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O que é o Ensino Explícito?

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por Nikolai Petrovich Bogdanov-Belsky

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Apresentamos o texto O Ensino Explícito: Um meio para tornar eficaz nosso saber pedagógico – entrevista com Clermont Gauthier, publicado pela Revista Teias v. 15, n. 39 - 268-280, 2014: Currículo, Políticas e Trabalho Docente, disponível no LINK.

O ENSINO EXPLÍCITO: Um meio para tornar eficaz nosso saber pedagógico – entrevista com Clermont Gauthier

Andressa Aita Ivo [*]
Marie Pierre Dencuff [**]

Clermont Gauthier é Professor Titular do Departamento de Estudos sobre o Ensino e a 2da Cadeira de Pesquisa do Canadá em estudos para a Formação de Professores da Universidade Laval (Quebec) e membro fundador do Centro de Pesquisa Interuniversitária para a Formação e a Profissão Docente (CRIFPE). Ao longo de sua carreira universitária publicou, como autor ou em colaboração, mais de 40 livros e mais de uma centena de artigos e capítulos de livros sobre os temas pedagogia – suas origens e fundamentos – correntes pedagógicas, práticas pedagógicas eficazes e formação de professores.

A entrevista foi realizada em 18 de dezembro de 2012, ocasião em que a entrevistadora [1] realizava seu Doutorado Sanduíche na Universidade Laval de Quebec sob orientação de Clermont Gauthier. As entrevistadoras acrescentaram notas explicativas, com o intuito de facilitar a compreensão de alguns aspectos.

***

Entrevistadora: Prof. Clermont Gauthier, dentre sua numerosa publicação, seu livro Por uma teoria da pedagogia, publicado em 1998, permanece no Brasil uma referência para grande parte dos professores. Uma vez que temos a chance de lhe receber hoje, gostaríamos de lhe fazer algumas perguntas acerca de sua pesquisa e seus questionamentos atuais. Minha primeira questão: O seu livro Por uma teoria da pedagogia mostra o quanto a intervenção pedagógica do professor se transforma com a sociedade e o quanto ela permanece como uma chave para a aprendizagem dos alunos. O senhor escreveu que o ensino, no seu entendimento, compreende duas grandes funções: a gestão da classe e a gestão da aprendizagem. Você poderia nos explicar isso?

Gauthier: Sim, na verdade, nós poderíamos dizer que o objetivo da educação, ao menos na escola, o objetivo do ensino sempre foi o de instruir e educar, transmitir uma série de conteúdos culturais dados, seja pela língua, pela escrita, pela história, etc. Ao mesmo tempo, o objetivo também sempre foi o de transmitir ou de inculcar uma série de valores que a sociedade considera desejável. O que se refere à transmissão de conteúdos ou à aprendizagem de conteúdos eu chamei de gestão de aprendizagem, e o que se refere à inculcação de valores e comportamentos eu chamei de gestão da classe. Qualquer professor em situação de trabalho com os alunos na sala de aula trabalha continuamente sobre esses dois planos. Não podemos transmitir um conteúdo ou fazer aprender um conteúdo uma vez que não há sempre transmissão. Podemos colocar os alunos em situação de aprendizagem de conteúdos, mas não podemos o fazer isto se não houver alguma ordem na classe. Se não houver um ambiente relativamente calmo, o professor fala e os alunos não são capazes de escutar, não são capazes de entender o que o professor diz; do mesmo modo simplesmente não poderemos mais ter procedimentos para gerir a classe se o ensino de conteúdos não ocorrer. Então, esses dois elementos, essas duas grandes funções são complementares e necessárias para o trabalho do professor na sala de aula.

Entrevistadora: Suas pesquisas atuais, neste domínio, apresentam novos caminhos sobre este sujeito?

Gauthier: Sim, na verdade entre o livro Por uma teoria da pedagogia, publicado em 1997-98, e o trabalho que publicamos em 2012 existe uma diferença significativa. Em 1997 tentamos sintetizar as pesquisas sobre ensino. Existiam desde os anos 70, especialmente no contexto norte-americano, pesquisas realizadas em salas de aula que apontavam elementos interessantes, eram pesquisas baseadas na observação dos professores em classe. Nós chamamos essas pesquisas de “processo-produto”, no sentido de que elas tentaram estabelecer correlações entre o comportamento do professor em sala de aula e a aprendizagem dos alunos. Na tentativa de multiplicar as observações e mensurar as correlações entre diversas variáveis, demo-nos conta de que existiam alguns comportamentos dos professores que estavam associados a um maior sucesso escolar dos alunos. Comparamos vários contextos, mais favorecidos e menos favorecidos, professores mais experientes e em início da profissão, no ensino primário e secundário [2], nas diversas disciplinas, etc., e finalmente identificamos uma série de comportamentos que pareciam estar relacionados com o sucesso dos alunos. Na época eu me perguntei se éramos capazes de reconstruir um perfil do “Bom professor”, ao final do trabalho eu não tive a impressão de que tínhamos conseguido reconstruir o perfil do “Bom professor”. Eu tive mais a impressão de que existiam vários tipos de “Bom professor” e que cada comportamento que havíamos identificado – por exemplo, retomar os conhecimentos prévios – era uma estratégia de um “Bom professor”, mas ele poderia ao mesmo tempo ter muitas outras estratégias, sem que eu soubesse. Na verdade, eu não poderia reconstruir um perfil único do que seria um “Bom professor”. Eu dizia a mim mesmo que isso era como as partes do quebra-cabeça dentro de um saco, os comportamentos são como as partes do quebra-cabeça e eu não sei se dentro do saco há apenas partes dispersas que pertencem a um único ou a diferentes perfis de “Bom professor” sem reconstituir a totalidade de qualquer um deles. Então, com a evolução que se passou depois deste tempo, com os trabalhos que foram realizados sobre o Ensino Explícito, é que nós podemos dizer que agora temos um perfil integrado do “Bom professor”, daquele que se utiliza de estratégias para fazer os alunos aprenderem. Agora dispomos de uma abordagem pedagógica que funciona, de uma abordagem pedagógica integrada que toca por vezes a gestão de aprendizagem e também a gestão da classe. Podemos fazer o Ensino Explícito dos conteúdos e o Ensino Explícito dos comportamentos. A este respeito, eu penso que é uma evolução muito interessante. Isso não quer dizer que esta é a única forma de ensino que pode funcionar. O que sabemos, no entanto, é que esta forma de ensino funciona, é eficaz. Essa constatação pode ser comprovada empiricamente, e eu penso que é algo fundamental para o plano de pesquisa em ensino. A coisa mais interessante trata-se de estratégias formalizadas pela pesquisa e relativamente fáceis de serem aprendidas pelos professores.

Entrevistadora: O Ensino Explícito é uma abordagem pedagógica que se aproxima de qual(is) corrente(s) de pensamento?

Gauthier: O Ensino Explícito encontra sua fundamentação na psicologia cognitiva. Ao longo dos anos 1970, os trabalhos de pesquisadores norte-americanos começaram a versar sobre a observação de professores em sala de aula. Como já mencionei anteriormente, observamos que algumas práticas de ensino estavam associadas a uma melhor performance dos alunos, contudo não sabíamos realmente os motivos. Nós sabíamos que existiam relações entre os fenômenos, mas não sabíamos a razão. A psicologia cognitiva no seu desenvolvimento dos últimos anos, particularmente com o trabalho de Jonh Sweller [3], permitiu fornecer um quadro teórico para compreender por que algumas abordagens pedagógicas, como o Ensino Explícito, funcionam e por que outras não. O motivo é que quando a Memória de Trabalho fica sobrecarregada, o aprendizado não pode ocorrer. Lembremo-nos que a Memória de curto prazo, também chamada de Memória de Trabalho, tem pouca capacidade de reter informações e funciona durante pouco tempo, antes de se tornar sobrecarregada. A teoria da carga cognitiva de Sweller diz que a Memória de Trabalho do aprendiz torna-se rapidamente sobrecarregada, por isso é necessário dividir, separar o saber para aprender em partes mais simples, para assegurar que a Memória de Trabalho possa absorver e transferir esta informação corretamente para a Memória de longo prazo, onde elas serão organizadas. Numa exposição oral o professor fala sem parar. Num dado momento, a capacidade de escutar de seus alunos torna-se limitada porque a Memória de Trabalho torna-se completamente sobrecarregada. Então, o que Sweller nos diz é que nos interessa separar o saber em partes mais simples, para dar sequência a esse saber do mais simples ao mais complexo e, dessa maneira, poderemos conseguir facilitar a aprendizagem dos alunos. Nesse sentido, a psicologia cognitiva se afasta muito do construtivismo, que é a ideologia pedagógica da moda nos últimos anos aqui no Quebec, mas também no restante do mundo. Embora o modelo por projeto possa ser interessante, a verdade é que para os alunos, especialmente para os alunos com dificuldade, a aprendizagem se torna ainda mais complicada no modelo por projetos do que no modelo de aprendizagem cuja sequência é bem gradual.

Entrevistadora: O senhor poderia nos expor as principais características do Ensino Explícito?

Gauthier: Para começar, de um ponto de vista muito geral, poderíamos dizer que o Ensino Explícito visa “tornar explícito o que é implícito”. É um pouco óbvio, mas neste momento ainda tem sua importância. Isso significa, por exemplo, para o professor, explicitar desde o início da lição seus objetivos de aprendizagem, o que ele quer que seus alunos aprendam. Isso deve estar claro para o professor que ensina, mas também para os alunos, para que eles saibam o que se espera deles. Tornar explícito o que é implícito também significa que os alunos não chegam em sala de aula com a mente vazia. Eles chegam cheios de conhecimentos, conhecimentos precisos e conhecimentos errôneos. Para alguns conteúdos, o professor deverá tornar explícitos os conhecimentos que os alunos já possuem; ele faz o que chamamos de recordar os conhecimentos prévios a fim de mensurar a precisão e a solidez. Se ele quer ensinar um novo saber que se baseia nos conhecimentos já ensinados no mês anterior, ele deve retomar a consciência, tornar esse saber explícito. Ele poderá, então, verificar se os alunos o dominam suficientemente ou não. Se eles ainda não o dominam, ele deverá retomar este conteúdo antes de ensinar novos conteúdos. Tornar explícito também significa utilizar uma tripla estratégia de apoio: a modelagem, a prática guiada e a prática autônoma. Para que seja mais explícito, o professor executará a operação para seus alunos: nós dizemos que ele deve no início “conectar um alto-falante na sua mente”. Se, por exemplo, ele faz uma multiplicação, vai raciocinar o processo da multiplicação em voz alta diante dos alunos ao fazê-la. Ele pode fazer a mesma coisa com a concordância verbal ou com as correções gramaticais. O primeiro momento, muito importante, é tornar explícito seu pensamento para resolver uma operação – é o que chamamos de etapa de modelagem. A segunda etapa é a prática guiada. Uma vez realizada a modelagem, o professor vai colocar os alunos em situação de prática ou de exercício e acompanhará de perto a realização da atividade. Contrariamente ao ensino tradicional, não é “eu explico alguma coisa, coloco os alunos no trabalho e corrijo as atividades enquanto os alunos estão trabalhando”; ao contrário, quando os alunos estão sob prática guiada, o professor vai estar atento, observando constantemente os alunos no que estão fazendo: ele vai, desse modo, verificar se compreendem, vai perguntar aqui e ali para ter certeza de que não há nenhum mal-entendido comum entre muitos. Se ele percebe que a metade da turma não compreendeu, vai re-ensinar o conteúdo, não deixará os alunos continuarem a praticar os mesmos erros que cometeram. A prática guiada é importante para que o professor saiba se os alunos compreendem. Enfim, o Ensino Explícito visa desenvolver um bom nível de autonomização e gradualmente os alunos trabalham sozinhos de maneira autônoma. O Ensino Explícito implica, então, no treinamento. Há vários anos, nós pensávamos que o exercício, o treinamento, era alguma coisa negativa. A expressão inglesa Drill and Kill representa bem esta ideia. Archer [4] disse em contrapartida: Drill and Skill para mostrar que a prática desenvolve também habilidades. Nesta perspectiva, podemos pensar nos atletas, nos artistas, nos músicos, não importa quem quer desenvolver uma competência, deve treinar; o treinamento é uma característica do Ensino Explícito. Uma outra característica do Ensino Explícito é dar apoio aos alunos para que avancem na aprendizagem. A modelagem é uma forma de apoio, a prática guiada igualmente estrutura o ensino do mais simples ao mais complexo. Em inglês nós chamamos scaffold. O scaffold é como a construção de um edifício: no início colocamos uma moldura para apoiar a estrutura e, à medida que o cimento seca, removemos as molduras. Da mesma maneira o professor no Ensino Explícito, no início vai apoiar os alunos, vai lhes ajudar muito: ele pode fornecer listas de palavras, lembretes, listas de etapas para não serem esquecidas; depois, progressivamente, ele vai remover o suporte para chegar ao estágio onde eles são capazes de fazer tudo sozinhos.

