas se movem seguindo elipses, das quais o Sol ocupa um dos focos; 2) que os quadrados dos tempos das revoluções planetárias são proporcionais aos cubos dos eixos maiores das órbitas (os cubos das distâncias) – leis cuja aplicação se resolve por meio de problemas de geometria.

Estas descobertas expurgaram do sistema de Copérnico os círculos excêntricos e os epiciclos, que o embaraçavam ainda, e que tinham ficado como herança orgânica do antigo sistema.

Copérnico foi o fundador, o pai espiritual da astronomia moderna; e esta foi sendo aperfeiçoada por Tycho Brahe (1546–1601), Francis Bacon (1561–1626), Newton (1642–1727), Kepler (1571–1630), Galileu (1564–1642), Herschel (1732–1822), Halley (1656–1742), e muitos outros de todas as nações.

“A obra capital de Newton foi demonstrar que a causa da suspensão da Terra e de todos os astros, no espaço, é uma força determinada – calculável –, cuja intensidade diminui na razão inversa do quadrado da distância; e que em virtude da qual os corpos celestes se atraem reciprocamente; e que se movem e se sustentam no equilíbrio duma rede invisível. A atração universal, a gravitação – demonstrou-o esse sábio – rege os mais ínfimos movimentos que se operam tanto à superfície do solo, como nas mais longínquas regiões acessíveis ao telescópio, sustentando os nossos passos e as nossas habitações, regendo a gota de chuva, o grão de pó levantado pelo vento, dirigindo a Lua em volta da Terra, esta em volta do Sol, e organizando os movimentos das estrelas.”

Em notas ao Canto X, acrescentam-se mais algumas breves noções de astronomia popular, para auxiliar a interpretação das estrofes 77 a 90, onde se descreve o sistema cosmográfico consagrado no tempo do poeta.

Notas:

[8] V. Prefácio do Editor, p. 14. [Nota do Editor]
[9] Estas citações e transcrições ou extratos e os que se seguem são principalmente da obra de Camille Flammarion, L’Astronomie et ses Fondateurs – Copernic et le Sistème du Monde.
[10] Todavia Aristóteles já conhecia opiniões opostas às que sustentava (Do Céu, II, 13, 1): “Os partidários chamados pitagóricos eram de parecer contrário. Pretendiam eles que o fogo estava no centro do mundo, que a Terra era um dos astros que fazem revolução em torno desse centro, a qual produzia o dia e a noite”.
[11] Séc. IV a.C.
[12] Séc. I d.C.
[13] “Em todos estes orbes, diferente curso verás” (X, 90).
[14] Nicolau Copérnico, ilustre fundador da astronomia moderna, nasceu em Thorm (Polônia) a 10 de fevereiro de 1473; era eslavo por parte dos ascendentes e pelo nascimento.
[15] Demonstrou-se mais tarde que é um esferóide, achatado nos pólos.
[16] Nasceu 21 anos depois da morte de Copérnico, mas foi o primeiro astrônomo que se declarou aberta e calorosamente em favor do novo sistema, por escrito – daí procede a sua glória.
[17] Na verdade, o Papa Bento XIV.


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O que é o Quadrivium? - por Roberto Helguera

Um jovem sendo apresentado às sete
artes liberais, 1484-1486. Sandro Botticelli

Transcrevemos abaixo um vídeo sobre Quadrivium traduzido pela própria Sacros*. Vídeo original está neste link.

 ...são artes que nos explicam a harmonia
que existe nas coisas
e essa harmonia é contemplável em si mesma,
porque diretamente
nos aponta para aquele Deus que nos fez
imagem e semelhança...

...são coisas que nos surpreendem
e nos fazem rir
porque, assim como O Pequeno Príncipe, 
elas nos fazem cantar,
eles nos fazem rir
porque são lindas...

...para entender que eu
também sou chamado para ser um ser divino,
para ser um Filho de Deus...

Olá. Como vai? Mais uma vez, estamos juntos. Estamos aprendendo a educar. Estamos aprendendo sobre homeschooling e estamos aprendendo sobre um monte de coisas. Quero falar com você hoje. Já falei com você sobre o que fazer se no meio de sua vida você descobrir que não foi educado.

