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Matemática de Singapura - O que é? por Sérgio Morselli


Transcrevemos abaixo um vídeo do professor Sérgio Morselli sobre Matemática de Singapura com grifos nossos.

Olá, tudo bem? Quero compartilhar com vocês hoje um pouco sobre o método de matemática de Singapura. Quando o assunto é educação, Singapura é destaque no cenário internacional. Isso porque os seus alunos têm sistematicamente tirado as primeiras colocações em todos os exames de avaliação de desempenho no mundo. Também nós devemos levar em consideração que Singapura até pouco tempo atrás era uma ilha onde reinava o analfabetismo e a pobreza. Hoje além de Singapura ter os melhores estudantes do mundo, Singapura também tem (apenas a título de exemplo) os menores índices de corrupção do mundo e a maior concentração de milionários do mundo. Há um ditado famoso que diz que todos os países do mundo inveja a Matemática de Singapura, mas o que tem de tão especial nesse método? 

Bem, cabe a gente saber desde já que, embora obviamente Singapura seja um país oriental, o método de Matemática de Singapura é ocidental. Sim, exatamente. Quando Singapura saiu atrás de soluções para os seus problemas educacionais, elas os encontrou no ocidente. Então o método de matemática de Singapura, em síntese, se baseia em uma tríade ocidental: um psicólogo norte americano, um professor inglês e um matemático húngaro. Antes que eu avance para o método, eu gostaria de brevemente me apresentar e explicar porque estou gravando este vídeo. 

Meu nome é Sérgio e sou engenheiro de formação, mas antes de concluir a graduação, eu tive a oportunidade de dar aulas de Matemática, acabei gostando e numa exerci a profissão [de engenheiro]. Então dei aula em cursinho, dei aula particular, dei aula escola particular e dei aulas de reforço. Da minha experiência como professor e observei desde cedo que a maior parte dos alunos tem sérias dificuldades em matemática básica.  À época até fiz um paralelo com as dificuldades de linguagem. Hoje nós sabemos que os alunos estão terminando o ensino médio e entram nas faculdades com sérios problemas de interpretação de texto. Isso se deve à forma ineficiente de como se faz a alfabetização hoje nas escolas. Então da mesma forma os alunos hoje saem do ensino médio entram nas faculdades com dificuldades em matemática básica por causa do método ineficiente que ocorre o ensino da matemática na primeira infância.

Quando foi que eu comecei a me preocupar com a educação matemática na infância? Nós aqui em casa somos uma família educadora. Eu tenho três filhos e meu filho mais velho tem cinco anos e eu vejo que já está na hora de introduzir conceitos matemáticos para ele. Quem fará isso? Eu sempre quis, na verdade, ensinar Matemática para o meu filho, então pesquisei, procurei métodos e, de tudo que encontrei, pelo menos até o momento, e para a faixa etária do filho, o que eu mais gostei foi o método de Matemática Singapura.

Porque eu estaria habilitado a falar pra você do método de matemática de Singapura? Quando eu conheci o método, eu realmente procurei saber e fiquei impressionado com os resultados de Singapura. Então eu disparei e-mails para vários contatos. Mandei e-mail para o Ministro de Educação de Singapura, mandei e-mail para para pesquisadores das universidades, encontrei uma relação dos 20 melhores colégios de Singapura e mandei e-mail e mensagens para eles perguntando como era o ensino de matemática no ensino fundamental, mas principalmente eu fiz contato e acabei conhecendo o doutor Ban Har que é provavelmente a maior referência do mundo do método de Singapura e estou em contato com ele, sempre tirando dúvidas conversando. Em uma das conversas, ele mesmo me incentivou a gravar esse vídeo aqui e disponibilizar para trazer informações sobre o método de Singapura. Então vamos ao método. 

Como eu disse previamente, o método se baseia em uma tríade ocidental. O primeiro pilar que dá sustentação ao método é a teoria CPA, baseada na psicologia do doutor Jerome Bruner. CPA significa concreto, pictórico e abstrato e nós estamos tratando de três estágios de aprendizado. Iniciamos pelo concreto, se tornando um abstrato com a intermediação do estado de pictórico. Vamos direto a um exemplo didático para ficar mais fácil de entender. Por exemplo, eu ensinei para o meu filho (ele tem cinco anos e já compreende bem o conceito de frações), eu ensinei o conceito de frações para ele utilizando a teoria CPA, então o objetivo é introduzir o conceito abstrato para a criança. Nós começamos com um elemento concreto, objeto concreto. Então você pode, por exemplo, começar com uma folha de papel e contar uma historinha para o seu filho. Filho, eu tenho uma folha de papel em minhas mãos. Meu desejo é dividi-la para dois amiguinhos. Como posso fazer isso? Então ele vai pegar a folha, vai pensar e vai fazer uma sugestão. Meu filho, no caso, sugeriu dobrá-la no meio assim (horizontalmente) e recortar. Eu falei: ótimo, filho, então faça. Ele foi lá e cortou e apareceu com duas metades. Eu estou com duas metades (da folha de papel). Então aqui se encerrou o estágio concreto. 

O estágio pictórico se inicia quando a gente pega e mostra para para ele todas as possíveis formas de se fazer essa divisão. Então, por exemplo, ele poderia ter dobrado assim (verticalmente). A gente mostra todas as possíveis representações. O estagio de pictórico é aquele estágio que um objeto concreto e se torna uma figura. Por fim, uma vez assimilado o estágio concreto, assimilado o estágio pictórico, nós podemos introduzir o conceito abstrato. Então a gente fala para ele: o filho, aqui nós temos duas metades. A metade já é um tema abstrato em linguagem. Uma metade em linguagem matemática descreve dessa forma $\dfrac{1}{2}$, através de uma fração. Eu também ensinei o conceito de fração assim para o meu filho e funcionou muito bem.

O segundo pilar do método de Matemática de Singapura é um conceito de compreensão relacional do professor Richard Skemp. O professor Richard Skemp defendia que as crianças aprendem matemática de duas formas: através de uma forma instrumental em que você diz para a criança como fazer e através de uma forma relacional que você diz para a criança porque fazer. Veja que nesse nesse conceito de compreensão relacional, há um fomento à oralidade. Se você tiver a oportunidade de assistir uma aula de matemática de Singapura, você vai observar que as crianças são incentivadas a falar o tempo todo. Isso vem do conceito compreensão relacional. Também vamos ver como isso se dá na prática. Eu trouxe também um exemplo.  Suponhamos que você queira que o seu filho de 7 anos calcule a área desse quadrado. Segundo o conceito instrumental, você pediria para ele calcular a área e você daria um método para ele, ou seja, você falaria: meu filho, você tem que multiplicar os lados. Então assim, ele chegaria uma resposta.