Entrevistadora: O Ensino Explícito tem a particularidade de aumentar a eficácia da prática de ensino? O senhor poderia nos explicar como você define o ensino eficaz?

Gauthier: A eficiência no ensino se traduz pelos melhores resultados dos alunos. Sabemos também que o sucesso do aluno tem efeitos sobre outras partes de sua pessoa, incluindo o sócio-emocional, por isso não é exagero dizer que o desempenho acadêmico leva a uma melhora na autoestima dos alunos. É mais fácil desenvolver a estima de si dos alunos tornando-os bem-sucedidos academicamente do que o inverso, ou seja, tentar trabalhar a autoestima dos alunos sem que eles tenham sucesso no plano escolar. Em suma, como uma criança poderia ter uma boa estima de si se ao sair do ensino primário ela não sabe nem ler, nem escrever, nem contar?

Entrevistadora: Professor Gauthier, é sabido que todos os alunos não aprendem na mesma velocidade e que hoje, de acordo com a realidade escolar, os professores estão rotineiramente sobrecarregados pela multiplicação de tarefas que devem fazer. Na sua visão, como o Ensino Explícito pode contribuir para o sucesso dos alunos diante desse tipo de situação? Como em um determinado contexto, em uma realidade escolar, você pensa que o Ensino Explícito pode trazer elementos adicionais?

Gauthier: Várias pesquisas e experiências tratam sobre a pedagogia diferenciada. Nós temos examinado isso e estamos convencidos de que na maior parte do tempo os trabalhos que falam da pedagogia diferenciada são mais do tipo prescritivo ou exortativo do que científico. Nós ficamos um pouco surpresos com isso porque pensávamos que existia uma base de pesquisa empírica mais forte para sustentar a pedagogia diferenciada, que é uma abordagem amplamente prescrita e difundida. Nós percebemos, igualmente, que as definições variam e que nem sempre existem avaliações sistemáticas sobre o impacto dessa abordagem sobre a aprendizagem. E, finalmente, nunca sabemos exatamente do que se está a falar quando falamos de pedagogia diferenciada. Abordamos a questão da diferenciação de outra forma, a partir do modelo “1, 2, 3”, no início do trabalho do Ensino Explícito em aula com todos os alunos (Nível 1). Este primeiro nível de intervenção é, na realidade, uma medida preventiva para a utilização de uma abordagem do Ensino Explícito em sala de aula, para favorecer a aprendizagem de todos os alunos (em torno de 80%). Contudo, como esse primeiro nível não pode garantir a aprendizagem de todos os alunos, é preciso, então, implementar intervenções de segundo nível para os 15% dos alunos que estão com dificuldade. Estes últimos podem se beneficiar de um ensino adicional em subgrupos na sala de aula. Enfim, os 5% que ainda possuem dificuldade recebem um Ensino Explícito e intensivo fora da sala de aula. Este modelo “1, 2, 3” é uma maneira de diferenciar a pedagogia, mas no âmbito da instrução explícita. O Ensino Explícito não é a solução perfeita, mas é a melhor abordagem pedagógica disponível para abordar este problema da diferença de aprendizagem entre os alunos.

Entrevistadora: Existe um princípio em educação que deseja que todo o ensino formal seja avaliado. Quais são as especificidades na avaliação no programa do Ensino Explícito?

Gauthier: Existem dois elementos que eu gostaria de colocar em evidência. O primeiro é o princípio do alinhamento curricular. O alinhamento curricular significa que o que está previsto no currículo deve ser ensinado em sala de aula e depois avaliado. Nós não avaliamos o que não foi ensinado; avaliamos o que foi ensinado e ensinamos o que foi previsto no currículo. Este alinhamento entre o currículo, o ensino propriamente dito e a avaliação é importante. Cada um teve em seu percurso escolar, em um determinado momento, aqueles professores que avaliaram outra coisa além do que ensinaram. O que tornou, então, impossível para a maioria dos alunos responderem corretamente, porque eles não receberam a instrução necessária para atender à avaliação. Em segundo lugar, é preciso mencionar que no Ensino Explícito utilizamos a avaliação somativa e formativa. Sobre isso o Ensino Explícito não traz nenhuma novidade. Salientamos constantemente a importância da avaliação formativa como forma de procurar regularmente as informações sobre o que o aluno sabe ou pensa e, assim, reafirmar que a fim de adaptar o ensino para melhor assegurar a aprendizagem é possível utilizar a estratégia da diferenciação “1, 2, 3”. A avaliação somativa tem lugar em termos de aprendizagem e permite saber se os alunos estão sendo bem sucedidos ou não, e em qual proporção. Permite também que se tome as decisões administrativas acertadas no final do ano ou do semestre escolar. As modalidades de avaliação somativa e formativa estão presentes no Ensino Explícito como em outras formas de ensino. Em suma, existem três elementos para lembrar: o alinhamento curricular, a importância das avaliações formativas para os ajustes na rota e a avaliação somativa a ser realizada no final do percurso.

Entrevistadora: Vários pesquisadores apontaram a influência do meio socioeconômico sobre a formação dos alunos. Contudo, muitas pesquisas sobre o “efeito professor” não consideram estas variáveis. Quais são as vantagens do Ensino Explícito para os alunos menos favorecidos?

Gauthier: Eu gostaria de acrescentar uma nuance à sua questão. O Ensino Explícito leva em conta a questão do nível socioeconômico no sentido de procurar neutralizar os efeitos negativos dos meios socioeconômicos desfavorecidos. Eu me explico: as observações realizadas nas turmas de meios socioeconômicos equivalentes nos permitem verificar que alguns professores, em situações relativamente semelhantes, são capazes de fazer seus alunos aprenderem mais do que seus colegas docentes em semelhantes meios socioeconômicos. Então, a questão que se coloca é: O que fazem estes professores? O que os diferencia daqueles que possuem alunos menos bem sucedidos?

As nossas observações têm mostrado que algumas estratégias utilizadas pelos “melhores professores” eram as mais apropriadas para os alunos desses meios. Os alunos precisam de mais apoio de scaffold e o Ensino Explícito se caracteriza precisamente pela sustentação, do tipo: a fragmentação do conteúdo complexo nos seus elementos mais simples, a modelagem, a prática guiada, e outras formas já indicadas. Esses elementos de apoio convêm para todos os alunos, mas especialmente para os alunos com dificuldade de aprendizagem que precisam de mecanismos de apoio intensivos.

Entrevistadora: Nessas condições, quais são os pontos importantes a modificar na formação dos professores?

Gauthier: Nós fizemos, nos últimos vinte anos, muitas mudanças na formação dos professores, aqui no Quebec, como também em muitos países. Eu penso que a formação dos professores está muito mais próxima do exercício real da profissão, ou seja, de seu contexto. Por exemplo, a proporção de tempo dado aos estágios em sala de aula tem aumentado; os cursos de gestão de classe fazem, igualmente, parte dos programas de formação. Antes a abordagem era mais teórica. Nós tínhamos um curso sobre Piaget, como na minha época, mas convenhamos que não se pode fazer muita coisa com Piaget numa turma, embora seja uma personagem importante na história da educação. Uma vez que a gente pensa um pouco na ideia dos estágios em desenvolvimento, isso não vai muito longe, no plano operacional, como orientação a um professor com os seus alunos. Eu acho que depois dos últimos vinte anos nos aproximamos mais da formação do ensino no contexto real, naquele em que o trabalho do professor se desenvolve. Contudo, a formação dos professores tem ainda um impacto fraco sobre o desenvolvimento de competências profissionais usadas para favorecer a aprendizagem dos alunos. Em outras palavras, a formação de professores não permite aos que são formados realmente trabalhar de maneira competente com os alunos. A formação continuada, ao contrário, tem um impacto maior. Então, a minha explicação para este fenômeno é que não ensinamos nas Faculdades de Educação adequadamente como ensinar. Isso mostra como comportamentos e estratégias pedagógicas ou didáticas – e isso é quase generalizado no Quebec e em outros lugares – referem-se a abordagens construtivistas que estão centradas na descoberta de algo que, na realidade, somente atingem a mais improvável das situações em salas de aula. Na verdade, os alunos não descobrem, ou descobrem muito pouco, e nós tentamos nas faculdades de educação formar os futuros professores para que utilizem abordagens construtivistas que, praticamente, não podem ser aplicadas em sala de aula. Os alunos se desenvolvem mais facilmente em um quadro mais estruturado, como aquele proposto pelo Ensino Explícito. Uma consequência de nossa reforma na formação de professores, no Quebec, foi a multiplicação de cursos de didática. De acordo com o que pode ser observado, os didáticos são quase todos construtivistas, de tal modo que a ideologia construtivista é onipresente nos programas de formação. Esta abordagem de ensino não é verdadeiramente eficaz, ou, mais precisamente, ela é útil apenas para uma pequena proporção de alunos – para aqueles que podem operar em uma situação de descoberta – enquanto que o professor tem que trabalhar com um grupo muito maior de alunos com dificuldades. Em suma, a razão pela qual a formação de professor não tem impacto é porque não formamos os professores com boas estratégias para fazer com que os alunos aprendam.

Entrevistadora: Pesquisadores norte-americanos identificaram práticas eficazes a partir de observações de professores experientes, mas os professores no início da carreira ainda não possuem experiência e, portanto, ainda não são capazes de criar estratégias para serem realmente eficazes em seu ensino. O que o senhor pensa sobre isso?

Gauthier: Eu faço uma ligação com o trabalho de meu colega Maurice Tardif que, há muitos anos, fez uma pesquisa na qual entrevistou professores. Ele lhes perguntou, entre as questões, como haviam desenvolvido seus conhecimentos na sua profissão, na sua formação na Universidade ou como professor? A grande maioria dos professores responderam que não foi a formação recebida que lhes permitiu desenvolver sua perícia, ao contrário, foi por meio de tentativas e erros, através da experiência no trabalho. Eu penso que ainda hoje isso é verdade, salvo que agora nos beneficiamos com muito mais informações sobre as boas práticas pedagógicas que podem ter efeitos positivos sobre a aprendizagem. Então, por que não as integrar na formação inicial imediatamente para que os futuros professores aprendam a utilizá-las nos seus estágios de formação para o ensino, ao invés de esperar que eles as descubram ao longo de anos de experiência? Se a formação quer ser relevante, é necessário que ela permita reduzir o tempo de aprendizagem de comportamentos ou de estratégias pedagógicas eficazes. Se nós formamos durante quatro anos [5] os jovens que se destinam ao ensino e no final deste processo conclui-se que não aprenderam nada ou que vão aprender com a experiência, eu diria que é preciso fechar as faculdades de educação! Mas isso seria um erro porque nós dispomos agora de resultados de pesquisas interessantes sobre as boas práticas pedagógicas. É preciso simplesmente integrá-las nos currículos de formação e fazendo isso vamos melhorar o desempenho de futuros professores.

