Postagem em destaque

COMECE POR AQUI: Conheça o Blog Summa Mathematicae

Primeiramente quero agradecer bastante todo o apoio e todos que acessaram ao Summa Mathematicae . Já são mais de 100 textos divulgados por a...

Mais vistadas

Institutiones, um livro que preservou a Educação Clássica

 

O copista Jean Mielot (1448-68) trabalhando em seu
scriptorium na página de um manuscrito do século XV

Tempo de leitura: 8 min.

O texto abaixo é a Apresentação do livro de Institutiones: introdução às letras divinas e seculares, de Cassiodoro, publicado pelas Edições Kírion, 2018.

APRESENTAÇÃO

Flávio Magno Aurélio Cassiodoro Senador viu a luz deste mundo pela primeira vez por volta de 485 na cidade de Scyllaceum, atual Squillace, localizada nas terras quentes do sul da Península Itálica e beijada docemente pelas águas do Mar Jônio. Quando nasceu, o Império Romano do Ocidente já estava morto e enterrado, e com ele todo aquele período que séculos mais tarde os historiadores chamariam de Idade Antiga. Na segunda metade da década de oitenta do séc. V, a porção ocidental da Europa já se havia tornado uma enorme colcha de retalhos de reinos germânicos que se esforçavam em manter-se de pé sobre os escombros do colossal edifício civilizacional construído pelos romanos ao longo de mais de mil anos.

A Itália dos antigos césares, pátria de Cassiodoro, se encontrava naquele momento sob o domínio dos ostrogodos, de jure subordinados à corte de Constantinopla; de facto, porém, independentes. Em outras palavras, isso significava que os ostrogodos tinham em suas mãos a hercúlea missão de encontrar o tênue equilíbrio entre a manutenção do legado romano (ainda muito vivo na população nativa remanescente) mediante a conservação de diversas instituições e leis do extinto Império do Ocidente, e a preservação dos costumes típicos dos próprios ostrogodos. Falhar no primeiro ponto poderia lançar a península em uma guerra contra Constantinopla, aquela porção do Império Romano ainda muito viva, de conseqüências inimagináveis naquele momento; falhar no segundo seria agir para o progressivo embotamento da própria identidade. A esse caldeirão fervente devemos acrescentar também o ingrediente inflamável da divisão religiosa. Ora, os ostrogodos aderiram em sua maioria ao arianismo, enquanto a população nativa da Península Itálica era majoritariamente adepta da fé católica proclamada com solenidade pelo Concílio de Nicéia em 325. Por cerca de cinqüenta anos os ostrogodos tiveram governantes — como Teodorico, o Grande — que souberam dar bases sólidas à ponte do presente que haveria de unir o passado ao futuro. A partir da década de trinta do séc. VI, no entanto, crises políticas agudas romperam o frágil equilíbrio das coisas e a intervenção inevitável das forças de Constantinopla sepultaram o reino ostrogodo. Cassiodoro não só testemunhou todos esses eventos como também, de certa forma, deixou-se moldar por eles.

Assim como seu pai, Cassiodoro ocupou altos cargos entre os ostrogodos. Sob Teodorico, o Grande, foi sucessivamente questor, cônsul e magister officiorum, isto é, ministro para a política interna. Atalarico, sucessor de Teodorico, fez dele prefeito do pretório da Itália. De suas mãos correram rios de tinta que deram forma a diversas obras nesta etapa de sua vida, entre as quais citamos: Chronica, Historia Gothorum e Variae. As crises que culminaram na eclosão da guerra entre os ostrogodos e o Império Romano do Oriente levaram Cassiodoro à desesperança na política e, por conseguinte, ao abandono da vida pública. Por volta de 545, Cassiodoro fundou nos arredores de sua cidade natal o monastério de Vivarium, destinado a tornar-se o embrião dos centros culturais monásticos da Idade Média. Ali viveria o restante de seus dias, emigrando deste mundo com aproximadamente noventa anos de idade.

No Vivarium, Cassiodoro tomou em suas mãos a tarefa de preservar os monumentos da literatura ameaçados pelos conflitos que percorriam as terras da Itália com a impetuosidade de fogo em palha seca. Assim, foram realizados ali os trabalhos de cópia e tradução de tudo o que se pudesse encontrar de gregos e latinos. Para este fim, criaram-se métodos e estabeleceram-se preceitos rigorosos a fim de que os textos produzidos fossem os mais fidedignos possíveis. A biblioteca que se estruturou no Vivarium tornou-se, como se pode imaginar, verdadeiro tesouro das preciosíssimas jóias do mundo greco-romano. Como uma espécie de prolongamento dessa atividade, instituiu-se naquele local uma escola voltada ao estudo de assuntos sagrados e humanos.

Ora, em decorrência dos trabalhos realizados no Vivarium, o grande engenho de Cassiodoro produziu as célebres Institutiones, que o leitor tem agora nas mãos em uma bela edição traduzida para o português. Escritas em torno do ano de 550, as Institutiones possuíam como objetivo primeiro a instrução dos monges residentes no Vivarium. Entretanto, a posteridade demonstrou que a grandeza das Institutiones não podia ficar circunscrita a este modesto escopo e fez delas uma das obras mais influentes do medievo.

O tratado se divide em duas partes bastante distintas. Na primeira, o autor discorre sobre os livros sagrados e aproveita a oportunidade para tratar de seus principais comentadores, conduzindo o leitor por veredas suaves à introdução daquilo que hoje chamamos Patrística. A mensagem de Cassiodoro é clara: a leitura das Sagradas Escrituras deve sustentar-se na autoridade da Igreja — manifestada, por exemplo, através dos Concílios — e nos comentários dos grandes sábios cristãos. Ademais, o autor salienta que a educação não deve ser vista como um fim em si, mas como um meio que fornece os instrumentos adequados para a reta compreensão das Sagradas Escrituras. Por fim, abordam-se questões referentes à arte de copiar e à ortografia. A segunda parte, por sua vez, versa sobre cada uma das artes que compõem o trivium e o quadrivium, percorrendo, portanto, cada uma das sete artes liberais, consideradas, como já mencionado há pouco, suportes para o estudo da Teologia.

Embora as Institutiones não tenham sido escritas para eruditos e especialistas, Cassiodoro não deixou de empregar em seu texto o melhor do estilo latino de seu tempo. Podemos mesmo conjecturar que talvez o êxito de seu escrito se explique justamente pelo fato de o autor conciliar de maneira magistral a simplicidade didática na exposição dos temas com um bom estilo latino que se empenha em seguir os cânones da literatura clássica. O que não quer dizer que o seu latim não se ressinta aqui e acolá do cenário conturbado e decadente daqueles tempos de incertezas e miscigenação cultural que empurravam a língua latina para províncias cada vez mais distantes daquelas freqüentadas outrora por Cícero, Virgílio e Horácio. Assim, o tradutor de Cassiodoro enfrenta não poucas dificuldades para determinar se tal termo foi empregado em sua acepção clássica ou de acordo com um significado mais recente. Além disso, o uso de termos técnicos e neologismos se torna outro campo minado mesmo para o tradutor mais experiente. Entretanto, nenhuma dessas coisas é suficiente para ofuscar a beleza e a relevância das páginas que logo se abrirão aos olhos do leitor.

Para concluir, é preciso ressaltar que todo aquele que estiver realmente empenhado em resgatar a essência das artes liberais sob um viés cristão não pode de forma alguma ignorar o conteúdo destas Institutiones, verdadeira espinha dorsal de tal projeto pedagógico.

William Bottazzini Rezende
Pouso Alegre, abril de 2018

***

Leia mais em Boécio e Cassiodoro.

Leia mais em Sobre as artes e as disciplinas das letras liberais, por Cassiodoro.


Leia mais em COMECE POR AQUI: Conheça o Blog Summa Mathematicae



Curta nossa página no Facebook Summa Mathematicae. Nossa página no Instagram.




Quadrivium: O Estudo dos Números

Pitágoras de Samos

Tempo de leitura: 8 min.

Quadrivium: O Estudo dos Números por Wagner Jales.

A Matemática é uma das ciências mais antigas que existem e, segundo Boyer está “originalmente centrada nas ideias de número, grandeza e forma”. Os gregos antigos influenciados por Pitágoras reconheciam que “na natureza tudo é número” e consideravam 4 formas básicas de estudá-los; pela Aritmética, Geometria, Música e Astronomia e o conjunto dessas disciplinas foi chamado de Quadrivium que, juntamente com as disciplinas do Trivium, que são: a Gramática, Dialética e Retórica compõem as 7 artes liberais e eram a base da educação carolíngia.

O Quadrivium seria o melhor meio de compreender a ordem do universo, enquanto obra primorosa concebida pelo divino arquiteto” com essa frase Lopes (2014) sintetiza o interesse mais elevado dos pensadores gregos e tal interesse foi herdado pelos medievais cristãos que viam nos estudo dos números, uma maneira de compreensão integral da palavra de Deus contida nas escrituras.

O que é o Quadrivium

Alguns pesquisadores falam que o termo “Quadrivium” aparece pela primeira na obra De institutione arthmetica de Boécio (489 – 524 d.C). No mesmo documento, o monge explica que “se o investigador carece dessas quatro partes [Aritmética, Geometria, Música e Astronomia], não poderá encontrar o que e verdadeiro, e sem essa especulação da verdade nada pode ser retamente sabido […] Este, pois é o Quadrivium”.