Já segundo o conceito relacional, você envolveria criança numa dinâmica, isto é, nós queremos que ela calcula essa área. O que nós podemos fazer? Por exemplo: sabemos que a face da unidade do material dourado tem um centímetro quadrado, então a gente pode começar com uma experimentação. A gente pode pedir para o nosso filho, por exemplo, perguntar quantas unidades do material dourado vão caber aqui e assim ele consegue chegar uma primeira estimativa da área. Após isso, você pode também fazer outras atividades de recorte, etc. e por fim, depois de ter ocorrido a experimentação, você pode sim apresentar fórmula pra ele e falar: veja filho, você também pode usar a multiplicação lado vezes lado, mas tenha sempre em mente que isso é mais uma forma de você resolver o exercício. Existem outras formas, mas o que importa é você dar um jeito de obter a área, seja construir modelos, estabelecendo um outro método de comparação. 

O terceiro pilar do método de Matemática de Singapura é o conceito de variabilidade perceptiva e variabilidade matemática do matemático húngaro Zoltan Dienes. Zoltan Dienes ficou famoso, porque ele utilizava jogos para ensinar matemática para crianças. Inclusive, ele é o inventor dos blocos lógicos. Zoltan Dienes afirmava que a criança quando exposta um conceito, ela deve ser desafiada a visualizar esse conceito em contextos distintos e com representações múltiplas. Eu sei que essa definição parece um pouco formal, mas eu trouxe aqui um exemplo para vocês que vai ficar fácil entender o que defendia o Zoltan Dienes. Eu trouxe aqui três figurinhas para entender o conceito de variabilidade perspectiva. Esse jogo ou uma atividade é a famosa atividade do intruso.


Nós mostraríamos essa imagem a criança e perguntarmos a ela (no caso nosso filho): filho, quem aqui nessa imagem é um intruso? Ele naturalmente sem dificuldade responderia que é esse [o primeiro da direita para esquerda]. Então agora a gente introduz o conceito de variabilidade perceptivo. Nós vamos apresentar a criança uma nova imagem com os mesmos rostinhos, entretanto aqui existe um novo elemento de diferenciação.


Nós chamaremos nosso filho e perguntaremos: filho, e agora, quem é o intruso? Ele é incentivado a falar e incentivado a pensar, etc., mas a resposta correta que seria: segundo critério do rosto, é esse [primeiro da direita para esquerda], segundo critério da cor, é esse [primeiro da esquerda para direita]. Encerrada essa segunda etapa, a gente avança novamente na variabilidade perceptiva. Um novo elemento de diferenciação foi introduzido.


Nós perguntaremos: filho, e agora, quem é o intruso? Novamente ele é incentivado a falar, mas a resposta correta seria: segundo o rostinho, esse [primeiro da direita para esquerda], segunda cor, esse [primeiro da esquerda para direita] e segundo óculos, esse [rosto do meio]. 

Em síntese, é isso. É claro que há muito mais do que falar sobre o método de Matemática de Singapura como, por exemplo, o conceito de mastery, o conceito do ensino continuado, o conceito do numbers bonds e dentre vários outros. Eu posso inclusive trazer isso o futuro vídeos. Como eu também estou aplicando o método de Matemática de Singapura ao meu filho, eu pretendo em breve trazer algumas dinâmicas aqui pra mostrar pra vocês como as coisas estão caminhando. Para não alongar o vídeo, eu já vou encerrar aqui. Agradeço muito a você que assistiu até agora. Se você gostou por favor de um like, pode se inscrever no canal. Se você tiver alguma dúvida ou alguma sugestão para próximos vídeos, pode deixar um comentário que eu vou ler. É isso pessoal, foi muito legal e só tenho a agradecer a você que ficou comigo até agora. Muito obrigado.

Canal do professor Sergio Morselli: link


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VOCÊ PRECISA DISTO PARA ENTENDER MATEMÁTICA! - por Instituto Hugo de São Vitor

Você só não entende a matemática pelo fato de que não lhe dão nada que entender. E poucos têm coragem de dizer isso.

Pessoas há que são muito hábeis em fazer cálculos; por isso tiram boas notas na escola. Porém, isso de modo algum quer dizer que elas entendam a matemática. Só quer dizer que calculam bem; e calcular é somente uma técnica da matemática.

Assim, a matemática tem-se reduzido ao cálculo. Porém, para os antigos, a matemática era muito mais.

Para entender o quê, precisamos saber que os números são uma abstração de segundo grau. Quantos professores lhe ensinaram isso?

Infelizmente, eles não lhe ensinaram nem mesmo sobre as abstrações de primeiro grau. Então, vamos ter que recuperar também essa lição.

A abstração de primeiro grau abstrai, retira a matéria das coisas. Nunca percebeu que você faz isso? Bem, você faz. Quando usa a palavra “cadeira”, você não está falando de uma cadeira individual. Nunca. Você está falando do conceito de cadeira, que abrange todas as cadeiras que já existiram, existem e virão a existir. E o seu intelecto faz isso naturalmente, dadas certas condições.

Assim, ao ver uma cadeira, seu intelecto abstraiu o conceito de cadeira; mas, uma segunda abstração tira de uma cadeira não só o conceito de cadeira, mas o número um, pois você viu uma cadeira, afinal de contas. Assim, excluindo a matéria da cadeira primeiro, e depois a forma da cadeira, resta algo ainda: o número.

Com esse número, que é o número um, você pode ir em duas direções. A direção que se vai na escola é a do cálculo e da medição.

O Intelecto nota que há a multiplicidade no mundo. E na multiplicidade pode haver cálculo. 1 mais 1 é 2. 375 mais 813 é 1188. E este é apenas um tipo de cálculo possível. E todos eles, ou quase todos, são lógicos. São, em essência, raciocínios.

Mas os antigos viam outras vias, que foram abandonadas por soarem “místicas” demais. Porque há mais abstrações por fazer, que os modernos não ousam.

Hugo de São Vítor falava de passar dos inteligíveis (as formas e os números) para os intelectíveis (a mais alta causa do Ser). Para isso, precisamos meditar na natureza dos números, e para isso servem as quatro artes do Quadrivium.

Retirado do link


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μάθημα: Pensar matematicamente

No afresco de Rafael Sanzio, a Escola de
Atenas, Pitágoras é mostrado escrevendo
em um livro quando um jovem o apresenta
com uma tabuleta mostrando uma
representação esquemática de uma lira
 acima de um desenho do tetráctis sagrado
Para pensar matematicamente, é bom compreender que a Matemática em sua origem tinha um significado muito profundo. Infelizmente até mesmo entre matemáticos esse significado se perdeu, pelo desconhecimento do próprio caráter filosófico da Matemática. Quando consideramos a construção dos números inteiros, isso tem uma ligação com profundas questões ontológicas.

A palavra “Matemática” deriva de μάθημα (máthēma), que, numa acepção superficial, significa lição, ensinamento, mas que, numa acepção mais profunda, comum entre os pitagóricos, significava o ensinamento divino, a sabedoria divina que se desvelava aos nossos olhos. Não é à toa que os pitagóricos usaram o termo θεώρημα (theṓrēma), ou seja, teorema, para designar uma proposição matemática demonstrável. Na transliteração theṓrēma, a barrinha em cima, chamada mácron, diz que a vogal embaixo é longa, deve ser pronunciada por um tempo duas vezes maior do que uma vogal breve, seria algo como theóoreema. θεώρημα (theṓrēma) é aquilo que é contemplado, no sentido de visão das coisas divinas, a contemplação mesma das verdades superiores.