Entrevistadora: A introdução do Ensino Explícito terá um impacto sobre os currículos escolares?

Gauthier: Com a reforma nos anos 2000 no Quebec, o currículo das escolas foi elaborado numa perspectiva construtivista. Foi proposta a integração de anos de ciclos de aprendizagem, primeiro ao segundo, terceiro ao quarto, quinto ao sexto, desenvolvendo-se as competências por meio dos projetos. Os manuais foram construídos em torno de projetos. Um Ensino Explícito vai funcionar melhor numa divisão por anos, 1, 2, 3, 4, 5 e 6 com objetivos determinados para o final de cada ano. A organização dos conteúdos é estruturada do mais simples ao mais complexo. Então, a meu ver, sobre o plano do currículo um Ensino Explícito pode ter também um impacto importante.

Entrevistadora: Conforme sua visão existem fatores que poderiam interferir na introdução do Ensino Explícito no currículo?

Gauthier: Sim. O que acontece agora é que assistimos ao fim do construtivismo nas escolas. Este discurso, que há longo tempo foi dominante, está morrendo e se desagrega pouco a pouco. O Ensino Explícito está ganhando força. Por quanto tempo? Eu não tenho a menor ideia. No entanto, eu não penso que isso seja um modismo. Na base do Ensino Explícito existe a ideia dos dados provados, que as estratégias pedagógicas apresentadas antes foram validadas pela pesquisa, o que não é o caso do construtivismo. Nesse ponto, eu penso que isso ajudará o Ensino Explícito a permanecer por um certo tempo. Outras razões militam a favor do Ensino Explícito – trata-se de estratégias que não são difíceis de serem aprendidas pelos professores. É muito menos complicado do que trabalhar com projetos pedagógicos. Ademais, estas são estratégias que não exigem materiais sofisticados; nós podemos utilizar o Ensino Explícito nos contextos econômicos mais pobres, com poucos recursos. Esses elementos me fazem crer que o Ensino Explícito pode ter uma certa duração. Mas como a educação é um meio fortemente ideológico, é inútil explicar ou dar provas a quem não quer ouvir nada. Como dizia Jean Chall, mesmo se há cinquenta anos as pesquisas mostram que a abordagem global, o whole language, para a aprendizagem da leitura não fornece bons resultados, não é necessário ter 10 anos suplementares de pesquisas, a questão mais importante é: o que faz com que as pessoas continuem acreditando nela? Isso é porque nós estamos na ordem da crença. Então, o que poderia talvez prejudicar, a meu ver, o Ensino Explícito ou a sua difusão são aqueles que são absolutamente refratários a esta abordagem e que permanecem a fazer o de sempre, mesmo que os dados mostrem que o Ensino Explícito produz bons resultados.

Entrevistadora: Para o senhor o Ensino Explícito no nível da formação de professores é difícil de ser transmitido?

Gauthier: Eu penso que não, ao contrário. O Ensino Explícito é fácil de ser aprendido porque ele se apoia sobre as estratégias que os professores experientes utilizam em sala de aula. Os estudantes em formação inicial observaram, em um momento ou outro no seu percurso escolar, os seus professores utilizarem essas estratégias. Não existem novidades, há professores que já utilizam essas estratégias, tais como as da modelagem, as da prática guiada ou as do uso dos conhecimentos prévios. A aprendizagem dessas estratégias não é nada muito complicado. Em alguns aspectos o Ensino Explícito se assemelha ao ensino tradicional, mas não se confundem. O Ensino Explícito é muito melhor do que o ensino tradicional. Esta abordagem possui uma série de limitações – por exemplo, um professor faz uma exposição oral mas não verifica o nível de compreensão que seus alunos possuem, ele apenas fala como se tudo o que ele tenha dito fosse retido na mente dos alunos, tal como ele havia dito, o que não é absolutamente o caso. O importante é questionar os alunos, para saber o que eles compreenderam, para identificar aqueles que realmente entenderam e os que não.

Entrevistadora: Até aqui as grandes correntes pedagógicas, que nasceram de alguns homens que foram pensadores, ou filósofos, ou pesquisadores em psicologia, deram uma orientação a todos os pedagogos e professores. O senhor não pensa que hoje em dia existe uma mudança de paradigma, com o Ensino Explícito que busca o ator dos comportamentos que são eficazes, e não estaríamos mais numa corrente pedagógica, mas em atividades eficazes que, postas juntas, programam o ensino?

Gauthier: Eu acho que o que há de interessante no que se produz agora é a contribuição da pesquisa empírica para tentar isolar algumas estratégias que funcionam no ensino. É o que Raymond Bourdoncle [6] chama de “profissionalismo”, ou seja, a formalização de ações profissionais, gestos que são executados no contexto real da profissão. Por meio da pesquisa nós conseguimos isolar os comportamentos eficazes, boas práticas, e o ensino tornou-se pouco a pouco “analógico”. Outras profissões formam seus profissionais para realizar essas ações que são identificadas como eficazes. Neste momento podemos dizer que o saber coletivo é compartilhado por todos os atores de uma mesma profissão. É o que não temos ainda na educação. Nós temos pensadores e pedagogos que escreveram (Freinet, Montessori, Paulo Freire, Neill, etc.) e foram colocados em muitos aspectos prescritivos, sem se dispor de evidências empíricas sobre a eficácia do que afirmaram. Eles provavelmente tinham um senso prático e intuitivo muito elevado, mas sobre o plano de evidências da eficácia de seus dispositivos, não mensuraram muita coisa. Eles persuadiam, eles tinham grande carisma, treinaram as pessoas a seguir seu rastro. Isto teve sua importância, mas, a meu ver, não fundamos uma profissão a partir de crenças; uma profissão funda-se a partir de estudos precisos e rigorosos sobre o efeito de ações realizadas, a eficácia dos gestos profissionais dos atores, para integrá-las, em seguida, na formação, de modo a obter um saber profissional compartilhado. Um saber compartilhado limita a autonomia profissional. A meu ver, um profissional não faz aquilo que quer, um profissional é responsável por utilizar os melhores meios para cumprir com sua função. No que concerne ao ensino, o profissional deve utilizar os melhores meios para fazer com que os alunos aprendam. Ele não pode utilizar qualquer meio, deve utilizar somente os melhores meios para que os alunos aprendam, é a sua responsabilidade como profissional. Da mesma maneira, um médico não pode tratar da fratura de um braço de qualquer forma, ele deve seguir um protocolo com as melhores práticas para reparar o braço; o médico, mesmo tendo sua autonomia profissional, possui uma autonomia limitada por um saber coletivo compartilhado da sua profissão. Eu vejo da mesma forma o ensino. Não podemos mais ensinar a ler conforme a abordagem da Whole Language porque já foi comprovado que não funciona. Eu não vejo por que os professores devem aceitar, como grupo profissional, que uma abordagem pedagógica que não funciona, ou não funciona bem, seja utilizada para ensinar. Com o tempo nós vamos, provavelmente, descobrir melhores estratégias, o Ensino Explícito não é o fim do percurso. Existirão outras abordagens que vão, sem dúvida, emergir; outras estratégias que vão, sem dúvida, ser implementadas. Contudo, elas terão que passar por testes que mensurem a sua eficácia. A medida, a meu ver, é o nosso amuleto contra os excessos; é preciso proteger os alunos, senão a porta estará aberta para qualquer coisa entrar, não importa o quê!

Entrevistadora: Como o senhor disse há pouco, o Ensino Explícito não é contra as abordagens de ensino. Em outras palavras, ele pode possuir elementos que provêm de professores que adotam correntes construtivistas, ou outras.

Gauthier: Há vários anos eu examinei os tratados da pedagogia do século XVII. Os trabalhos são muito interessantes. Eu lembro que no prefácio de “A conduta das escolas cristãs”, o trabalho pedagógico almirante dos Irmãos das Escolas Cristãs estava escrito para expressar o tratado que tinha reunido todas as estratégias dos melhores professores. Havia sido solicitado aos melhores Irmãos professores que, a partir de seus saberes da experiência, descrevessem como trabalhavam em sala de aula. Foram reunidas as estratégias desses professores experientes, o que resultou em “A conduta das escolas cristãs”. Estas práticas de saber-fazer foram utilizadas durante séculos. Muitas foram questionadas no final do século XX e outras estratégias foram ajustadas, algumas se mantiveram e outras desapareceram. Na verdade, para além das divergências das escolas construtivistas versus não-construtivistas, o principal a ser lembrado é que o teste de eficácia é que diz tudo. Se ele mostrar que a estratégia utilizada permite facilitar a aprendizagem, então simplesmente ela merece ser conservada.

Entrevistadora: Os Organismos Internacionais e Organizações não-governamentais (ONGs) também produzem programas educativos para apoiar os países em desenvolvimento. No Brasil, como o senhor sabe, estas políticas são muito influentes. Conforme o senhor, o Ensino Explícito é conhecido ou reconhecido por estes organismos no momento atual?

Gauthier: Eu penso que não. Existe um discurso dominante, o discurso do construtivismo, e as ONGs propagam este discurso e o reproduzem. Em pesquisa que estamos realizando sobre o discurso pedagógico dos Organismos Internacionais, nos demos conta da utilização de expressões, tais como “abordagem centrada no aluno”, “pedagogia ativa”, “desenvolver as competências” – termos gerais que são usualmente entendidos por todos. Ora, estes termos são habitualmente traduzidos pelos Organismos Internacionais por meio da ideologia construtivista e produzem uma série de consequências sobre o plano das estratégias de ensino preconizadas. Eu acredito que é um problema para os países que recebem ajuda destas organizações, pois são prescritas abordagens pedagógicas difíceis de serem aprendidas e que necessitam de condições especiais para sua aplicação. Por exemplo, trabalhar com abordagens por descobertas requer professores qualificados e experientes. Do mesmo modo, são necessários recursos materiais, número adequado de alunos por turma, condições de trabalho, coisas que não necessariamente os países possuem. Nesse contexto, propor abordagens por descoberta torna-se uma aberração. É preciso funcionar de outro modo e, a meu ver, o Ensino Explícito é mais fácil de ser aprendido, custa menos e produz melhores resultados. Cada professor pode introduzir no seu repertório pequenas estratégias do Ensino Explícito, seu repertório pode gradualmente ser ampliado, de modo que ele possa pensar o que é possível de se fazer. Pouco a pouco ele acrescenta estratégias sobre o plano da gestão da classe ou sobre o plano da gestão da aprendizagem. Certa vez uma pessoa me disse “eu não pensava que o ensino era tão complicado!” E não é, na realidade! Mas, ainda existem dezenas de pequenas estratégias que um professor eficiente mobiliza. Roma não foi construída em um dia!

Submetido em: setembro de 2014
Aprovado em: dezembro de 2014


Notas:

[*] Andressa Aita Ivo é atualmente Bolsista de Pós-Doutorado – DOCFIX na Universidade Federal de Santa Maria. Graduada em Educação Física, Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) em 2007. Especialista em Gestão Educacional (UFSM) em 2008. Especialista em Educação Física Escolar (UFSM) em 2008. Mestre em Educação pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) em 2010. Doutora em Educação (UFPel) em 2013. Contato: dessaaita@gmail.com.

[**] Marie Pierre Dencuff é professora da Universidade Laval de Quebec – Canadá, atualmente realiza seu Pós-Doutorado na Faculdade de Ciências de Educação da Universidade Laval, junto ao Centro de Pesquisa Interuniversitária sobre formação e trabalho docente (CRIFPE). Mestre em Comunicação pela Universidade Montpellier da França em 2000. Doutora em Educação pela Universidade de Provence da França em 2010. Contato: mpdencuff@gmail.com.