Depois, falei com você sobre em que consiste uma boa educação. Mencionei a você que uma boa educação requer as artes do trivium e do quadrivium: as artes liberais ou aquelas artes que tornam o homem livre. Era o que os antigos, até não muito tempo atrás consideravam que tinha que saber qualquer pessoa capaz de participar politicamente ou governar a polis. Por quê? Porque essas artes liberais da gramática, lógica, retórica, aritmética, geometria, música e astronomia foram aquelas que moldam a alma e inteligência de tal forma que você pudesse se tornar um homem sábio, porque elas lhe permitiram não apenas nomear o que existe, mas ver bem o que existe nessas coisas. Prudência, como adaptar seu intelecto a uma realidade que está fora de você.

Hoje quero falar com você sobre o quadrivium, as quatro artes liberais, cujo objeto é, se você preferir, a matéria, mas me referir a elas como artes cujo objeto é a matéria, pode lhe dar uma ideia errada de que o quadrivium é mais do que qualquer outra coisa artes servis e não liberais, ou seja, artes que são usadas para fazer coisas.

Por exemplo, a física é usada para construir pontes ou resolver problemas de construção de edifícios, ou balística, ou guerra, ou qualquer outra coisa. Esses são usos legítimos da física, usos legítimos de uma ciência, mas não é a forma como os antigos pensavam nisso.

A razão pela qual temos quatro artes liberais que é a aritmética, geometria, música e astronomia,  principalmente, é porque são artes que nos explicam a harmonia que existe nas coisas, e essa harmonia é contemplável em si mesma, porque diretamente nos aponta para aquele Deus que nos fez imagem e semelhança... Portanto, a maneira liberal de pensar nas artes, tanto na gramática quanto na lógica, retórica, bem como as artes do quadrivium, é pensar no que elas nos dão de harmonia.

Como posso alcançar a harmonia? Pois a harmonia é o repouso, o repouso de minha alma e esse repouso que é obtido pela contemplação e compreensão, aquele momento em que você diz: "ah, entendi" ou se não, pelo menos acho que isso deve ser ótimo. "Senhor - como o Pedro disse - estamos muito bem aqui, vamos fazer três tendas". Por que Pedro quis ficar com Cristo transfigurado? Porque ele estava vendo a harmonia daquele Deus criador.

As artes liberais nos permitem ver a harmonia e considerar a harmonia das coisas. E isso, essa permanência constante na beleza é uma questão que nos da esse repouso. Repousa a mente, repousa a alma e é muito sensato, é muito saudável para minha mente, é muito saudável para essa modernidade.

Vamos pensar: o que a modernidade nos oferece hoje?

A modernidade hoje nos oferece uma "desarmonia", música que não é harmônica, pura gritaria, pura percussão, puro pulo, um escapismo. Desconstrói, o ser humano e a alma em mil matérias e em mil aspectos, como se fôssemos uma coleção acidental de átomos. Não acredita em leis permanentes. Tudo está sujeito a mudanças. Sempre há gritos. Existe um desespero, uma falta de esperança. Por quê? Porque não há beleza. Porque não há beleza. Podemos ver isso de forma muito prática.

Na cidade de Buenos Aires, onde eu moro, por exemplo, é possível ver perfeitamente bem imagens da rua onde temos muito bonita arquitetura de uma época anterior, onde o homem que via harmonia e também tem arquitetura mais bem "original" e muitas vezes brutalista e feia, de uma mentalidade moderna que não acredita mais em harmonia, mas acredita no efêmero do ser humano. Acredita que estamos aqui por acidente e, na pior das hipóteses, também temos todas as calçadas e todas as paredes pichadas por pessoas que não acreditam mais em nada. Portanto, é muito importante trazer harmonia para sua vida. 