Antigamente, “teorema” em Português era escrito “theorema” e “teatro” era escrito “theatro”. Não é coincidência, a raiz é a mesma. A ideia essencial também é: a contemplação. Uma verdade matemática, portanto, enunciada como teorema, era uma verdade divina a ser contemplada. Assim compreendiam os pitagóricos a Matemática e tudo o que a ela se relacionasse, em particular a Geometria, porquanto descrevesse as formas divinas ou ideias das quais as coisas do mundo participavam, isto é, das quais eram mera projeção mimética.

A Matemática era, portanto, considerada a linguagem pela qual a Divindade nos mostrava as verdades eternas que deveríamos contemplar. Por essa razão, ao pensarmos matematicamente, devemos manter o espírito e a mente em um nível que abarque não somente o raciocínio e a lógica, mas também a intuição, como defendia Poincaré, e, em vez de “ler” as proposições matemáticas como quem lê uma asserção lógica com quantificadores existenciais e universais, dever-se-ia “contemplá-las” enquanto descritoras das belezas do universo. Essa postura expande radicalmente a capacidade de pensar como um matemático.

Por Rodrigo Peñaloza

Texto retirado do link


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Dez mandamentos para professores, por George Pólya

Apresentação do autor por Elon Lages Lima

George Pólya (1887 + 98 = 1985) nasceu em Budapest, Hungria, foi professor em Zurich de 1914 a 1940 e depois em Stanford, Estados Unidos, onde se aposentou em 1953 mas continuou ativo até praticamente sua morte, quase centenário. Pólya foi coautor de um notável livro, escrito juntamente com seu compatriota Gabor Szegõ, intitulado "Aufgaben und Lehrsãtze aus der Analysis" (Berlim, 1924) depois traduzido para o inglês com o título "Problems and Theorems in Analysis" (Berlim, 1972). Neste texto, em dois alentados volumes, os autores mostram como o ensino da Análise Matemática pode ser gradativamente desenvolvido, dos fundamentos até algumas fronteiras do conhecimento, através de uma judiciosa sequência de exercícios e problemas, alguns dotados de suprema elegância.

Pólya escreveu outros livros e inúmeros artigos originais, que lhe deram sólida reputação em Análise Clássica, Combinatória e Probabilidades. Suas obras completas, em 4 volumes, foram publicadas em 1984 pela MIT Press. Nos últimos quarenta anos de sua longa carreira, passou a interessar-se pelo ensino da Matemática, dedicando-se quase inteiramente ao estudo das questões referentes à transmissão do conhecimento matemático. A esse respeito escreveu muitos artigos e alguns livros extraordinários, como "How to Solve It" (traduzido para o português como "A Arte de Resolver Problemas"), "Mathematics and Plausible Reasoning" (Princeton Univ. Press, 1954) e "Mathematical Discovery" (2 vols., Wiley, 1962 e 1965).

O trabalho de Pólya sobre o ensino da Matemática é maravilhoso simplesmente porque não propõe truques, fórmulas miraculosas, ou muito menos pomposas teorias pseudo-psicológicas. O artigo que reproduzimos a seguir, de uma espontaneidade e de uma franqueza quase rudes, resume suas idéias de modo bastante claro.

Após anos de experiência como matemático de grande destaque e professor universalmente reconhecido por seus dotes de mestre, Pólya sintetiza suas conclusões em dez mandamentos e uma regra muito simples para treinar professores que saibam seguir esses mandamentos.

Para ser um bom professor de Matemática, você tem que vibrar com a sua matéria, conhecer bem o que vai ensinar, ter um bom relacionamento com os alunos para entender os problemas deles e dar a esses alunos a oportunidade de (pelo menos algumas vezes) descobrir as coisas por si mesmos. Deve ainda entender que "know-how" é mais importante do que informação. (Pólya lhe dirá no texto o que entende por "know-how".) E, para treinar professores a fim de que possam cumprir sua tarefa, o melhor a fazer é praticar com ele a arte de resolver problemas. Estou certo de que a leitura do artigo que se segue e, mais ainda, a releitura seguidas vezes, a meditação sobre o mesmo e a adoção dos princípios nele expostos, muito contribuirão para melhorar a qualidade das nossas aulas de Matemática.  

(*) Artigo publicado no "Journal of Education", University of British Columbia, Vancouver and Victoria (3) 1959, p. 61-69. Reproduzido nos "Collected Papers" de George Pólya, vol. IV, pp. 525-533, MIT Press 1984. Traduzido por Maria Celano Maia.  

 Dez mandamento para professores

Nos últimos cinco períodos letivos, todas as minhas aulas foram dirigidas a professores secundários que, após alguns anos de prática, voltaram à Universidade para mais treinamento. Eles desejavam, segundo entendi, um curso que fosse de uso prático imediato nas suas tarefas diárias. Tentei planejar um tal curso no qual, inevitavelmente, eu teria de expressar repetidas vezes minhas opiniões sobre o dia-a-dia do professor. Meus comentários foram aos poucos assumindo uma forma condensada e finalmente fui levado a enunciá-los como dez regras, ou mandamentos.

Para tornar claro o significado dos mandamentos deveria ter acrescentado exemplos ilustrativos mas, em vista da exiguidade de espaço, isso ficou fora de cogitação. Alguns pontos são ilustrados em meus livros (l) e (2), e outros serão discutidos noutro livro ao qual este artigo, ou seu conteúdo sob outra forma, será incorporado.  

Dez mandamentos para professores

1. Tenha interesse por sua matéria.  

2. Conheça sua matéria

3. Procure ler o semblante dos seus alunos; procure enxergar suas expectati­vas e suas dificuldades; ponha-se no lugar deles.  

4. Compreenda que a melhor maneira de aprender alguma coisa é descobri-la você mesmo.  

5. Dê aos seus alunos não apenas informação, mas know-how, atitudes mentais, o hábito de trabalho metódico.  

6. Faça-os aprender a dar palpites

7. Faça-os aprender a demonstrar.  

8. Busque, no problema que está abordando, aspectos que possam ser úteis nos problemas que virão -- procure descobrir o modelo geral que está por trás da presente situação concreta.

9. Não desvende o segredo de uma vez -- deixe os alunos darem palpites antes -- deixe-os descobrir por si próprios, na medida do possível.

10. Sugira; não os faça engolir à força. 

Comentário

Ao formular os mandamentos, ou regras, acima, tive em mente os participantes das minhas classes, professores secundários de Matemática. Entretanto, essas regras se aplicam a qualquer situação de ensino, a qualquer matéria ensinada em qualquer nível. Todavia, o professor de Matemática tem mais e melhores oportunidades de aplicar algumas delas do que o professor de outras matérias.

Vamos agora considerar as dez regras, uma por uma, prestando atenção especial à tarefa do professor de Matemática.  


Tenha interesse por sua matéria. Conheça a sua matéria.


1. É muito difícil prever com segurança o sucesso ou fracasso de um método de ensino. Mas há uma exceção: você aborrecerá a audiência com sua matéria se esta matéria o aborrece.

Isto deve ser suficiente para tornar evidente o primeiro e principal dos mandamentos do professor: Tenha interesse por sua matéria.