[1] A acadêmica Andressa Aita Ivo – hoje doutora em educação – realizou um ano de seu doutorado na Universidade Laval de Quebec – Canadá, sob orientação de Clermont Gauthier, junto ao Centro de Pesquisa Interuniversitária para a Formação e a Profissão Docente (CRIFPE).

[2] O ensino educacional no Quebec é composto por quatro etapas, o Ensino Primário, com duração de seis anos; o Ensino Secundário, com duração de cinco anos; o Colegial, com duração de três anos na modalidade técnico integrado, e de 2 anos na modalidade de formação preparatória para a Universidade; e a Universidade cuja duração dos cursos varia entre três e quatro anos.

[3] Foi consultado com proveito: Sweller, J.; van Merrienboer, J.; & Paas, F. (1998). Cognitive architecture and instructional design. Educational Psychology Review, 10, 251-296. Ver também: Sweller, J. (2003) Evolution of Human Cognitive Architecture, In The Psychology of Learning and Motivation, Volume 43. Brian Ross (eds.). San Diego: Academic Press. Do mesmo modo, Sweller, J.; Kirschner, P.A.; Clark, R.E. (2006). Why Minimal Guidance During Instruction Does Not Work: An Analysis of the Failure of Constructivist, Discovery, Problem-Based, Experiential, and Inquiry-Based Teaching, Educational psychologist, 41(2), 75–86.

[4] Archer, A.L.; Hugues, C. A. Explicit Instruction. Effective and Efficient Teaching. Guilford Press (2011).

[5] No Quebec os cursos de Licenciatura têm a duração de quatro anos.

[6] A quem se interesse pelo tema ver BOURDONCLE, R. La professionnalisation des enseignants: analyses sociologiques anglaises et américaines. Revue Française de Pégagogie, Paris, n. 94, jan./mar. 1991; BOURDONCLE,R. La professionnalisation des enseignants: les limites d’um mythe. Revue Française de Pégagogie, Paris, n. 105, 1993; BOURDONCLE, R.; MATHEY-PIERRA, C. Autour du mot profissionalité. Recherche et Formation, Paris, n. 19, 1995. 

***

Leia mais em O declínio da escola tradicional

Leia mais em Edith Stein e a educação



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Introdução à Logica Clássica

Robert Fludd, Tomus secundus, 1619-1621

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Tempo de leitura: 32 minutos.

Apresentamos o Prefácio e Preliminares do livro Elemento de Filosofia 2: A ordem dos conceitos: Lógica menor, de Jacques Maritain, tradução de Ilza das Neves, revisão por Adriano Kury. 13.ed. Editora Agir, 1994.


PREFÁCIO 

I

Ao compormos estes elementos de Lógica, esforçamo-nos para distinguir com cuidado o que pertence à Lógica propriamente dita, cujo objeto é o ser de razão: as intenções segundas do espírito (intenciones secundae), e o que pertence à Crítica, que é uma parte da Metafísica e tem por objeto o próprio ser real em sua relação com o espírito que conhece. Esta discriminação é um trabalho bastante delicado - pois muitos problemas oscilam entre as duas disciplinas - e entretanto muito necessária - pois é preciso antes de tudo manter as ciências na linha exata do seu objeto formal.

Por esta razão preferimos reservar para a Crítica várias questões geralmente estudadas nos tratados de Lógica, em particular na Logica Major, por exemplo a discussão (metafísica) do nominalismo e do realismo, as controvérsias referentes à natureza da ciência e do conhecimento vulgar, a ordem do nosso conhecimento intelectual, o valor dos primeiros princípios e a maneira pela qual os conhecemos, etc., finalmente a questão da classifica­ção das ciências (pois em primeiro lugar é preciso saber o que é a ciência e o que ela representa antes de classificar as ciências, e compete ao sábio, isto é, ao metafísico, ordenar as ciências); nesse caso mesmo, a questão dos métodos das diversas ciências, que não pode ser estudada convenientemente sem haver determinado antes o objeto e o valor das mesmas, ficaria também reservada para o tratado de Crítica.

Tirando, desse modo, da Lógica Maior (Logica Major) muitos materiais que lhe são estranhos, pudemos restituir-lhe várias questões que na verdade lhe dizem respeito, e que na maior parte dos manuais escolásticos sobrecarregam inutilmente a Lógica Menor (Logica Minor, Lógica formal). Graças a esta redistribuição geral, em que procuramos sempre nos conservar fiéis ao espírito de Aristóteles e dos antigos escolásticos, esperamos, ter conseguido certas vantagens pedagógicas de clareza e precisão, podendo apresentar os problemas da Lógica e da Crítica em uma ordem suficientemente natural de complexidade e de dificuldade crescentes.

Sendo estes problemas bastante áridos em si mesmos, devido ao seu alto grau de abstração, certos professores hão de pensar talvez que para comodidade do ensino seria conveniente quebrar a ordem normal indicada na Introdução (1º Lógica Menor e Maior; 2° Cosmologia e Psicologia; 3° Crítica como primeira parte da Metafísica...) e substituí-la na prática pela ordem seguinte, que permite tratar da Lógica Maior somente quando os alunos se tivessem familiarizado bastante com a abstração filosófica e por outro lado fizessem estudado suficientemente a parte científica do programa, a fim de ter alguma experiência do raciocínio dedutivo e indutivo e alguma compreensão das alusões e exemplos a que o Lógico deve recorrer.

1º Lógica Menor (que se torna mais curta e mais fácil pelo plano que adotamos).

2º Cosmologia e Psicologia.

3º Lógica Maior.

4° Crítica.

Em conseqüência resolvemos dividir em duas partes, que aparecerão separadas, o segundo fascículo (Ordem dos Conceitos ou Lógica) e o quinto fascículo (O Ser enquanto ser ou Metafísica­) do nosso manual, de modo a publicar em três seções separadas a Lógica Menor, a Lógica Maior e a Crítica, permitindo assim a cada um agrupar as matérias do curso segundo a ordem que mais praticamente lhe parecer melhor.

Talvez esta Lógica encontre alguns leitores mesmo fora do público das escolas, como aconteceu com a nossa Introdução Geral. "O abandono dos estudos lógicos", escrevia Renouvier em 1875, "atingiu na França um tal grau que a teoria do juízo é tão pouco estudada como a do silogismo, e se o estudo das Matemáticas e até certo ponto o do Direito não tivessem trazido algum remédio a este mal, poucas seriam as pessoas instruídas capazes de manejar a recíproca por exemplo, e que não se habituariam a semear sua conversa de paralogismos grosseiros" [1]. Desde a época em que apareceram essas queixas, aliás muito justas, muito mais numerosos foram os espíritos que compreenderam a necessidade de um retorno ao estudo da Lógica, para a restauração da inteligência. Muito nos alegraremos se o nosso modesto trabalho puder contribuir com sua parte para este retorno benéfico. "Estou convencido" dizia Stuart Mill [2] a respeito da Lógica, "que nada pode contribuir mais do que ela, quando dela se faz uso judicioso, para formar pensadores exatos, fiéis ao sentido das palavras e das proposições­, preservando-os dos termos vagos, frouxos e ambíguos. Aconselham muito o estudo das Matemáticas para chegar a este resultado: ele não é nada em comparação ao da Lógica. Com efeito, nas operações matemáticas não se encontra nenhuma das dificuldades que constituem verdadeiros obstáculos para um raciocínio correto (por exemplo, em matemática, as proposições são apenas universais afirmativas; além disso, os dois termos são reunidos pelo sinal $=$, donde a possibilidade imediata da conversão pura. e simples, etc.)... No entanto, muitos homens, aliás capazes, não conseguem elucidar uma idéia confusa e contraditória, por não se terem submetido ao estudo desta disciplina..."

II

Permitam-nos ainda duas observações. Em primeiro lugar, como já dissemos no prefácio da Introdução Geral, mas convém repetir para evitar qualquer mal-entendido, a presente obra destina-se a principiantes. Continua, pois elementar e não tem pretensões a ser absolutamente completa no que diz respeito especialmente à riqueza de referências documentárias e de textos citados. Entretanto, como deve conservar, na exposição filosófica, seu caráter científico, constituirá um verdadeiro tratado, encerrando portanto mais do que pedem em geral os programas. Mas todas as explanações que comportarem alguma dificuldade ou que servirem apenas para esclarecer melhor certos pontos de detalhe, serão escritas em caracteres menores; além disso marcaremos com um asterisco todos os parágrafos cujo estudo não é de estrita necessidade à preparação do exame.

Em segundo lugar, há um ponto sobre o qual julgamos ter sido bastante claro, mas que talvez não tenhamos explicado suficientemente, pois que um crítico de responsabilidade como o R. P. Ramirez [3] pôde a esse respeito equivocar-se inteiramente quanto à verdadeira significação do nosso modo de proceder. Cremos, com o próprio R. P. Ramirez e com a tradição aristotélica, que o estudo da natureza da Filosofia e de sua divisão, assim como de seu valor, só deve ser feito num tratado que respeite a ordem das disciplinas filosóficas, na Metafisica, pois que só ela, a Metafísica, a título de sabedoria, pode julgar a si mesma e os seus próprios princípios, e julgar as outras ciências. E é exata­mente deste modo que pretendemos proceder na presente obra. Se tocamos nessas questões (e em outras mais) em nossa Introdução Geral, é porque esta, segundo o nosso modo de pensar, de forma alguma é uma parte do curso ou do tratado de Filosofia, e por conseguinte nenhuma questão lhe é reservada especialmente. Como seu próprio nome bem o indica, ela precede o curso e o prepara, ficando-lhe inteiramente exterior; desenvolvemo-la exclusivamente por preocupação pedagógica, a fim de auxiliar os principiantes e lhes ministrar uma exposição geral e propedêutica, colocando certos grandes resultados da ciência ao seu alcance do ponto de vista, do senso comum, antes de serem estabelecidos mais tarde de maneira mais aprofundada e mais científica. Eis por que as questões que aqui forem tratadas deverão ser retomadas em seu respectivo lugar nos diversos capítulos do Curso, especialmente na Crítica.

III

A natureza deste trabalho não nos permitiu discutir lon­gamente sobre as diversas teorias modernas de interesse para a Lógica, e com todas as explanações convenientes. Julgamos, no entanto, haver tratado suficientemente das mais importantes, sem prejuízo dos complementos que aparecerão na Lógica Maior e posto suficientemente em relevo os princípios essenciais que dirigem essa discussão. Ficaríamos contente de ter podido mostrar que a melhor maneira de renovar muitos problemas é remontar ao pensamento dos antigos, consultando-os em suas fontes.

Não pretendemos dissimular as imperfeições inevitavelmente inerentes a uma exposição geral e didática como é esta. Se, apesar do cuidado com que foi redigida, escaparam erros, muito reconhecido ficaremos aos nossos leitores que tiverem a gentileza de nos informar.

J. M.

Notas:

[1] CH. RENOUVIER, Essais de Critique générale 2ª édit., 1875, Logique, t. II, pág. 126.

[2] J. STUART MILL, Mémoires, pág. 18.

[3] Ciência tomista, julho-agosto 1922.


LÓGICA (A ORDEM DOS CONCEITOS)

PRELIMINARES

1. PRIMEIRA NOÇÃO DA LÓGICA. - A Lógica [1] estuda a razão como instrumento da ciência ou meio de adquirir e possuir a verdade. Pode-se defini-la: a arte

QUE DIRIGE O PRÓPRIO ATO DA RAZÃO,

isto é, que nos permite chegar com ordem, facilmente e sem erro, ao próprio ato da razão [2]

a) Desse modo, a Lógica não procede somente como qualquer ciência, segundo a razão, mas diz respeito ao próprio ato desta razão; daí seu nome de ciência da razão ou do lógos (λογικὴ ἐπιστήμη) [3]

A Lógica é a arte que nos faz proceder, com ordem, facilmente e sem erro, no ato próprio da razão.

b) A razão não é uma faculdade diferente da inteligência (ou ainda entendimento, intelecto). Mas, do ponto de vista do funcionamento desta faculdade, chamamo-la mais especialmente inteligência quando ela vê, atinge ou "apreende", e mais especialmente razão, quando vai pelo discurso de uma coisa apreendida a uma outra.