Assim como a palavra do trivium nos deu harmonia nos nomes, em nomear, em dizer: "sim, de fato, esse som, essa palavra, ela significa justamente essa realidade" e isso nos dá repouso. A lógica junta essas palavras em uma sintaxe harmônica: sujeito, verbo, predicado, etc., que nos dá satisfação em completar uma ideia, em dar uma ideia completa e expressá-la. A retórica nos dá... diz o grande Andrew Kern do Instituto CIRCE, que é um grande pensador, nos diz: o propósito da retórica é trazer harmonia para a comunidade. Por quê? Porque com a palavra da gramática e da lógica argumentamos para convencer o outro do que é bom, belo e verdadeiro, e para manter a paz, para obter paz para a comunidade.

Dessa forma podemos considerar a Ilíada, aqueles que a leram, a Ilíada, onde tudo é guerra  como uma falha de harmonia como uma falha na retórica. Por outro lado, na Odisseia, onde se trata de uma jornada de um personagem, Ulisses ou Odisseu, desde o naufrágio e a pobreza, de ter perdido todos os seus tesouros de guerra e seus homens para recuperar sua pátria, botim e riquezas e tudo graças à sua boa retórica.

Bem, hoje Quero falar com você sobre harmonia em números, em quantidade ou magnitude, no tempo e no espaço. Vamos falar sobre aritmética. A aritmética é harmônica, por quê? Porque os números, (a quantidade é natural para o homem e os números). Brincando com os números, aqueles que são bons em matemática sabem que há muitas regras.

Por exemplo. Como posso saber qual número é divisível por determinados números? Eu sei que todo número par é divisível por dois. Por que isso acontece? Porque eu tenho uma ideia do que significa a unidade e do que o dois significa. Dois não é somente um mais um, dois tem suas próprias características, é por isso que o chamamos de número par, entre outras coisas.

Quais números são divisíveis por três ou por seis ou por nove? Muitas vezes sabemos que se for divisível por três e por dois é divisível por seis, ou que, se a soma de seus dígitos dá nove, é divisível por nove. Isso é muito interessante porque nos diz que que há uma harmonia desde o início.

Tendo mencionado o "(princípio)", você quer ir embora. O que lemos em São João?

"No princípio era o Verbo, e a Palavra era Deus - ou é Deus - e a Palavra era Deus e a Palavra está com Deus, e sem a Palavra nada foi criado".

A Palavra é uma só, mas Deus é uno e trino. Como sabemos disso? Porque Deus cria o homem à sua própria imagem e semelhança e fala no plural. E nós sabemos que Deus é três e criou o homem, macho e fêmea: dois. E criou o homem com quatro, digamos, elementos da natureza: o úmido, o seco, o quente e o frio, como diriam os antigos. E assim por diante temos números em toda a natureza.

De fato, aqueles que estão familiarizados com o número áureo ou a proporção áurea sabem que a sequência de Fibonacci. Pesquise: "Sequência de Fibonacci". É uma sequência que indica uma ordem absolutamente permeável por toda a criação. Essa sequência é como um logaritmo que indica que cada número é o resultado da soma dos dois anteriores.

Então é $1$; 
$2=1+1$;
$3=2+1$; 
$5=3+2$; 
$8=5+3$, e assim por diante...

E se fizermos isso logaritmicamente, geometricamente, isso nos dará uma curva específica que você vê na forma como as sementes crescem, os galhos das árvores, a forma do nautilus, esse caracol, tão bonito das profundezas do mar e tantas outras figuras da natureza. Isso nos mostra que Deus utiliza a quantidade de forma harmoniosa, mas também a magnitude, porque a matéria tem, além de quantidade, além de ser quantificável. Por quê? Porque ela tem partes. A matéria tem magnitude, tem comprimento, tem largura, profundidade, volume e tudo isso está dentro dos limites. Isso significa que a matéria tem formas.

A geometria é o estudo das formas, por assim dizer. Mas essas formas também são harmônicas porque elas nos trazem repouso na compreensão das propriedades, por exemplo, dos quadriláteros. O que acontece quando eu divido um segmento, por exemplo, em partes iguais e desiguais e construo um quadrado nesse segmento? Percebo que a área desse quadrado, por exemplo, é a soma da área dos dois quadrados menores formados pelos segmentos mais dois quadriláteros, formados por um lado por um segmento longo e o outro lado por um segmento curto. Isso nada mais é do que a equação quadrática, mas expressa geometricamente, ela tem uma beleza enorme.