A afirmação de Boécio sugere a utilização do Quadrivium na busca pela verdade não através de uma pesquisa experimental, mas através do raciocínio abstrato e da interpretação simbólica dos números. Essa mesma ideia é vista em Isidoro de Sevilha (560 – 636 d.C.) quando o mesmo divide a Filosofia em “especulativa” e “prática”, onde a primeira “Eleva-nos acima do visível tornando possível contemplarmos as coisas divinas e celestiais, as quais só podem ser apreciadas com a mente, pois está acima do corpo”.

A Filosofia especulativa por sua vez é subdividida em “Doutrinal”, “Natural” e “Divina” sendo a primeira, definida pelo próprio bispo como “Aquela que investiga a quantidade abstrata” e é nessa subdivisão que o autor enquadra das disciplinas do Quadrivium.

A Aritmética pode ser definida como o estudo ou teoria dos números; a Geometria como o estudo do número no espaço; a Harmonia (ou Música) que, para Platão, representava o número no tempo e a quarta, a Astronomia/Astrologia, o número no tempo e no espaço.

Com essas definições é possível observar que sem a Aritmética não é possível existir as demais disciplinas e o estudo em sequencia se faz necessário, pois o conhecimento adquirido na disciplina anterior serve de base para o estudo da posterior.

Outra observação que pode ser feita é que a Gramática está para o Trivium assim como a Aritmética está para o Quadrivium; enquanto que a primeira é a base para as “Artes da Linguagem” e sem ela não se avança no Trivium, a segunda é base das “Artes dos Números” e, da mesma forma, sem ela não se estuda as demais.

O Quadrivium em York, e as referências de Alcuíno.

Por não ter produzido literatura especifica sobre o Quadrivium, para investigar quais as bases utilizadas por Alcuíno no renascimento Carolíngio é necessário conhecer a sua historia e seus referenciais.

Alcuíno foi instruído na escola de York e nela, seu maior professor era o Venerável Beda (672 – 735 d.C.). Suas grandes obras se tornaram material didático para a grande escola de York e foram levados por Alcuíno às escolas de Carlos Magno. O venerável é reconhecido por obras sobre Aritmética, Música e Astronomia/Astrologia e em especial por seus trabalhos De Tempurum Ratione e De Natura Rerum.

Na escola carolíngia também se utilizou trabalhos de Plínio, o Velho (23 – 79 d.C.) e Macróbio (390 – 430 d.C.) complementados com traduções romanas de Phaenomena de Arato (315 – 240 a.C.) bem como De Natura Rerum e Etymologia de Isidoro de Sevilha “além das tábuas de contagem (Computus), a tradição irlandesa que foi extensamente consultada”.

Outros autores importantes aparecem no catálogo da biblioteca de Reichenau de 821/822 a exemplo; Boécio sobre Aritmética, Música e Geometria além dos livros de Vitruvius (81 a.C. – 15 a.C.) arquiteto romano que descreveu em um dos seus livros, a proporções ideais do corpo humano.

Em seu texto Dialogus De Rethorica Et Virtutibus, Alcuino descreve um esquema de subdivisões da Filosofia. As disciplinas que formam o Quadrivium estão subordinadas à Física, definida na mesma publicação como Physis naturi ou física natural. Nesta obra, a Aritmética é definida como “a ciência dos números”, dividindo-se em Astronomia e Astrologia, Geometria (conceituada como “a disciplina que mede as distâncias e tamanhos dos corpos”) e Música (definida como “a divisão dos sons”).

O estudo dos números no período de Carlos Magno possuía três diferentes formas; uma forma mais “pura”, próxima ao que chamamos hoje de teoria dos números; uma abordagem aplicada e uma terceira; mais mística e simbólica.

O que se tem hoje de conhecimento de Aritmética, Geometria, Música e Astronomia com certeza é muito superior ao que se tinha há aproximadamente 1.200 anos. Seria inconcebível nos dias atuais abandonar tudo o que se produziu do século IX em diante, mas o que devemos aprender com os medievais é reconhece da presença de uma inteligência superior na natureza.


Referências

ALCUINO – Dialogua De Rethorica et Virtutibus, Opera Omnia, 2 vols. Paris, 1851. (Migne, Patrologia Latina, C, CI).

BOÉCIO, A. M. S. De Arithmetica. Manuscrito. Biblioteca Nazionale Centrale di Firenze. 1872

BOYER, C.B. História da matemática. Tradução de Elza F. Gomide. 2 ed. São Paulo: Edgard Blücher, 1996.

LOPES, J. F. N. S. T. (2014) “A Escola de Chartres e a Tradição do Quadrivium” Cuestiones Teológicas, No 96, Medelim-Colômbia. ISSN 0120-131X. [Disponível AQUI]

MARTINEAU J. (Org) (2014). Quadrivium, As Quatro Artes Liberais Clássicas Da Aritmética, Da Geometria, Da Música E Da Cosmologia. Tradução Jussara Trindade de Almeida – São Paulo. É Realizações. São Paulo, SP.

JOSEPH, M (2008). O Trivium: as artes liberais da lógica, gramática e retórica: entendendo a natureza e a função da linguagem. Tradução e adaptação de Henrique Paul Dmyterko – São Paulo. SP. É Realizações, 2008.

EASTWOOD, B. S. (2007) Ordering the Heavens, Roman Astronomy and Cosmology in the Carolingian Renaissance, BRILL, Leiden – Boston.

Texto disponível no LINK.

***


Curta nossa página no Facebook Summa Mathematicae. Nossa página no Instagram.






Um tesouro perdido da Educação

Tempo de leitura: 18 min.

O texto abaixo é a Apresentação do livro de Didascalicon - sobre a arte de ler, de Hugo de São Vitor, publicado pelas Edições Kírion, 2018. 

APRESENTAÇÃO

O que aqui se oferece ao leitor é uma obra rica e profunda, que por muito tempo constituiu um dos pilares da educação cristã, mas que depois acabou por ser totalmente esquecida. Por esta razão, não podemos simplesmente jogá-la em seu colo sem fazer-lhe a advertência de que este livreto aparentemente obsoleto é na verdade um grande tesouro. O propósito desta apresentação — e também das notas de rodapé ao longo do livro — é propiciar uma absorção mais consciente de seus ensinamentos tão fundamentais, enquadrando-os num panorama mais abrangente da pedagogia vitorina, de modo que os frutos colhidos desta leitura possam ser mais saborosos e nutritivos.

***

A começar pelo autor da obra, podemos afirmar que, se é pouco conhecido o seu nome, menos ainda o são sua vida e sua relevância na história da Igreja e da educação. Já considerado por muitos um dos expoentes da educação, não só cristã, mas ocidental, e um dos maiores teólogos da história, ao lado de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, Hugo de São Vítor reúne em si, harmonicamente, todas as principais potências que um bom cristão pode almejar, como descreve São Boaventura:

“[…] de onde se deduz que todas as Sagradas Escrituras ensinam estas três coisas: a geração eterna e a encarnação temporal de Cristo, a norma do viver e a união da alma com Deus, ou a fé, os costumes e o fim de ambos. Sobre a primeira destas coisas devemos exercitar-nos com afinco no estudo dos Doutores; sobre a segunda, no estudo dos Pregadores; sobre a terceira, no estudo das almas contemplativas. Santo Agostinho ensina de preferência a primeira; São Gregório, a segunda; São Dionísio Areopagita, a terceira. Santo Anselmo segue a Santo Agostinho; São Bernardo segue a São Gregório; Ricardo de São Vítor segue a São Dionísio Areopagita; porque Santo Anselmo se distingue no raciocínio, São Bernardo na pregação e Ricardo de São Vítor na contemplação. Mas Hugo de São Vítor se sobressai nas três” [1].

Qual foi, então, a causa do esquecimento de tão grande doutor? No que concerne à sua obra teológica, o motivo parece claro. Hugo de São Vítor, calcado numa longa tradição de comentadores e estudiosos da Sagrada Escritura, realiza com seu trabalho uma nova façanha: reunir, num único livro, tudo que o cristão deve saber de fundamental sobre os mistérios da fé. Ou seja, tudo aquilo que antes estava disperso nos muitos comentários dos Santos Padres e dos teólogos subseqüentes foi sintetizado numa única obra, com uma unidade perfeita, de tal modo que este tipo de escrito veio a se tornar a nova prática no estudo da teologia: é o que posteriormente se chamará de “suma teológica”. Ele mesmo o descreve:

“Por isto reunimos nesta obra uma suma de todos os mistérios da fé, para que a alma, firmando-se em coisas certas, pudesse conformar-se e unir-se às mesmas em sua intenção, a fim de não ser tragada sem direção e sem ordem pelos vários volumes e lições das Sagradas Escrituras” [2].

Portanto, o que Hugo de São Vítor fez foi nada menos que lançar as bases e o modo de fazer daquilo que São Tomás de Aquino levaria à perfeição. E foi justamente isto o que fez com que o seu De Sacramentis Fidei Christianae deixasse de ser copiosamente lido, dando lugar à Suma teológica de São Tomás de Aquino.

Quanto ao âmbito da educação, seu esquecimento não foi algo individual. Na verdade, toda aquela educação que gerara tantos sábios e santos ao longo de séculos foi progressivamente abandonada devido ao novo esquema educacional centrado nas universidades. Fica evidente logo nas primeiras páginas do Didascalicon que Hugo de São Vítor não visava formar pessoas para desempenharem certas funções — garantidas pelo futuro diploma —, mas para alcançarem o último degrau da Sabedoria, a contemplação, com a qual, segundo ele mesmo, “tem-se um antegosto nesta vida do que será a recompensa futura das boas obras”. Ele visava a uma formação integral que proporcionasse uma união cada vez mais profunda com o próprio Deus, ou seja, algo que não teria Ԃm aqui nesta vida e nem mesmo no Céu, o exato oposto de uma formação que visa à conclusão do curso. De um ponto de vista mais geral, Hugo de São Vítor foi esquecido junto com muitos outros ao passo que a tradição cristã foi perdendo vigência na Europa, dando lugar aos modismos cada vez mais passageiros da modernidade.