2. AS TRÊS OPERAÇÕES DO ESPÍRITO. - Qual é o ato próprio da razão corno tal?

RACIOCINAR.

Raciocinamos quando pensamos por exemplo:

O que é espiritual é incorruptível;

ora. a alma humana é espiritual;

logo, ela é incorruptível.

Raciocinar,

O raciocínio é a operação mais complexa do nosso espírito; é raciocinando que vamos das coisas que já conhecemos às que ainda não conhecemos, que descobrimos, que demonstramos, que fazemos progredir a nossa ciência. A Lógica, que estuda a razão como meio de adquirir a ciência, deve portanto considerar, entre as operações do espírito, antes de tudo o raciocínio. Todavia, há outras operações do espírito que ela precisa considerar. Considera-as, porém, em relação ao raciocí­nio, em função do raciocínio.

ato indiviso

O ato de raciocinar é um ato um ou indiviso, como o ato de dar três passos até o fim. Um, dois, três, chegamos ao fim: contamos três passos, mas nos movemos sem interrupção, num movimento indiviso. Da mesma maneira, raciocinamos com um movimento indiviso. Isto porque não raciocinamos pelo prazer de correr ou "discorrer" de uma idéia à outra, mas sim para concluir, isto é, para tornar evidente qualquer verdade em que nos detemos.

mas complexo.

O ato de raciocinar é contudo um ato complexo; é um ou indiviso, mas não é simples ou indivisível; pelo contrário, é com posto de vários atos distintos ordenados entre si, cada um deles tendo por objeto uma enunciação semelhante às três enunciações do exemplo dado acima, chamadas proposições. Cada um destes atos considerados em si mesmo chama-se um

JUÍZO.

Eis aqui uma outra operação do espírito que é anterior ao raciocínio e por ele suposta.

Julgar,

Julgar é afirmar ou negar. É por exemplo pensar:

A desconfiança

é a mãe da segurança,

ou ainda:

Uma cabeça empenachada

não é pequeno embaraço.

Pelo primeiro juízo afirmamos deste termo "desconfiança" este outro termo "mãe da segurança", isto é, identificamos esses dois termos, dizendo: existe uma coisa uma e a mesma (um mesmo sujeito) à qual convém ao mesmo tempo o nome "desconfiança" e o nome "mãe da segurança".

Pelo segundo juízo, negamos do termo "uma cabeça empenachada" este outro termo "pequeno embaraço".

Pelo juízo, declaramo-nos de posse da verdade sobre este ou aquele ponto. Um homem sábio é um homem que julga bem.

ato simples mas sobre um objeto complexo

O ato de julgar é um ato um ou indiviso como o ato de dar um passo, ou, mais propriamente falando, um ato simples, isto é, indivisível [4]. Assim, o juízo dado acima como exemplo não é uma justaposição de três atos de pensamentos diferentes, - um ato de pensamento para "a desconfiança'', um outro, para "é" e um terceiro para "a mãe da segurança", - mas representam um só ato de pensamento. Todavia, refere-se a um objeto complexo. (proposição fabricada pelo espírito) e assim como um passo é um movimento entre dois termos, entre um ponto de partida e um ponto de chegada, assim também o ato de julgar é um movimento de pensamentos, - traduzido pela palavra "é" - que une duas noções diferentes, expressas pela palavra-sujeito e pela palavra-atributo ou predicado.

Cada uma destas noções corresponde por si a certo ato do espírito chamado concepção [5], percepção ou

SIMPLES APREENSÃO.

Aqui temos uma outra operação do espírito que é anterior ao juízo e por ele suposta.

Conceber é formar em si uma idéia, na qual se vê, atinge ou "apreende" alguma coisa. É pensar por exemplo:

"homem"

ou

"desconfiança"

ou

"infeliz''.

Conceber ou fazer ato de apreensão sobre um objeto simples,

Este ato está evidentemente na origem de todo o nosso co­nhecimento intelectual; eis por que sua importância é capital. Por ele um objeto de pensamento é representado a consideração de nossa inteligência e à sua posse por ela.

Entretanto, este ato de percepção ou de apreensão é tão imperfeito que nos dá sem dúvida um objeto de pensamento discernível em uma coisa, mas sem nos dar, ao mesmo tempo, os outros objetos de pensamento que estão unidos a este na coisa tal qual existe (de uma existência atual ou possível); de maneira que nosso espirito, ficando por assim dizer em suspenso, não tem ainda o que afirmar ou negar. É claro, por exemplo, que se pensamos:

"o homem"

ou

"a neve"

ou

"os delicados",

só temos no espírito uma verdade começada, nosso espírito ainda não fez nenhuma declaração de conformidade com o real; esta declaração só se realiza, só há verdade acabada no espírito, quando pensamos por exemplo (num juízo):

"o homem é mortal"

ou

"a neve é branca"

ou

"os delicados são infelizes",

ou qualquer outra coisa semelhante.

Assim não andamos quando elevamos simplesmente o pé acima do solo; só andamos quando damos um passo.

Digamos por conseguinte que, quando nosso espírito faz ato de simples apreensão, ele se contenta em apreender uma, coisa sem nada afirmar ou negar.

Temos aqui um ato não somente um ou indiviso, mas além disso simples ou indivisível: o ato de pensar "homem" ou "neve" é evidentemente um ato que não comporta partes. Além disso [6], refere-se a um objeto que é ou indivisível em si mesmo (enquanto objeto de pensamento, "homem" por exemplo), ou então pelo menos apreendido da mesma maneira que os objetos indivisíveis, isto é, sem implicar construção edificada pelo espírito. Eis por que se chama ato de simples apreensão.

ato simples sobre um objeto simples.

O ato de concepção ou de simples apreensão é deste modo uma operação primeira, que não supõe nenhuma outra operação intelectual antes dela: não constitui naturalmente o nosso primeiro ato de conhecimento (pois supõe antes dele as operações dos sentidos), mas constitui a nossa primeira operação INTELECTUAL, é a primeira operação do espírito.

As três operações do espírito humano são a simples apreensão, o juízo e o raciocínio.


*3. AS OPERAÇÕES E AS OBRAS DO ESPÍRITO. - o estudo da natureza das operações do espirito e do seu mecanismo íntimo pertence à Psicologia. Observemos aqui que é necessário distinguir

a própria operação ou o ato do espírito, e a obra que o espírito produz em conseqüência dentro de si mesmo [7].

O ato de julgar, por exemplo, é uma operação mental que implica a produção ou a construção no espírito de um certo conjunto de conceitos que denominamos uma enunciação ou proposição. E existe tanta diferença entre o ato de reunir conceitos e julgar, e a reunião construída, como a que existe entre a ação de construir uma casa e a casa construída.

A proposição pensada (reunião de conceitos) distingue-se por sua vez da proposição falada que a exprime por palavras, e que é o seu sinal oral. Existe tanta diferença entre uma e a outra como entre a própria casa e um sinal qualquer que a represente.

Por proposição falada, entendemos tanto a proposição falada realmente, - reunião de palavras emitidas exteriormente - como a proposição falada mentalmente - reunião de palavras formadas na imaginação.

Quanto pensamos, por exemplo, "o homem é mortal", afirmamos aquilo que nos é apresentado pela idéia de homem e aquilo que nos é apresentado pela idéia de mortal. Mas ao mesmo tempo que formamos em nosso espírito esta proposição pensada, imaginamos a proposição falada que a exprime (e às vezes chegamos mesmo a esboçar realmente os movimentos de fonação pelos quais pronunciaríamos essa proposição).

A proposição pensada (reunião de conceitos), evidentemente difere tanto da proposição falada mentalmente (reunião de imagens auditivas ou musculares de sons articulados) como da proposição falada realmente.

Para precisar o sentido dos termos que empregaremos, podemos estabelecer da seguinte maneira o quadro das operações do espírito:





Na primeira coluna deste quadro escrevemos o que concerne aos atos ou operações do espírito; na  segunda o que concerne às obras produzidas dentro do espírito; na terceira o que concerne aos sinais orais e materiais dessas obras espirituais. A linguagem corrente em geral confunde essas três ordens de coisas, porque em muitos casos o que se diz da obra também se pode dizer da operação, e porque é natural ao homem chamar as coisas significadas pelo mesmo nome que o sinal por ser este último mais conhecido. Entretanto um juízo, por exemplo, é um ato vital, uma proposição (pensada) é um organismo imaterial composto de vários conceitos, uma proposição falada é um composto inerte de partes materiais (palavras) justapostas no tempo (proposição oral) ou no espaço (proposição escrita). Estas distinções têm grande importância para a boa compreensão da Lógica.

a) Como veremos mais tarde, Leibniz e certos Lógicos que se inspiram nele tendem a deixar a operação pela obra, e a obra imaterial do espírito pelo seu sinal material.

b) Por outro lado, em sua crítica da inteligência, a escola anti-intelectualista (James, Bergson, Le Roy) confunde não poucas vezes as operações e as obras da inteligência com os sinais materiais que as exprimem.

c) Esta distinção entre o pensamento e os seus sinais materiais, em nenhum lugar é tão bem marcada como em Aristóteles, cuja Lógica tem precisamente por objeto as obras imateriais do espírito, não as palavras faladas ou escritas, e refere-se a estas somente enquanto são sinais daquelas. Cf. Ammonius, in Periherm, f. 19a e 20a: τὰ τε ἐκφωνοὐμενα σὐμβολα εἰναι τίθεται τῶν νοουμένων καὶ τά υραφόμενα τῶν ἐκφωνουμένων.

Para evitar qualquer equívoco, restringiremos aqui o sentido corrente da palavra juízo, empregando-a somente no caso em que se trata da operação do espírito que consiste em dar seu assentimento, e empregando a palavra proposição para designar a obra realizada dentro do espírito, e sobre a qual recai este ato de assentimento. A mesma restrição não se impõe à palavra raciocínio, que empregamos com a linguagem corrente para designar ora só a operação do espírito, ora a obra assim produzida ou argumentação, ora as duas ao mesmo tempo, bastando o contexto para fixar o pensamento.

4. DIVISÃO DA LÓGICA. - Considerando a Lógica antes de tudo o raciocínio, é em relação ao raciocínio que deve ser dividida. Ora, não há duas coisas a considerar num raciocínio, como em qualquer construção e obra de arte? Numa casa, por exemplo, é preciso distinguir os materiais e a disposição que o arquiteto lhes dá: se esta disposição é má, a casa não ficará de pé porque está mal construída; e se os materiais são maus (mesmo quando a disposição seja boa), a casa não ficará de pé, porque foi construída com maus materiais. O mesmo acontece com o raciocínio. É preciso distinguir: 1º, os materiais ideais com os quais se raciocina, é o que se denomina

a MATÉRIA do raciocínio,

e 2.° a disposição segundo a qual estes materiais são reunidos no espírito, de maneira a sustentar a conclusão; é o que se chama

a FORMA do raciocínio.

Em virtude de sua forma o raciocínio é correto ou incorreto; em virtude da sua matéria é verdadeiro ou falso. O seguinte raciocínio

Nenhum homem faz o mal; (I)

ora, este criminoso é homem; (II)

logo, este criminoso não faz o mal, (III)

é correto - a forma é boa, a conclusão é bem deduzida; - mas conclui falsamente, a matéria é má, sendo falsa a proposição I.