Portanto, a geometria é importante para a educação porque ela nos traz harmonia, porque é cheia de maravilhas. Temos admiração por esse tipo de regras que acabei de mencionar para você, ou que os ângulos internos de um triângulo somam dois ângulos retos. Sempre. Essas são coisas que nos surpreendem e nos fazem rir porque, assim como O Pequeno Príncipe, elas nos fazem nos fazem cantar, nos dão, nos fazem rir porque são lindas.

A geometria também é bonita. Há pelo menos três fontes de beleza na geometria. Primeiro, as próprias figuras que são perfeitas, dentro de sua espécie, são perfeitas. Cada um dos sólidos, por exemplo, a simetria e a proporção. Isso também é algo que nos dá prazer. E finalmente, há uma beleza nas próprias verdades geométricas,

E já estou falando de forma abstrata, que não estou falando de geometria ou aritmética como algo útil para construir pontes. Ela pode ser usada para isso, e por ter essas propriedades que estão descobrindo e há uma grande alegria, um grande descanso em harmonia quando se vê essas coisas.

Além disso, a geometria está repleta de elementos fundamentais para a filosofia. É por isso que vemos na famosa Academia de Platão uma placa na entrada que dizia que ninguém que seja ignorante de matemática ultrapassa esse limite. Ou seja, que ninguém que seja ignorante de matemática faça filosofia. Isso é importante porque na modernidade o filósofo é visto como alguém que lida com palavras, ciências sociais e não em ciências exatas. As ciências exatas são para engenheiros. Mentira. Não há melhor filósofo do aquele que entende bem de física, que entende bem a beleza e a harmonia da matemática.

Por quê? Bem, porque Platão viu muitos dos princípios universais facilmente descobertos na matemática, e são princípios que são fundamentais para a filosofia, que o todo é maior do que a parte. Você vai me dizer: óbvio. Mas isso é frequentemente negado. Que uma coisa não pode ser tanto par ou ímpar, por exemplo. Isso me mostra o princípio da não-contradição. Os gregos eram muito, muito realistas que não iam além das três dimensões. Para eles, quatro, cinco ou seis dimensões não têm sentido.

A matemática moderna muitas vezes segue uma física moderna que contém muitos dos erros filosóficos, mas isso não impede ninguém, qualquer físico, prefira às equações mais elegantes, mais bonitas, mais sintéticas e que melhor e mais elegantemente expressam uma realidade. É por isso que Einstein, apesar de sua belíssima equação da relatividade, estudou todo o fenômeno da relatividade tentando salvar as equações de Maxwell, as equações da eletricidade, porque ele as viu de forma tão bela que disse que elas não podem deixar de ser verdadeiras, não podem não ser verdadeiras, porque naquela época eles não podiam provar que as equações de Maxwell eram verdadeiras.

Então, isso é interessante. É um aspecto da vida de alguém que realmente considera a geometria ou a matemática, a aritmética como algo belo em si mesmo, como algo que tem um valor em si mesmo. A geometria, além disso, exercita a mente de uma forma elevada. É por isso que os gregos estudavam a geometria como algo fundamental e necessário, algo que mostra, se você preferir, a ordem divina das coisas.

E isso nos leva ao o estudo da música. A música, diriam os antigos, é o conhecimento prático, segundo eles, da modulação, "modulatio" que constitui o som e o canto e a música deriva da palavra musa. As nove musas dos gregos, que inspiravam os poetas para expressar verdades divinas sem compreendê-las. Ou seja, como se os deuses falassem por meio dos poetas, ao homem normal. Mas como eles falavam em um idioma superior, eles falavam de uma forma poética, de uma forma intuitiva, como metafórica ou alegórica, ou, exatamente, dessa forma: analógica. Essa linguagem que é tão importante saber e que eu já falei com você em outros vídeos sobre a importância importância de conhecer esse modo de conhecer, é uma linguagem que, é expressa na música.