Afinal, qual é a origem deste homem e o que ele fez?

Hugo de São Vítor nasceu na Saxônia, em 1096, em uma família profundamente religiosa. Influenciado desde cedo pelo seu tio Reinardo, que era bispo e matinha uma relação muito próxima como Mosteiro de São Vítor, localizado nos arredores de Paris, Hugo convenceu um tio-avô seu de mesmo nome, Hugo, a irem até lá e entregarem suas vidas unicamente a Deus, tornando-se religiosos daquele recente mas já famoso mosteiro.

A fundação do Mosteiro de São Vítor está diretamente ligada à fama, primeiro porque seu fundador quis fugir dela, e segundo porque ele não conseguiu. Guilherme de Champeaux fez seus estudos na escola anexa à Catedral de Notre Dame, em Paris, e ali mesmo continuou sua trajetória, tornando-se padre, bispo e o mais célebre professor da mais célebre escola do início do século XII. Ao chegar ao auge da fama, Guilherme percebeu ser outro o caminho que Deus queria para ele, e fez a inesperada escolha de largar sua cátedra e sua fama para se isolar nas proximidades da capelinha de São Vítor, afastada do centro movimentado de Paris, e viver uma vida ascética e de maior comunhão com Deus, optando por vestir o hábito agostiniano. Porém alguns de seus alunos, sedentos pelos ensinamentos de seu antigo mestre, seguiram-no e o encontraram. No começo tomavam aulas semanais, mas a freqüência foi aumentando, e com ela o número de alunos, e Guilherme viu-se obrigado a tomar uma atitude: por volta de 1108, dando-lhe o nome da capela onde se reuniam, ele funda, com uma escola anexa e sob a Regra de Santo Agostinho, o Mosteiro de São Vítor.

Essa mesma fama atraiu o jovem Hugo, que levou consigo seu tio-avô, o qual acabaria por ser o maior financiador das despesas da grande igreja do mosteiro de São Vítor. (Hoje, infelizmente, a igreja e o mosteiro já não existem, destruídos durante a Revolução Francesa). Lá Hugo continuou os estudos que havia começado em sua terra natal e ordenou-se sacerdote. Em 1125 tornou-se professor da escola anexa ao mosteiro; em 1133, diretor; logo depois, tornou-se também o prior do mosteiro, tendo sido consagrado bispo. Faleceu em São Vítor em 11 de fevereiro de 1141.

“Hugo foi certamente um dos homens mais ilustres de seu tempo por suas virtudes e por sua ciência. Jacques de Vitry, em sua História ocidental, depois de um elogio pomposo da comunidade de São Vítor e dos grandes homens que ela produziu, acrescenta: ‘O mais célebre e o mais renomado de todos foi Hugo. Ele foi a harpa do Senhor, e o órgão do Espírito Santo: um símbolo de virtudes e um símbolo de pregação. Levou um grande número de cristãos à prática do bem pelo seu exemplo e pela sua pia conversação, dando-lhes a ciência pela sua doutrina tão doce quanto o mel’” [3]

É realmente incrível tudo que Hugo fez em apenas 45 anos de vida. Além de todas estas funções, dirigindo tantas almas, ele escreveu inúmeros tratados, livros e opúsculos acerca dos mais variados temas, desde teologia, moral e mística até gramática, pedagogia e geograԂa; sua obra ocupa três volumes da Patrologia Latina de Migne. Em 1154, o cronista Robert de Torigny registrou: “O mestre Hugo escreveu tantos livros que não haveria modo de enumerá-los, de tão espalhados que estão”.

Um dos pontos mais interessantes a ser ressaltado na sua produção escrita, em relação à esfera pedagógica, é que Hugo de São Vítor fazia de fato o que hoje os teóricos dizem ser a grande novidade da educação contemporânea: colocar o foco do processo de aprendizado no estudante. O que hoje parece inovação é, na verdade, um simulacro do que se fez durante séculos, desde Platão até Hugo de São Vítor. Hoje podemos encontrar inúmeros livros que dirão aos professores como centrarem-se no aluno, mas Hugo de São Vítor se dirigia aos próprios estudantes: o leitor-estudante é o interlocutor do Didascalicon. Para Hugo, era absolutamente claro ser o aluno a causa eԂciente do processo de aprendizado. Portanto, o Didascalicon não é um livro sobre como ensinar, mas como aprender; não é sobre didática, mas a própria didática aplicada, uma verdadeira aula, por assim dizer, a todo aquele que procura percorrer este caminho que conduz à Sabedoria.

“Os resultados destes modos diversos de encarar a pedagogia são também diversos. O primeiro, centrado no mestre, tende a tornar-se uma transferência mecânica de conhecimento do professor para o aluno; o segundo, centrado no aluno, tende a tornar-se uma aventura do espírito. A escola centrada no mestre só irá produzir um discípulo melhor do que o mestre por acaso, quando o discípulo, apesar do método utilizado, puder fugir espontaneamente às regras desta pedagogia; a escola centrada no aluno tende a produzir por sua natureza um certo número de alunos melhores do que o mestre. Conseqüência destes fatos é que os professores da escola centrada no mestre são, no que depende da escola, a cada geração possuidores de um nível cada vez mais baixo, enquanto que na escola centrada no aluno a tendência é a oposta.

[…]

Obras filosóficas e sínteses deste porte ainda surgem hoje em dia; mas a diferença é que hoje em dia elas aparecem apesar das escolas, enquanto que na época da Escola de São Vítor e na época em que Aristóteles estudou com Platão elas surgiam por causa das escolas. O tipo de gênio que havia em Newton e em Einstein foi desenvolvido por eles próprios sem que, entretanto, o soubessem desenvolver em seus alunos. Na escola de Platão, o gênio do mestre soube reproduzir-se em Aristóteles, e na de São Vítor o gênio de Hugo soube reproduzir-se em Ricardo, e, menos diretamente, em diversos contemporâneos que reproduziram seu sistema de ensino” [4].

Neste caminho que visa à Sabedoria, a última ciência a ser adquirida é a Ciência Sagrada, que tem na Sagrada Escritura o seu alicerce. Hugo pertence a uma tradição, que começou mais explicitamente com Orígenes, na qual o caminho rumo à Sabedoria está no estudo dos conhecimentos mais profundos da Sagrada Escritura. Assim diz Cassiodoro, a quem Hugo de São Vítor tinha por mestre:

“Esta talvez seja a escada de Jacó pela qual os anjos subiam e desciam, e feliz será aquela alma a quem Deus conceder formar-se na intimidade deste caminho; mais feliz ainda será aquele que nele souber indagar pela inteligência da vida, aquele que, sabendo despojar-se dos pensamentos humanos, souber revestir-se do discurso divino” [5].

Para estes sábios, compreender a palavra de Deus é o caminho mais eԂciente para se unir à Palavra Viva de Deus, o Logos Divino. AԂnal, para Hugo, a filosofia — a amizade com a Sabedoria —, é uma participação na própria Sabedoria Divina, e elas não são duas coisas distintas, mas a mesma inteligência que está no ser de todas as coisas, não sendo contida por elas, mas contendo-as todas.

Muitos especialistas em educação podem achar que este ensino, com esta finalidade e este caminho, é na verdade um tipo específico de escola, adequado para determinados fins. Para Hugo de São Vítor, porém, esta é a verdadeira e única escola: tudo o que não se direcionar à Sabedoria é um simulacro de escola, de aprendizado, uma deturpação do uso da nossa inteligência, a qual nos foi dada por Deus para, acima de tudo, contemplarmos a Ele próprio. “Esta é a verdadeira e legítima finalidade da escola. São as outras escolas, e não esta, que representam um desvio do verdadeiro ideal do ensino”[6].

Por fim, a última advertência que faço ao leitor é que não se espante se o texto às vezes lhe parecer demais sintético ou obscuro. É praticamente impossível em uma primeira leitura e sem qualquer mediação compreender com profundidade os escritos filosóficos deste glorioso período, considerado por muitos o apogeu da educação cristã, e que culminou enԂm em São Tomás de Aquino. Nossa ignorância é tão sobrepujante que a princípio nos parece estarmos lendo algo errado, ou incompleto, ou fora de ordem. Hoje em dia estamos todos, de modo geral, acostumados a uma linguagem rasa e unívoca, que pouco expressa além de nossos sentimentos e desejos mais momentâneos. Quando nos deparamos com uma obra de tamanha densidade (sem esquecer de que ela era voltada para os iniciantes nos estudos), não sabemos sequer por qual caminho seguir a fim de apreender esta luz que brilha para nós como se tivéssemos acabado de sair da escuridão. Sentimos falta de explicações detalhadas, de exemplos abundantes e de clareza nos termos. Mas a clareza que buscava Hugo de São Vítor e seus pares não estava focada nas palavras, mas na própria realidade e na sua compreensão. Se não tivermos isso sempre em vista, jamais compreenderemos o que ele está querendo nos mostrar através de suas palavras.