Sendo a Lógica a arte que nos permite proceder com ordem, facilmente e sem erro no próprio ato da razão, precisa ocupar-se tanto da forma como da matéria de nossos raciocínios. Daí sua divisão em duas partes: Lógica Menor ou Lógica "formal" (Logica Minor) e Lógica Maior ou Lógica "material" (Logica ma­jor).

Lógica Menor.

A Lógica Menor estuda as condições formais da ciência; analisa ou "resolve", como se diz, o raciocínio nas leis de que ele de­pende do ponto de vista de sua forma, ou de sua disposição [9]; ela ensina as regras a se seguir para que o raciocínio seja correto ou bem construído, e para que a conclusão seja boa relativamente à disposição dos materiais. Um espírito que não se conforma com estas leis formais do pensamento é um espírito inconseqüente. E, como diz a Lógica de Port-Royal, um espírito inconseqüente "não tem garras" para reter a verdade.

Lógica Maior.

A Lógica Maior estuda as condições materiais da ciência; ela analisa ou resolve o raciocínio nos princípios de que ele depende quanto à sua matéria ou ao seu conteúdo [10]; ela mostra a que condições devem corresponder os materiais do raciocínio para que se obtenha uma conclusão firme sob todos os aspectos - não somente quanto à forma, mas também quanto à matéria. - isto é, uma conclusão verdadeira e certa [11].

A Lógica Menor estuda pura e simplesmente o mecanismo do raciocínio, abstração feita do conteúdo mesmo das proposições que ele emprega e do uso (investigação ou demonstração) que o espírito dele faz. É chamada de Lógica Menor (Logica Minor) porque, sendo constituída de regras e de preceitos, é menos longa para se estudar e trata de questões menos árduas. O nome de Lógica formal é mais expressivo, e deveria ser preferido, se não favorecesse um equívoco, pois muitos autores modernos, desde Kant e Hamilton, empregaram a palavra "Lógica formal" em sentido completamente diferente [12]. Os antigos tratavam dessa parte da Lógica no que denominavam as Summulae.

A Lógica Maior, pelo contrário, exige mais desenvolvimento, porque trata das questões mais difíceis, - questões que são também as mais importantes, não só em relação à própria arte de raciocinar, mas em relação aos conjuntos da Filosofia. Este é o motivo pelo qual recebe a denominação de Lógica Maior (Logica Major). Podemos chamá-la também de Lógica material, uma vez que chamamos a Lógica Menor de Lógica formal. Certos tratados modernos preferem o nome de Lógica aplicada, mas este nome pode provocar equívocos e levar a pensar que a parte da Lógica assim designada só trata de "aplicar" as verdades estabelecidas na Lógica Menor, quando na realidade ela é uma disciplina particular que se refere a um aspecto das coisas ló­gicas que a Lógica Menor não considera [13].

Subdivisões da Lógica. Menor e da Lógica Maior.

A Lógica Menor e a Lógica Maior dividem-se naturalmente segundo as três operações do espírito, o estudo da terceira operação, o objeto primeiro da Lógica, supondo necessariamente o estudo das duas primeiras.

Além disso é do domínio da Lógica Maior tratar especialmente da Definição, da Divisão e da Argumentação como instrumento do saber. Convém também que ela termine pelo estudo do objeto e da natureza da Lógica, questão que aliás pertence ao domínio próprio da Crítica, e que a Lógica apenas toma de empréstimo dessa ciência.





ÍNDICE

Prefácio 11

LÓGICA (A ORDEM DOS CONCEITOS)

Preliminares 17

LÓGICA MENOR

CAPÍTULO I - O CONCEITO E A 

PRIMEIRA OPERAÇÃO DO ESPÍRITO

SEÇÃO I. A Simples Apreensão 35

SEÇÃO II. O Conceito 41

                    A. Noção do Conceito 41

                    B. Extensão e compreensão dos Conceitos 46

                    C. As várias espécies de Conceitos 55

                        § 1. Conceitos incomplexos e conceitos complexos 55

                        § 2. Conceitos concretos e conceitos abstratos 57

                        § 3. Conceitos coletivos e conceitos divisivos 59

                        § 4. Extensão do Conceito-Sujeito 60

SEÇÃO III. O Termo 69

                    A. Noção do Termo oral 69

                    B. As várias espécies de Termos 72

                        § 1. Generalidades 72

                        § 2. Nome e Verbo 74

                        § 3. Sujeito e Predicado 79

                        § 4. Extensão do Termo-Sujeito 80

                    C. Propriedades dos Termos na Proposição 81

SEÇÃO 4. A Definição 100

SEÇÃO 5. A Divisão 104

CAPÍTULO II - A PROPOSIÇÃO E

A SEGUNDA OPERAÇÃO DO ESPÍRITO

SEÇÃO 1. O Juízo 109

SEÇÃO 2. A Proposição 120

                    A. Noções Gerais 120

                        § 1. O Discurso em geral 120

                        § 2. A Enunciação ou Proposição 123

                    B. As várias espécies de Proposições 126

                        § 1. Proposições simples e Proposições compostas 126

                        § 2. Proposições afirmativas e proposições negativas 120

                        § 3. Proposições de inesse e proposições modais 135

                        § 4. O Sujeito e o Predicado do ponto de vista da quantidade 139

                    C. Oposição das Proposições 134

                    D. Conversão das Proposições 164

CAPÍTULO III - RACIOCÍNIO

SEÇÃO I. O Raciocínio em geral 173

                    A. Noções gerais 173

                    B. Divisão do Raciocínio 176

                    C. As "Inferências imediatas" 187

SEÇÃO 2. O Silogismo 195

                    A. O Silogismo categórico 195

                        § 1. Noções gerais 195

                        § 2. Figuras e Modos do Silogismo 210

                        § 3. Elucidações e discussões sobre o Silogismo 230

                        § 4. O Silogismo Expositório 258

                    B. O Silogismo condicional 260

                        § 1. Os Silogismos hipotéticos em geral 231

                        § 2. O Silogismo Condicional 233

                    C. Divisão do Silogismo 272

                        § 1. Silogismos demonstrativos, prováveis, errôneos, sofísticos 272

                        § 2. Silogismos incompletos 274

                        § 3. Silogismos oblíquos 275

                        § 4. Silogismos compostos 277

SEÇÃO III. A Indução 283

                    A. O Raciocínio indutivo 283

                    B. Divisão da Indução 303

                    C. O Raciocínio por semelhança 308

APÊNDICE

INDICAÇÕES PRÁTICAS 313

RESUMO 319


Notas:

[1] Cf. J. MARITAIN, Introdução Geral à Filosofia, págs. 102. AGIR S. A. Editora, 17ª ed. 1994.

[2] "Ars directiva ipsius actus rationis, per quam scilicet homo in ipso actu rationis ORDINATE et FACILITER et SINE ERRORE procedat." (S. TOMÁS, in Anal. Post., lib. I, lect. 1.)

[3] Logica vocatur rationalis non solum "ex eo quod est secundum rationem, sed etiam ex eo quod est circa ipsum actum rationis, sicut circa propriam materiam." (SANTO TOMÁS, ibid.)

[4] Ver mais adiante, nº 37.

[5] A palavra concepção designa geralmente apenas a formação da idéia (é neste sentido que a empregamos aqui), se bem que possa designar também a formação da proposição à qual se aplica o juízo.

[6] Ver mais adiante, nº 7.

[7]. "Sicut in actibus exterioribus est considerare operationem, et operatum. putn aedificationem et aedificatum; ita in operibus rationis est considerare ipsum actum rationis, qui est intelligere et ratiocinari, et aliquid per hujusmodi actum constitutum: quod quidem in speculativa ratione primo quidem est definitiosecundo enuntiatiotertio vero syllogismus, vel argumentatio". (SÃO TOMÁS, Sum. Teol. I - II, q. 90, a. 1, ad 2.)

[8] Primeira quanto à ordem lógica e não quanto à ordem cronológica. Ver mais adiante nº 29-a. Dizemos que a definição é a primeira obra da razão porque ela é a primeira obra da inteligência reunindo entre si os conceitos. 

[9] Esta análise ou "resolução" do raciocínio em seus princípios formais constitui o objeto dos Primeiros Analíticos de ARISTÓTELES. Eis por que os escolásticos a chamavam de resolutio prioristica.

[10] Esta análise ou "resolução" do raciocínio em seus princípios materiais constitui o objeto dos Segundos Analíticos de ARISTÓTELES; eis por que os escolásticos a chamavam de resolutio posterioristica.

[11] Para prevenir qualquer confusão, devemos notar que, quando se diz que a Lógica Menor resolve o raciocínio em seus princípios formais (trata-se então dos princípios ou leis que dirigem a forma ou a disposição dos materiais inteligíveis empregados pelo raciocínio), emprega-se a palavra formal num outro sentido do que quando se diz a Filosofia se resolve formalmente nos primeiros princípios da razão, e materialmente na experiência sensível (Cf. Introd. pág. 99). Dizemos simplesmente que os primeiros princípios conhecidos por si mesmos são os princípios que constituem a Filosofia "formalmente" ou em sua essência e que lhe dão sua luz própria, enquanto que a experiência sensível fornece os materiais de onde provém realmente nosso conhecimento intelectual e nos quais a Filosofia se baseia.

Desse modo, os primeiros princípios da razão podem entrar na consideração da Lógica maior ou material, que se ocupa do conteúdo de nossos raciocínios e não unicamente da sua "forma" ou disposição; não deixam de ser sob outro ponto de vista, os princípios formais do conhecimento intelectual e da Filosofia como a alma é a forma que dá vida ao corpo.

[12] Este ponto será examinado na Lógica Maior.

[13] O nome de Lógica aplicada convém antes àquilo que os Antigos denominavam Logica utens. A distinção entre a Logica docens (Lógica pura) e a Lógica utens (Lógica aplicada) será estudada na Lógica Maior.

***

Leia mais em Introdução à Astronomia Clássica

Leia mais em Introdução geral ao Quadrivium (Matemáticas)



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S. Agostinho e os Matemáticos

Santo Agostinho disputando com os hereges, por Vergós Family

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Santo Agostinho e os matemáticos: uma polêmica sobre os astros [1], por Joel Gracioso [2]

Resumo: Durante um período da sua vida, Agostinho envolveu-se com a ciência ou a arte de estudar a influência exercida pelos astros na vida do homem, da sociedade e da própria natureza: a assim denominada astrologia.

No presente artigo pretendemos analisar as razões e os pressupostos que levaram Santo Agostinho a ser um grande crítico dessas práticas.

Palavras-chave: Agostinho, astrologia, matemáticos, providência, destino.

ABSTRACT: During a certain period of his life, St. Augustine get involved with that science, or art, which study the influence of the stars over human life, society, and even nature: i.e., the so-called astrology.

In this paper, we seek to consider the reasons and motives which made the saint bishop of Hippo to become a severe critic of these practices.

KEY-WORDS: Augustine, Astrology, Mathematicians, Providence, Destiny.


Durante um período da sua vida [3], Agostinho envolveu-se com a ciência ou a arte de estudar a influência exercida pelos astros na vida do homem, da sociedade e da própria natureza: a assim denominada astrologia.

Na sua época, os astrólogos ou matemáticos eram vistos como sábios cuja sabedoria estava fundamentada em tratados científicos de origem grega [4]. Transmitiam, assim, com essa imagem de seriedade, certa confiança às pessoas. Eram denominados, também, “homens do horóscopo”, pois explicitavam as influências dos astros sobre o dia do nascimento das pessoas [5].

Segundo Hamman:

[...] é incontestável a influência do zodíaco sobre as antigas gerações. Um epitáfio cristão de uma criança precisa que ela nasceu na quarta hora da noite, no dia de Saturno, sendo, portanto do signo de Capricórnio, o que lhe pressagiava uma morte prematura. Havia calendários, também chamados “listas egípcias”, que eram ao mesmo tempo científicos e religiosos. O homem de negócio ou da terra consultava-os como se fossem um Evangelho, até mesmo para saber se podia se aproximar de sua mulher [6].

