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A Arte da Memória

por Eduardo Rocha do Instituto Hugo de São Vitor.

Grandes intelectuais dedicaram tempo a um tema recorrente: A arte da memória. Cícero é um dos mais antigos que temos registro, outros tratam do tema com mais detalhes ainda, como Santo Tomás de Aquino, Santo Agostinho, monges e professores do século XV e até mesmo, mais recentemente, Sertillanges, que escreve sobre o tema num capítulo de A Vida Intelectual, assim como outro livro mais abrangente, de abordagem mais histórica, de Frances Yates, dentre um manancial de títulos. Sabemos que ao nos depararmos com uma grande quantidade de novos vocábulos ou textos e retê-los na memória não encaramos uma atividade fácil nem mesmo aos que se submetem a uma vida de muito estudo; pois, um observador atento e consciente dos próprios passos que dá, enquanto estuda, nota que boa parte do sucesso está ligada ao interesse específico, esforço e habilidade para memorizar uma série de itens.

A arte da memória já foi considerada a rainha de todas as artes e por ela podemos conhecer ainda mais sobre nosso próprio intelecto, assim como dominá-la.

Não somos capazes de crescer nem mesmo em virtudes se exercitamos pouco a memória. Reavivando certos momentos em que reconhecemos esse aspecto, vemos, por exemplo, que ao nos esforçarmos por lembrar de algo, as informações, as imagens antes simbolizadas e todas as lembranças se misturam pelo menos um pouco; há no intelecto, nesse momento, não só uma simples mistura, mas também a perda de informações ou o distanciamento delas.

O remédio contra isso permanece ainda um mistério para muitos que guardam escondida, por exemplo, a vergonha de não conseguirem cantar músicas inteiras ou declamar poesias, dominar técnicas – com sequências de itens a serem repetidas, como uma escala de acordes no piano, aprender línguas, melhorar no que já praticam, dentre muitas atividades que dependem dessa habilidade; então, em decorrência do problema, muitos dizem “li há pouco tempo um texto enorme, mas agora não consigo dizer muito sobre ele” ou alguns piores “tento aprender gramática desde a quinta série e nunca lembro de nada” e também “estudo espanhol há mais de 3 anos, leio bem os textos, mas escrevo mal por causa dos tempos verbais e das regras ortográficas”.

No entanto, algumas pessoas passam menos por isso sendo normal reterem muitos itens na memória, mesmo por talento natural, característica que lhes dá vantagem para tudo que aprendem. Portanto devemos ter pelo menos, se formos minimamente responsáveis, alguma noção de como isso funciona.

Segundo Frances Yates, em A Arte da Memória, há uma produção bibliográfica muito intensa que começa a se acumular a partir do início do século XV, na qual encontramos obras de escolásticos e outras reescritas de livros mais antigos contendo muitas técnicas de memorização, cada uma conforme suas necessidades específicas, em grande parte para serem usadas para a leitura das Escrituras Sagradas. Para entendermos um pouco como a mnemotécnica funciona, devemos pensar primeiro sobre uma questão, até bem simples: do que somos capazes de lembrar com mais facilidade? Se compararmos a qualidade das memórias que temos, podemos facilmente reconhecer que as coisas de nosso maior interesse nas quais detemos a atenção, com uma curiosidade maior, são muito mais fáceis de guardar, assim como momentos intensos e ambientes pelos quais frequentamos por certo tempo; resumidamente podemos dizer que esta atenção nos levou a um trabalho imaginativo mais rico, mais denso, como se produzisse em nosso intelecto um material pesado de difícil remoção, o que também é típico daqueles que precisam desvendar mistérios urgentes e lembram-se da investigação nos mínimos detalhes.

No caso contrário, quando passamos muito tempo encarando um assunto que nos seja desagradável ou para o qual sejamos indiferentes ou, por exemplo, num texto que corramos os olhos apenas uma vez, temos muito mais dificuldade com a memorização. Desse modo, o básico é ler ou aprender algo sempre com uma imaginação ativa, que produza as imagens referidas ou listadas com a maior qualidade possível, como, por exemplo, ao ler “maçã”, não só lembrar da cor vermelha e do formato arredondado, mas também do brilho, cheiro, gosto, temperatura, dentre outros tantos atributos possíveis do objeto; e num momento seguinte, em se tratando de uma narrativa ou discurso lógico, vincular todas as imagens produzidas com a ordem que foram dadas, de forma que guardemos uma cadeia de informações do início ao fim e a imagem do todo – já para itens sem ligação entre si, depositá-los próximos uns dos outros como se os enxergássemos de perto dispostos num ambiente. Esses passos podem nos ajudar a entender a técnica talvez mais popular, denominada “palácio da memória”, na qual deixamos os itens que desejamos memorizar espalhados por um lugar que tenha de preferência uma arquitetura bem conhecida, valendo-se da afirmação de que a memória espacial é a mais forte.

Tomemos isso tudo como dicas bem resumidas, pois há uma multidão de livros e materiais sobre o tema, assim como inúmeras formas de usar as mesmas técnicas mnemônicas. O assunto é vasto e complexo, nunca deixará de fazer parte de nenhuma atividade humana, hoje limitadas por não termos mais consciência da liberdade que a inteligência cria. Desse modo, a exemplo de tantos que se empenharam por enrijecer a memória e detiveram soluções incríveis da mnemotécnica - que não servem para evitar esforços, visto que as próprias ferramentas demandam os seus, mas sim para melhorar a qualidade do estudo – também alavanquemo-nos nas atividades mais complexas como no domínio das línguas e de textos literários, caminhemos de encontro às questões de nosso interesse verdadeiro sem medo e façamos esforços com toda a nossa capacidade.

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Texto retirado do link.


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