Que este possa ser o objetivo do leitor com este livro: iluminar sua compreensão do mundo e de sua própria vida; que, além de uma fonte de informações, este escrito seja uma porta que se abre para o aperfeiçoamento cujos frutos são de valor inestimável, como nos diz o próprio Hugo:

“Quem quer que se entregue ao estudo da sabedoria ou da ciência divina conhecerá o fruto de seu aprendizado mais pela experiência do que pelo documento ou conhecimento alheio. Nela a alma possuirá o bem da ocupação honesta, o amparo da meditação, o estímulo da oração e a luz da suprema contemplação. Ali será formada no exemplo da santidade, será instruída no exercício da virtude e se fundamentará no exercício da boa obra. Ali, rejeitado o engano da falsidade, expulsa a malícia da iniqüidade, será conduzida ao verdadeiro e ao perfeito conhecimento da verdade e amor da bondade. Nela será fortalecida, para não desanimar diante da adversidade; será conԂrmada, para não desviar-se na prosperidade, aprenderá a recordar-se do passado e a acautelar-se com o futuro”[7].

Roger Campanhari 
Campinas, junho de 2018.


Notas:

[1] São Boaventura, Redução das ciências à teologia.

[2] Hugo de São Vítor, Prólogo ao De Sacramentis Fidei Christianae.

[3] Monsenhor Hugonin, bispo de Bayeux, Ensaio sobre a fundação da Escola de São Vítor de Paris.

[4] Princípios fundamentais de pedagogia, disponível em cristianismo.org.br/pfp-00.htm.

[5] Cassiodoro, De Institutione Divinarum Litterarum.

[6] Princípios fundamentais de pedagogia, idem.

[7] Hugo de São Vítor, Prólogo ao Simbologia de ambos os Testamentos.

***

Leia mais em Princípios Fundamentais de Pedagogia - parte 1

Leia mais em Princípios Fundamentais de Pedagogia - parte 2

Leia mais em Opúsculo sobre o modo de aprender e de meditar de Hugo de São Vítor.

Leia mais em Hugo e Ricardo de São Vítor


Leia mais em COMECE POR AQUI: Conheça o Blog Summa Mathematicae



Curta nossa página no Facebook Summa Mathematicae. Nossa página no Instagram.



Dúvidas Geométricas

Ilustração do ensino da geometria numa 
tradução medieval de Os elementos de Euclides.
Tempo de leitura: 35 min.

Apresentamos, hoje a cópia de uma carta de Francisco Sanches a Cristóvão Clávio, publicada pelo P. Iriarte no Gregorianum (Revista da Universidade Gregoriana de Roma). É anônima ou, melhor, esconde o nome sob o pseudônimo de Carnéades. Mas não há dúvida ser ela de Sanches. Esta carta deve ter sido escrita, segundo nota o P. Iriarte, por volta dos anos de 1589-1590.

Esta carta também foi publicada em português na Revista Portuguesa de Filosofia, T. 1, Fasc. 3 (Jul. - Sep., 1945), pp. 294-305 e está disponível AQUI e TAMBÉM AQUI

***

Introdução


O talento, excepcionalmente dotado, de Francisco Sanches exercitou-se em quase todos os ramos do saber humano: nas letras e na poesia, logo nos primeiros anos da juventude, e de que ainda conservamos amostras no Carmen de Cometa; na filosofia e medicina, de que nos falam ainda, hoje, as suas principais obras, recolhidas pelo discípulo e admirador Raimundo Delassus; e na matemática. Já Delassus se refere à sua aplicação e gosto por esta última disciplina, e às dúvidas que lhe torturavam a alma, sedenta de luz plena da verdade. «Primus in stadio litterario labor eiusden in Mathematis enituit in quibus quid profecerit, maius non suppetit argumentum, quam obiectiones et ἐρωτήματα super geometricas Euclidis demonstrationes, quae a se primum excogitata, ad Clavium solvenda transmisit: fuit autem Clavius geometrarum rerum suo tempore decus, quibus Clavius satisfacere nititur perhonorifica responsione; sed frustra, ut idem Sanchez existimat, qui eas difficultates molitur in Theonem primarium Euclidis interpretem, et quae in mediis schedis repertae dum medica ipsius tanquam sybillae folia congererentur, iunctae fuissent medicis, nisi institutum operis repugnaret»! (Opera medica, introd. p. 3). Ficamos, pois, sabendo, por este depoimento de Delassus, que ele, ao reunir para a imprensa as obras do mestre, teve sob os olhos toda ou parte da correspondência entabulada entre Sanches e Clávio, e que não a incluiu na sua obra, por não se coadunar facilmente com o objetivo da mesma. E foi pena, porque nunca mais se soube do paradeiro dessa correspondência. Só, em 1940, o P. J. Iriarte — Ag., S. J., grande admirador de Sanches, conseguiu, revolvendo o fundo «Clávio» da Universidade Gregoriana, em Roma, encontrar uma dessas cartas-consultas de Sanches, carta publicada, ainda nesse ano, na conceituada revista dessa universidade, Gregorianum. Supõe, esta carta, uma troca de correspondência entre Sanches e Clávio, bastante ativa. Sanches escreveu, uma primeira vez, comunicando-lhe algumas dúvidas sobre Proclo. Clávio respondeu, e a amabilidade da resposta animou Sanches a dirigir-lhe segunda consulta. Fê-lo, e de novo insiste sobre as mesmas objeções contra Proclo, refutando, de passo, a resposta de Clávio. Não sabemos, se este correspondeu, ainda desta vez, ao apelo de Sanches: «Gratissimum feceris si rescripseris», ser-me-ia gratíssimo receber, de novo, carta vossa. Por fim, o testemunho de Delassus obriga-nos a admitir, pelo menos, uma terceira consulta, em que Sanches representava as suas dificuldades contra Téon, principal comentador de Euclides.

Apresentamos, hoje, aos nossos leitores a cópia da carta, publicada pelo P. Iriarte no Gregorianum. É anônima ou, melhor, esconde o nome sob o pseudônimo de Carnéades. Mas não há dúvida ser ela de Sanches: basta, para isso, olhar um pouco para a letra, papel, estilo, para certas excentricidades que aparecem, aqui e ali, muito próprias do nosso filósofo, e para certos pontos de contato com o Quod nihil scitur.

Esta carta deve ter sido escrita, segundo nota o P. Iriarte, por volta dos anos de 1589-1590, pois Sanches serve-se da segunda edição da obra do P. Clávio, In Euclidis... de 1589.

Resumo: (1-2) Confessa a sua desilusão de encontrar a verdade na física e na metafísica, e por isso acolhe-se à matemática. (3-4) Nem a geometria, nem a astronomia merecem o nome de ciências, por demasiado empíricas. (5-7) Na geometria, mesmo quanto aos princípios, há muitas flutuações e disputas. (8) Assunto da consulta: Proclo, na 14 prop. do liv. I. (9) Desculpa-se de o vir incomodar, mas confessa-lhe que a sua primeira resposta o não satisfez. (10-12) Conveniência em simplificar as provas. (12-16) Inconsistência da resposta dada, com exemplos e discussão. (17) Não pretende impugnar Euclides. (18) Deseja ser ensinado e corrigido; despedida afetuosa.

***

Uma carta de Francisco Sanches a Cristóvão Clávio

+
Ao sapientíssimo e piíssimo varão, o senhor
Cristóvão Clávio [1], Carnéades, filósofo: saúde!


(1) Perante o desespero que, de há muito, se apoderou de mim, de poder descobrir e conhecer a verdade, no tocante às coisas humanas, ilustríssimo senhor, o que me tem acarretado inúmeros trabalhos, tomei muitas vezes a resolução de não me importar mais, nem de combater tantos erros que povoam a terra e que me fazem andar a braços com tantos desgostos, dos quais outro fruto não colhi, que levar uma vida miserável. E sendo a verdade uma só, reta como uma linha, e inúmeros os erros, como uma oblíqua, a maior parte dos homens deixa-se levar do erro, nem pode ser de outra maneira. Não acabo, contudo, de me resignar a esquecer o meu propósito, e milhares de vezes saio da minha trincheira, a ver se consigo descobrir, algures escondida, a verdade. Esforço vão! Que fazer? Deus deu ao homem este triste emprego, como diz o sábio, para que nele se ocupasse! [2]

(2) Buscando eu, outrora, a verdade através da Física e da Metafísica, sem jamais a poder descortinar, alguém me disse ter ela estabelecido o seu pouso entre as coisas naturais e as transnaturais, isto é, na Matemática. Ávida e alegremente acorro; e como o general avisado, ainda que veja as portas da cidade inimiga abertas, não entra temerariamente nela, mas, temendo insídias, manda adiante exploradores, para que tudo sondem e examinem e, ao atacar de surpresa uma província hostil, não deixa, atrás de si, nenhuma defesa ou fortaleza do inimigo, que não destrua e aplane, assim eu, logo ao pôr os pés no átrio das Matemáticas, hesitei, temendo, de todos os lados, desconfiado e suspeito, o dolo. As vantagens foram palpáveis. Sem essa desconfiança, teria caído em terreno minado, qual é o que se cava no campo da Matemática, não tão grande e vasto como no da Física e da Metafísica, mas por isso mesmo mais difícil e perigoso.

(3) Não vou discutir, presentemente, se as disciplinas matemáticas se devem contar entre as demais ciências, o que não ousaria afirmar, pois dependem mais dos sentidos que da razão e, por isso, são mais certas, se algo de certo existe neste mundo. De feito, a verdadeira ciência pretende conhecer, antes de mais, a Deus, depois a Natureza, sua escrava, interna e externamente, ou, no dizer de Aristóteles, conhecer as coisas pelas suas causas. Ora, comparar lado com lado, ângulo com ângulo, figura com figura, o todo com as partes, proporções com proporções, inscrever figuras umas nas outras, investigar finalmente as demais propriedades de ambas as quantidades, pode denotar engenho e agudeza; não é, no entanto, científico.