Para os astrólogos, a precisão dos ciclos naturais e a sua regularidade indicavam uma presença divina na esfera celeste, enquanto os deuses estavam encarnados em planetas, constelações e astros fixos. Esses, os astros, eram seres pessoais dotados de emoções e atitudes, amando-se ou odiando-se, unindo-se ou em conflito, acarretando conseqüências para a vida humana e todo o cosmos. O sol e a lua tinham uma função predominante, chamando a atenção principalmente pelos eclipses [7].

Em Confissões VII, 6, 8 Agostinho analisa a problemática da astrologia, expondo como resistia obstinadamente aos argumentos de Vindiciano e Nebrídio que procuravam apontar as incongruências dessa técnica de adivinhação. Tentavam mostrar que não há a arte de prever o futuro, mas apenas a obra do acaso, esclarecendo que os astrólogos acertam algumas previsões não devido a uma suposta técnica que conseguiria analisar a posição dos astros e sua influência e determinação sobre os atos humanos, mas apenas por coincidência, por não se calarem. Mas Agostinho ainda não se havia convencido desta tese.

Contudo, a partir de um encontro com um amigo, chamado Firmino [8], que tinha o costume de consultar os astros, o bispo de Hipona conhece um relato que o ajudará a superar as dúvidas sobre a incoerência ou não da astrologia.

Firmino expõe a Agostinho que seu pai e um amigo interessavam-se muito pela técnica dos astrólogos, procurando sempre conhecer mais sobre esse pensamento. A tal ponto chegava o interesse e a aceitação, que observavam o momento do nascimento dos animais domésticos e o relacionavam com a posição dos astros, com o intuito de recolher fatos e argumentos a favor desse pensamento.

Quando a mãe de Firmino ficou grávida dele, uma empregada daquele amigo de seu pai também engravidou. Ora, o pai e o amigo procuraram calcular e registrar tudo, os dias, as horas e tudo o mais, até a ocorrência dos partos, com o objetivo de comprovar a influência dos astros na vida dos homens. Dando a luz as duas ao mesmo tempo, e procurando serem exatos o máximo possível, não perceberam a menor diferença na posição dos astros nem a menor diferença no tempo sendo, portanto, obrigados a compor o mesmo horóscopo para os dois bebês.

Ora, sendo as duas crianças do mesmo horóscopo, deveriam possuir o mesmo futuro. Porém, não foi isso que aconteceu. Firmino, proveniente de família rica, continuou rico e famoso. E o outro, originário de família pobre e escravo, continuou tendo de servir seus patrões.

A partir dessa constatação, Agostinho afasta-se da astrologia, entendendo que, para o horóscopo de alguém ser eficiente, não basta levar em consideração apenas a posição dos astros na hora do nascimento, mas é preciso também relevar fatores familiares, sociais e educacionais, pois, caso contrário, não se acerta o prognóstico. Contudo, a inclusão desses novos elementos não se coaduna com o pensamento dos astrólogos. Logo, a arte de prever o futuro defendida por eles e a racionalidade do mundo apresentada pela sua doutrina, segundo Agostinho, não se sustentam, mas mostram apenas que quando acertam, o fazem por acaso e não por eficiência e coerência de sua técnica e pensamento.

Entretanto, segundo Agostinho, poderiam eles objetar que esse relato baseia-se em fatos imprecisos ou que Firmino teria sido levado ao erro pelo pai. Como inviabilizar tais objeções? O autor das Confissões recorre ao argumento dos gêmeos [9], pois esses ao nascerem, devido ao breve intervalo de tempo entre um e outro, não permitem que se observem alguns detalhes, como os segundos, que seriam importantes para a composição dos horóscopos e previsões. Sendo assim, fica faltando uma certa exatidão aos vaticínios.

Agostinho cita como exemplo o caso bíblico de Esaú e Jacó, que deveriam possuir os mesmos horóscopos, pois apresentavam os mesmos sinais astrais e, por conseguinte, deveriam ter o mesmo futuro. Todavia, não foi isso que ocorreu. Assim, segundo o hiponense, ou o astrólogo efetuava previsões falsas ou, no caso de estar prevendo corretamente, deveria ter prognosticado fins diferentes, apesar dos dados astrológicos serem iguais. Dessa maneira, mais uma vez, Agostinho conclui: é pelo acaso e não pela sua arte que, às vezes, os astrólogos acertam e dizem a verdade. De fato, não são os astros que regem a realidade, mas a providência de Deus, que é imperscrutável ao homem.

Entretanto, qual o lugar e importância, no interior do pensamento agostiniano, da crítica efetiva à astrologia? Se a técnica e o conhecimento dos astrólogos fascinavam tanto Agostinho na sua juventude, por que ele abandonou essa ciência ou arte e transformou-se num crítico feroz?

Na questão 45 do Livro sobre oitenta e três questões diversas (De diversis quaestionibus octoginta tribus), Agostinho inicia o texto apresentando a quem se referiam os antigos quando usavam o termo matemáticos: homens “que investigavam no movimento do céu e dos astros os números dos tempos” [10].

Por essa definição, notamos que os astrólogos eram estudiosos que valorizavam a ciência da terra e do céu, dos números e da temporalidade, procurando obter o conhecimento sobre o cosmos e o seu funcionamento a partir da análise do movimento celeste e da observação sensível. Essa atividade efetuada por eles, capacitava-os a conhecer os segredos da criação, a ordem presente no mundo, a beleza do cosmos e sua regularidade etc.

Ora, a primeira crítica direcionada aos matemáticos por Agostinho refere-se justamente ao conhecimento obtido por eles e sua utilidade. Conhecendo tão bem a criação, não quiseram reconhecer o criador como a felicidade almejada e, além disso, não tiveram humildade suficiente para reconhecer o verdadeiro caminho que é a palavra divina, o verbo de Deus, pelo qual tudo foi criado, pois, movidos pelo orgulho, buscavam no exterior e não no interior, no exame de si mesmo, a ciência necessária para obter a beatitude. Para o hiponense, mais vale uma alma que tem consciência de sua fraqueza e miséria do que aquela que investiga afoita o curso dos astros, pois o conhecimento de si lhe possibilitará a aquisição da humildade e, para, assim descobrir o verdadeiro caminho para o bem supremo [11].

Dessa maneira, o saber obtido por eles torna-se algo estéril e inútil, pois, segundo Agostinho, no processo de retorno a Deus, que vai do visível ao invisível, a alma começa contemplando a beleza das coisas visíveis, reconhece a sua própria superioridade em comparação com essas coisas, mas também admite, devido à sua mutabilidade, que há algo acima dela mesma, a verdade imutável, e fixando-se nela, torna-se feliz [12], porque encontra o criador e senhor de todas as coisas e o verdadeiro caminho da felicidade que é o seu Verbo.

Vemos, assim que, para o bispo de Hipona, o estudo e a análise da criação só são válidos na medida em que a contemplação da beleza das criaturas e o conhecimento delas nos admoestam, nos estimulam para o plano da interioridade e da humildade, pois é aí que o homem encontra o que ele tanto busca. O homem feliz é aquele que possui a Deus e não aquele que possui conhecimentos sobre os astros e o firmamento, mas não está unido ao seu criador.

Num segundo momento, Agostinho apresenta e analisa uma outra figura dos matemáticos, que é mais própria de seu tempo, homens que “querem fazer nossas ações dependerem dos corpos celestes, nos vender às estrelas e receber de nós o preço desta venda” [13].

De acordo com essa concepção, o pensamento e a técnica dos matemáticos parecem anular o livre-arbítrio humano, pois as atitudes e as escolhas do homem estariam submetidas aos astros. Agostinho salienta que o problema está precisamente na valorização excessiva das constelações, do firmamento. Primeiramente, porque os astrólogos, por meio do cálculo e da observação do movimento celeste, distinguem os diversos tipos de constelações, a estrutura do zodíaco (os graus, a divisão das horas em minutos etc.), porém, apesar de toda essa técnica, falham exatamente num ponto fundamental para eles: achar nos astros a mínima divisão do tempo [14], pois somente assim poderiam calcular com exatidão e enunciar a influência das constelações no momento da geração e, por conseguinte, em toda a vida da pessoa.

Através do exemplo dos gêmeos, que já analisamos anteriormente, o hiponense questiona a legitimidade da tese dos matemáticos e a maneira como eles entendem a ordem e a racionalidade do cosmos. Se foram concebidos sob a mesma constelação, qual a causa de tantas diferenças entre eles nas atitudes, inclinações e fatos da vida? Não possuem o mesmo horóscopo e não devem possuir as mesmas previsões e realizações? [15] Contudo, não é isso que se observa.

Para Agostinho, o caso dos gêmeos coloca em dúvida a eficácia da técnica dominada pelos astrólogos, pois exige deles justamente o que não podem oferecer, a divisão dos minutos. Logo, podem possuir uma técnica que possibilita calcular o curso do tempo e prever o retorno regular das constelações, mas não de adivinhar tudo o que acontece com alguém, nem de prever ou determinar as escolhas boas ou más que serão feitas [16].

Todavia, muitas vezes, como lembra Agostinho, as previsões feitas por intermédio dos astrólogos se realizam. Como entender tal fato? O problema é que as pessoas esquecem rapidamente as previsões não realizadas e aquelas que se concretizam, acertam não por causa de um cálculo exato e fatal, mas sim por puro acaso. Dito de outro modo, da mesma forma que um poema contém versos que falam do futuro e por acaso alguns se realizam, assim também uma predição pronuncia algo sobre o futuro de alguém e por acaso se realiza. Em outros termos, parece que para Agostinho, tanto num caso como no outro, descobriu-se antecipadamente os fatos, não graças a um cálculo preciso, mas sim por puro acaso [17].

Entretanto, descobrir algo por acaso seria uma prova de que a realidade, o cosmos, a vida humana é governada por ele? Para responder a essa questão, é necessário, anteriormente, explicitar o que é o acaso. Na Cidade de Deus, Agostinho define o acaso como o que não tem causa ou, se a tem, não procede de alguma ordem racional [18].

Nota-se que, para ele, o acaso nega e impossibilita a existência de uma racionalidade no mundo e na vida, estando mais relacionado ao fortuito e ao caos do que ao cosmos, isto é, com a desordem do que com a ordem.

Isso, assim nos parece, constitui um problema para o autor das Confissões, pois o que ele tanto almejava era exatamente conhecer essa racionalidade ou a lógica do mundo, não sendo sem razão sua atração pela astrologia. Se a abandonou, foi porque viu incongruências na racionalidade do mundo defendida por ela, que não conseguia, por exemplo, dar uma razão para a existência do mal no mundo, assim como o dualismo gnóstico.

Agostinho não concorda que o fim das coisas e a vida do próprio homem sejam uma pura obra do acaso, isto é, que a realidade seja regida por algo irracional ou desordenado, e, por isso, continua a procurar uma explicação racional mais satisfatória sobre o mundo, sua maneira de ser.

Mas então o que governa o mundo e todas as coisas? Segundo Agostinho, a providência divina, que não deixa nada escapar de suas leis, desde as pedras e animais até o homem e os anjos [19].

Ora, em que consiste a providência divina?

De acordo com A. Rascol, Agostinho não formulou uma definição da providência, mas a nomeava constantemente, oferecendo assim, elementos que nos ajudam a compreender o que ele entendia por esse termo. Podemos, dessa maneira, defini-la como “o atributo divino pelo qual a Trindade dirige a ação que exerce sobre toda a criação e que tem por fim a constituição definitiva da Cidade de Deus” [20].