2. Se um assunto não interessa ao professor, ele não será capaz de ensiná-lo aceitavelmente. Interesse é sine qua non, uma condição indispensavelmente necessária, mas, em si mesma, não é uma condição suficiente. Nenhuma quantidade de interesse, ou de métodos de ensino, permitirá que você explique claramente um ponto a seus alunos se você próprio não entender mais claramente ainda esse ponto.

O argumento acima deve ser bastante para tornar claro o segundo mandamento para professores: Conheça a sua matéria.

3. Mesmo com algum conhecimento e interesse, você pode ser um professor ruim ou bem medíocre. O caso não é muito comum, admito, mas tampouco é raro: muitos de nós conheceram professores que sabiam suas matérias mas não eram capazes de estabelecer contato com os seus alunos.  

Procure ler o semblante dos seus alunos. ...ponha-se no lugar deles.

Para que o ensinar, por parte de um, resulte no aprender, por parte de outro, deve haver uma espécie de contato ou conexão entre professor e aluno: o professor deve ser capaz de perceber a posição do aluno; ele deve ser capaz de assumir a causa do aluno. Daí o próximo mandamento: Procure ler o semblante dos seus alunos; procure enxergar suas expectativas e suas dificuldades; ponha-se no lugar deles.

4. As três regras anteriores contêm a essência do bom ensino; elas formam, juntas, uma espécie de condição necessária e suficiente. Se você tem interesse e conhecimento, e é capaz de perceber o ponto de vista do aluno, você já é um bom professor ou logo se tornará um; só precisa de experiência.

Experiência é necessário, experiência prática, para pô-lo a par das interações entre professor e alunos na sala de aula, e para familiarizá-lo, tão intimamente e pessoalmente quanto possível, com o processo de aquisição de novas informações e habilidades — um processo que tem muitos e vários aspectos: aprendizagem, descoberta, invenção e compreensão... Os psicólogos fizeram trabalhos experimentais muito importantes e emitiram algumas opiniões teóricas interessantes sobre o processo de aprendizagem. Tais experiências e opiniões podem servir como uma base estimulante para um professor excepcionalmente receptivo, mas elas ainda não amadureceram suficientemente (e não amadurecerão por um bom tempo, temo eu) para ser de uso imediatamente prático naquelas fases da instrução que nos concernem aqui. Em seu trabalho diário, o professor deve basear-se, primeiro e antes de tudo, na sua própria experiência e no seu próprio julgamento.

Baseando-me em meio século de experiência em pesquisa e ensino, e de reflexão muito cuidadosa, apresento aqui, para consideração do leitor, alguns pontos sobre o processo de aprendizagem, os quais eu considero como os mais importantes para uso em sala de aula.

Já se disse repetidas vezes que a aprendizagem ativa é preferível à aprendizagem passiva, meramente receptiva. Quanto mais ativa, melhor é a aprendizagem: Compreenda que a melhor maneira de aprender alguma coisa é descobri-la você mesmo.

De fato, numa situação ideal, o professor seria somente uma espécie de parteira espiritual; ele daria oportunidade aos alunos de descobrirem por si mesmos as coisas a serem aprendidas. Este ideal é dificilmente alcançado na prática, sobretudo por falta de tempo. Contudo, mesmo um ideal inatingível pode guiar-nos indicando a direção correta -- ninguém ainda atingiu a Estrela Polar, mas muitas pessoas encontraram o rumo certo guiando-se por ela.

5. O conhecimento consiste em parte de informação e em parte de know-how. Know-how é destreza; é a habilidade em lidar com informações, usá-las para um dado propósito; know-how pode ser descrito como um apanhado de atitudes mentais apropriadas, know-how é em última análise a habilidade para trabalhar metodicamente.

Em Matemática, know-how é a habilidade para resolver problemas, construir demonstrações, e examinar criticamente soluções e demonstrações. E, em Matemática, know-how é muito mais importante do que a mera posse de informações.

Portanto, o mandamento seguinte é de especial importância para o professor de Matemática: Dê aos seus alunos não apenas informações, mas know-how, atitudes mentais, o hábito de trabalho metódico.

Já que know-how é mais importante em Matemática do que informação, a maneira como você ensina pode ser mais importante nas aulas de Matemática do que aquilo que você ensina.  

Faça-os aprender a dar palpites. Faça-os aprender a demonstrar. 

6. Primeiro conjecture, depois prove -- assim procede a descoberta na maioria dos casos. Você deveria saber disto (pela sua própria experiência, se possível) e deveria saber, também, que o professor de Matemática tem excelentes oportunidades de mostrar o papel da conjectura no processo de descoberta e assim imprimir em seus alunos uma atitude mental fundamentalmente importante. Este último ponto não é tão amplamente conhecido como deveria ser e, infelizmente, o espaço aqui disponível é insuficiente para discuti-lo em detalhes (2). Ainda assim, desejo que você insista com seus alunos a respeito. Faça-os aprender a dar palpites.

Alunos ignorantes e descuidados provavelmente vão dar palpites rudimentares. Os palpites que nós queremos estimular, naturalmente, não são os rudimentares, mas os educados, os razoáveis. Palpites razoáveis baseiam-se no uso judicioso de evidência indutiva da analogia, e englobam em última análise todos os procedimentos do raciocínio plausível que desempenham um papel no método científico (2).

7. "A Matemática é uma boa escola de raciocínio plausível". Esta afirmativa resume a opinião subjacente à regra anterior; ela soa incomum e é de origem muito recente; na realidade, o autor do presente artigo reivindica seu crédito.

"A Matemática é uma boa escola para o raciocínio demonstrativo". Esta afirmativa soa bem familiar -- algumas formas dela são provavelmente quase tão velhas quanto a própria Matemática. De fato, muito mais é verdade; Matemática tem quase o mesmo significado que raciocínio demonstrativo, o qual está presente nas Ciências na medida em que os seus conceitos se elevam a um nível lógico-matemático suficientemente abstrato e definido. Abaixo deste alto nível, não há lugar para raciocínio verdadeiramente demonstrativo (o qual não tem lugar, por exemplo, nas tarefas do dia-a-dia). Ainda assim (é desnecessário discutir-se tal ponto, tão amplamente aceito) os professores de Matemática devem colocar os seus alunos, salvo os das classes mais elementares, em contato com o raciocínio demonstrativo: Faça-os aprender a demonstrar.

8. Know-how é a parte mais valiosa do conhecimento matemático, muito mais valiosa que a mera posse de informação. Mas como devemos ensinar know-how? Os alunos só podem aprendê-lo através de imitação e prática.

Quando você apresentar a solução de um problema, enfatize convenientemente os aspectos instrutivos da solução. Um aspecto é instrutivo se merece imitação; isto é, se puder ser usado não somente na solução do presente problema, mas também na solução de outros problemas -- quanto mais puder ser usado, mais instrutivo. Enfatize os aspectos instrutivos não somente louvando-os (o que poderia causar efeito contrário em alguns alunos) mas através de seu comportamento (um pouco de dramatização é muito bom se você tiver uma pontinha de talento teatral). Um aspecto bem enfatizado pode converter a sua solução numa solução modelo, num padrão marcante; imitando-o, os alunos resolverão muitos outros problemas. Daí a regra: Busque, no problema que está abordando, aspectos que possam ser úteis nos problemas que virão -- procure descobrir o modelo geral que está por trás da presente situação concreta (l).  