(4) No que diz respeito, por exemplo, à Astronomia, aumentastes os círculos concêntricos, excêntricos, epiciclos; tecestes ótimas teorias, como sempre o pensamos, sobre a trepidação, número dos céus, que se multiplicam com toda a facilidade, e outras coisas semelhantes, necessárias, sem dúvida, úteis à observação e indicação dos fenômenos, e à conservação da economia eclesiástica. Tudo isto, ótima e firmemente, como vós mesmo o afirmais, procurou corrigir Copérnico, admitindo que a terra era móvel e os céus imóveis, mas partindo de um falso suposto. Nem foge à tua perspicácia, a que nada escapa, quão frívola seja a sagacidade e engenho daqueles que dividem o céu em compartimentos e, contemplando o aspecto dos planetas e astros, atiram o pobre Nero para as pontas do punhal, logo no primeiro momento do nascimento: tão longe vão o furor e a temeridade do engenho humano!

(5) Mas voltemos à Geometria, que deve ser certíssima, pois se serve da régua e do compasso. Há nela, no entanto, muitas fendas, como se vai ver. Não bastam, em repetidos casos, os sentidos. Quando estes falham, recorre-se à inteligência. Ambos, por vezes, quer juntos quer separados, se enganam, sobretudo a razão. Muito me tem servido em tudo o bom senso, ainda desprovido, não digo de razão, mas de qualquer argumento, prova ou demonstração. Há muito de duvidoso na Matemática, não só nos princípios, mas também nos seus desenvolvimentos. Supõe, antes de mais, pontos, duvidando-se se e como existem, e também linhas e superfícies: aqueles, totalmente indivisíveis; as linhas, dividindo-se segundo o comprimento, as superfícies segundo a largura. Admite, por outro lado, como certas, outras coisas, como algumas definições, por exemplo, a de ângulo (na qual não concordais com Peletário [3]; e até nós duvidaremos dela, um dia), e a de proporções (sobre esta discordais vós de Orôncio [4] e de Peletário), bem como de algumas proposições, qual a décima terceira do livro I de Euclides, que vós, com Gémino [5] e Proclo [6], afirmais não pertencer ao número dos axiomas (Proclo, no entanto, ao querer prová-lo, comete uma petição de princípio, como vos julgais, e é mais obscura, aqui e ali, a prova, que o que se pretende provar), e a décima quarta, que o mesmo Proclo demonstra contra a natureza do princípio; enfim, muitas outras coisas, que por brevidade omito, que são obscuras e se prestam a discussão. Parece que, de novo, se admite uma quantidade contínua e indivisível, o ângulo de contingência, contra o que Aristóteles parece e crê ter demonstrado. Mas disto, se me derdes licença, trataremos noutra ocasião.

(6) Sabeis que Aristóteles foi ótimo matemático e conheceu o ângulo de contingência. Conclusão: os matemáticos vêem-se seriamente embaraçados, porque os seus princípios e regras não concordam, com o que se ensina, ao tratar das coisas naturais; e ainda que concordassem, nem por isso seriam mais certos, pois muito do que se ensina, a respeito das coisas naturais, é duvidoso e discutível.

Por fim, há muitos outros problemas, dos quais se duvida com motivo; se não aplicamos com todo o cuidado a força da razão, bastas vezes não atingiremos a meta, ainda mesmo apoiando-nos em demonstrações, como bem o mostrais a Peletário, homem aliás tão douto, a propósito do ângulo de contingência, ou ainda a este mesmo e a Orôncio, a respeito da definição e natureza da proporção. Vedes, pois, quanta perturbação acarreta consigo a ambigüidade de um só teorema: se estremece, virá a terra tudo o que nele se apoia. Tanto importa olhar, bem fundo, aos alicerces do edifício, não aconteça que este, como se dá com um mau pedreiro, apenas acabado de construir, venha a terra.

(7) Vede quão grande seja a miséria humana, e como esta se conjuga, por vezes, com a boa sorte! Acontece, com efeito, erguer-se, mesmo sobre débeis alicerces, o edifício que se pedia; não raro, também, a ciência progride, partindo de princípios absurdos ou obscuros. É o que se dá, precisamente, nos que edificam no mar ou em lugares pantanosos. Arremessam, ao acaso, enormes blocos até à superfície das águas, para de seguida construírem o que pretendem, segundo as regras da arte: assim, também, a Astrologia, de falsas suposições (que há aí de mais falso do que tantos, tão grandes e tais círculos, epiciclos, e inventar tudo o mais ao próprio sabor, idear os céus imóveis, e a terra móvel, crer que toda a terra e todos os mares formam uma esfera, equivalente a um ponto: tudo isto são princípios astrológicos) consegue acertar com as razões dos eclipses e demais coisas celestes. A Aritmética, igualmente, de uma regra, que os Árabes chamam Catain, e nós do Falso [7], deduz o que pretende; do mesmo modo, o dialético, de premissas falsas, conclui, com admirável lógica, por vezes, a verdade; e, finalmente, vós próprio que por meio da linha quadradora, engenhosamente lançada, pondo de parte apenas alguns detalhes, ensinais a realizar a quadratura do círculo. Disse que a Astrologia deduz, com bastante verdade, o que pretende: conheceis, sem dúvida, quanto se tem trabalhado, ultimamente, na reforma do Calendário, onde haverá sempre que melhorar.

(8) Mas já muito faz o homem com pretender aproximar-se da verdade. Eu, quanto está da minha parte, examino tudo, cuidadosa e escrupulosamente, para me ajustar com ela, afastando-me o menos possível [8]. Ora, examinando, um dia, nos vossos doutíssimos e substanciosos comentários a Euclides, a prova de Proclo à décima quarta proposição do livro I, e que há bem pouco vos enviei, pareceu-me que Proclo se enganara no seu raciocínio. Não quero, com isto, menoscabar, por pouco que seja, a estima daquele varão sapientíssimo, e menos ainda a vossa, pois estais acima de toda a crítica ou inveja; o facto, porém, só virá aumentar o vosso renome. Costumam os flecheiros arremessar as seus dardos para o alto, e sucede, convosco e conosco, vós magnates e nós desprezíveis, o que se passa com ricos e pobres. Mais facilmente se anicha certa negligência ou esquecimento nos cantos da casa do príncipe do que aparece no casebre do pobre e, enquanto o rico progride às mãos cheias, o miserável corre atrás de um tostão.

(9) Por isso, não me julguei, por então, bastante digno; passaram já muitos anos, para vos importunar com semelhantes ninharias, pois sabia terdes, entre mãos, importantíssimas questões. Mas sempre venceu o amor da verdade, e a oportunidade. de certo mensageiro, ou até, como sói dizer-se, o influxo não sei de que constelação, ou melhor, um conjunto de circunstâncias, levaram-me a molestar-vos agora, contando já fazê-lo, ainda outra vez, mais tarde. Esta, a desgraça dos grandes homens: serem importunados e perseguidos pelos pequenos, como Hércules pelos pigmeus. Não vos admireis, portanto, ilustríssimo senhor, se eu, um desconhecido de vós e de todos, na ciência e na realidade, vos venha, mais uma vez, interromper, um tanto, nos vossos importantíssimos estudos. Estou certo de que o fareis de boa vontade, dada a virtude que nos atraiu a vós, e a caridade a que vos consagrastes totalmente; concedei-me mais, ainda, este benefício, pois só é tal, quando não espera retribuição, tanto mais que é próprio da vossa religião [9] ou, melhor, de toda a sociedade humana, ligar os homens entre si por meio de obséquios. Respondestes, pois, às dúvidas que se me apresentaram ao espírito contra Proclo, argutamente e em poucas palavras; mais, no entanto, do que esperava. Julgava, eu, ter demonstrado tão claramente o que pretendia, que me persuadi ser impossível, caso não me tivesse enganado, dar-se-me qualquer resposta cabal, e se aquela demonstração fosse de Euclides, desesperaria, de vez, de alcançar a certeza em Geometria, ainda que não confio muito nela, como terei talvez ocasião de o mostrar, mais tarde. Vós, com todo o vosso engenho e sinceridade, procurastes defender o exímio Proclo. Contudo, a vossa douta resposta, não só me não arrancou o escrúpulo, como mais me confirmou nele. Vou, pois, expor a minha opinião sobre isso, em poucas palavras.

(10) Concedeis-me, primeiro, que Proclo podia, como eu afirmo e provo, demonstrar a sua tese com menos palavras, como vós provastes, bem mais brevemente do que Euclides, muitas das suas proposições. Mas, acrescentais logo, isso não é defeito. Eu julgo o contrário, apoiando-me na opinião geral, de que em vão se diz, em longo arrazoado, o que se pode exprimir em poucas palavras; e que é grandíssimo defeito, num mestre, explicar qualquer assunto com grandes discursos, mas confusos, podendo-o fazer claramente em poucas palavras, sobretudo na Matemática, onde, quanto for possível, nós devemos estribar nos sentidos. Por tal motivo, louvo-vos grandemente, porque sabeis ensinar muitas coisas com método e facilidade, nem concordo com o douto Peletário que criticava o aproximar figura a figura, corpo a corpo, ao querer comprovar a mútua igualdade ou desigualdade, como reza o oitavo axioma do livro de Euclides. A minha opinião é, exatamente, a contrária: tudo o que podermos conseguir a olho com o compasso e régua, devemo-lo fazer, sem nos metermos no caminho longo da demonstração, senão no caso dos sentidos falharem; tão avesso sou a grandes, longos e difíceis raciocínios que, por vezes, só tornam mais escuro o que, de si, é claro!