A música também é muito matemática. Como assim? Porque as notas são uma questão de relações matemáticas. Se você souber, uma nota, por exemplo, uma oitava, é uma proporção de 1 para 2. Se eu tiver uma corda com comprimento de um metro e eu a cortar pela metade, por 50 centímetros, esses 50 centímetros vai soar uma oitava acima do que a corda, ela vibrará duas vezes mais rápido, do que a corda inteira. E assim sabemos que, por exemplo, uma 5ª é uma proporção de 2 para 3 e uma 4ª é uma razão de 3 para 4, e a segunda é uma proporção de 9 para 11 ou 9 para 12, se não estou enganado.

Quanto mais harmônico o som, mais simples a proporção, quanto mais atonal ou "inarmônico" for o som, mais complexa será a relação para o ouvido, o número é maior. E é dito que, por exemplo, os planetas circulam, há uma sinfonia famosa do som dos planetas por Holst, que me parece ser baseada no Timeu, onde os planetas circulam em órbitas que têm relações matemáticas com respeito ao resto das órbitas, e essas relações formam sons, sons do universo.

O antigo tinha um ouvido capaz de ouvir muitas harmonias e muitas coisas que nós perdemos por causa do barulho de toda a tecnologia da modernidade. Nós perdemos, mas podemos recuperá-lo sempre buscando isso.

Portanto, a terceira arte do quadrivium é a música e ela é tão fundamental e tão embutida na criação que não é à toa que um poeta, por assim dizer, como Tolkien escreve em seu Silmarillion, que no início Ilúvatar, que é um nome para Deus, cantou, fez música e essa música era criativa, criou.

E a Liturgia nós a cantamos ou deveríamos cantá-la. E quando estamos felizes, ou apaixonados ou alegres, o que fazemos? Começamos a assobiar ou cantar. E por que cantar é orar duas vezes? Porque quando alguém canta afirma que o que ele está cantando é bonito, é bom, é bonito e é verdadeiro. Afirma duas coisas: é verdadeiro e é belo portanto, é digno de uma canção. É por isso que a música é uma das artes mais importantes e não deve faltar em sua educação ou na educação de seus filhos.

Se você nunca fez nada sobre música, bem, nunca é tarde demais para começar a estudar um instrumento, um instrumento clássico: violino, violoncelo, algum instrumento agradável se você tiver um bom ouvido. O piano é o mais simples, porque as notas já estão predeterminadas. O violão é um pouco mais difícil, mas é muito satisfatório. E cantar. Cante, cante, coloque música em sua vida, em sua alma. Isso é importante.

Na modernidade, estamos acostumados a não fazer música, mas a ouvir música transmitida eletronicamente. E é muito bom, mas eu te encorajo a tentar fazer música você mesmo, participe de um coral, cantar, fazer aulas de voz, aulas de canto faça alguma coisa.

Finalmente, astronomia. A astronomia, aqui podemos lembrar dessa pequena rima de Estrelinha, com a música de Mozart, que resume todo o espírito da astronomia.

«Twinkle, Twinkle twinkle little star. How I wonder what you are».

Brilha, brilha, estrelinha. Eu me pergunto o que você é.

E isso é como O Pequeno Príncipe. Aqui chega um estudo que nos leva ao espaço. E o espaço nos atrai porque é misterioso e cheio de ordem e previsibilidade. Todo dia o sol nasce, todo dia o sol se põe, todo dia nós vemos a lua de minguante, de meia-lua, de lua cheia, até cheia e assim por diante. Ela cresce e cresce a cada 29 dias, é regular, há uma regularidade nos planetas, nas órbitas que quando as entendemos, nos causa uma enorme harmonia na alma.

Saber que esses seres misteriosos que estão lá, essas criaturas que são esses planetas e sóis gigantescos que estão lá, alguns que nós nunca chegaremos a ver como seres humanos. E Deus os colocou lá pelo prazer, para nos mostrar a beleza e que a beleza como é Deus é harmônica, porque Deus Trino e Uno e Trino faz tudo em harmonia.