...deixe-os descobrir por si próprios, na medida do possível.
... não os faça engolir à força.

9. Eu gostaria de indicar aqui um pequeno truque que é fácil de aprender e que todo professor deveria conhecer. Quando você começar a discutir um problema, deixe que seus alunos adivinhem a solução. O aluno que concebeu um palpite, ou mesmo que tenha anunciado seu palpite, empenha-se: ele tem que seguir o desenvolvimento da solução para ver se o seu palpite estava certo ou não. Ele não pode permanecer desatento.

Este é um caso muito especial da regra seguinte, que tem pontos em comum com as regras 4 e 6: Não desvende o segredo de uma vez -- deixe os alunos darem palpites antes -- deixe-os descobrir por si próprios, na medida do possível.

10. Um aluno apresenta um longo cálculo que ocupa várias linhas. Olhando para a última linha, vejo que o cálculo está errado, mas me abstenho de dizer isso. Prefiro acompanhar o cálculo com o aluno, linha por linha: "Você começou bem; sua primeira linha está correta. A linha seguinte também está correta, você fez isto e aquilo. A próxima linha está boa. Agora, o que você acha desta linha?" O engano está naquela linha e, se o aluno descobre o erro por si mesmo, ele tem uma chance de aprender algo. Se, no entanto, digo logo "Isto está errado", o aluno poderá se ofender e aí não ouvirá o que eu possa dizer depois. E se digo "Isto está errado" a todo instante, o aluno poderá odiar a mim e à Matemática, e todos os meus esforços estarão perdidos em relação a ele.

Evite dizer "Você está errado". Em vez disso, se possível, diga: "Você está certo, mas..." Se você procede assim, você não é hipócrita, você é somente humano. Que você deve proceder assim, está implicitamente contido na regra 4. Assim, nós podemos tornar o conselho mais explícito: Sugira; não os faça engolir à força.  

Sobre o currículo para futuros professores

Os mandamentos acima são simples e bastante óbvios, mas nem sempre é fácil segui-los no dia-a-dia. E nós também, nem sempre tornamos fácil para os professores segui-los. Por exemplo, os estudos universitários do professor ajudam-no muito pouco a obedecer a estes mandamentos.

E assim chegamos à questão penosa do currículo para futuros professores de escola secundária. Eu não tenho espaço, tempo, meios (ou coragem) suficientes, ao meu dispor para tratar desta questão adequadamente. Entretanto há alguns pontos que não posso omitir. Todos eles têm relação com professores de Matemática que ensinam Álgebra, Geometria ou Trigonometria (muito raramente alguma matéria mais avançada) numa escola secundária. Não estou preocupado com "Matemáticas gerais" ou assuntos desse tipo nos quais há uma porção de generalidades, mas muito pouca Matemática.

Não posso deixar de citar uma frase que ouvi de um participante de minhas aulas: "O futuro professor não é bem tratado pelo Departamento de Matemática nem pelo Departamento de Educação. O Departamento de Matemática nos oferece bife duro de roer e o Departamento de Educação, sopa rala sem nenhuma carne". Encontrei vários professores que expressaram a mesma opinião, talvez de modo mais tímido e menos contundente. Quais as origens dessas opiniões?

Todo mundo conhece casos em que a Álgebra ou Geometria são ensinadas por um professor que conhece menos do assunto do que se supõe que ele deveria exigir de seus alunos. E isto pode até acontecer se o instrutor em questão não é o professor particular nem o professor de economia doméstica, mas o professor de Matemática. Quão excepcionais ou difundidos são tais casos, eu não gostaria de discutir.

Acontece também, mais freqüentemente do que seria de se desejar, que um professor de Matemática capaz e bem intencionado não conheça bastante o back-ground da Matemática de nível secundário para satisfazer a curiosidade, ou ao menos entender as reações, dos seus melhores alunos. (Alguns pontos que deveriam ser, mas não são, geralmente conhecidos: decimais infinitas, números irracionais, divisibilidade, primeiras provas de Geometria sólida.) Por que isto acontece?

O futuro professor deixa a escola secundária, muito freqüentemente, sem nenhum conhecimento ou com um conhecimento hesitante da Matemática de nível secundário. Onde e quando ele deveria aprender a Matemática de nível secundário?

Ele segue um curso oferecido pelo Departamento de Matemática sobre tópicos mais avançados. Ele tem muita dificuldade de adaptar-se e de ser aprovado no curso, porque o seu conhecimento de Matemática de nível secundário é inadequado. Ele não consegue relacionar o curso com a sua Matemática de nível secundário. Por outro lado, ele recebe um curso oferecido pelo Departamento de Educação sobre métodos de ensino. Este é oferecido de acordo com o princípio de que o Departamento de Educação ensina somente métodos, não conteúdo. Nosso futuro professor pode ficar com a impressão errônea de que os métodos de ensino estão essencialmente relacionados com conhecimento inadequado, ou ignorância do conteúdo. De qualquer forma, seu conhecimento da Matemática de nível secundário permanece marginalizado.

Chego, agora, a um ponto que toca mais de perto o meu coração. O professor é exortado a fazer muitas coisas bonitas: ele deve dar a seus alunos não só informações mas know-how, ele deve encorajar sua originalidade e trabalho criativo, ele deve fazê-los experimentar a tensão e o triunfo da descoberta. Mas, e o professor, ele próprio? Há em seu currículo alguma oportunidade de trabalho independente em Matemática, de adquirir o know-how que se espera que ele transmita a seus alunos? A resposta é não. Tanto quanto eu saiba, não há Universidade que dê ao professor oportunidade decente de desenvolver seu know-how, sua própria habilidade em Matemática.

Alguns pontos que deveriam ser, mas não são, geralmente conhecidos:
decimais infinitas, números irracionais, divisibilidade, primeiras
provas de Geometria sólida. Onde e quando ele deveria aprender a Matemática de nível secundário?
... um seminário sobre resolução de problemas para professores

Eu reivindico o crédito por haver introduzido o remédio mais óbvio para esses defeitos mais óbvios ainda: um seminário sobre resolução de problemas para professores, onde o conhecimento requerido é de nível secundário e o grau de dificuldade dos problemas a serem resolvidos é apenas um pouco acima do nível da escola secundária.

Um tal seminário pode ter, se dirigido adequadamente, vários efeitos bons (3). Em primeiro lugar, os participantes têm uma oportunidade de adquirir um conhecimento sólido da Matemática de nível secundário -- conhecimento real, pronto para ser usado, não adquirido por mera memorização mas através de aplicação em problemas interessantes. Então o participante pode adquirir algum know-how; certa habilidade em lidar com Matemática de nível secundário; algum discernimento da essência da resolução de problemas.  

Além disso, eu usei meu seminário para dar aos participantes alguma prática em explicar problemas e dirigir suas soluções, na verdade, uma oportunidade para prática de ensino, para a qual, na maioria dos currículos usuais, não há bastantes oportunidades. Isto é feito da seguinte maneira: ao começar uma aula prática, cada participante recebe um problema diferente (somente um para cada) o qual espera-se que ele resolva naquela aula; ele não deve comunicar-se com seus companheiros, mas poderá receber alguma ajuda de seu instrutor.