Figura 1


(11) Se tivesse de construir um triângulo equilátero sobre determinada linha AB, contentar-me-ia com abrir o compasso e, medido o comprimento da linha dada, colocá-lo-ia de A a B e de B a C (o mesmo se poderá fazer para a outra parte da linha) e de C a A, até encontrar o ângulo ACB, e uma vez encontrado, o que é facílimo, de um só golpe traçaria o triângulo, sem ter que provar tratar-se de triângulo equilátero, pois o compasso o manifestaria, sendo muito mais fácil acreditar na medida dos três lados, do que na confecção de dois círculos primeiro, para depois traçar os lados.

Figura 2


Do mesmo modo, se tivesse de dividir um ângulo reto, em duas partes iguais, operação que vós ensinais a fazer mais facilmente do que Euclides, traçaria duas linhas iguais AB e AC, e depois a reta AD, que daria origem a dois ângulos absolutamente iguais, provando, deste modo, o que pretende o 8 axioma do livro I, e a 4, 5 e 8 proposições do mesmo, muito mais facilmente do que o faz Euclides no 9 do livro I. Sentimos, contudo, prazer na dificuldade e andamos à cata de desvios, para que nos não taxem de empiristas ou pouco versados na matéria, pretendendo mostrar, pela razão, o que é patente aos sentidos, invertendo assim a ordem das coisas. Muito teria que dizer a tal respeito, o que omito, agora, por brevidade, esperando escrever, sobre isso, em tempo mais oportuno.

(12). Mas, como dizíamos, pouca importância teria o que apontamos, se a prova de Proclo fosse verdadeira. Não o é; ao contrário, é capciosa, como provávamos, quando afirma serem os ângulos ACF e ACE iguais a dois retos.
Figura 3


Respondeis-me, vós, que tais ângulos se devem tomar separadamente, não enquanto um é parte do outro, pois só desta maneira poderão igualar dois retos. Ainda que, na minha escaramuça passada, preveni esta resposta, parecendo-me tê-la refutado suficientemente, de novo volto a ela, para o mostrar mais claramente. Se eu afirmasse que o sapientíssimo Clávio, com a sua cabeça, é Jano de duas caras, haveria alguém que me acreditasse? Suponhamos que tínhamos, ambos, o mesmo pai, e que vos legara, por testamento, duas geiras de terra, equivalentes, digamos, a outros tantos ângulos retos, e a mim me constituíra herdeiro. Ficaríeis satisfeito, se vos desse, apenas, uma medida de terra, equivalente ao ângulo ACF, que na demonstração de Proclo iguala dois ângulos retos? Ora é precisamente disto que tratamos, pois a questão versa sobre Geometria, ou seja, sobre a medida da terra. Se vos vendesse duas geiras de terra por 2.000 dinheiros, sejam estes, como fizemos acima, os dois ângulos retos, ficaríeis contente com os dois ângulos traçados por Proclo? Não de certo; pelo menos, o meu caseiro não aceitaria, por mais que insistísseis na prova. E se, tendo-me emprestado 20, eu vos restituísse apenas 15, apoiando-me neste raciocínio: 15, mais os 5 neles incluídos, igualam 20; ora dou-vos 15; logo, paguei-vos o que devia, admitiríeis semelhante conclusão? E, se quisésseis comprar em qualquer loja, uma certa medida de pano para vestido, seja AB, e vos dessem apenas CD, acrescendo que CD + CE equivalem a AB, não seria demasiado curto o vosso vestido? Não se oculta, em tudo isto, um sofisma?

Figura 4


E, se a Matemática procedesse em tudo, assim, não seria apenas uma disciplina enganadora? Se ACF equivale a ACD + BCD, que haveríamos de dizer do enunciado 9, tão certo: o todo é maior que a sua parte?
Figura 5


(13) Mas, dir-me-eis: o ângulo ACE deve-se tomar separadamente, não enquanto faz parte do ângulo ACF. Mas tal resposta envolve uma contradição, como se dissésseis que se devia tomar a parte não-parte, o homem não-homem. Se eu vos imaginasse distinto do sapientíssimo Clávio, pensaria bem? E, se vos tivesse na conta de ignorante, não seria eu um louco? E, se tirasse ao vosso nome uma letra, bem insignificante e simples, Clávio não se converteria em cravo [10]? Pergunto: quando afirmais que o ângulo ACF equivale a um reto e meio, não compreendeis toda a quantidade contida entre as duas retas AC e CF? Logo, também os ângulos ACE, ECD, DCF, que são partes dela, e todos os demais ângulos que quiserdes traçar nesse espaço. Ora, quando de novo ajuntais ou tomais separadamente o ângulo ACE, onde o ides buscar? Será necessário pô-lo à vossa custa: eu não o consentirei à minha, e muito menos o ângulo ACF à sua.

(14) Mas já nos demoramos demais, numa coisa tão fácil e evidente. E, se isto acontece na lenha verde, que sucederá na seca? i. é, se tanto suamos em provar um problema tão fácil e manifesto, que acontecerá nos mais difíceis e obscuros? Acrescentais, depois, na vossa resposta, que os dois ângulos se devem tomar a seguir. Sabeis que a palavra ἐφεξῆς (a seguir, usada aqui por Euclides, tem, em Aristóteles, outro sentido, querendo significar, não o lugar, mas a ordem. Por isso, preferiria traduzi-lο por: da outra parte, de modo a compreender as linhas BC e BD, que se encontram com o ponto extremo da linha AB, e as linhas EF, e FG, que cortam a mesma reta AB no ponto F. Em todo o caso, acho melhor a expressão: a seguir, do que a que emprega Campano: em volta de si; pois, as duas retas EF e FG fazem, em volta de si, com AB, quatro ângulos ou retos ou iguais a retos. Mas isto pouca importância tem.
Figura 6


(15) É certo que os dois ângulos se devem tomar da mesma parte da reta, transversal à outra. De outra maneira, como demonstrais claramente, ainda que as retas EF e FH façam com AB dois ângulos AFH e EFB, iguais a dois retos, não formam, contudo, uma só linha, porque o ângulo AFH deita para a parte A, e o outro EFB para a parte B. De passo, quero tirar argumento em favor da minha tese. Se o ângulo AFD (este tamanho lhe assinava Proclo), não basta para obter dois ângulos iguais a dois retos, ainda que o dividamos por meio de qualquer reta, devendo acrescentar-se-lhe ou EFB, como vós fazeis, ou AFC, ou BFD, para termos dois ângulos iguais a dois retos, segue-se evidentemente, que o ângulo AFD, ainda que se divida milhares de vezes, jamais igualará dois ângulos retos. Por fim, contra a minha demonstração, em que concluía, que se a prova de Proclo tinha algum valor, se seguiria dela que duas retas CF e FG seriam uma só linha continuada, já que constituíam dois ângulos CFG e CFA (os quais, segundo Proclo, são iguais a dois retos), tirados de um e de outro lado, originando ângulos seguidos, e contudo, como é evidente, não são uma só linha, contra isto, digo, como subtil artífice que sois, apresentastes ótimo subterfúgio e escapatória. Vale, talvez, no foro judicial; não, porém, no da consciência.
Figura 7


Figura 8

(16) Dizeis, de fato, que aqueles dois ângulos se não originam ambos em F (a vossa figura tem outras letras, mas vem a dar no mesmo), sobre a linha AB, pois AFC abre-se sobre a reta AB, mas não CFG. Logo, não se segue que CF e FG devam fazer uma linha. Mas a minha afirmação ou negação, como sabeis, não faz mudar as coisas. Mais: ainda que afirme algo contra aquilo que a coisa é ou não é, a proposição continuará a ser verdadeira ou falsa. Nem qualquer quantidade, de qualquer maneira que a olhardes, ou quaisquer que sejam as figuras ou linhas que lhe inscreverdes, aumentará ou diminuirá, por isso.

Assim, se dividirdes o trapézio ABCD com as retas AC e AE, originando, desse modo, três triângulos, não ficará, por isso, maior ou menor, e o mesmo acontecerá, se traçardes ainda a reta BF, que o dividirá em quatro ângulos e dois trapézios. Logo, quaisquer que sejam as linhas tiradas entre ACF (para, de novo, voltarmos à minha e vossa primeira figura), jamais conseguireis aumentar ou diminuir aquela quantidade. Podereis, sem dúvida, aumentar ou diminuir o número dos ângulos; nunca, porém, obtereis, que aquela quantidade valha mais ou menos que um ângulo reto e mais meio. Mas a quantidade do meu paralogismo (é, verdadeiramente, um paralogismo à imagem da argumentação de Proclo), GCD, é igual, em tudo, à quantidade do de Proclo, ACF. Ora, se a de Proclo equivale a dois ângulos rectos, também com a minha sucederá o mesmo. Nem é necessário, nem Euclides o afirma, que a linha AB se repita duas vezes, uma em cada ângulo, como vós quereis. Mas, concedamos que Proclo tivesse dito assim: o ângulo ACF equivale a um reto e meio, e o ângulo FCD a meio reto; logo, ambos os ângulos ACF e FCD igualam dois retos. Não seria o mesmo e não concluiria do mesmo modo, ainda que a linha AB se não repetisse no segundo ângulo? Logo, o geômetra deve atender à quantidade, não ao traçado de linhas, que outro fim não têm senão fazer-no-la apanhar, mas sem delas depender. Concluís, enfim, que jamais se poderá demonstrar algo contra Euclides, que não há tais paralogismos em Matemática, e que fui eu que me servi de paralogismos.
Figura 9

(17) Mas eu, por ora, nada quis demonstrar contra Euclides, antes só contra Proclo. Aquele, decerto, se hoje vivesse, não defenderia este, nem as suas obras o defendem, pois nelas nada se encontra que se pareça com esta demonstração ou paralogismo de Proclo. Se for necessário demonstrar algo contra Euclides, poderemos, talvez, fazê-lo, não num só lugar, mas em 2 proposições do livro III, e no ângulo de contingência, o qual, ao parecer, não pode ser menor que qualquer ângulo agudo retilíneo ou só em quantidade mínima, contra as afirmações de Aristóteles e do mesmo Euclides 1, décimo (livro). Nem, por isso, seria obrigado a aceitar o parecer de Peletário, homem aliás doutíssimo, que não admite nem tal ângulo, nem tal quantidade. Aos seus paralogismos, respondestes vós, sapientissimamente, dando-lhes tal nome; donde se colhe poderem dar-se, também, paralogismos em Matemática, para não falar de outros, a que se refere Pedro Nunes, grande autoridade em Matemática, no seu livro sobre Orôncio. Mas, se fòrdes de opinião que não se fazem paralogismos assim, e julgardes não ser tal a argumentação de Proclo, pouco me importa o nome, contanto que admitais que a sua prova é insubsistente.