Por exemplo, é dito que o universo começou no dia 25 de março. E por quê? Porque a encarnação ocorreu no dia 25 de março e também no dia 25 de dezembro, nove meses depois Cristo nasce e assim tudo tem uma harmonia, certo? E se você me dissesse: «adivinha que dia poderia ser o dia em que tudo acabaria" E eu diria: Não sei quando, não sei em que ano, mas apostaria no dia 25 de março.

Então, no quadrivium temos a aritmética da quantidade, a geometria da magnitude, música, que é quantidade, magnitude e tempo colocados em uma harmonia. E a astronomia que me causa, me mostra essa harmonia de toda a criação que eu contemplo para entender que eu também fui chamado para ser um ser divino, para ser um Filho de Deus... para me alegrar como o Pequeno Príncipe.

E quando eu olhar para as estrelas, rir e ouvir a risada do Pequeno Príncipe, esse é o quadrivium, muito importante faça com que isso faça parte de sua vida, coloque em prática em seu programa, eduque seus filhos com isso ou se eduque também nessas artes. Eu te incentivo.

Nos vemos na próxima vez para continuarmos falando sobre educação.

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A distinção mais básica na Matemática - por Instituto Hugo de São Vítor

Há dois tipos de quantidade: discreta e contínua. Entender isso é de suma importância no estudo da matemática. É por não começar daí que muitos estudos escolares acabam, no longo prazo, confundindo a cabeça de muita gente.

No estudo atual, se começa falando de número puros e, no máximo, se dá o exemplo das maçãs ou das peras para se apoiar este estudo em algo concreto. Só que, em dado momento, o professor entrará a falar de tamanhos, das áreas dos planos e sólidos geométricos. E aí poderá se insinuar um pequeno erro.

Só que, como ensinava Aristóteles, um pequeno erro no começo se transforma, passado algum tempo, num problema monstruoso.

O erro inicial é não distinguir bem os dois tipos de quantidade. Pois há dois, e não um só. Vamos lá. Quando falamos que há duas maçãs, estamos falando na verdade de quantidade discreta, isto é, de quantidades separadas; no fim, de duas coisas diferentes que foram contadas.

Porém, ao falarmos que um corpo tem um metro e noventa, passamos a falar de outro tipo de quantidade, totalmente diferente. Estamos falando de quantidade contínua. Se confundirmos, por mau aprendizado, os dois tipos, viveremos para sempre confusos em relação à matemática.

A quantidade contínua se refere à medição de uma coisa. Para medir, precisamos de um padrão de medida, como uma régua, que parte de uma unidade de medida, no caso, 1 cm.

Assim, contamos a quantidade discreta; e medimos a quantidade contínua. São coisas diferentes, que os próprios olhos enxergam como diferentes.

São lições básicas, mas muitas vezes malfeitas. E elas são passíveis de infinito aprofundamento e refinamento. Na realidade, o aprofundamento a respeito da quantidade discreta denomina-se aritmética; o aprofundamento a respeito da quantidade contínua, geometria. As duas artes básicas do Quadrivium.

Nos dois campos, muita coisa se descobriu ao longo dos milênios. Porém, resta que o óbvio permanece sempre o óbvio, e não deve ser desrespeitado. Se partirmos de modo seguro dessas distinções iniciais, poderemos avançar no estudo da matemática, sempre com calma e consistência.

Retirado de Link


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Desse modo, o Mundo é regido pelo Número - por Instituto Hugo de São Vitor

Anônimo, “Deus, o Arquiteto do
Universo” (1220-1230), Bíblia
Moralisée, iluminação em pergaminho,
 34,4 × 26 cm, Österreichische
Nationalbibliothek, Viena, Áustria

O cálculo nos ensina como combinar, das mais diversas formas, os números. Mas não o porquê do número, a sua causa. As raízes dessa questão são profundas.

Por isso, quando ouvimos dizer que Pitágoras de Samos, o grande matemático grego, dizia que o mundo era regido pelo número, podemos estranhar. Alguns até debocham dessa assertiva.

Pitágoras tinha uma razão para pensar assim. E quando os antigos sábios tinham uma razão, isso em geral significa que eles tinham uma boa razão.