Entre essa aula e a seguinte, cada participante deve completar, rever e, se possível, simplificar sua solução, procurar alguma outra abordagem para a solução, e assim por diante. Ele deve também, fazer um plano de aula para apresentar seu problema e sua solução para uma classe. Ele pode consultar o instrutor sobre qualquer dos pontos acima. Então, na aula prática seguinte, os participantes formam grupos de discussão; cada grupo composto de 4 membros selecionados, tanto quanto possível, de acordo com as suas afinidades. Um membro assume o papel do professor e três outros o papel dos alunos. O professor apresenta o seu problema aos alunos e tenta guiá-los para a solução, de acordo com a regra 9 e os outros mandamentos. Quando a solução for obtida, segue-se uma pequena crítica amistosa. Depois, outro membro toma o lugar do professor, apresenta o seu problema; e o procedimento se repete até que todos tenham tido sua vez. Alguns problemas particularmente interessantes ou apresentações particularmente boas são mostrados à classe completa e depois discutidos.

Resolução de problemas por grupos de discussão é muito popular e eu tenho a impressão de que os seminários, como um todo, são um sucesso. Os participantes são professores experientes e muitos deles sentem que a sua participação lhes dá idéias úteis para suas próprias aulas.

Referências

(1) A arte de resolver problemas. Interciência, Rio de Janeiro 1975.

(2) Mathematics and Plausible Reasoning, 2 vols. Princeton University Press.

(3) No "American Mathematica! Monthly", vol. 65 (1958), p. 101-104, escrevi um pequeno artigo onde apresentei alguns dos pontos de vista aqui expressos.

    Texto retirado da Revista do Professor de Matemática, da Sociedade Brasileira de Matemática, nº 10, 1º semestre de 1987, disponível no site: Link


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Definição de Número, por Elon Lages Lima

Elon Lages Lima

Números Naturais

"Deus criou os números naturais. O resto é obra dos homens." Leopold Kronecker

1. Introdução

Enquanto os conjuntos constituem um meio auxiliar, os números são um dos dois objetos principais de que se ocupa a Matemática. (O outro é o espaço, junto com as figuras geométricas nele contidas.)

Números são entes abstratos, desenvolvidos pelo homem como modelos que permitem contar e medir, portanto avaliar as diferentes quantidades de uma grandeza.

Os compêndios tradicionais dizem o seguinte:

"Número é o resultado da comparação entre uma grandeza e a unidade. Se a grandeza é discreta, essa comparação chama-se uma contagem e o resultado é um número inteiro; se a grandeza é contínua, a comparação chama-se uma medição e o resultado é um número real."

Nos padrões atuais de rigor matemático, o trecho acima não pode ser considerado como uma definição matemática, pois faz uso de idéias (como grandeza, unidade, discreta, contínua) e processos (como comparação) de significado não estabelecido. Entretanto, todas as palavras que nela aparecem possuem um sentido bastante claro na linguagem do dia-a-dia. Por isso, embora não sirva para demonstrar teoremas a partir dela, a definição tradicional tem o grande mérito de nos revelar para que servem e por qual motivo foram inventados os números. Isto é muito mais do que se pode dizer sobre a definição que encontramos no nosso dicionário mais conhecido e festejado, conforme reproduzimos a seguir.

Número. [Do lat. numeru.] S.m. 1. Mat. O conjunto de todos os conjuntos equivalentes a um conjunto dado. 

(...)

2.3 O Conjunto dos Números Naturais

Lentamente, à medida em que se civilizava, a humanidade apoderou-se desse modelo abstrato de contagem (um, dois, três, quatro, ...) que são os números naturais. Foi uma evolução demorada. As tribos mais rudimentares contam apenas um, dois, muitos. A língua inglesa ainda guarda um resquício desse estágio na palavra thrice, que tanto pode significar "três vezes" como "muito" ou "extremamente".

Algo parecido ocorre no idioma francês, onde as palavras très (muito) e trop (demasiado) são claramente vocábulos cognatos de trois (três), bem como em italiano, onde troppo (excessivamente) derivada de tre (três). É curioso observar que, em alemão, o fenômeno se dá com viel que significa "muito" enquanto vier quer dizer "quatro". Coincidência, ou os germânicos estavam um passo à frente dos bretões gauleses e romanos?

As necessidades provocadas por um sistema social cada vez mais complexo e as longas reflexões, possíveis graças à disponibilidade de tempo trazida pelo progresso econômico, conduziram, através dos séculos, ao aperfeiçoamento do extraordinário instrumento de avaliação que é o conjunto dos números naturais.

Decorridos muitos milênios, podemos hoje descrever concisa e precisamente o conjunto $\mathbb{N}$ dos números naturais, valendo-nos da notável síntese feita pelo matemático italiano Giuseppe Peano no limiar do século 20.

$\mathbb{N}$ é um conjunto, cujos elementos são chamados números naturais. A essência da caracterização de $\mathbb{N}$ reside na palavra "sucessor". Intuitivamente, quando $ n,\ \ n' \in \mathbb{N}$, dizer que $n'$ é o sucessor de $n$ significa que $n'$ vem logo depois de $n$, não havendo outros números naturais entre $n$ e $n'$. Evidentemente, esta explicação apenas substitui "sucessor" por "logo depois", portanto não é uma definição. O termo primitivo "sucessor" não é definido explicitamente. Seu uso e suas propriedades são regidos por algumas regras, abaixo enumeradas:

a) Todo número natural tem um único sucessor;

b) Números naturais diferentes têm sucessores diferentes;

c) Existe um único número natural, chamado um e representado pelo símbolo $1$, que não é sucessor de nenhum outro;

d) Seja $X$ um conjunto de números naturais (isto é, $X \subset \mathbb{N}$). Se $1\in X$ e se, além disso, o sucessor de todo elemento de $X$ ainda pertence a $X$, então $X =\mathbb{N}$.

As afirmações a), b), c) e d) acima são conhecidas como os axiomas de Peano. Tudo o que se sabe sobre os números naturais pode ser demonstrado como conseqüência desses axiomas.

Um engenhoso processo, chamado sistema de numeração decimal, permite representar todos os números naturais com o auxílio dos símbolos $0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8$ e $9$. Além disso, os primeiros números naturais têm nomes: o sucessor do número um chama se "dois", o sucessor de dois chama-se "três", etc. A partir de um certo ponto, esses nomes tornam-se muito complicados, sendo preferível abrir mão deles e designar os grandes números por sua representação decimal. (Na realidade, os números muito grandes não possuem nomes. Por exemplo, como se chamaria o número $10^{1000}$?).

Deve ficar claro que o conjunto $\mathbb{N} = \{1,2,3, . . . \}$ dos números naturais é uma seqüência de objetos abstratos que, em princípio, são vazios de significado. Cada um desses objetos (um número natural) possui apenas um lugar determinado nesta seqüência. Nenhuma outra propriedade lhe serve de definição. Todo número tem um sucessor (único) e, com exceção de $1$, tem também um único antecessor (número do qual é sucessor).