Nessa noção encontramos, primeiramente, a idéia de que a providência é um predicado divino, e como em Deus seus predicados não são distintos de sua substância, pois o ser dele é simples, então a providência é Deus mesmo agindo no mundo e não algo distinto dele do qual ele participasse ou apenas fizesse uso.

Em segundo lugar, vemos que Deus não é apenas transcendente, mas também presente, pois relaciona-se com sua criação e a influencia em todos os sentidos, por exemplo, na hierarquia que há no mundo, nos acontecimentos pessoais e sociais etc., por meio de uma ação direcionada, isto é, ordenada, coordenadora, harmoniosa, e não caótica.

Em terceiro lugar, notamos que a ação de Deus é teleológica e não aleatória e casual, ou seja, possui uma finalidade que é a edificação da Cidade de Deus.

Por fim, percebemos que, para Agostinho, o mundo contém uma racionalidade, cuja origem está numa ação divina livre e direcionada, que é constante. Assim, quando contemplamos o cosmos, principalmente no seu aspecto global, vemos a sua beleza e harmonia; tudo está disposto com medida, forma e ordem, que organizam a estrutura do mundo e das coisas. Algo que não possui medida, forma e ordem, é um puro nada [21].

Entretanto, a providência também não anularia o livre-arbítrio da vontade no homem como o fatalismo dos astrólogos? Para responder a essa questão, voltemos um pouco sobre ao pensamento dos matemáticos e o problema do fatalismo.

Segundo Agostinho, a fatalidade é, na opinião de alguns, aquilo que ocorre por necessidade de uma determinada ordem, prescindindo da vontade de Deus e dos homens [22]. Ora, se essa definição é verdadeira, a anulação da vontade e do seu livre-arbítrio (não só do homem, mas também a de Deus) é apenas conseqüência de um pensamento coerente, pois se há uma instância reguladora, direcionadora e necessária da realidade dentro da própria criação, totalmente independente, então não há como afirmá-la.

Apesar disso, algumas pessoas relacionam ou atribuem a ação providencial à fatalidade, pois entendem que essa nada mais é do que a própria vontade de Deus e seu poder [23]. De acordo com o bispo de Hipona, esse é um procedimento arriscado, pois os homens geralmente entendem por esse termo, em continuidade com o exposto anteriormente, a influência determinante dos astros sobre a geração e o nascimento das pessoas, devendo-se, portanto, efetuar-se uma mudança de vocabulário [24].

Isto posto, vemos que há três maneiras de se considerar a fatalidade. Em primeiro lugar, como aquilo que acontece inevitavelmente, devido a determinada ordem, independentemente da vontade divina ou humana; em segundo lugar, como algo que se confunde com a providência, devendo-se corrigir os termos utilizados; e em terceiro, semelhante ao primeiro, como a influência determinante que a posição das constelações exerce sobre a vida humana, mas com a diferença que, no primeiro caso, tudo ocorre não dependendo em nada da vontade divina ou humana, enquanto no terceiro os astros podem ou não depender da vontade de Deus.

Agostinho entende [25], como já vimos, que a segunda maneira de abordar a questão deve ser corrigida apenas nos seus termos, pois a providência constitui as coisas, mas não de uma maneira fatal e, por isso, detém-se mais em analisar as outras formas, principalmente a terceira.

Segundo ele, dentre os matemáticos, há aqueles que compreendem que os astros interferem nas atitudes e escolhas dos homens, no que acontece de bom e de mal etc., independente da vontade de Deus. Esses não devem nem ser ouvidos, pois a atitude deles leva simplesmente à supressão de qualquer tipo de culto a uma divindade distinta das constelações. Contudo, aqueles que estabelecem e reconhecem uma dependência da posição dos astros para com a vontade de Deus também são condenáveis, e por duas razões.

A primeira delas é o fato de entenderem que é na dimensão das constelações que se estabelecem os crimes que vão ocorrer necessariamente, isto é, a causa dos crimes estaria nos astros pois esses determinam tudo, logo, o homem não pode ser responsabilizado pelos seus crimes. Esse pensamento inviabiliza qualquer tipo de julgamento sobre os atos humanos que poderia ser feito por Deus pois, se os astros determinam tudo, como alguém pode ser recompensado ou punido por um bem ou um mal que não escolheu? [26] Além disso, a culpa cairia sobre Deus, pois ele é o criador dos astros e, por conseguinte, eles só poderiam receber esse poder dele.

A segundo razão está no fato de se dizer que as constelações não fazem sua vontade, mas cumprem aquilo que Deus determinou o que significa afirmar que Deus governa e estabelece tudo por meio dos astros, sendo esses apenas um meio de a vontade e a providência divina se manifestarem. A princípio, isso não parece ser um problema, mas há uma dificuldade, que se encontra na continuação da idéia de fatalidade e negação da vontade e do seu livre-arbítrio. Assim, segundo o bispo de Hipona, se não foi digno pensar e aceitar tal pensamento referente às constelações o será para Deus? [27] Ademais, as conseqüências são as mesmas.

Entretanto, a questão da fatalidade ainda não está encerrada, pois há uma quarta concepção que a relaciona não com os astros, mas com a sucessão de causas que remontam a Deus. Dessa maneira, ela é vista como a conexão e série de todas as causas que determinam o nosso fazer, dependendo da vontade e do poder de Deus [28].

Ora, de acordo com essa definição, quando observamos o mundo, encontramos, aí, uma ordem e um encadeamento de causas que remontam, em última instância, ao criador, o grande ordenador. Dessa maneira, pelo fato de tudo ter uma causa e as causas, num certo sentido, começarem em Deus, a fatalidade, no dizer de alguns, será a própria vontade de Deus, seu domínio universal, pois tudo ocorre conforme o estabelecido por sua vontade. Ora, isso significa colocar Deus como a causa de todo tipo de malefício presente no mundo.

Assim, finalizando essa exposição da análise agostiniana das diferentes concepções filosóficas e cosmológicas que se fundamentavam numa doutrina do fatalismo, percebe-se que o bispo de Hipona não identifica, em nenhuma delas, qualquer relação com a Providência. A Providência, como se disse acima, não nega a vontade e seu livre-arbítrio, mas dispõe tudo de forma ordenada, a fim de que o desígnio de Deus se realize.

Dessa maneira, podemos nos perguntar: será que a vontade humana existe mesmo estando sujeita a alguma necessidade?

A resposta de Agostinho seria sim [29], pois se entendermos por necessidade aquilo que não se encontra em nosso poder, mas que ocorre ainda assim, isso não anula a vontade nem nega a sua existência, porque, quando quero algo, é preciso que haja a vontade e, quando não quero também é preciso, pois, caso contrário, não quereria, ou seja, o próprio ato de não querer seria uma evidência da sua existência.

O que é preciso, conforme o autor das Confissões é distinguir entre a capacidade de querer (vontade) e a capacidade de realizar o que se quer (poder). Nem sempre a vontade “pode” e, assim, fica sujeita à dependência para com algo maior que ela, mas nem por isso deixa de ser o que é [30].

Pode-se concluir, portanto, que, para Agostinho, a Providência Divina não possui nenhuma relação com as concepções de fatalismo apresentadas. Ela nada mais é do que o próprio Deus agindo, para, por meio dessa ação, governar ordenadamente o cosmos, imprimindo uma racionalidade e uma dinâmica à realidade que não exclui a vontade humana nem a presença do mal no mundo. Diferentemente pensavam os matemáticos, que, conforme Agostinho, queriam, com suas práticas, apenas justificar o pecado [31], e inocentar o homem [32].


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGOSTINHO, A. A Cidade de Deus (contra os pagãos), Parte I. Trad. br. de Oscar Paes Leme. Petrópolis: Vozes, 1990.

______________. A Cidade de Deus (contra os pagãos), Parte II. Trad. br. de Oscar Paes Leme. Petrópolis: Vozes, 1990.

______________. A Trindade. Trad. Portuguesa de Arnaldo do Espírito Santo, Domingos Lucas Dias, João Beato, e Maria Cristina de Castro-Maia de Souza Pimentel. Coimbra: Paulinas, 2007.

______________. Comentário ao Salmos. Trad. br. Monjas beneditinas. São Paulo: Paulus, 1997.Vols. 1, 2 e 3.

______________. Confissões. Trad. Portuguesa de Arnaldo do Espírito Santo, Domingos Lucas Dias, João Beato, e Maria Cristina de Castro-Maia de Souza Pimentel. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2004.

______________. De la natureza del bien contra los Maniqueos. In: Obras completas San Agustín. Traducción de Mateo Lanseros. Madrid: BAC, 1951, vol. 3.

_____________. Les Confessions. Trad. de E. Tréhorel e G. Bouissou. Bibliotèque Augustinienne, Paris: Desclée, 1992, vols. 13 e 14.

______________. Les quatre-vingt-trois questions diverses. Trad. de Péronne, Écalle, Vincent, Charpentier e Barreau. Paris: Librairie de Louis Vivès, 1873.

Bruning, B. De l’astrologie à la grâce. In Collectanea Augustiniana, Mélanges T.J. van Bavel. Leuven: Institut Historique Augustinien, Augustiniana 40-41, pp. 575-643.

Hamman, A. Santo Agostinho e seu tempo. São Paulo: Paulinas, 1989.

Rascol, A. La providence selon Saint Augustin. In: Dict. de Théologie Catolique. Paris: Letouzey et Ané, 1936, v. XIII 1, cols. 961- 984.


Notas:

[1] Texto publicado na Revista Omnia Lumina, v. 02, p. 41-54, 2011.

[2] Professor da Faculdade de São Bento de São Paulo.

[3] Cf. Confissões, IV , 3, 4.

[4] Cf. Hamman, A. Santo Agostinho e seu tempo, Paulinas, 1989, p. 148.

[5] Cf. Idem, Ibidem, pp. 148 - 149.

[6] Cf. Idem, Ibidem.

[7[ Cf. Bruning, B. De l’astrologie à la grace, pp. 582 e 583.

[8] Cf. Confissões. VII , 6, 8 e 9.

[9] Ibidem, VII , 6, 10.

[10] De diversis quaestionibus 83, q. 45, 1: qui temporum numeros motu coeli ac siderum pervestigarunt". Texto segundo a edição dos beneditinos da Congregação de S. Mauro, Paris, 1873. Tradução francesa de Péronne, Vincent ,Écalle, Charpentier e Barreau, Librarie de Louis Vivés, T. XXI, p. 22.

[11] Cf. Trindade IV, Prólogo.

[12] Cf De diversis quaestionibus 83 , q. 45, 2

[13] Ibidem, q. 45, 2 : "vendere stellis, volentes actus nostros corporibus coelestibus subdere, et nos ipsumque pretium, quo vendimur, a nobis accipere." p. 23.

[14] Ibidem. Conferir também Conf. VII, 6, 10.

[15] Cf. Ibidem.

[16] Cf. Bruning, ob. cit. p.596.

[17] Cf. De div. Quaest. 83, q. 45, 2.

[18] A Cidade de Deus, V, I. Tradução de Oscar Paes Leme, Vozes, 1990, p. 190

[19] Cf. Ibidem, V, XI.

[20] Rascol, A. La providence selon Saint Augustin. In: Dict. de Théol. Cathol., c. 962.

[21] Cf. De natura boni, III.

[22] Cf. Cid. de Deus V, I.

[23] Cf. Ibidem.

[24] Cf. Ibidem.

[25] Cf. Ibidem.

[26] Cf. Ibidem.

[27] Cf. Ibidem.

[28] Cf. Ibidem, V , 8.

[29] Cf. Ibidem, V, 10, 1.

[30] Cf. Ibidem.

[31] Cf. Comentários aos Salmos, 140, 9. Paulus, pp. 923- 925.

[32] Cf. Conf. IV, 3, 4.

***

Leia mais em Santo Agostinho e a Educação

Leia mais em O Cristianismo e a Educação Clássica - parte 1



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