(18) Concedo-vos, sim, que tenha eu usado de paralogismo. Só quis, neste ponto, imitar o paralogismo de Proclo, e consegui-o, se não me engano. Sabeis que, no arguir, muito aproveita mostrar a consequência absurda do adversário, mudando simplesmente a matéria e guardando a forma. Mas quero, concedo, afirmo, ter-me enganado; desejo ser ensinado e vencido; tenho, até, sumo prazer, em descobrir os erros. Pelo que, se alguma coisa tiverdes sobre tudo isto, ser-me-ia muito grato receber resposta vossa. Não procureis saber quem sou: sou, apenas, outro Carnéades, amicíssimo, não da glória vã, mas da verdade e de vós. Adeus. [11]


Notas:

[1] O P. Cristóvão Clávio S. J., alemão por nascimento, veio em 1503, com 17 anos de idade, para Coimbra, cursar, no Colégio das Artes, letras, filosofia e matemáticas, para as quais dava mostras de singular vocação. Em 1550, observou, nesta cidade, o eclipse total do sol, que ele próprio descreve no seu Comentário à Esfera de João de Sacro Bosco. Em 1561, já estava em Roma, onde, no ano seguinte, começou a ensinar matemática no Colégio Romano, com tanta aceitação que lhe mereceu o apelido de Euclides do seu tempo. Cfr. Franc, Rodrigues, A Formação Intelectual do Jesuíta, Porto, 1917, págs, 283-284. De 1569 a 1573, viajou Sanches pela Itália, demorando-se, sobretudo, em Roma, onde deve ter cursado os estudos superiores, e onde conheceu, tratou e talvez, até, foi discípulo de Clávio.

[2] Comparar com o Quod nihil scitur: «Quid igitur nos consumimus? Nescio, Sic fata ferunt. Dedit Deus filiis hominum occupationem hanc pessimam ut in ea occuparentur» (à margem; Ecclesiast. 1).

[3] Jacques Peletier, médico e literato francês, nascido em Mans, em 1517, e morto em Paris, em 1582. Escreveu várias obras sobre geometria.

[4] Orôncio Fine, matemático francês, nascido em 1494, morto em Paris em 1555. Entre outras, escreveu a seguinte obra: In sex priores libros Geometricorum Elementorum Euclidis.

[5] Gémino, astrônomo e geômetra grego, o qual viveu um século antes de Cristo.

[6] Proclo, filósofo grego, neoplatônico, nascido em Constantinopla, em 412; morto em 495, Escreveu, sobretudo, sobre filosofia, e também um comentário ao I livro dos Elementos, de Euclides.

[7] Regra Catain ou do Falso: «Quando proposita aliqua quaestione per numerum solvenda, ponimus quemcumque numerum, qui propositae quaestioni putatur satisfacturus, licet reipsa non satisfaciat, et cum ipso procedimus prout quaestio vult, tandemque quaestionem solvimus, verum ac desideratum numerum inveniendo. Vocatur passim Regula Falsi, non quod falsum doceat, sed quod plerumque ex numero falso verum invenire doceat», Cfr. Gregorianum. Roma, 1940, vol. XXI, pág. 431, nota 39.

[8] Relevamos esta e outras expressões de Sanches, que mostram, de alguma maneira, a sua atitude perante o angustioso problema da verdade. Não nega, de modo nenhum, a sua existência, e é por isso que lança mão de tudo para se aproximar dela, o mais possível, servindo-se, separada e conjuntamente, dos sentidos e da razão, pois, mesmo assim, não atingem por vezes a verdade (cf. n. 5); há princípios que estão fora de toda a dúvida, como «o todo é maior que a sua parte» (cf. n. 12, ao fim), e apesar da sua crítica ao silogismo, no Quod nihil scitur (págs. 9, 11... ed. de 1581), não teme usá-lo aqui (n. 12).

[9] «Societatis vestrae», refere-se à Companhia de Jesus, a que Clávio pertencia.

[10] O trocadilho só dá bem em latim, pois, suprimindo no nome Clavius o i, ficará clavus.

[11] Gregorianum, Roma, 1940, vol. XXI, págs. 422-443.

***

Leia mais: O Matemático Jesuíta Cristóvão Clávio.


Leia mais em COMECE POR AQUI: Conheça o Blog Summa Mathematicae


Curta nossa página no Facebook Summa Mathematicae. Nossa página no Instagram.





Ensinar é uma Arte

O exame da escola - Albert Anker 1862

Tempo de leitura: 3 min.

ENSINAR É UMA ARTE por George Polya (*)

Ensinar não é uma ciência, mas uma arte, Esta opinião já foi expressa por tantas pessoas, tantas vezes que eu me sinto um pouco acanhado em repeti-la. Se, entretanto, abandonarmos a generalidade vulgar e descermos aos detalhes pertinentes poderemos enxergar alguns aspectos da nossa profissão sob uma luz reveladora.

Ensinar, obviamente, tem muito em comum com a arte teatral. Por exemplo, você tem que apresentar à sua classe uma demonstração [matemática] que conhece muito bem, pois já a apresentou tantas vezes em anos anteriores no mesmo curso. Você certamente não pode estar entusiasmado a respeito desta demonstração mas, por favor, não o demonstre à sua classe: se você parecer chateado, toda a classe ficará  chateada. Quando começar a demonstração, finja estar entusiasmado com ela; finja ter idéias brilhantes à medida que prossegue; finja surpresa e enlevo quando a demonstração terminar. Você deve representar um pouco, para o bem de seus alunos, que podem, às vezes, aprender mais através das atitudes do professor do que do assunto apresentado,

Devo confessar que sinto prazer em representar um pouco, especialmente agora que estou velho e muito raramente descubro algo novo em Matemática: costumo sentir alguma satisfação em reviver o modo como fiz esta ou aquela pequena descoberta no passado.

Menos obviamente, o ensino tem algo em comum com a Música. Sabemos, naturalmente, que o professor não deve dizer as coisas somente uma ou duas vezes; mas três, quatro ou mais vezes. Porém, repetir a mesma sentença várias vezes, sem pausa e sem mudança, pode tornar-se muito cansativo e anular seus objetivos. Bem, podemos aprender com os compositores como fazê-lo melhor. Uma das principais formas musicais é a "ária com variações". Transpondo esta forma musical para o ensino, começamos por dizer a sentença na sua forma mais simples; depois a repetimos com uma pequena mudança; depois a repetimos novamente com um pouco mais de côr e assim por diante; final mente retornamos à formulação original simples.

Outra forma musical é o "rondô", Transpondo o rondô da música para o ensino, repetimos a mesma sentença essencial várias vezes com uma pequena ou nenhuma mudança, mas inserimos entre duas repetições algum material ilustrativo contrastante. Espero que na próxima vez que você ouvir um tema com variações de Beethoven ou um rondô de Mozart você pensará num modo de melhorar as suas aulas.

(*) Trecho extraído do artigo "On learning, teaching, and teaching learning" por George Polya, American Mathematical Monthly, 7/0 (1963) pags. 605-619 e também disponível no LINK.

***

Leia mais em: Dez mandamentos para professores, por George Pólya.


Leia mais em COMECE POR AQUI: Conheça o Blog Summa Mathematicae


Curta nossa página no Facebook Summa Mathematicae. Nossa página no Instagram.





Papa Silvestre II - O Papa Matemático

O Ábaco de Gerberto

Tempo de leitura: 12 min.

Abaixo segue a transcrição do vídeo Cromos Medievais - 5 - Papa Silvestre II - O Papa Matemático.

Dois engenheiros [portugueses], Bernardo Motta e Gonçalo Andrade tentam harmonizar os conhecimentos científicos da sua formação básica com a sua Fé Católica. O resultado é uma série de episódios onde apresentam a interação entre estas duas visões do mundo de uma forma integrada.

Será possível olhar para a Fé de forma Racional? Quais os princípios metafísicos da Ciência? Pode um Cientista, ser Católico? São estas e muitas outras questões que vamos analisar nos episódios deste podcast!

Nesta nova rúbrica de mini-episódios dos "Cromos" Medievais, vamos olhar para a vida de vários sábios da Idade Média. Com trabalho em Ciência, Matemática, Filosofia, História ou Teologia, muitas destas personalidades tiveram um papel fundamental no estabelecimento das bases metafísicas da Ciência, permitindo o seu amadurecimento em épocas posteriores.

O vídeo está disponível neste LINK.