Vistos desta maneira, podemos dizer que os números naturais são números ordinais: $1$ é o primeiro, $2$ é o segundo, etc.

Um Pequeno Comentário Gramatical

Quando dizemos "o número um", "o número dois" ou "o número três", as palavras "um", "dois" e "três" são substantivos, pois são nomes de objetos. Isto contrasta com o uso destas palavras em frases como "um ano, dois meses e três dias", onde elas aparecem para dar a idéia de número cardinal, isto é, como resultados de contagens. Nesta frase, "um", "dois" e "três" não são substantivos. Pertencem a uma categoria gramatical que, noutras línguas (como francês, inglês e alemão, por exemplo) é chamada adjetivo numeral e que os gramáticos brasileiros e portugueses, há um par de décadas, resolveram chamar de numeral apenas. Este comentário visa salientar a diferença entre os números naturais, olhados como elementos do conjunto $\mathbb{N}$, e o seu emprego como números cardinais. 

(...)

Recomendação

1. Não se deve dar muita importância à eterna questão de saber se $0$ (zero) deve ou não ser incluído entre os números naturais. (Vide "Meu Professor de Matemática", pág. 150.) Praticamente todos os livros de Matemática usados nas escolas brasileiras consideram $0$ como o primeiro número natural (conseqüentemente $1$ é o segundo, $2$ é o terceiro, etc). Como se viu acima, não adotamos esse ponto-de-vista. Trata-se, evidentemente, de uma questão de preferência. Deve-se lembrar que o símbolo $0$ (sob diferentes formas gráficas) foi empregado inicialmente pelos maias, posteriormente pelos hindus, difundido pelos árabes e adotado no ocidente, não como um número e sim como um algarismo, com o utilíssimo objetivo de preencher uma casa decimal vazia. (No caso dos maias, a base do sistema de numeração era $20$, e não $10$.) De resto, a opção do número natural para iniciar a seqüência não se limita a escolher entre $0$ e $1$. Freqüentemente esquecemos que, do mesmo modo que conhecemos e usamos o zero mas começamos os números naturais com $1$, a Matemática grega, segundo apresentada por Euclides, não considerava 1 como um número. Nos "Elementos", encontramos as seguintes definições:

"Unidade é aquilo pelo qual cada objeto é um. Número é uma multitude de unidades".

(...)

A palavra "número" no dicionário

As vezes se diz que os conjuntos $X$ e $Y$ são (numericamente) equivalentes quando é possível estabelecer uma correspondência biunívoca $f: X \rightarrow Y$, ou seja, quando $X$ e $Y$ têm o mesmo número cardinal.

Isto explica (embora não justifique) a definição dada no dicionário mais vendido do país. Em algumas situações, ocorrem em Matemática definições do tipo seguinte: um vetor é o conjunto de todos os segmentos de reta do plano que são equipolentes a um segmento dado. (Definição "por abstração".) Nessa mesma veia, poder-se-ia tentar dizer: "número cardinal de um conjunto é o conjunto de todos os conjuntos equivalentes a esse conjunto." No caso do dicionário, há um conjunto de defeitos naquela definição, com um número cardinal razoavelmente elevado. Os três mais graves são:

1. Um dicionário não é um compêndio de Matemática, e muito menos de Lógica. Deve conter explicações acessíveis ao leigo (de preferência, corretas). As primeiras acepções da palavra "número" num dicionário deveriam ser "quantidade" e "resultado de uma contagem ou de uma medida".

2. A definição em causa só se aplica a números cardinais, mas a idéia de número deveria abranger os racionais e, pelo menos, os reais.

3. O "conjunto de todos os conjuntos equivalentes a um conjunto dado" é um conceito matematicamente incorreto. A noção de conjunto não pode ser usada indiscriminadamente, sem submeter-se a regras determinadas, sob pena de conduzir a paradoxos, ou contradições. Uma dessas regras proíbe que se forme conjuntos a não ser que seus elementos pertençam a, ou sejam subconjuntos de, um determinado conjunto-universo. Um exemplo de paradoxo que resulta da desatenção a essa regra é "o conjunto $X$ de todos os conjuntos que não são elementos de si mesmos." Pergunta-se: $X$ é ou não é um elemento de si mesmo? Qualquer que seja a resposta, chega-se a uma contradição.

(...)

Números Reais

4.1 Segmentos Comensuráveis e Incomensuráveis

Seja $AB$ um segmento de reta. Para medi-lo, é necessário fixar um segmento-padrão $u$, chamado segmento unitário. Por definição, a medida do segmento $u$ é igual a $1$. Estipularemos ainda que segmentos congruentes tenham a mesma medida e que se $n - 1$ pontos interiores decompuserem $AB$ em $n$ segmentos justapostos então a medida de $AB$ será igual à soma das medidas desses $n$ segmentos. Se estes segmentos parciais forem todos congruentes a $u$, diremos que $u$ cabe $n$ vezes em $AB$ e a medida de $AB$ (que representaremos por $\overline {AB}$) será igual a $n$.

Pode ocorrer que o segmento unitário não caiba um número exato de vezes em $AB$. Então a medida de $AB$ não será um número natural. Esta situação conduz à idéia de fração, conforme mostraremos agora.

Procuramos um pequeno segmento de reta $w$, que caiba $n$ vezes no segmento unitário $u$ e $m$ vezes em $AB$. Este segmento $w$ será então uma medida comum de $u$ e $AB$. Encontrado $w$, diremos que $AB$ e $u$ são comensuráveis. A medida de $w$ será a fração $1/n$ e a medida de $AB$, por conseguinte, será $m$ vezes $1/n$, ou seja, igual a $m/n$.

Relutantes em admitir como número qualquer objeto que não pertencesse ao conjunto $\{2, 3, 4, 5, \}$, os matemáticos gregos à época de Euclides não olhavam para a fração $m/n$ como um número e sim como uma razão entre dois números, igual à razão entre os segmentos $AB$ e $u$.

Na realidade, não é muito importante que eles chamassem $m/n$ de número ou não, desde que soubessem, como sabiam, raciocinar com esses símbolos. (Muito pior eram os egípcios que, com exceção de $2/3$, só admitiam frações de numerador $1$. Todas as demais, tinham que ser expressas como somas de frações de numerador $1$ e denominadores diferentes. Por exemplo, $7/10$ no Egito era escrito como $1/3 + 1/5 + 1/6$.)

O problema mais sério é que por muito tempo se pensava que dois segmentos quaisquer eram sempre comensuráveis: sejam quais fossem $AB$ e $CD$, aceitava-se tacitamente que haveria sempre um segmento $EF$ que caberia um número exato n de vezes em $AB$ e um número exato $m$ de vezes em $CD$. Esta crença talvez adviesse da Aritmética, onde dois números naturais quaisquer têm sempre um divisor comum (na pior hipótese, igual a $1$).