A boa razão de Pitágoras era que os números são obtidos por uma abstração maior do que a abstração que retira a forma da matéria. Assim sendo, para ele isso demonstrava que os números são algo mais universal que as formas. E, de fato, as formas, nas coisas da natureza, se deterioram, mas o número, de algum modo, permanece sempre. Dessa ótica, o número parece realmente ser mais perene que a forma, e, por isso, parece regê-la.

 Você até pode rejeitar essa visão pitagórica com outros argumentos. Porém, não pode alegar que ela seja irracional.

O que é inegável é a importância do número. Sem ele, cairíamos na total desordem, no caos mais completo, de tal modo que qualquer vida seria inimaginável. Pois mesmo a imaginação, muitas vezes alcunhada de fantástica, precisa respeitar o número.

Daí que o livro da sabedoria afirme que Deus criou o mundo com número, peso e medida. Daí que sem a compreensão do universo dos números, não se caminhe em direção à sabedoria.

Daí que os antigos tenham estabelecido um currículo básico para o estudo dos números. Seu nome era Quadrivium. A Aritmética era o estudo da quantidade discreta; a Geometria, o estudo da quantidade contínua; a Música, o estudo aplicado da quantidade discreta; a Astronomia, o estudo aplicado da quantidade contínua. Sem dúvida era um currículo completo e acabado, como não vemos mais, por ser um estudo ordenado e coeso.

Estudando-o, aprenderemos certamente muito melhor a natureza do número do que pelo currículo atual, em que se misturam graus básicos com graus avançados de matemática, de modo a confundir mais do que elucidar a mente do aluno.

Texto retirado de Link


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VOCÊ PRECISA DISTO PARA ENTENDER MATEMÁTICA! - por Instituto Hugo de São Vitor

Você só não entende a matemática pelo fato de que não lhe dão nada que entender. E poucos têm coragem de dizer isso.

Pessoas há que são muito hábeis em fazer cálculos; por isso tiram boas notas na escola. Porém, isso de modo algum quer dizer que elas entendam a matemática. Só quer dizer que calculam bem; e calcular é somente uma técnica da matemática.

Assim, a matemática tem-se reduzido ao cálculo. Porém, para os antigos, a matemática era muito mais.

Para entender o quê, precisamos saber que os números são uma abstração de segundo grau. Quantos professores lhe ensinaram isso?

Infelizmente, eles não lhe ensinaram nem mesmo sobre as abstrações de primeiro grau. Então, vamos ter que recuperar também essa lição.

A abstração de primeiro grau abstrai, retira a matéria das coisas. Nunca percebeu que você faz isso? Bem, você faz. Quando usa a palavra “cadeira”, você não está falando de uma cadeira individual. Nunca. Você está falando do conceito de cadeira, que abrange todas as cadeiras que já existiram, existem e virão a existir. E o seu intelecto faz isso naturalmente, dadas certas condições.

Assim, ao ver uma cadeira, seu intelecto abstraiu o conceito de cadeira; mas, uma segunda abstração tira de uma cadeira não só o conceito de cadeira, mas o número um, pois você viu uma cadeira, afinal de contas. Assim, excluindo a matéria da cadeira primeiro, e depois a forma da cadeira, resta algo ainda: o número.

Com esse número, que é o número um, você pode ir em duas direções. A direção que se vai na escola é a do cálculo e da medição.

O Intelecto nota que há a multiplicidade no mundo. E na multiplicidade pode haver cálculo. 1 mais 1 é 2. 375 mais 813 é 1188. E este é apenas um tipo de cálculo possível. E todos eles, ou quase todos, são lógicos. São, em essência, raciocínios.

Mas os antigos viam outras vias, que foram abandonadas por soarem “místicas” demais. Porque há mais abstrações por fazer, que os modernos não ousam.

Hugo de São Vítor falava de passar dos inteligíveis (as formas e os números) para os intelectíveis (a mais alta causa do Ser). Para isso, precisamos meditar na natureza dos números, e para isso servem as quatro artes do Quadrivium.

Retirado do link


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