Gonçalo Andrade: Sejam muito bem-vindos a mais um episódio do Café Ciência e Fé. Estamos de volta, mais uma vez, com rubrica dos "Cromos" Medievais. Hoje vamos falar de Silvestre II, o Papa matemático. Silvestre II foi um papa, cujo cognome é um pouco usual para um papa. Ele ficou conhecido como o Papa Matemático. Mas quem é este Silvestre II e de onde é que ele surge e como é que ele chegou a papa? É isso que vamos ver no episódio de hoje. 

Bernardo Motta: O Papa Silvestre II nasceu em França com o nome Gerberto de Aurillac no ano 946 e morre no ano 1003. E para o tema que nos traz e para a explicação de porque que ele é conhecido como Papa matemático, importa saber que o seu percurso de estudo foi feito em Barcelona e foi feito nomeadamente num num meio literário e acadêmico que estava mergulhado nos debates e nos temas de matemática, de astronomia e que ainda refletia a influência árabe. Nós já temos comentado nos outros "Cromos" anteriores a importância dos sábios árabes para alguns dos temas da ótica e da astronomia, em particular. Gerberto de Aurillac vai receber a sua educação, vai crescer e vai ganhar os seus conhecimentos neste meio. Por isso, quando o destino leva a ser o Sumo Pontífice, ele traz consigo estas competências nestes meios, nestes temas astronômicos e científicos. Gonçalo, quais são as contribuições científica pelas quais este Papa Silvestre II ficou para a história? 

Gonçalo: Ele teve várias. O fato dele ter sido Papa acabou por contribuir para divulgar muitas destas causas que lhe eram queridas. Uma das coisas que ele contribuiu bastante foi, por exemplo, a adoção da numeração árabe. Os nossos ouvintes certamente estarão familiarizados com esta questão. Mas como sabem a numeração que era utilizada no Império Romano era a numeração romana [I, II, III, IV, etc.], que é muito menos prática de utilizar do que aquela que nós temos hoje com os 10 números o $0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9$ que facilita bastante o trabalho com números. Portanto, este Papa Silvestre II foi um dos principais e um dos grandes impulsionadores da utilização desta numeração árabe que, de fato, é bastante mais prática que a (numeração) romana no dia-a-dia nas contas no geral. 

Também adotou e contribuiu para a adoção de uma série de ferramentas entre as quais o ábaco árabe. Nessa altura foi assim, como a introdução do computador pessoal, portátil. Talvez não dava para consultar as redes sociais no ábaco, mas - imagina - ajudava bastante quando era necessário a fazer contas 

Bernardo: Imagine-se no comércio. Qualquer atividade comercial não podia viver sem um instrumento de cálculo

Gonçalo: [Ele] também contribuiu para reintroduzir a esfera armilar na Europa que infelizmente tinha caído em desuso desde o final da época Romana, mas ele contribuiu para voltar a reintroduzir este importante instrumento na Europa. Além disso, escreveu também várias obras sobre os temas que nós já falamos várias vezes nestes episódios dos "Cromos" e da ciência medieval que são principalmente os temas do quadrivium, em particular, aritmética, geometria, astronomia e a música Portanto, ele escreveu bastante, escreveu várias obras sobre estes temas. No fundo, além de ser papa, acabou por ser um acadêmico muito importante nas cortes em que esteve antes de ser papa e, que quando se tornou Papa, lutou pela introdução de muitas destas inovações ou instrumentos que caíram em desuso e que eram bastante bons. Tentou reintroduzi-los na vida intelectual europeia. 

Bernardo: Podemos imaginar, Gonçalo, o impacto que estas novidades trouxeram para o dia-a-dia em todo o continente ou em todos os territórios que prestavam obediência ao Papa e que eram católicos. Isto foram decisões absolutamente civilizacionais ao introduzir, quer numeração árabe, quer o ábaco, quer a esfera armilar. Já para não falar de lhe ser atribuído (não há muita certeza disso), mas de lhe ser atribuído a invenção ou a introdução, pelo menos, de um relógio mecânico, quase no final do milênio. Portanto, estamos a falar de um Papa que tinha um conhecimento científico naturalmente muito acima da média, muito avançado. E como tu dizias que pelo cargo que ocupou, pode dar um efeito muito profundo aos seus conhecimentos científicos. 

Eu acho que também teria piada para os nossos ouvintes em partilhar aqui alguns detalhes da sua biografia, porque, às vezes, isto ajuda-nos a perceber que nem sempre, raramente em História as causas e as explicações são simples: costumam ser um bocado rebuscadas. E, por vezes, nós vemos quando se discute quem é que preservou o saber dos gregos; como é que esse saber foi preservado e tipicamente extremam-se muitas posições. Há quem diga: "se não fosse os árabes não havia o saber dos gregos, numa época que na Idade Média era tudo trevas e ignorância" que é uma visão errada e extremista. Por outro lado, podemos cair numa situação de dizer: "os árabes não foram realmente relevantes, porque foi tudo feito na cristandade".

A história deste Gerberto de Aurillac, do Papa Silvestre II, é interessante, porque no fundo, quando ele ainda é um um jovem estudante e está a estudar manuscritos na Catalunha (estou aqui a ler da sua biografia) que provavelmente estaremos a falar perto do mosteiro de Santa Maria de Ripoll e que esse esses mosteiros, vários deles continham manuscritos que teriam vindo de Córdova. Córdova que foi a cidade importante da península ibérica da Espanha, ocupada pelos árabes, um dos centros intelectuais da Europa à época da ocupação árabe. Seria da biblioteca de al-Hakam II em Córdova que teriam vindo manuscritos, milhares de manuscritos de temas científicos que seriam traduções de obras gregas que teriam vindo para Catalunha. Foi precisamente ao estudar nestes Mosteiros da Catalunha que o nosso Gerberto de Aurillac teve contato com todos estes temas de matemática e de astronomia. E claramente, tendo vocação para eles, ficou absolutamente fascinado com este manancial de informação. Quando chegou ao pontificado não deixou de exercer a sua autoridade e o seu poder de divulgar estes conhecimentos que são, sobretudo, muito úteis para o dia-a-dia que mudaram, de forma radical, a história da Europa. Nós não conseguimos imaginar uma Europa sem o dígito $0$ (zero) ou sem numeração árabe.

Gonçalo: Em particular a nós, toca-nos bastante, porque esta reintrodução da esfera armilar que hoje faz parte da nossa bandeira [de Portugal]. Este um instrumento importantíssimo na navegação, para a parte das descobertas e para orientação, que teve repercussões (reparem que aqui estamos ainda próximo do ano 1000). Esta reintrodução destes instrumentos teve impactos séculos mais tarde, portanto, são coisas que se propagam no tempo.

Bernardo: Podemos dizer de forma muito categórica: no virar do primeiro milênio para o segundo (uma altura que muitas vezes é tratada de forma ignorante, como a Idade das Trevas), temos aqui um papa que se pode dizer humanista, muito antes das tendências humanistas do Renascimento, porque era um papa que leu os clássicos gregos e romanos, estudou por Boécio (já fizemos um episódio sobre este: Cromos medieval - Boécio, recomendamos que vão ouvir a importância de Boécio, um dos últimos sábios do Império Romano, no virar do fim do Império Romano). [Boécio] era um homem que este Papa Silvestre II estudou. [Papa Silvestre II estou] quase todos os temas que se podem pensar e, que na altura que eram estudados, não eram conhecidos. Escreveu várias obras acerca dos temas do quadrivium, portanto, aritmética, geometria, astronomia e música e do trivium também, da gramática, da lógica e da retórica. Estas são as sete Artes Liberais que eram utilizadas para o ensino universitário e acadêmico. Portanto, temos aqui um um papa de primeiríssimo nível acadêmico no virar do primeiro para segundo milênio. 

Gonçalo: Temos dizer que este papa era de fato um "Cromo" [*]. 

Bernardo: Sim, este sim era um duplo "Cromo": um "Cromo" da nossa "caderneta" de sábios medievais, mas também era um "Cromo". Ficamos por aqui e esperemos que tenham gostado de conhecer este Papa Silvestre II e até ao próximo "Cromo" Medieval. 

Gonçalo: Voltamos em breve com com mais "Cromos" e novos temas até à próxima obrigado Bernardo.

Esta foi mais uma edição dos nossos "Cromos" Medievais, desta vez com o Papa Silvestre II, o Papa Matemático. Espero que tenham gostado deste mini-episódio. Se gostaram do que aqui falamos e estes temas vos interessam, não se esqueçam de subscrever por gosto e partilhar. Tudo isto são formas de nos ajudarem a continuar este podcast: Canal Café Ciência e Fé.


Livros e textos consultados pelos autores:

Artigo sobre o Papa Silvestre II da New Catholic Encyclopedia:

https://www.newadvent.org/cathen/14371a.htm

James Hannam - God's Philosopher: How the Medieval World Laid the Foundations of Modern Science.

S. João Paulo II - Fides et Ratio.

***

[*] Para eles, "Cromos" são sábios do período medieval que tiveram contribuições em várias áreas do conhecimento. Todos os protagonistas da série são "cromos medievais" no sentido em que fazem parte da nossa "caderneta" de sábios medievais. Mas como Papa Silvestre II era especialmente inteligente, era também um "cromo" nesse sentido, ou seja, grande cabeça, portanto um duplo "Cromo" que será mencionado posteriormente. 

Leia mais em: A incrível história do papa matemático.


Leia mais em COMECE POR AQUI: Conheça o Blog Summa Mathematicae

 

Curta nossa página no Facebook Summa Mathematicae. Nossa página no Instagram.



Total de visualizações de página