A ilusão da comensurabilidade durou até o quarto século antes de Cristo. Naquela época, em Crotona, sul da Itália, havia uma seita filosófico-religiosa, liderada por Pitágoras. Um dos pontos fundamentais de sua doutrina era o lema "Os números governam o mundo". (Lembremos que números para eles eram números naturais, admitindo-se tomar razões entre esses números, formando as frações.) Uma enorme crise, que abalou os alicerces do pitagorismo e, por algum tempo, toda a estrutura da Matemática grega, surgiu quando, entre os próprios discípulos de Pitágoras, alguém observou que o lado e a diagonal de um quadrado são segmentos de reta incomensuráveis.

O argumento é muito simples e bem conhecido.

Figura 4.1

Se houvesse um segmento de reta $u$ que coubesse $n$ vezes no lado $AB$ e $m$ vezes na diagonal $AC$ do quadrado $ABCD$ então, tomando $AB$ como unidade de comprimento, a medida de $AC$ seria igual a $m/n$ enquanto, naturalmente, a medida de $AB$ seria $1$. Pelo Teorema de Pitágoras teríamos $(m/n)^2 = 1^2 + 1^2$, donde $m^2/n^2 = 2$ e $m^2 = 2n^2$. Mas esta última igualdade é absurda, pois na decomposição de $m^2$ em fatores primos o expoente do fator 2 é par enquanto em $2n^2$ é ímpar.

A existência de segmentos incomensuráveis significa que os números naturais mais as frações são insuficientes para medir todos os segmentos de reta.

A solução que se impunha, e que foi finalmente adotada, era a de ampliar o conceito de número, introduzindo os chamados números irracionais, de tal modo que, fixando uma unidade de comprimento arbitrária, qualquer segmento de reta pudesse ter uma medida numérica. Quando o segmento considerado é comensurável com a unidade escolhida, sua medida é um número racional (inteiro ou fracionário). Os números irracionais representam medidas de segmentos que são incomensuráveis com a unidade. 

No exemplo acima, quando o lado do quadrado mede $1$, a medida da diagonal é o número irracional $\sqrt{2}$. (O fato de que esta conclusão não depende do tamanho do quadrado que se considera, deve-se a que dois quadrados quaisquer são figuras semelhantes.)

Recomendação

1. Nos meios de comunicação e entre pessoas com limitado conhecimento matemático, a palavra incomensurável é muitas vezes usada em frases do tipo: havia um número incomensurável de formigas em nosso piquenique. Nunca diga isso. Incomensurabilidade é uma relação entre duas grandezas da mesma espécie; não dá idéia de quantidade muito grande. Uma palavra adequada no caso das formigas seria incontável ou imenso. Noutros casos, como um campo gigantesco, poderia ser imensurável ou imenso. Mas nada é incomensurável, a não ser quando comparado com outro objeto (grandeza) da mesma espécie.

(...)

Recomendação 2

A maioria de nossos livros escolares define número racional como "o número que pode ser expresso como quociente de dois inteiros", número irracional como "o número que não é racional" e $\mathbb{R}$ como o conjunto dos números racionais mais os irracionais. Como seus autores não dizem o que entendem por "número", resulta de suas definições que um número musical ou um número de uma revista são números irracionais. Não se deve adotar esse tipo de atitude. É verdade que a apresentação rigorosa da teoria dos números reais (conforme feita nos cursos de Análise) foge inteiramente ao nível e aos objetivos do ensino médio. Mas isto não deve ser motivo para escamoteações. Pelo contrário, quando se tem que falar sobre números reais para uma audiência matematicamente imatura, tem-se aí uma boa oportunidade para fazer a ligação entre a Matemática e o cotidiano, apresentando-os como resultados de medições, como tentamos explicar aqui.

Retirado do livro A Matemática do Ensino Médio, Volume 1. Autores: Elon Lages Lima, Paulo Cezar Pinto Carvalho, Eduardo Wagner e Augusto César Morgado. 10 ed. - Rio de Janeiro: SBM, 2012.


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A dura tarefa de escrever livros de Matemática

Johannes Kepler (1620),
autor desconhecido

O texto em latim abaixo reproduzido é parte da introdução do livro "Astronomia Nova", escrito por Johannes Kepler e publicado em Praga em 1609. Segue-se uma tradução feita pelo Professor José Paulo Q. Carneiro, da UFRJ. Esse mesmo trecho serviu de abertura ao livro "Variationsrechung im Grossen", de H. Seifert e W. Threlfall, (Teubner, Berlim, 1938) e provavelmente foi a inspiração para os cuidados que levaram aqueles autores a produzir sua pequenina e maravilhosa obra prima de exposição matemática.

É muito difícil hoje em dia escrever livros de Matemática. Se você não preservar a sutileza original das proposições, das explicações, das demonstrações e das conclusões, o livro não será autenticamente matemático. Se, no entanto, você mantiver tudo isso, a leitura se tornará muito lenta. Por isso muito poucos são hoje os leitores dignos de confiança; os outros só conseguem enfrentar banalidades. Quantos matemáticos agüentam o  esforço de ler as Cônicas de Apolônio de Perga? E note-se que o assunto aí tratado é destes que se coloca em figuras e linhas muito mais facilmente que o presente livro. Eu mesmo, com toda a minha reputação de matemático, quando releio este meu trabalho, sinto um apreciável cansaço cerebral, ao tentar passar do texto para a mente aquele significado mais profundo das demonstrações que eu mesmo antes tinha passado da mente para o texto. E quando tento remediar a obscuridade do assunto inserindo explicações, aí me sinto com o vício contrário, o da loquacidade em Matemática. De fato, a prolixidade tem sua dose de obscuridade, não menor do que a concisão. Esta escapa aos olhos da mente, aquela os confunde; esta carece de luz, aquela sofre de excesso de luminosidade; aqui a visão não se move, lá é ofuscada. Por isso tomei a decisão de ajudar o entendimento do leitor com uma introdução a mais clara possível a esta obra.

Texto original em latim

Durissima est hodie condictio scribendi libros mathematicos. -- Nisi enim servaveris genuinam subtilitatem propositionum, instructionum, demonstrationum, conclusionum, liber non erit mathematicus; sin autem servaveris, lectio efficitur morosissima. Adeo que hodie perquam pauci sunt lectores idonei: ceteri in commune respuunt. Quotusquisque mathematicorum est, qui tolerat laborem perlegendi Apollonii Pergaei Conica? Est tamen illa materia ex eo rerum genere, quod longe facilius exprimitur figuris et lineis quam nostra. -- Ipse ego, qui mathematicus audio, hoc meum opus relegens fatisco viribus cerebri, dum ex figuris ad mentem revoco sensus demonstrationum, quos a mente in figuras et textum ipse ego primitus induxeram. Dum igitur medeor obscuritati materiae insertis circumlocutionibus, jam mihi contrario vitio videor in re mathematica loquax. Et habet ipsa etiam prolixitas phrasium suam obscuritatem non minorem quam concisa brevitas. Haec mentis oculos effugit, illa distrahit: eget haec luce, illa splendoris copia laborat: hic non movetur visus, illic plane excoecatur. -- Ex eo consilium cepi, quadam luculenta intoductione in hoc opus juvare captum lectoris, quoad ejus fieri possit.

Texto extraído da Revista Matemática Universitária (RMU n.2, dezembro de 1985) disponível no link.


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